Acórdão Nº 01005701120168200160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 29-04-2020

Data de Julgamento29 Abril 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01005701120168200160
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100570-11.2016.8.20.0160
Polo ativo
RAILSA DOMINGOS DO NASCIMENTO COSTA e outros
Advogado(s): LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS
Polo passivo
MUNICIPIO DE UPANEMA e outros
Advogado(s): LINDOCASTRO NOGUEIRA DE MORAIS

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÕES CÍVEIS E REMESSA NECESSÁRIA. SERVIDORA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE UPANEMA OCUPANTE DO CARGO DE PROFESSORA. PRETENSÃO DE PAGAMENTO DE 15 (QUINZE) DIAS DE FÉRIAS REMUNERADAS ACRESCIDAS DO TERÇO CONSTITUCIONAL. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO DO RÉU: LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL QUE DISPÕE SOBRE O PLANO DE CARGOS, CARREIRA E REMUNERAÇÃO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO MUNICIPAL DE UPANEMA/RN. EXPRESSA PREVISÃO DO DIREITO A FÉRIAS DE 45 (QUARENTA E CINCO) DIAS, ACRESCIDOS DO TERÇO CONSTITUCIONAL. INCIDÊNCIA SOBRE A REMUNERAÇÃO TOTAL. EXEGESE DO ART. 30 DA LEI MUNICIPAL Nº 08/2009 E DO ART. 7º, VII DA CF. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. LEI MUNICIPAL Nº 521/2014 QUE SUPRIMIU O DIREITO DE 45 (QUARENTA E CINCO) DIAS FÉRIAS MANTENDO APENAS 30 (TRINTA) DIAS DE FÉRIAS. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA FIXADOS DE ACORDO COM AS TESES CONSOLIDADAS NO JULGAMENTO DO STF EM REPERCUSSÃO GERAL - RE 870947. INOCORRÊNCIA DE PREJUÍZO AO ENTE MUNICIPAL. NÃO OFENSA À LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. AUSÊNCIA DE SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA: ALEGAÇÃO DE INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. CONCESSÃO DO DIREITO A PARTIR DO QUINQUÊNIO ANTERIOR AO AJUIZAMENTO DA AÇÃO ATÉ A VIGÊNCIA DA LEI Nº 08/2009. CORREÇÃO DA DATA INICIAL PARA O RECEBIMENTO DO DIREITO CONSIDERANDO O LAPSO PRESCRITO. RECURSOS E REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDOS E DESPROVIDO O APELO DA AUTORA E PARCIALMENTE PROVIDO O RECURSO DO RÉU E A REMESSA NECESSÁRIA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes acima identificadas, acordam os Desembargadores que compõem a 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade, conhecer dos recursos e negar provimento ao apelo da autora e dar parcial provimento à remessa necessária e à apelação do réu, apenas para determinar que a condenação ao pagamento da remuneração referente aos 15 (quinze) dias de férias acrescidas do terço constitucional, compreenda o período de 15/12/2011 a 21/03/2014, nos termos do voto do Relator, que integra o julgado.

RELATÓRIO

Trata-se de Remessa Necessária e Apelações Cíveis interpostas pelo Município de Upanema e Railsa Domingos do Nascimento Costa em face de sentença prolatada pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Upanema/RN, que, nos autos Ação Ordinária de Pagamento de Diferença das Férias e do Terço de Férias, julgou a pretensão autoral, nos seguintes termos (ID nº 4399369):

Ante o exposto, com fulcro nas razões fático-jurídicas expedidas, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para condenar o Município de Upanema ao pagamento da remuneração correspondente a 15 (quinze) dias de férias devidas aos professores da rede municipal – que tenham atuado no quinquênio anterior ao ajuizamento da ação -, acrescida de 1/3 (um terço) constitucional sobre o total dessa verba, por ano trabalhado, limitado ao período de 19/05/2011 a 21/03/2014, a ser apurado em liquidação de sentença.

Na forma do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ADIN 4.357, sobre os valores deverão incidir correção monetária pelo índice TR, até 25/03/2015, e juros de mora aplicados à caderneta de poupança; após 25/03/2015, o índice de correção a ser utilizado será o IPCA, mantendo-se os mesmos juros de mora aplicados à caderneta de poupança.

Considerando que a edilidade possui isenção legal, não há condenação em custas processuais.

Condeno a parte ré a pagar honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85 do CPC.

Sentença sujeita à remessa necessária (art. 496 do CPC c/c Súmula 490 do STJ).

Em suas razões (ID nº 4399521), o ente municipal alegou que a ação foi ajuizada em 14/12/2016, devendo redimensionar o lapso prescricional para fulminar os pleitos anteriores a 14/12/2011.

Sustentou que as férias de 45 (quarenta e cinco) dias extrapolava a razoabilidade, causando enorme prejuízo ao ensino público daquela municipalidade.

Declarou que em 2014 foi editada a Lei Municipal nº 521, prevendo férias de 30 (trinta) dias para os professores, no qual foi objeto de negociação.

Argumentou a existência de sucumbência recíproca, já que a autora decaiu em parte de seu pedido.

Afirmou ainda afronta a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Por fim, requereu o conhecimento e provimento do recurso.

Contrarrazões apresentadas (ID nº 4399523).

