Acórdão Nº 01001311220158200135 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 26-05-2020

Data de Julgamento26 Maio 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01001311220158200135
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100131-12.2015.8.20.0135
Polo ativo
JAILMA CANDIDA DA SILVA
Advogado(s): MIZAEL GADELHA
Polo passivo
EMBRATEL TVSAT TELECOMUNICACOES SA
Advogado(s): FERNANDO AUGUSTO CORREIA CARDOSO FILHO

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO POR DANO MORAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. AQUISIÇÃO DE ANTENA PARABÓLICA COM CANAIS ABERTOS GRATUITOS. COBRANÇA INDEVIDA DE PACOTE DE CANAIS NÃO CONTRATADO PELO CONSUMIDOR. INTERRUPÇÃO DE SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE SINAL DE TV. RELAÇÃO NEGOCIAL NÃO COMPROVADA PELA EMPRESA RÉ. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CABIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 6º, VIII, DO CDC. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA. TEORIA DO DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR OU PERDA DE TEMPO ÚTIL DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. PROVA DA TENTATIVA REITERADA DE SOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA NA ESFERA EXTRAJUDICIAL. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE. DANO MORAL CONFIGURADO. ABALO PSICOLÓGICO QUE EXTRAPOLOU O LIMITE DO MERO DISSABOR. REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas. Acordam os Desembargadores que integram a Terceira Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, conhecer e dar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por JAILMA CÂNDIDA DA SILVA em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Almino Afonso que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenizatória por si ajuizada em desfavor de EMBRATEL TVSAT TELECOMUNICAÇÕES S.A. (CLARO HDTV), julgou improcedente a pretensão autoral. Condenou a parte autora em custas e honorários de sucumbência, estes fixados em 10% do valor da causa, suspendendo a sua exigibilidade em face da justiça gratuita.

A parte autora foi condenada no pagamento de honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, fixando suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade judiciária.

Nas razões recursais (ID 5354505), sustenta, em síntese, que restou comprovada a cobrança indevida, consubstanciada no bloqueio dos canais abertos.

Alega que “na contestação (fls. 40/41), a empresa apelada sustenta que a apelante não efetivou o pagamento correspondente ao pacote de canais (fechados) supostamente solicitado, o que ensejou o bloqueio da antena”, razão pela qual resta “incontroversa a cobrança e a interrupção do sinal, ex vi do art. 341do novo Código de Processo Civil, não havendo necessidade que a apelante produzisse prova sobra tais circunstâncias”.

Afirma que jamais solicitou qualquer pacote de canais fechados (pagos), tendo feito uso apenas dos canais abertos (Claro TV Livre) desde quando adquiriu a antena.

Acrescenta que “a empresa recorrido poderia muito bem ter juntado documentos que comprovassem a legitimidade do suposto débito, demonstrando que a apelante solicitou o pacote de canais impugnado, todavia não o fez, devendo suportar os efeitos de sua inércia”.

Argumenta que resta caracterizada a falha na prestação do serviço, sendo o restabelecimento do sinal da antena medida que se impõe, bem como a reparação pelos danos morais suportados.

Aduz que solicitou em diversas oportunidades o restabelecimento do serviço, tendo sido informada pela empresa recorrida a impossibilidade sem o pagamento dos supostos débitos em aberto, informando os respectivos protocolos de atendimento.

Com base nesses fatos, pugna pelo conhecimento e provimento do apelo, para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos autorais.

Nas contrarrazões (ID 5354506), a apelada pede pelo desprovimento do recurso.

A 11ª Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da apelação cível.

Pretende o apelante reformar a sentença que julgou improcedente a pretensão autoral.

Da análise dos autos, observa-se que a autora ajuizou a presente demanda arguindo que foi surpreendida com a interrupção do sinal de TV (canais abertos), tendo argumentado a empresa ré que foi contratado um pacote de serviço de canais fechados pela demandante.

Nesse passo, considerando que a relação firmada entre a parte autora e a parte demandada trata-se inquestionavelmente de relação de consumo, ainda que potencial, deverá o caso vertente ser analisado sob o amparo da Teoria da Responsabilidade Objetiva, mormente considerando o que determina o caput do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

De acordo com a Teoria da Responsabilidade Objetiva, o ofendido, ao buscar ser ressarcido pelos possíveis danos que lhe advieram, não precisa demonstrar a culpa do seu causador, sendo suficiente a comprovação do prejuízo suportado e o liame de causalidade entre a atividade do agente e o dano ensejado.

