Acórdão Nº 01003432920138200159 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 07-05-2021

Data de Julgamento07 Maio 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01003432920138200159
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100343-29.2013.8.20.0159
Polo ativo
MUNICIPIO DE OLHO D'AGUA DO BORGES e outros
Advogado(s):
Polo passivo
MPRN - PROMOTORIA UMARIZAL e outros
Advogado(s):

EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRETENDIDA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONAIDADE DE LEIS MUNICIPAIS E REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO PELO MUNICÍPIO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ACOLHIMENTO. MÉRITO. PLEITO DE EXONERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE REALIZAR CONCURSO PÚBLICO. ACOLHIMENTO PARCIAL. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE CONCURSO PARA REPOSIÇÃO DAS VACÂNCIAS DAS CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS DE QUE TRATA O INCISO IX DO ART. 37 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, NOS TERMOS DO ART. 8º, IV, DA LC 173/2020. MULTA COMINATÓRIA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO. REDUÇÃO. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.

1. Forçoso o reconhecimento da inadequação da via eleita para fins de reconhecimento da inconstitucionalidade das leis municipais, pois a ação sob rito ordinário não se presta ao controle concentrado de inconstitucionalidade; ademais, ainda que se admitisse tal apreciação no bojo da presente ação, revela-se juridicamente impossível o pedido, eis que se almeja espécie de controle concentrado de norma municipal por se apresentar violadora de prescrições contidas na Constituição Federal, hipótese vedada em nosso ordenamento jurídico.

2. Decerto que a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público deve se enquadrar na autorização prevista no art. 37, IX, da Constituição Federal, sob pena de se configurar irregular por afronta ao art. 37, II, da Constituição Federal.

3. Porém, é salutar destacar que o direito não é uma ciência que fica parada no tempo, por isso, deve acompanhar as mudanças da sociedade e adequar às situações por ela vivenciadas.

4. No caso, está-se a analisar a obrigação imposta na sentença cujo conteúdo obriga o Município de Olho D´Água dos Borges a realizar concurso público para provimento dos cargos de Professor e Auxiliar de Serviços Gerais, no prazo de quatro meses, sob pena de multa cominatória, sendo que a ação foi proposta no ano de 2014 e a sentença foi prolatada no ano de 2019, quando ainda não enfrentada a pandemia decorrente do Sars-Covid.

5. Diante desse cenário, a solução mais adequada à solução da lide consiste em obrigá-lo a realizar concurso para reposição das vacâncias das contratações temporárias de que trata o inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, nos termos do art. 8º, IV, da LC 173/2020, ou seja, é obrigatória a realização de concurso público pelo Município apelante, em havendo vacância de cargo cuja contratação foi efetivamente justificada na necessidade temporária de excepcional interesse público.

6. Finalmente, acerca das astreintes, ressalte-se que o Código de Processo Civil, no seu art. 537, faculta ao magistrado, em tutela provisória ou na sentença, a aplicação de medidas necessárias ao cumprimento de obrigação de fazer, como a imposição de multa.

7. De mais a mais, as astreintes têm natureza inibitória, com vistas a que seja cumprida a obrigação, devendo ser arbitrada pelo magistrado em patamar suficiente e necessário a que esteja o devedor compelido a cumprir com a ordem judicial.

8. Desse modo, afigura-se necessária a redução da multa cominatória com a fixação, no caso concreto, do valor de R$ 1.000,00 (mil reais) por contrato irregular afigura-se razoável e proporcional, limitada a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

9. Conhecimento e parcial provimento do apelo e da remessa necessária.



ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas.

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, por unanimidade de votos, em consonância parcial com o parecer de Dra. Iadya Gama Maio, Sétima Procuradora de Justiça em substituição legal ao Décimo Segundo Procurador de Justiça, conhecer e dar parcial provimento ao apelo e à remessa necessária, para acolher a preliminar suscitada pelo apelante, no sentido de decretar a inadequação da via eleita no tocante ao pleito de inconstitucionalidade das Leis Municipais nºs 77/98, 140/2004, 346/2005, 363/2006, 006/2007, 412/2009, 001/2009, 002/2011, 468/2021, 005/2012 e 02/2013, por via de conseqüência, reconhecer prejudicada a preliminar de falta de interesse processual e, quanto ao mérito, conhecer e dar parcial provimento ao apelo, apenas para obrigar o apelante a realizar concurso público em havendo vacância de cargo cuja contratação foi efetivamente justificada na necessidade temporária de excepcional interesse público, além da redução da multa cominatória com a fixação do valor de R$ 1.000,00 (mil reais) por contrato irregular limitado a R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

1. Trata-se de Remessa Necessária e Apelação Cível interposta pelo MUNICÍPIO DE OLHO D´ÁGUA DOS BORGES/RN, em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Umarizal/RN (Id. 7673531 - págs. 4/16), que, nos autos da Ação Civil Pública (Proc. nº 0100343-29.2013.8.20.0159) proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, julgou procedente a pretensão do Ministério Público para determinar a abstenção de formalização de contratações temporárias fundadas em Leis Municipais nºs 77/98, 140/2004, 346/2005, 363/2006, 006/2007, 412/2009, 001/2009, 002/2011, 468/2021, 005/2012 e 02/2013, com a consequente realização de concurso público para a substituição de servidores temporários irregularmente contratados, no prazo de quatro meses.

