Acórdão Nº 01002099120168200160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 27-01-2023

Data de Julgamento27 Janeiro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01002099120168200160
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100209-91.2016.8.20.0160
Polo ativo
MARIA STELLA FREIRE DA COSTA
Advogado(s): ABRAAO DIOGENES TAVARES DE OLIVEIRA, OHANA GALVAO DE GOES BEZERRA
Polo passivo
MUNICIPIO DE UPANEMA
Advogado(s):

EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA QUE CONDENOU A DEMANDADA NAS CONDUTAS DEFINIDAS NOS ARTS. 10, VIII E XI, DA LIA, NA MODALIDADE CULPOSA, NOS TERMOS DA REDAÇÃO ANTERIOR DA LEI Nº 8.429/92. AUSÊNCIA DE ELEMENTO SUBJETIVO NECESSÁRIO PARA A CONFIGURAÇÃO DOS ATOS TIDOS COMO ÍMPROBOS. EXIGÊNCIA DO DOLO PARA A SUA CARACTERIZAÇÃO. TESE DA REPERCUSSÃO GERAL FIXADA PELO STF COM A NOVA LEI 14.230/22021. APLICABILIDADE AOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CULPOSOS PRATICADOS AINDA NA VIGÊNCIA DO TEXTO ANTERIOR, PORÉM SEM CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. INOCORRÊNCIA DE DOLO, MÁ-FÉ OU ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. INAPLICABILIDADE DAS SANÇÕES PREVISTAS NO ARTIGO 12, INCISO III DA LEI Nº 8.429/92. REFORMA DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO APELO.


ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Primeira Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer ministerial, conhecer e dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO


Trata-se de apelação cível interposta por MARIA STELLA FREIRE DA COSTA, por seu advogado, em face da sentença exarada pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Upanema/RN que, nos autos da Ação Civil de Improbidade Administrativa de registro nº 010020991.2016.8.20.0160, ajuizada pelo MUNICÍPIO DE UPANEMA/RN, julgou parcialmente procedente a pretensão veiculada na inicial. Eis o teor do dispositivo da sentença recorrida (ID 11623098): “… Diante do exposto, nos termos dos artigos 10, caput e incisos VIII e IX da Lei 8.429/92, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pleito veiculado na exordial para reconhecer que o demandado MARIA STELLA FREIRE DA COSTA, praticou ato de improbidade administrativa que causa prejuízo ao erário, condenando-o às sanções de a) ressarcimento ao erário correspondente ao valor adimplido a mais pelo Município de Upanema/RN, em virtude da não realização de processo licitatório com a participação de outros licitantes, acrescido de atualização monetária e de juros de mora de 1% ao mês, contados a partir do dano ao erário, a ser apurado em sede de liquidação de sentença; b) pagamento de multa civil, em favor da municipalidade, nos termos do que preceitua o art. 18 da LIA, de 01 vez o valor do dano, consistente no valor adimplido a mais pelo Município de Upanema/RN em virtude da não realização de processo licitatório com a participação de outros licitantes, acrescido de atualização monetária e de juros de mora de 1% ao mês, a partir da data do evento danoso, a ser apurado em sede de liquidação de sentença; c) suspensão dos direitos políticos por 05 (cinco) anos; d) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos; Ratifico a decisão de ID 48699113 que decreta a indisponibilidade dos bens do demandado no limite da sua responsabilidade que lhe é atribuída. No mais, condeno a demandada sucumbente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no importe de 10% (dez) por cento. Lance-se no cadastro do CNJ de condenados por improbidade administrativa. Sentença não sujeita a reexame necessário.