Igualmente inconformada, a autora interpôs recurso de apelação (ID nº 4399524), alegando que com base em orientação do STJ e deste Egrégio Tribunal, a prescrição quinquenal só se inicia com a extinção do contrato de trabalho, o que não aconteceu na espécie por se encontrar em atividade.

Defendeu que faz jus ao período de férias da data da entrada em vigor da lei municipal ou data de admissão até 21/03/2014.

Ao final, requereu o conhecimento e provimento do recurso.

Contrarrazões apresentadas (ID nº 4399525).

O Ministério Público declinou de sua intervenção no feito (ID nº 4850045).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos e do reexame necessário.

Cinge-se o mérito recursal em aferir a possibilidade de percepção referente a 15 (quinze) dias de férias devidas aos professores da rede municipal acrescidos do terço constitucional.

I- APELAÇÃO DO RÉU E REMESSA NECESSÁRIA

Sobre o tema, o artigo 30 da Lei Municipal nº 08/2009 (Plano de Cargo, Carreira e Remuneração do Magistério Público no Município de Upanema), estabelecia que os professores da rede pública municipal, tinha direito ao gozo de férias anuais de 45 (quarenta e cinco) dias.

Como sabido, o direito à percepção de férias é garantido pela Constituição Federal, com previsão no artigo 7º, inciso XVII, in verbis:

Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XVII – gozo de férias anuais e remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal.

Com efeito, a leitura do art. 30 da mencionada lei municipal em conjugação com o inciso XVII do art. 7º da CF leva à conclusão de que o professor em efetivo exercício das atividades de docência tem o direito de gozar 45 (quarenta e cinco) dias de férias anuais e não 30 (trinta), bem como que o terço de férias incide sobre o gozo de férias anuais remunerada.

Importante consignar, por oportuno, que a Administração Pública obrigatoriamente deve obedecer ao previsto na lei, sendo vedado não aplicá-la, sob pena de ofensa ao Princípio da Legalidade.

A confirmar a exegese na defendida, invoca-se a lição de José dos Santos Carvalho Filho[1]:

O princípio da legalidade é certamente a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa deve ser autorizado por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita. (...) O princípio "implica subordinação do administrador à lei. Todos os agentes públicos, desde o que lhe ocupe a cúspide até o mais modesto deles, devem ser instrumentos de fiel e dócil realização das finalidades normativas". Na clássica e feliz comparação de HELY LOPES MEIRELES, enquanto os indivíduos no campo privado podem fazer tudo o que a lei não veda, o administrador público só pode atuar onde a lei autoriza.

Dessa forma, verifica-se que a Lei Complementar Municipal de nº 08/2009, que à época alterou o Plano de Cargos, Carreira e Remuneração do Magistério Público do Município de Upanema, estabelecia que as férias anuais do professor do magistério em exercício de docência seriam de 45 (quarenta e cinco) dias. De outro modo, embora esse direito tenha sido suprimido através da Lei Municipal nº 521/2014, que reduziu o período de férias dos profissionais para 30 (trinta) dias, deve ser respeitado, garantindo à autora o recebimento dos 45 (quarenta e cinco) dias de férias na vigência da lei anterior e, desde que respeitado o prazo prescricional.

Logo, considerando o estabelecido na Constituição Federal bem como na Lei Municipal nº 08/2009 em sua vigência, deve ser assegurado ao professor daquela municipalidade a percepção de um terço a mais sobre a remuneração dos dias de férias efetivamente gozados, ou seja, 45 (quarenta e cinco) dias, até a data da efetiva publicação da Lei Municipal nº 521/2014, que suprimiu o referido direito, não havendo que se falar em 30 (trinta) dias de férias anuais e 15 (quinze) dias de recesso.

Sobre o tema esta Corte de Justiça já se manifestou em caso similares ao ora relatado, in verbis:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE (ARTIGO 1.010, CPC). ACOLHIMENTO. REMESSA NECESSÁRIA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. PROFESSOR EM EXERCÍCIO DE DOCÊNCIA. DIREITO A FÉRIAS DE QUARENTA E CINCO DIAS ANUAIS RECONHECIDO EM LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL. PERCENTUAL PREVISTO EM RELAÇÃO AO TERÇO DE FÉRIAS, DE ACORDO COM O ART. 7º, INCISO XVII DA CF. INCIDÊNCIA SOBRE A TOTALIDADE DA REMUNERAÇÃO DO PERÍODO DE FÉRIAS A QUE FAZ JUS O SERVIDOR. DICÇÃO DOS ARTIGOS 56 E 57, AMBOS DA LEI MUNICIPAL Nº 333, DE 02 DE AGOSTO DE 1993 (PLANO DE CARGOS, CARREIRA E REMUNERAÇÃO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO MUNICIPAL DO MUNICÍPIO DE CARAÚBAS/RN). PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. PRETENSÃO COM AMPARO LEGAL. DESPROVIMENTO DO REEXAME NECESSÁRIO. (RN e AC n° 2017.015828-6, Relator Desembargador Amaury Moura Sobrinho, j. em 27.02.2018).

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO ORDINÁRIA. FÉRIAS ESCOLARES DE PROFESSORES DA REDE ESTADUAL DE ENSINO. PAGAMENTO DO ADICIONAL DE FÉRIAS SOBRE O PERÍODO DE 45 (QUARENTA E CINCO) DIAS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PLEITO. PERCENTUAL PREVISTO EM RELAÇÃO AO TERÇO DE FÉRIAS, DE ACORDO COM O ART. 7º,...

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