Acórdão Nº 01002864920138200114 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 27-05-2021

Data de Julgamento27 Maio 2021
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
Número do processo01002864920138200114
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0100286-49.2013.8.20.0114
Polo ativo
WELLINSON CARLOS DANTAS RIBEIRO
Advogado(s): GILBERTO DE MORAIS TARGINO FILHO
Polo passivo
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e outros
Advogado(s):

Apelação Criminal n° 0100286-49.2013.8.20.0114

Origem: Vara Única da Comarca de Canguaretama

Apelante: Wellinson Carlos Dantas Ribeiro

Advogado:Gilberto de Morais Targino Filho

Apelado: Ministério Público

Relator: Dr. Roberto Guedes (Juiz Convocado)

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APCRIM CRIME DE RESPONSABILIDADE (ART. 1º, XIII DO DL 201/1967). MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADOS QUANTUM SATIS. CRIME FORMAL. DESNECESSIDADE DE RESULTADO NATURALÍSTICO PARA SUA CARACTERIZAÇÃO. INSUBSISTÊNCIA DA TESE ABSOLUTÓRIA. DOSIMETRIA. CÁLCULO NA PRIMEIRA FASE ENTABULADO NA PAUTA DE PREMISSAS LEGAIS EQUIVOCADAS E EM DISSENTIMENTO À DIRETRIZ DE 1/8, ESTABELECIDA PELO STJ. REDIMENSIONAMENTO IMPERATIVO, COM O SUBSEQUENTE RECONHECIMENTO DE UMA DAS CAUSAS DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO DECURSO DO TEMPO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL, COM O RECONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores integrantes da Câmara Criminal deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância parcial com a 2ª Procuradoria de Justiça, conhecer e prover em parte a Apelação, reconhecendo, diante do redimensionamento sancionatório, e em harmonia com o parecer oral do Dr. José Alves, 4º Procurador de Justiça, a prescrição retroativa, nos termos do voto Relator.

RELATÓRIO

1. Apelação interposta por Wellinson Carlos Dantas Ribeiro em face da sentença do Juízo de Canguaretama, o qual na AP 0100286-49.2013.8.20.0114, onde se acha incurso no art. 1º, XIII do Decreto-Lei 201/67 (crime de responsabilidade), lhe condenou a 04 (quatro) anos e 02 (dois) meses de reclusão, em regime semiaberto (art. 33, §2º, “b” do CP) e ainda a perda do cargo e a inabilitação para o exercício do cargo e função pública pelo prazo de 05 (cinco) ano, a contar do trânsito em julgado, consoante o art. 1º, §2º do Decreto-Lei 2.201/67 (Id 9195975, p. 01-16).

2. Segundo reproduzido na sentença, “… narra a peça acusatória que o denunciado Wellinson Carlos Dantas Ribeiro, na condição de Prefeito de Canguaretama/RN nos anos de 2009 e 2010, admitiu 689 (seiscentos e oitenta e nove) servidores públicos municipais irregularmente, contrariando expressamente o art. 37, II da Constituição Federal, bem como as Leis Municipais nº 551/2009 e nº 855/2010, em detrimento dos candidatos aprovados nos concursos públicos referentes aos Editais nº 01/2005 e 01/2008 …” (Id 9195975, p. 01).

3. Em razões insertas no Id 9195978, p. 01-16, pede: i) absolvição pela ausência de provas e ilicitude; ii) decote dos vetores por fundamentação inidônea e redimensionamento da pena base; e iii) exclusão da continuidade delitiva.

4. Contrarrazões (Id 9195978, p. 01-10).

5. Parecer pelo seu conhecimento e provimento parcial (Id 9250651, p. 01-13).

6. É o relatório.

7. Feito sem revisor.

VOTO

8. Conheço do Recurso.

9. No mais, com razão em parte o Apelante.

10. Com efeito, malgrado insista a Defesa no pleito de absolvição pela ausência de provas e de ilicitude da conduta (i), a materialidade se acha demonstrada pela vasta e pródiga documentação acostada aos autos, cujo conteúdo revela o desacerto das contratações, de índole temporária e inerentes a cargos de provimento efetivo, cujo preenchimento, como cediço, pressupõe aprovação em concurso público.

11. Já a autoria resta inconteste, porquanto era o Recorrente prefeito do Município na época dos fatos e, portanto, responsável pelo engendramento dos aludidos atos administrativos.

12. Aliás, em seu depoimento, tomada no âmbito judicial, o Inculpado admitiu:

“… quando ganharam a eleição em 2008, o prefeito da época era oposição; … em dezembro, fora do período de aulas, ele chamou quase todos os concursados … (mais de 100 pessoas); Que esse opositor convocou os concursados para prejudicar a nova gestão, que assumiria em janeiro …” (transcrição não literal - mídia Id 9195923).

13. Portanto, resta frágil e inconsistente a alegativa de que a imputação teria o propósito de apenas “prejudicá-lo”, porquanto, repito, confessou o Recorrente o entabulamento das contratações, mesmo estando cônscio da existência de aprovados em concurso público, cujas nomeações poderiam suprir a situação de carência de pessoal experimentada pelo Município para aquelas mesmas funções.

14. Ao tópico, merece destaque o seguinte trecho do parecer da douta 2ª PJ:

“… o Prefeito, intitulado como um agente público, está vinculado as normas e princípios do direito público, entre eles o princípio da legalidade, que exprime a ideia que só é lícito o administrador fazer o que a lei autoriza … Pois bem. Dispõe a Constituição Federal, no art. 37, inciso IX, que a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público …”.

