Acórdão Nº 01006908920178200137 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 25-06-2021

Data de Julgamento25 Junho 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01006908920178200137
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100690-89.2017.8.20.0137
Polo ativo
MINISTÉRIO PÚBLICO DO RIO GRANDE DO NORTE e outros
Advogado(s): GEORGE ARTHUR FERNANDES SILVEIRA
Polo passivo
MPRN - PROMOTORIA CAMPO GRANDE
Advogado(s):

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROTEÇÃO DE SÍTIO ARQUEOLÓGICO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. INVOCAÇÃO DA RESPONSABILIDADE DO PODER PÚBLICO QUANTO À OBRIGAÇÃO DE FISCALIZAÇÃO. OBRIGAÇÃO QUE NÃO AFASTA A RESPONSABILIDADE DO VIOLADOR DAS NORMAS DE PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE CULTURAL DE NATUREZA OBJETIVA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

1. Os sítios arqueológicos são considerados patrimônio cultural brasileiros, incumbindo-se o poder público a obrigação de fiscalizar sua proteção, por força de norma de natureza constitucional (art. 216, V, CF).

2. Todavia, é salutar destacar também que, no âmbito cível, há previsão legal acerca da responsabilidade do violador das normas de proteção ao meio ambiente cultural de natureza objetiva, ou seja, independe da existência de culpa, consoante estabelece o artigo 14, §1º, da Lei 6.938/81, a qual dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, c/c artigo 927, parágrafo único, do Código Civil Brasileiro.

3. No caso, demonstrado o dano proveniente da extração de material rochoso localizado no Sítio Arqueológico da Pedra do Anjinho, além da presença de pichações e grafismos, ocorridos a partir da omissão da apelante quanto à preservação ambiental do local por se tratar de área privada, constitui consequência inarredável, a obrigação de reparar.

4. Portanto, a providência de determinar à apelante a proteção do sítio arqueológico mediante a colocação de cerca e placa no terreno do Lajedo, advertindo sobre a área de vestígios arqueológicos e sob a proteção da União, bem como impedir qualquer espécie de exploração econômica das peças granitícias próximas ao Lajedo se revela evidente e imperiosa para a solução da problemática existente, a teor da legislação aplicável.

5. Precedentes do STJ (RESP 115599/RS, 4ª Turma, Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJU 02.09.2002), TJMG (APCV 1.0216.14.001388-1/001; 8ª C.Cív.; Relator Desembargador Paulo Balbino; DJEMG 25/11/201) e TRF 5ª R. (AC 0000792-96.2012.4.05.8102; CE; 4ª T.; Relator Desembargador Federal Lázaro Guimarães; DEJF 20/12/2018; p. 67).

6. Apelação Cível conhecida e desprovida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas.

Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em consonância com o parecer de Dr. Arly de Brito Maia, Décimo Sexto Procurador de Justiça, conhecer e negar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

1. Trata-se de remessa necessária e apelação cível interposta por EDNA DANTAS VERAS em face de sentença proferida (Id. 8362621), pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Campo Grande/RN, que, em sede de Ação Civil Pública (Proc. nº 0100690-89.2017.8.20.0137), ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, julgou procedente a pretensão inicial, para determinar que a apelante cerque o terreno do Lajedo, bem como coloque placa no local, advertindo sobre a área de vestígios arqueológicos e sob a proteção da União, no prazo de trinta dias, bem como impeçam qualquer espécie de exploração econômica das peças granitícias próximas ao Lajedo, se ainda não o fez.

2. Em suas razões recursais (Id. 8362625), a apelante aduziu que, desde os primeiros indícios de depredação pela população do patrimônio das terras, já promoveram as diligências para mitigação dos danos, de modo que a obrigação havia sido totalmente cumprida.

3. Acusa a sentença de ter inovado no dispositivo sentencial bem como a obrigação da União, Estado e Municípios em exercer os deveres de fiscalização e proteção do meio ambiente.

4. Pede, ao final, a reforma da sentença para que estipule aos demandados/apelantes apenas a obrigação de fiscalização ambiental da área da propriedade e não das áreas próximas ao Lajedo, estipulando esta última em obrigação de fiscalização da União, Estado e Município.

5. Em sede de contrarrazões, o MINISTÉRIO PÚBLICO refutou a argumentação apelativa e, ao final, requereu o desprovimento do apelo (Id. 8362626).

