Acórdão Nº 01005942720188200109 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 04-03-2021

Data de Julgamento04 Março 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01005942720188200109
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100594-27.2018.8.20.0109
Polo ativo
CAIXA SEGURADORA S/A
Advogado(s): JULIANO MESSIAS FONSECA
Polo passivo
HOSANA CECILIA ALVES DE ARAUJO e outros
Advogado(s): THIAGO COSTA ARAUJO, PETRUS ROMANI GALVAO DE GOES BEZERRA, LUIS GUSTAVO PEREIRA DE MEDEIROS DELGADO

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

Gab. Desª. Maria Zeneide Bezerra

Processo: 0100594-27.2018.8.20.0109 APELAÇÃO CÍVEL (198)

Origem: Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Acari

Apelante: Caixa Seguradora S/A

Advogado: Juliano Messias Fonseca

Apelada: Hosana Cecilia Alves de Araújo

Advogado: Petrus Romani Galvão de Góes Bezerra

Apelado: Samuel Douglas da Silva Aquino

Advogado: Luís Gustavo Pereira de Medeiros Delgado

Relatora: Desa. Maria Zeneide Bezerra

EMENTA: CIVIL. PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. SEGURO DE VIDA. AÇÃO DE COBRANÇA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. 1) PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL, SUSCITADA PELO APELANTE. REJEIÇÃO. INGRESSO DE LITISCONSORTE EM AUDIÊNCIA. MÉRITO. NEGATIVA DE PAGAMENTO EM VIRTUDE DE EMBRIAGUEZ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA INGESTÃO DE BEBIDA ALCOÓLICA PELO SEGURADO FOI CONDIÇÃO DETERMINANTE PARA A OCORRÊNCIA DO SINISTRO. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBIA À SEGURADORA. INTELIGÊNCIA DO ART. 373, II, DO CPC, E DO ART. 6º, VIII, DO CDC. PLEITO DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. NÃO ACOLHIMENTO. CLÁUSULA NO CONTRATO QUE ASSEGURA O PAGAMENTO DO REFERIDO AUXÍLIO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ. APELO CONHECIDO, MAS DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e por unanimidade de votos, rejeitar a preliminar suscitada pelo apelante, e no mérito, pela mesma votação, conhecer, mas negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora.

RELATÓRIO

Apelação Cível interposta por Caixa Seguradora S/A em face de sentença proferida pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Acari, que, nos autos da Ação de Cobrança nº 0100594-27.2018.8.20.0109, proposta por Hosana Cecilia Alves de Araújo e Samuel Douglas da Silva Aquino, julgou procedente o pedido autoral, nos seguintes termos (id. 8014884 - Pág. 4):

"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido autoral, pelo que condeno a Caixa Seguradora S/A ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de indenização de cobertura por morte e R$ 1.000,00(um mil reais) a título de auxílio-alimentação, valor este a ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir do evento morte (16.07.2017) e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação válida, ficando cada autor com 50% (cinquenta por cento) da quantia.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação (art. 85, § 2º, do CPC)”

Em suas razões (id. ) suscita, inicialmente, a preliminar de ausência de interesse processual, pois a inclusão do nome de Samuel Douglas da Silva aconteceu em momento posterior ao ajuizamento da ação, daí não caber a este participar da ação como litisconsorte ativo facultativo.

E, no mérito, sustenta que o segurado contribuiu decisivamente para a ocorrência do sinistro, posto restar comprovado que o segurado conduzia a motocicleta sob o efeito de álcool, consoante demonstra o resultado do exame de dosagem alcóolico, daí afastar a obrigatoriedade de pagamento do seguro.

Bem assim, Não há pedido de pagamento das demais coberturas previstas no contrato, dentre elas o Auxílio Alimentação, de modo que não caberia ao Juízo singular condenar a Apelante ao pagamento de uma cobertura não inclusa na presente ação.

Com estes argumentos, requer o conhecimento e provimento do recurso para julgar improcedente a demanda.

Os Apelados apresentaram contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso (id. 8014895 - Pág. 8 e 8014893 - Pág. 5).

O 12° Procurador de Justiça, Fernando Batista de Vasconcelos, declinou da intervenção ministerial (id. 8340387 - Pág. 1).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Preliminar de ausência de interesse processual, suscitada pelo Apelante.

A Apelante alega que a inclusão do nome de Samuel Douglas da Silva aconteceu em momento posterior ao ajuizamento da ação, daí não caber a este participar da ação como litisconsorte ativo facultativo.

Todavia, observo que na exordial foi pedido a citação do filho do de cujus, e houve diligência nesse sentido, conforme decisão (id. 8014702 - Pág. 55) onde o magistrado determinou a citação para Samuel Douglas da Silva dissesse do interesse em ingressar na ação na condição de litisconsorte, sendo aceita, de imediato, a condição em audiência (id. 8014702 - Pág. 73), daí inexistir qualquer ofensa legal ao ingresso do referido apelado no feito.

