Acórdão Nº 01004298920168200160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 06-02-2020

Data de Julgamento06 Fevereiro 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01004298920168200160
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100429-89.2016.8.20.0160
Polo ativo
MARIA ESTER DE CARVALHO VIEIRA e outros
Advogado(s): LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS
Polo passivo
MUNICIPIO DE UPANEMA e outros
Advogado(s): LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES CÍVEIS. SERVIDOR PÚBLICO. PROFESSORA. MUNICÍPIO DE UPANEMA. LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL QUE DISPÕE SOBRE O PLANO DE CARGOS, CARREIRA E REMUNERAÇÃO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO MUNICIPAL. EXPRESSA PREVISÃO DO DIREITO A FÉRIAS DE 45 (QUARENTA E CINCO) DIAS, ACRESCIDO DO TERÇO CONSTITUCIONAL. INCIDÊNCIA SOBRE A REMUNERAÇÃO TOTAL. EXEGESE DO ART. 30 DA LEI MUNICIPAL Nº 08/2009 E DO ART. 7º, VII DA CF. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. LEI MUNICIPAL Nº 521/2014 QUE SUPRIMIU O DIREITO DE 45 DIAS FÉRIAS MANTENDO APENAS 30 DIAS DE FÉRIAS. CONCESSÃO DO DIREITO A PARTIR DO QUINQUÊNIO ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO ATÉ A VIGÊNCIA DA LEI Nº 08/2009. ADEQUAÇÃO DA SENTENÇA QUANTO AOS JUROS DE MORA E A CORREÇÃO MONETÁRIA. DÉBITOS DE NATUREZA NÃO TRIBUTÁRIA. TESES FIXADAS NA REPERCUSSÃO GERAL JULGADA NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 870.947/SE. APELOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. PROVIMENTO PARCIAL DA REMESSA NECESSÁRIA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas. Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento aos apelos. Pela mesma votação, dar provimento parcial à remessa necessária nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO



Trata-se de remessa necessária e de apelações cíveis interpostas por MARIA ESTER DE CARVALHO VIEIRA e pelo MUNICÍPIO DE UPANEMA, ambos inconformados com a sentença proferida pelo Juízo de Direito da Comarca de Upanema que julgou parcialmente procedente a pretensão formulada pela autora para condenar o MUNICÍPIO DE UPANEMA ao pagamento da remuneração correspondente a 15 (quinze) dias de férias devidas aos professores da rede municipal — que tenham atuado no quinquênio anterior ao ajuizamento da ação —, acrescido de 1/3 (um terço) constitucional sobre o total dessa verba, por ano trabalhado, limitado ao período de 19/09/2011 a 21/03/2014, a ser apurado em liquidação de sentença.

Na forma do julgamento pelo STF da ADI 4.357, sobre os valores deverão incidir correção monetária pelo índice TR, até 25/03/2015, e juros de mora aplicados à caderneta de poupança: após 25/03/2015, o índice de correção a ser utilizado será o IPCA, mantendo-se os mesmos juros de mora aplicados à caderneta de poupança.

A parte ré também foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrado em 10% sobre o valor da condenação.

Nas razões recursais, a autora apelante informa que foi admitida no dia 08 de julho de 1985, de forma que as férias e o terço de férias de 45 (quarenta e cinco) dias pleiteados abrange o período de 22 de dezembro de 1986 a 21 de março de 2014.

Advoga que o marco inicial da prescrição quinquenal para a cobrança das férias não gozadas por interesse da administração pública é a data da aposentadoria, a data da demissão ou a data da exoneração, fatos ainda não acontecidos nos autos.

Requer, ao final, o conhecimento e provimento do apelo, para que seja afastada a prescrição quinquenal e reconhecido o seu direito aos quinze dias de férias, acrescida do terço constitucional de férias, por ano de trabalho, no período de 22 de dezembro de 1986, data da entrada em vigor da Lei Municipal nº 103/1986 ou da data de admissão, se posterior, até o dia 21 de março de 2014, data da entrada em vigor da Lei Municipal nº 521/2014, quando deve ser acrescida das prestações vincendas, dos juros de mora e da correção monetária, já deferida em sentença.

Nas contrarrazões, o Município de Upanema rebate a tese recursal e pugna pelo desprovimento do recurso da parte autora.