Baseia-se tal espécie de responsabilidade em um princípio de equidade, pelo qual aquele que se beneficia com uma determinada situação deve responder pelos riscos ou pelas desvantagens dela provenientes.

Nesse passo, cumpre ressaltar que, via de regra, cabe a quem ingressa com um processo no Poder Judiciário o ônus de provar suas alegações, no entanto, quando se trata de relação de consumo, como no caso em tela, existe a possibilidade da inversão desse ônus em favor do consumidor, quando for verossímil sua alegação ou quando ele for considerado hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências, conforme estabelece o art. 6º, VIII do Código de Defesa do Consumidor, ou seja, pode-se transferir para o fornecedor a obrigação de provar que não lesou o consumidor.

Ademais, a inversão do ônus da prova tem por escopo impedir o desequilíbrio da relação jurídica, e não se trata de faculdade do juiz, mas um direito do consumidor, quando preenchido os requisitos legais.

Feitas tais considerações iniciais, sobretudo considerando o lastro probatório reunido no feito, entendo relevante a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, posto que expressamente requerida pela parte autora, além de ser verossímil a alegação autoral, aliada ao seu estado de hipossuficiência.

Ocorre que, a demandada/apelada, apesar de sustentar a existência de contrato em nome da autora/recorrente, não produziu prova suficiente a demonstrar a relação jurídica. Não trouxe aos autos, sequer, telas de consulta ao seu próprio sistema interno, documento assinado pela consumidora, ou áudio de conversa em seu sistema de telemarketing.

Em que pese alegar que o ônus da prova cabe à parte autora, a parte ré afirmou, em sua contestação, que “A parte autoria contratou, sim, o serviço da promovida. A parte autora possuidora de antena de canais livres, adotou um pacote fechado da promovida com direito a outros canais, pagando um valor mensal por estes” (Id 5354497 – pág. 6), assumindo, assim, o ônus de comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do art. 373, II, do CPC.

Em contrapartida, a autora comprovou, através de prova testemunhal, a interrupção indevida do seu sinal de TV (Id 5354503).

Desta feita, presentes os pressupostos básicos autorizadores da responsabilidade civil, pois age ilicitamente qualquer instituição que cobra indevidamente dívida inexistente, sem comprovar que as obrigações foram pactuadas com aquele cliente, surge o dever de reparar o prejuízo material e moral suportado pela pessoa que sofreu abalo em função de conduta ilegítima.

Portanto, agiu a empresa ré de modo irresponsável, negligenciando elementos de consentimento necessários para a realização contratual, e sem tomar as cautelas que a prestação de serviços dessa natureza recomenda.

Assim, diante de toda a situação analisada nos autos, o dano moral restou comprovado, tendo a demandante passado por situação vexatória ao sofrer cobrança indevida, como se devedor fosse, bem como em ter seu serviço de TV interrompido sem que houvesse dado causa para tanto.

Neste sentido, é a jurisprudência desta Corte de Justiça:

CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA CONSUMIDORA. CONTRATO BANCÁRIO NÃO APRESENTADO. INEXISTÊNCIA DE PROVA. FORTUITO INTERNO. DANO MORAL CONFIGURADO. RESPONSABILIDADE CIVIL. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO QUE SE IMPÕE. PRECEDENTES DESTA CORTE. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (AC nº 2018.006545-8, Rel. Des. Cornélio Alves, 1ª Câmara Cível, Julgado em 10/12/2018).

CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COMPROVADO. COBRANÇA INDEVIDA DE CONTRATO DE TELEVISÃO POR ASSINATURA. INCLUSÃO DO NOME DO AUTOR NOS CADASTROS DOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DEMONSTRAÇÃO DO ILÍCITO, ALÉM DO NEXO DE CAUSALIDADE A ENSEJAR A CONDENAÇÃO DA PARTE DEMANDADA AO PAGAMENTO DE VERBA INDENIZATÓRIA REFERENTE AOS DANOS MORAIS APONTADOS NA PEÇA PREAMBULAR. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 14 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. QUANTUM INDENIZATÓRIO ARBITRADO QUE OBSERVOU OS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MINORAÇÃO. DESNECESSIDADE. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. (AC nº 2016.006966-3, Rel. Juiz Convocado Jarbas Bezerra, 3ª Câmara Cível, Julgado em 31/01/2017).

Nestes termos, merece reforma o julgamento hostilizado, pois prolatada em...

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