As razões recursais da apelante (ID 11623104) encontram-se fundadas nos seguintes pontos principais: I) necessidade de deferimento da justiça gratuita; II) integral satisfação do objeto do convênio nº 704875/2009, com comprovação de realização de evento compatível com geradores de fluxo e banda/artista de notoriedade nacional, implicando em regularidade formal e material do procedimento de inexigibilidade de licitação; III) o fim para o qual se destinava o convênio foi atingido com a completa execução do seu objeto e atendimento ao interesse público, de modo que, embora possa ter havido questões técnicas e burocráticas não previstas e levadas a termo por indução ao erro, os recursos públicos foram corretamente aplicados e licitamente destinados, não tendo havido favorecimento do gestor ou de terceiro, além de absoluta ausência de dolo ou culpa; IV) não há evidência de que o Município Apelado tenha sofrido prejuízo por inscrição no CAUC por culpa exclusiva da apelante, pois seria imprescindível a prova de que os eventos danosos resultaram em prejuízo evidente para o recebimento de repasse por parte do município, a teor da Súmula 615, do STJ e por aplicação do princípio da intranscendência subjetiva das sanções. Por fim, requer que: “A) A CONCESSÃO DO PEDIDO DE GRATUIDADE DA JUSTIÇA, vez que a Apelante não tem condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo de seu próprio sustento; B) O CONHECIMENTO E REGULAR PROCESSAMENTO DO PRESENTE RECURSO DE APELAÇÃO PARA QUE SEJA DADO PROVIMENTO AO PRESENTE APELO com a consequente reforma da r. decisão e declaração de inexistência de qualquer ato de improbidade administrativa por parte da Apelante, isentando-a de qualquer multa civil ou qualquer outra penalidade, haja vista preencher os requisitos para sua admissibilidade; C) Na eventualidade de se confirmar a procedência do pleito, QUE SEJA REFORMADA A R. SENTENÇA PARA QUE SEJAM ADEQUADAS AS PENALIDADES À REALIDADE DOS FATOS, em cumprimento ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade, especialmente porque não há comprovação de enriquecimento ilícito de quem quer que seja.”

O Ministério Público apresentou contrarrazões no ID 11623116, pugnando pelo desprovimento do recurso.

A 12ª Procuradoria de Justiça, no ID 16632321, opinou nos autos pelo conhecimento e desprovimento do apelo.

É o relatório.


VOTO


Verifico preenchidos os requisitos de admissibilidade, razão pela qual conheço do recurso.

De início impende registrar que em 26 de outubro de 2021, entrou em vigor a Lei nº 14.230/202, promovendo alterações substanciais na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92), e que, no caso dos autos, considerando que o término do mandato da apelante ocorreu em 31.12.2012 e que a presente ação civil pública por ato de improbidade administrativa fora ajuizada em 12.05.2016, verifica-se que a demanda judicial se deu antes de fluir o prazo quinquenal.

Diante desse contexto, o Ministério Público em parecer de ID 16632321, registrou com bastante propriedade que de acordo com a sentença, a apelante foi condenada pela prática de improbidade, na modalidade culposa, com fundamento no art. 10, incisos VIII e XI, porém, referidos dispositivos foram profundamente alterados pela Lei nº 14.230/21, passando o caput do art. 10 a prever apenas a forma dolosa da conduta, sendo ainda alterado seu inciso VIII que passou a prever “perda patrimonial efetiva”.

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal (STF), na análise do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 843989, com repercussão geral (Tema 1.199), fixou a tese de que é necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA a presença do elemento subjetivo dolo, deixando evidenciado ainda que a nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do tipo culposo, devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente.

Dito isso, considerando essas premissas, verifica-se que assiste razão a ora recorrente.

Da análise dos autos, verifica-se que o ponto central do apelo diz respeito à averiguação de possível cometimento, pela ré, ora recorrente, de ato ilícito qualificado como ímprobo, capitulado no artigo 10, incisos VIII e XI, da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92).

O Juiz de primeiro grau, analisando o caso, concluiu ter a ora apelante agido na modalidade culposa, entendimento este que restou acatado pelo Município de Upanema/RN, que atuou no feito na condição de parte, bem como o Ministério Público estadual, que funcionou no processo como custos legis, já que não interpuseram recurso quanto à decisão, não podendo, neste instante, haver reformatio in pejus.

Assim, nos termos do decidido, em sede de repercussão geral, no ARE 843989, seria “necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9o, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo – DOLO”, aplicando-se as inovações trazidas pela Lei 14.230/2021 “aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente”.

Nesse contexto, como já dito, seguindo a tese da repercussão geral fixada pelo STF, com a nova Lei 14.230/22021, a regra agora é a responsabilidade pelo elemento subjetivo, destacando a exigência do dolo para a configuração da improbidade, deixando assim de existir a modalidade culposa.

Dito isso, apesar das irregularidades consistentes na utilização irregular dos recursos públicos, no montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais), relativo ao convênio nº 704875/2009 celebrado entre o Município de Upanema e o Ministério do Turismo, por si...

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