6. Na sequência, Dr. Arly de Brito Maia, Décimo Sexto Procurador de Justiça, opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo e da remessa necessária (Id. 8721386).

7. É o relatório.

VOTO


8. Conheço do apelo.

9. Trata-se de apelação cível em que EDNA DANTAS VERAS, proprietária da área onde se situa um sítio arqueológico denominado Pedra do Anjinho, em que busca a reforma da sentença que a condenou a cercar o terreno do Lajedo, bem como colocar placa no local, advertindo sobre a área de vestígios arqueológicos e sob a proteção da União, no prazo de trinta dias, bem como impedir qualquer espécie de exploração econômica das peças granitícias próximas ao Lajedo.

10. Para a apelante, a obrigação em fiscalização e proteção do meio ambiente pertence ao Poder Público, por meio da União, Estado e Município e, ao mesmo tempo, defende que já promoveu todas as diligências de sua competência, para fins de mitigação dos danos, de sorte que a pretensão dirigida na inicial em seu desfavor havia sido totalmente cumprida.

11. Decerto que a Constituição Federal enaltece a importância à proteção do patrimônio histórico e cultural, veja-se:

“Art. 216 – Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tombados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupo formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: (...)

V – os conjuntos urbanos e sítios de valores histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.”

12. Pois bem, os sítios arqueológicos são considerados patrimônio cultural brasileiros, incumbindo-se o poder público a obrigação de fiscalizar sua proteção, por força de norma de natureza constitucional.

13. Todavia, é salutar destacar também que, no âmbito cível, há previsão legal acerca da responsabilidade do violador das normas de proteção ao meio ambiente cultural de natureza objetiva, ou seja, independe da existência de culpa, consoante estabelece o artigo 14, §1º da Lei 6.938/81, a qual dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, c/c artigo 927, parágrafo único, do Código Civil Brasileiro, os quais assim dispõem:

“Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

§ 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.”

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”

14. Com efeito, inexiste dúvida de que o agente que, por ação ou omissão, direta ou indiretamente, contribui de qualquer forma para a ocorrência de uma lesão ao patrimônio arqueológico brasileiro está concorrendo para a degradação da qualidade ambiental e, por via de conseqüência, enquadra-se juridicamente na condição de poluidor, figurando-se como responsável pela respectiva reparação, à luz do artigo 2º, IV c/c artigo 14, §1º, da Lei 6.938/81.

15. No caso, demonstrado o dano proveniente da extração de material rochoso localizado no Sítio Arqueológico da Pedra do Anjinho, além da presença de pichações e grafismos, ocorridos a partir da omissão da apelante quanto à preservação ambiental do local por se tratar de área privada, constitui consequência inarredável, a obrigação de reparar, consoante julgados que se transcreve:

"MEIO AMBIENTE — Patrimônio cultural. Destruição de dunas em sítios arqueológicos. Responsabilidade civil. Indenização. O autor da destruição de dunas que encobriam sítios arqueológicos deve indenizar pelos prejuízos causados ao meio ambiente, especificamente ao meio ambiente natural (dunas) e ao meio ambiente cultural (jazidas arqueológicas com cerâmica indígena da Fase Vieira). Recurso conhecido em parte e provido.” (STJ – RESP 115599–RS–4ª Turma — Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar — DJU 02.09.2002)


“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL E ARQUEOLÓGICO. PINTURA RUPESTRE E VESTÍGIOS LÍTICOS. SOBREPOSIÇÃO. TINTA VINÍLICA. DEVER DE INDENIZAR. RECOMPOSIÇÃO. DESPESAS PRÉ-PROCESSUAIS. RESSARCIMENTO. NÃO CABIMENTO. Assiste a todos os indivíduos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, cujo dever de defesa e proteção se impõe não apenas ao poder público, mas à coletividade como um todo, a fim de garantir um ambiente saudável às presentes e às futuras gerações. A proteção legalmente conferida é ao patrimônio cultural pátrio, independente de qualquer cadastro, registro ou certificação. Demonstrado que o dano ambiental e arqueológico decorreu de ato praticado pela requerida, esta deve ser condenada à indenização correspondente, na forma do artigo 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Eventual ganho ou benefício decorrente da
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