Por este motivo, rejeito a preliminar.

MÉRITO

O cerne da questão dos autos cinge-se em saber se o mero fato de ter sido atribuído a existência de álcool no sangue do segurado falecido, no momento do acidente, é suficiente ou não para excluir o dever da Apelante de pagar a indenização referente ao Seguro de Vida deixado pelo contratante Moabson Wagner Diniz Aquino (de cujus).

Registro, desde logo, que estamos diante de uma relação de consumo amparada na Lei nº 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Em razão disso, a relação jurídica ora discutida deve ser analisada sob o enfoque do CDC.

Pelo que consta dos autos, os Apelados são beneficiários de um seguro de vida pago por Moabson Wagner Diniz Aquino (id. 8014702 - Pág. 33), falecido em um acidente automobilístico. Bem assim, colacionaram os documentos solicitados pela seguradora, porém a Recorrente negou o pagamento da indenização alegando, em síntese, que o contratante, no momento do acidente, estava sob o efeito de álcool.

Pois bem. Sobre o tema, o artigo 768 do Código Civil dispõe que "O segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto do contrato".

Todavia, na espécie, trata-se de um seguro de vida, no qual a suposta embriaguez do segurado, por si só, não agrava o risco do seguro, a não ser que haja provas do nexo causal entre a ingestão da bebida alcoólica e o sinistro, digo isso com base no julgado do Superior Tribunal de Justiça, que evidencio:

"RECURSO ESPECIAL. CIVIL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. SEGURO DE VIDA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. CAUSA DO SINISTRO. EMBRIAGUEZ DO SEGURADO. MORTE ACIDENTAL. AGRAVAMENTO DO RISCO. DESCARACTERIZAÇÃO. DEVER DE INDENIZAR DA SEGURADORA. ESPÉCIE SECURITÁRIA. COBERTURA AMPLA. CLÁUSULA DE EXCLUSÃO. ABUSIVIDADE. SEGURO DE AUTOMÓVEL. TRATAMENTO DIVERSO.

1. Cinge-se a controvérsia a definir se é devida indenização securitária decorrente de contrato de seguro de vida quando o acidente que vitimou o segurado decorreu de seu estado de embriaguez.

2. No contrato de seguro, em geral, conforme a sua modalidade, é feita a enumeração dos riscos excluídos no lugar da enumeração dos riscos garantidos, o que delimita o dever de indenizar da seguradora. 3. As diferentes espécies de seguros são reguladas pelas cláusulas das respectivas apólices, que, para serem idôneas, não devem contrariar disposições legais nem a finalidade do contrato.

4. O ente segurador não pode ser obrigado a incluir na cobertura securitária todos os riscos de uma mesma natureza, já que deve possuir liberdade para oferecer diversos produtos oriundos de estudos técnicos, pois quanto maior a periculosidade do risco, maior será o valor do prêmio. 5. É lícita, no contrato de seguro de automóvel, a cláusula que prevê a exclusão de cobertura securitária para o acidente de trânsito (sinistro) advindo da embriaguez do segurado que, alcoolizado, assumiu a direção do veículo. Configuração do agravamento essencial do risco contratado, a afastar a indenização securitária. Precedente da Terceira Turma.

6. No contrato de seguro de vida, ocorrendo o sinistro morte do segurado e inexistente a má-fé dele (a exemplo da sonegação de informações sobre eventual estado de saúde precário - doenças preexistentes - quando do preenchimento do questionário de risco) ou o suicídio no prazo de carência, a indenização securitária deve ser paga ao beneficiário, visto que a cobertura neste ramo é ampla.

7. No seguro de vida, é vedada a exclusão de cobertura na hipótese de sinistros ou acidentes decorrentes de atos praticados pelo segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas (Carta Circular SUSEP/DETEC/GAB n° 08/2007).

8. As cláusulas restritivas do dever de indenizar no contrato de seguro de vida são mais raras, visto que não podem esvaziar a finalidade do contrato, sendo da essência do seguro de vida um permanente e contínuo agravamento do risco segurado.

9. Recurso especial não provido."

(Resp 1665701/RS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/05/2017, DJe 31/05/2017).

Portanto, não havendo perícia que demonstre que o fato de ter ingerido bebida alcoólica tenha sido a causa determinante para a ocorrência do sinistro, providências que cabiam à seguradora ora apelante, nos termos da legislação consumerista – artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, não há, pois, que se aplicar o disposto no artigo 768 do Código Civil.

Por oportuno, ressalto, ainda, que o caso dos autos não se trata de contrato de seguro de automóvel, onde a direção do veículo por um condutor alcoolizado já representa agravamento essencial do risco avençado. E sobre essa temática, reforço o meu pensar mencionando os ensinamentos do Ministro Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que em trecho do seu Voto proferido no REsp 1665701/RS, diferenciou bem o entendimento esposado pelo Superior Tribunal de Justiça, quanto se trata de pagamento de indenização de seguro e embriaguez ao volante,...

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