15. Mais adiante, complementou a r. Procuradoria:

“… No presente caso, foram promulgadas as Leis Municipais nº 551/2009 e nº 855/2010. Nos autos foi acostada cópia da Lei Municipal nº 551/2009, cujo art. 1º que permitia a contratação de pessoal por tempo determinado e limitado para atender "necessidade temporária de excepcional interesse público … dando-se por um período "não superior a 12 (doze) meses" (art. 1º, parágrafo único), com previsão de retroatividade a "5 de janeiro de 2009" (art. 6º). Da mesma forma, Lei Municipal nº 855/2010, a dispor sobre a contratação temporária de Auxiliares de Serviços Gerais, acertadamente previu no art. 1º, §2º que "é vedada e tida por inválida a contratação de que trata o caput deste artigo, na hipótese de existência de vaga apta a ser preenchida por candidato aprovado em concurso público para o provimento de cargo efetivo, já homologado pela Administração Pública Municipal e dentro do prazo de validade previsto no art. 37, III e IV da Constituição Federal" … ”.

16. Outrossim, reveladas a materialidade e autoria, hão de ser observados os precedentes desta Casa:

“… PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL MINISTERIAL. RÉU ABSOLVIDO PELA PRÁTICA DO CRIME DE RESPONSABILIDADE COMETIDO POR PREFEITO. DELITO TIPIFICADO NO ARTIGO 1º, XIII DO DECRETO-LEI Nº 201/1967. NOMEAR, ADMITIR OU DESIGNAR SERVIDOR, CONTRA EXPRESSA DISPOSIÇÃO DE LEI, SEM REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. PLEITO CONDENATÓRIO. POSSIBILIDADE. CRIME FORMAL. DESNECESSIDADE DE RESULTADO NATURALÍSTICO PARA SUA CARACTERIZAÇÃO. INEXISTENCIA DE AMPARO LEGAL PARA RESPALDAR SUA CONDUTA. FATO TÍPICO. DOLO GENÉRICO DO AGENTE COMPROVADO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO …”. (APCRIM 2012.011351-7 - Rel. Des. Glauber Rego - J. em 18-02-2014).

17. De se ressaltar, por fim, ser o crime em comento de natureza formal, sendo, de igual modo, irrelevante a ocorrência de danos ao erário, como reiteradamente tem decidido o STJ:

“… PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL … CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. NATUREZA FORMAL. EXISTÊNCIA DE DOLO NA CONDUTA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO … O delito descrito no art. 1º, XIII, do Decreto-Lei 201/67, de natureza formal, depende apenas da conduta de admitir, nomear ou designar pessoa para exercer cargo ou função pública em desalinho com a legislação pertinente, questões que foram suficientemente indicadas na denúncia. … A análise da existência ou não de dolo implica revisão do conjunto fático-probatório, o que encontra óbice na Súmula 7/STJ. … Agravo regimental improvido …” (AgRg no AREsp 2017.0280689-4, Relator Ministro NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, DJe 04/02/2019).

18. Logo, é insubsistente o pleito encaminhado pela absolvição.

19. Perpassando à dosimetria, ao dosar a pena sua primeira fase, o Juiz a quo negativou os vetores da “culpabilidade” e dos “antecedentes”, e o fez sob os seguintes fundamentos:

“… WELLINSON CARLOS DANTAS RIBEIRO, primário, possui maus antecedentes criminais, uma vez que fora condenado em ação penal com trânsito e julgado nos autos nº 102446- 47.2013.8.20.0114 pelo descumprimento de decisões judiciais prolatadas em 13 de julho de 2009 e 25 de fevereiro de 2010, sendo aquele crime cometido antes dos contratos indevidos celebrados nos presentes autos (2 de janeiro de 2010). A culpabilidade é assaz elevada, uma vez que houve numerosas contratações indevidas, contadas em 140 (cento e quarenta), número que exorbita bastante, inclusive, o limite máximo de atos considerados …” (Id 9250651, p. 11).

20. Ao primeiro (culpabilidade), penso ser desimportante o fato de terem sido 74 contratações e não as 140 citadas no destaque do voto do Desembargador Glauber, sobretudo porque ambos os números são por demais exagerados e, assim, aptos a servirem de baldrame para a desvaloração da circunstante.

21. Ao segundo, tratando-se de análise objetiva, e tendo por verdadeira a existência de condenação anterior transitada em julgado, não há muito a se discorrer.

22. Daí, e partindo da diretriz estabelecida pelo STJ de 1/8 sobre o intervalo sancionatório, a reprimenda é de ser acrescida em 08 meses e 06 dias, totalizando 11 meses e 06 dias de detenção.

23. Sem agravantes/atenuantes e outras causas de aumento/diminuição da pena, incide na espécie o art. 71 do CP (continuidade delitiva), sendo, repito, desimportante e inócua a discussão se foram 140 ou 74 contratações irregulares, já o que o máximo da fração em destaque (2/3) e conforme jurisprudência remansosa do STJ está relacionada a 07 ou mais condutas delituosas:

“PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SONEGAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E SONEGAÇÃO FISCAL. ART. 337-A, I, DO CP, E ART. 1º, I, DA LEI 8.137/90. MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM. VALIDADE. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIAS. NULIDADE. CERCEAMENTO DE...

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