Por outro lado, em suas razões recursais, o Município apelante aduz que o direito aos 15 (quinze) dias de férias requestadas na exordial foi objeto de negociação com o magistério público de Upanema, materializada no PCCR de 2014 – Lei Municipal nº 521/2014, que suprimiu a referida vantagem e, bem ainda, que o reconhecimento de tal direito afronta os artigos 15 e 16 da Lei Complementar nº 101- Lei de Responsabilidade Fiscal, razão pela qual a sentença deve ser reformada para julgar a pretensão inicial totalmente improcedente.

Alega, ainda, a necessidade de redistribuição dos ônus sucumbenciais, uma vez que a parte autor decaiu da maior parte do seu pedido e a sentença condenou apenas o Município demandado.

Requer, por fim, o conhecimento e provimento do recurso para que seja julgada improcedente a demanda ou que seja reformado o decisum nos pontos acima apontados.

Desnecessária a intervenção da Procuradoria de Justiça, em razão da ausência de interesse na matéria em discussão.

É o relatório.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da remessa necessária e dos apelos.

A questão posta a reexame nesta Corte, e também objeto de recursos, diz respeito à análise do direito da autora, Professora do Município Upanema, ao recebimento de diferenças de férias e do terço constitucional sobre o período de 45 (quarenta e cinco) dias; bem como o início do marco prescricional relacionado ao direito pleiteado.

De início, não há que se falar em prescrição do fundo de direito, tendo em vista que a relação jurídica trazida à lume é daquelas que se protraem no tempo, ou seja, renovam-se mês a mês. Em outras palavras, trata-se de uma relação de trato sucessivo. Estabelecida a premissa, merecem destaques os enunciados das Súmulas 443 do Supremo Tribunal Federal e 85 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõem:



Súmula 443 do STF: A prescrição das prestações anteriores ao período previsto em lei não ocorre, quando tiver sido negado, antes daquele prazo, o próprio direito reclamado, ou a situação jurídica de que ele resulta.



Súmula 85 do STJ: Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação.



Portanto, tratando-se de prestação pecuniária de trato sucessivo, a prescrição atinge somente as parcelas anteriores a cinco anos da propositura da ação, não alcançando o fundo de direito.

Dessa forma, o que prescreve não é o direito de ação, mas sim as parcelas vencidas e não reclamadas antes do quinquênio anterior à data da propositura da demanda, vez que o prazo prescricional é renovado a cada mês.

No mérito, a autora faz jus ao pagamento de diferenças de férias e do terço constitucional (CF, art. 7º, inc. XVII) em relação a 45 (quarenta e cinco) dias de férias gozados anualmente, e não sobre 30 (trinta) dias apenas.

Sobre isso, o artigo 30 da Lei Municipal nº 08/2009 (Plano de Cargo, Carreira e Remuneração do Magistério Público no Município de Upanema), dispõe que os professores da rede pública municipal, têm direito ao gozo de férias anuais de 45 (quarenta e cinco).

Como sabido, o direito à percepção de férias é garantido pela Constituição Federal, com previsão no artigo 7º, inciso XVII, in verbis:

Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XVII – gozo de férias anuais e remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal.

Com efeito, a leitura do art. 30 da mencionada lei municipal em conjugação com o inciso XVII do art. 7º da CF leva à conclusão de que o professor em efetivo exercício das atividades de docência tem o direito de gozar 45 (quarenta e cinco) dias de férias anuais e não 30 (trinta), bem como que o terço de férias incide sobre o gozo de férias anuais remunerada.

Importante consignar, por oportuno, que a Administração Pública obrigatoriamente deve obedecer ao previsto na lei, não podendo se esquivar de aplicá-la, sob pena de ofensa ao Princípio da Legalidade.

A confirmar a exegese na defendida, invoca-se a lição de José dos Santos Carvalho Filho1:

O princípio da legalidade é certamente a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizado por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita. (…) O princípio "implica subordinação do administrador à lei. Todos os agentes públicos, desde o que lhe ocupe a cúspide até o mais modesto deles, devem ser instrumentos de fiel e dócil realização das finalidades normativas". Na clássica e feliz comparação de HELY LOPES MEIRELES, enquanto os indivíduos no campo privado podem fazer tudo o que a lei não veda, o administrador público só pode atuar onde a lei autoriza.

Dessa forma, verifica-se que a Lei Complementar Municipal de nº 08/2009, que à época alterou o Plano de Cargos, Carreira e Remuneração do Magistério Público do Município de Upanema, estabelece que as férias anuais do professor do magistério em exercício de docência será de 45 (quarenta e cinco)...

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