2. Em suas razões (Id. 7673532), o apelante aduziu, preliminarmente, a inadequação da via eleita, porque a ação foi proposta com explícito pedido de anulação de lei municipal com supedâneo em alegação de inconstitucionalidade, cuja competência é privativa do Tribunal de Justiça, bem como defendeu a inocuidade da decisão uma vez que as leis municipais já foram revogadas.

3. Sustenta que as contratações temporárias decorreram da necessidade de excepcional interesse público, segundo o permissivo do art. 37, IX, da Constituição Federal.

4. Ao final, requer o provimento do recurso com o julgamento de improcedência da pretensão inicial.

5. Contrarrazões apresentadas no Id. 7673534. Na ocasião, o Ministério Público pugnou pela rejeição da preliminar de inadequação da via eleita e enfatiza que o pedido principal da ação reside na realização de concurso público para provimento dos cargos públicos do Município de Olho D´Água dos Borges e que as declarações de inconstitucionalidade das leis municipais são a causa de pedir.

6. Acusa o município apelante de promover contratações temporárias sem a demonstração do excepcional interesse público.

7. Ao final, pugna pelo desprovimento do recurso.

8. Com vista dos autos, Dra. Iadya Gama Maio, Sétima Procuradora de Justiça em substituição legal ao Décimo Segundo Procurador de Justiça, corrobora o posicionamento firmado nas contrarrazões ao recurso e pugna pelo desprovimento do recurso interposto pelo Município de Olho D’Água do Borges/RN. (Id. 8124086).

9. É o relatório.

VOTO

10. Conheço da Remessa Necessária e da Apelação Cível.

I – PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA, SUSCITADA PELO APELANTE

11. Conforme relatado, acusa o apelante a inadequação da via eleita, porque a ação foi proposta com explícito pedido de anulação de lei municipal com supedâneo em alegação de inconstitucionalidade, cuja competência é privativa do Tribunal de Justiça.

12. Com efeito, sob o aspecto formal, o controle de constitucionalidade pode ocorrer incidentalmente e de forma prejudicial ao próprio mérito da ação, ocasião em que cabe a análise da conformidade da legislação com a Constituição ou em ação principal, cuja verificação de compatibilidade ocorre como questão central e exclusiva da ação ajuizada.

13. No caso presente, a despeito do termo “incidentalmente” utilizado pelo Ministério Público na inicial (Id. 7673254 - Pág. 19), pode-se verificar que a pretensão de inconstitucionalidade das leis municipais representa o próprio do controle concentrado de constitucionalidade, tendo em vista que busca retirar as normas atacadas do mundo jurídico.

14. Porém, descabida a apreciação do pedido de declaração de inconstitucionalidade de lei municipal, em abstrato e com efeitos erga omnes, nos presentes autos cujo rito é ordinário.

15. Não fosse o bastante, o controle concentrado de constitucionalidade de lei municipal só pode ser analisando na hipótese de confronto com a Constituição Estadual. Vejamos teor do julgado do Supremo Tribunal Federal:

“RECLAMAÇÃO – FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DO INSTRUMENTO RECLAMATÓRIO (RTJ 134/1033 – RTJ 166/785) – COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA PARA EXERCER O CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE DE LEIS E ATOS NORMATIVOS ESTADUAIS E/OU MUNICIPAIS CONTESTADOS EM FACE DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – A “REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE” NO ÂMBITO DOS ESTADOS-MEMBROS (CF, ART. 125, § 2º) – A QUESTÃO DA PARAMETRICIDADE DAS CLÁUSULAS CONSTITUCIONAIS ESTADUAIS, DE CARÁTER REMISSIVO, PARA FINS DE CONTROLE CONCENTRADO DE LEIS E ATOS NORMATIVOS ESTADUAIS E/OU MUNICIPAIS CONTESTADOS, PERANTE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL, EM FACE DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – DOUTRINA – PRECEDENTES – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.O único instrumento jurídico revestido de parametricidade, para efeito de fiscalização concentrada de constitucionalidade de lei ou de atos normativos estaduais e/ou municipais, é, tão somente, a Constituição do próprio Estado-membro (CF, art. 125, § 2º), que se qualifica, para esse fim, como pauta de referência ou paradigma de confronto, mesmo nos casos em que a Carta Estadual haja formalmente incorporado ao seu...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT