Acórdão Nº 01004462820168200160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 19-02-2020

Data de Julgamento19 Fevereiro 2020
Classe processualAPELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA
Número do processo01004462820168200160
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100446-28.2016.8.20.0160
Polo ativo
MUNICIPIO DE UPANEMA
Advogado(s):
Polo passivo
AIRES DE MELO SILVA e outros
Advogado(s): LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES CÍVEIS. PROFESSORA. MUNICÍPIO DE UPANEMA. LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL QUE DISPÕE SOBRE O PLANO DE CARGOS, CARREIRA E REMUNERAÇÃO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO MUNICIPAL. EXPRESSA PREVISÃO DO DIREITO A FÉRIAS DE 45 (QUARENTA E CINCO) DIAS, ACRESCIDO DO TERÇO CONSTITUCIONAL. EXEGESE DO ART. 30 DA LEI MUNICIPAL Nº 08/2009 E DO ART. 7º, VII DA CF. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. LEI MUNICIPAL Nº 521/2014 QUE SUPRIMIU O DIREITO DE 45 DIAS FÉRIAS MANTENDO APENAS 30 DIAS DE FÉRIAS. CONCESSÃO DO DIREITO A PARTIR DO QUINQUÊNIO ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO ATÉ A VIGÊNCIA DA LEI Nº 08/2009. CORREÇÃO DA DATA INICIAL PARA O RECEBIMENTO DO DIREITO CONSIDERANDO O LAPSO PRESCRITO. REPERCUSSÃO GERAL Nº 870.947/SE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E DESPROVIDO. REEXAME OBRIGATÓRIO E APELO DO ENTE PÚBLICO CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.


ACÓRDÃO


Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao apelo da parte autora. Pela mesma votação, dar provimento parcial à remessa necessária e ao apelo do Município de Upanema, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO


Trata-se de remessa necessária e de apelações cíveis interpostas pelo Município de Upanema e por Aires de Melo Silva, em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Upanema, que nos autos da Ação Ordinária nº 0100446-28.2016.8.20.0160, julgou parcialmente procedente a pretensão autoral nos seguintes termos (ID n° 4548111):

Ante o exposto, com fulcro nas razões fático-jurídicas expedidas, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para condenar o Município de Upanema ao pagamento da remuneração correspondente a 15 (quinze) dias de férias devidas aos professores da rede municipalque tenham atuado no quinquênio anterior ao ajuizamento da ação –, acrescida de 1/3 (um terço) constitucional sobre o total dessa verba, por ano trabalhado, limitado ao período de 19/05/2011 a 21/03/2014, a ser apurado em liquidação de sentença.

Na forma do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ADIN 4.357, sobre os valores deverão incidir correção monetária pelo índice TR, até 25/03/2015, e juros de mora aplicados à caderneta de poupança; após 25/03/2015, o índice de correção a ser utilizado será o IPCA, mantendo-se os mesmos juros de mora aplicados à caderneta de poupança.

Considerando que a edilidade possui isenção legal, não há condenação em custas processuais.

Condeno a parte ré a pagar honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85 do CPC. (…)”

Em suas razões recursais (ID n° 4548113), o ente público, ora apelante, suscita a erro material na ocorrência da prescrição quinquenal, sob o argumento que o magistrado redimensionou erroneamente o lapso prescrito, já que a demanda foi proposta em 20/09/2016, e não em 19/05/2016.

Pugna, ainda, a reforma da decisão “ante a existência de transação dos referidos dias e terço de férias com outros direitos elencados no PCCR de 2014, bem como em razão de sua incompatibilidade com o ordenamento jurídico”.

Defende, por fim, a reforma da sentença para que se distribua os ônus sucumbenciais proporcionalmente, já que a autora decaiu da maior parte do pedido, bem como que a condenação afronta os artigos 15 e 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Ao final, pugna pela reforma da sentença para reconhecer a improcedência dos pedidos autorais.

Por sua vez, a autora, em sua apelação (ID n°4548116), defende a inocorrência da prescrição das férias e o terço de férias de 45 dias referentes ao período aquisitivo de 01/03/2004 a 20/09/2011, já que o marco inicial da prescrição quinquenal para a cobrança das férias não gozadas somente se inicia com a extinção do contrato de trabalho, seja pela concessão de aposentadoria, pela demissão ou a pela exoneração, fatos ainda não acontecidos nos autos.

Requer, ao final, o conhecimento e provimento do apelo.

Contrarrazões da autora apresentadas nos ID n° 4548115, e do Município no ID n° 4548117.

A 13ª Procuradoria de Justiça declinou da intervenção (ID n° 4898153).

É o relatório.

VOTO


Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço da remessa necessária e das apelações cíveis.

A questão posta diz respeito à análise do direito da autora, Professora do Município Upanema, ao recebimento de diferenças de férias e do terço constitucional sobre o período de 45 (quarenta e cinco) dias; bem como o início do marco prescricional relacionado ao direito pleiteado.

Verificada a similitude nos temas tratados tanto na remessa necessária como nos recursos de apelação interpostos, por critério de melhor exegese jurídica, recomendável se mostra promover seus exames conjuntamente.

Inicialmente, não há que se falar em prescrição do fundo de direito, tendo em vista que a relação jurídica trazida é daquelas que se protraem no tempo, ou seja, renovam-se mês a mês. Em outras palavras, trata-se de uma relação de trato sucessivo. Estabelecida a premissa, merecem destaques os enunciados das Súmulas 443 do Supremo Tribunal Federal e 85 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõem:

Súmula 443 do STF: A prescrição das prestações anteriores ao período previsto em lei não ocorre, quando tiver sido negado, antes daquele prazo, o próprio direito reclamado, ou a situação jurídica de que ele resulta.

Súmula 85 do STJ: Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação.

Portanto, ocorrerá a prescrição das parcelas não pagas nos 05 (cinco) anos imediatamente anteriores ao ajuizamento da ação.

Assim, o que prescreve não é o direito de ação, mas sim as parcelas vencidas e não reclamadas antes do quinquênio anterior à data da propositura da demanda, vez que o prazo prescricional é renovado a cada mês.

No mérito, a autora faz jus ao pagamento de diferenças de férias e do terço constitucional (CF, art. 7º, inc. XVII) em relação a 45 (quarenta e cinco) dias de férias gozados anualmente, e não sobre 30 (trinta) dias apenas.

Sobre isso, o artigo 30 da Lei Municipal nº 08/2009 (Plano de Cargo, Carreira e Remuneração do Magistério Público no Município de Upanema), dispõe que os professores da rede pública municipal, têm direito ao gozo de férias anuais de 45 (quarenta e cinco) dias.

Como sabido, o direito à percepção de férias é garantido pela Constituição Federal, com previsão no artigo 7º, inciso XVII, in verbis:

Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XVII – gozo de férias anuais e remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal.

Com efeito, a leitura do art. 30 da mencionada lei municipal em conjugação com o inciso XVII do art. 7º da CF leva à conclusão de que o professor em efetivo exercício das atividades de docência tem o direito de gozar 45 (quarenta e cinco) dias de férias anuais e não 30 (trinta), bem como que o terço de férias incide sobre o gozo de férias anuais remunerada.

Importante consignar, por oportuno, que a Administração Pública obrigatoriamente deve obedecer ao previsto na lei, não podendo se esquivar de aplicá-la, sob pena de ofensa ao Princípio da Legalidade.

Dessa forma, verifica-se que a Lei Complementar Municipal de nº 08/2009, que à época alterou o Plano de Cargos, Carreira e Remuneração do Magistério Público do Município de Upanema, estabelece que as férias anuais do professor do magistério em exercício de docência será de 45 (quarenta e cinco) dias.

De outro modo, embora esse direito tenha sido suprimido através da Lei Municipal nº 521/2014, que reduziu o período de férias dos profissionais para 30 (trinta) dias, deve ser respeitado o direito da autora do recebimento dos 45 dias de férias na vigência da lei anterior e, desde que respeitado o prazo prescricional.

Logo, considerando o estabelecido na Constituição Federal, bem como a Lei Municipal nº 08/2009 em sua vigência, deve ser assegurado ao professor daquela municipalidade a percepção de um terço a mais sobre a remuneração dos dias de férias efetivamente gozados, ou seja, 45 (quarenta e cinco) dias, até a data da efetiva publicação da Lei Municipal nº 521/2014, que suprimiu o referido direito, não havendo que se falar em 30 (trinta) dias de férias anuais e 15 (quinze) dias de recesso.

Sobre o tema esta Corte de Justiça já se manifestou em casos similares ao ora relatado, in verbis:

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE (ARTIGO 1.010, CPC). ACOLHIMENTO. REMESSA NECESSÁRIA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. PROFESSOR EM EXERCÍCIO DE DOCÊNCIA. DIREITO A FÉRIAS DE QUARENTA E CINCO DIAS ANUAIS RECONHECIDO EM LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL. PERCENTUAL PREVISTO EM RELAÇÃO AO TERÇO DE FÉRIAS, DE ACORDO COM O ART. 7º, INCISO XVII DA CF. INCIDÊNCIA SOBRE A TOTALIDADE DA REMUNERAÇÃO DO PERÍODO DE FÉRIAS A QUE FAZ JUS O SERVIDOR. DICÇÃO DOS ARTIGOS 56 E 57, AMBOS DA LEI MUNICIPAL Nº 333, DE 02 DE AGOSTO DE 1993 (PLANO DE CARGOS, CARREIRA E REMUNERAÇÃO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO MUNICIPAL DO MUNICÍPIO DE CARAÚBAS/RN). PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. PRETENSÃO COM AMPARO LEGAL. DESPROVIMENTO DO REEXAME NECESSÁRIO. (RN e AC n° 2017.015828-6, Relator Desembargador Amaury Moura Sobrinho, j. em 27.02.2018).

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE...

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