Acórdão Nº 01007733520178200128 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 14-07-2020

Data de Julgamento14 Julho 2020
Tipo de documentoAcórdão
Número do processo01007733520178200128
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100773-35.2017.8.20.0128
Polo ativo
MUNICIPIO DE SERRINHA
Advogado(s): ELTON OLIMPIO DE MEDEIROS MAIA, FELIPE AUGUSTO CORTEZ MEIRA DE MEDEIROS
Polo passivo
LINDALVA DIAS MARTINS
Advogado(s): ADALBERTO RIBEIRO MENEZES, KYLZE CAROLYNE PRATA DE LUCENA

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL, ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA SUSCITADA DE OFÍCIO PELO RELATOR: VALOR DA CONDENAÇÃO INFERIOR A 100 (CEM) SALÁRIOS MINIMOS. SERVIDORA CONTRATADA PELO PODER PÚBLICO. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO. INCIDÊNCIA DO ART. 19A DA LEI N° 8.036/90. CONCESSÃO DAS VERBAS RELATIVAS AO FGTS. ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO.

- Aplica-se ao caso o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do RE 596.478/RR, submetido ao regime de repercussão geral, no que concerne à constitucionalidade do art. 19-A, da Lei nº 8.036/90, acrescido da MP nº 2.164-41, o qual assegura o percebimento de FGTS por aquele cujo contrato com a Administração tenha sido declarado nulo.


ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a da 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao Recurso de Apelação Cível, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Remessa Necessária e Apelação Cível, esta interposta pelo Município de Serrinha/RN em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Santo Antônio/RN que, nos autos de ação de Cobrança, ajuizada em seu desfavor por Lindalva Dias Martins, reconheceu à nulidade do contrato entabulado ente as partes e julgou parcialmente procedente o pedido da inicial, condenando o Município requerido ao recolhimento do FGTS referente ao período não prescrito, efetivamente trabalhado pela autora.

No mesmo dispositivo, condenou a parte demandada ao pagamento dos honorários advocatícios, estes fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Em suas razões recursais o município apelante assegura que a mudança do regime celetista para o estatutário no Município de Serrinha se deu em 05 de outubro de 1998 com a publicação do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais Publicado no átrio do prédio da Prefeitura e da Câmara Municipal.

Alega que com a mudança do regime celetista para o estatutário em 05/10/1988, ocorreu à geração de um novo contrato de trabalho, diante de tal fato, o recorrido tinha até o ano de 2000 para ingressar com ação pleiteando verbas do contrato regido pela CLT.

Por fim, requer o provimento do apelo para reconhecer a prescrição quinquenal, nos termos da súmula nº 362 do TST e extinguir o processo sem julgamento do mérito expurgando a condenação quanto ao recolhimento do FGTS.

Sem contrarrazões (Num. 5972285 - Pág. 1)

A Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito (Num. 6494790 - Pág. 1).


VOTO


PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA SUSCITADA DE OFÍCIO PELO RELATOR


O art. 496 do CPC submete ao duplo grau de jurisdição a sentença que condena a Fazenda Pública, condicionando sua eficácia à confirmação pelo Tribunal de Justiça. O § 3º, III do mesmo dispositivo afasta a incidência dessa obrigatoriedade quando o valor do proveito econômico obtido na causa for inferior a 100 (cem) salários mínimos.

De acordo com o dispositivo da sentença, a condenação imposta à Fazenda Pública, ainda que não tenha sido apontada na sentença de forma líquida e definitiva, certamente não superará o patamar estabelecido em lei de 100 (cem) salários mínimos, conforme se infere a partir de projeções aritméticas quanto ao valor das parcelas em questão, de sorte que, ao final, será de valor inferior ao previsto na lei, não sendo caso de reexame obrigatório.

Sendo assim, não conheço da remessa necessária.


MÉRITO


Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do Recurso de Apelação interposto pelo Município de Serrinha.

O cerne meritório da presente irresignação repousa na análise acerca da suposta ocorrência da prescrição quinquenal, bem como do direito da apelada em receber FGTS, pelo período do exercício de função pública.

Analisando-se os documentos que guarnecem os autos, observa-se que a parte apelada foi contratada pelo Município de Serrinha/RN 01 de janeiro de 2010, portanto, após vigência da Constituição Federal de 1988.

Com a promulgação da Constituição da República de 1988, a investidura em cargo ou emprego público passou a depender de aprovação prévia em concurso público (art. 37, II, CF). Em casos excepcionais, o ente público poderia firmar contrato por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX, CF), sem a realização de concurso público, assim como nomear para os cargos em comissão declarados de livre nomeação e exoneração (art. 37, V, CF).

No caso concreto, o contrato firmado entre a parte apelada e o Município de Serrinha não se amolda em nenhum daqueles previstos na Constituição da República, qualificando-se, portanto, como um contrato nulo.

A própria Constituição Federal estabeleceu no § 2º, do art. 37, que a não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei.

Contudo, o STF entendeu que apesar de nulos, os contratos firmados entre os trabalhadores e a administração pública tiveram reflexos no plano da existência, não podendo ser "apagados", pois houve prestação do serviço realizado pelo servidor, de forma que este labor não pode ficar desprotegido, como se a nulidade encerrasse as consequências da relação outrora estabelecida, mesmo que sob o manto da nulidade.

Tal entendimento restou consignado no julgamento do Recurso Extraordinário nº 59.478 — Roraima, em repercussão geral, que reconheceu a constitucionalidade do artigo 19-A, da Lei nº 8.36/90, que dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta do trabalhador cujo contrato com a Administração seja declaração nulo. Transcrevo a ementa do retromencionado julgado:


"Recurso extraordinário. Direito Administrativo. Contrato nulo. Efeitos. Recolhimento do FGTS. Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90. Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2. Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3. Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (RE 596478, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013 EMENT VOL-02679-01 PP-00068)" [grifei]

Desse modo, resta induvidoso que é devido o pagamento da verba fundiária quando a relação entre o servidor e a Administração se deu à margem da lei, como na hipótese tratada.

Ademais, sobre os temas aqui abordados, em casos semelhantes, inclusive envolvendo o Município de Serrinha/RN, este Tribunal de Justiça já se posicionou por meio de suas 3 (três) Câmaras Cíveis:


“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OBRIGATÓRIA E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DO FGTS E DE EVENTUAL SALDO DE SALÁRIO. SERVIDOR QUE DESEMPENHOU A FUNÇÃO DE MOTORISTA SEM PRÉVIA APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. CONTRATAÇÃO NULA. INTELIGÊNCIA DO ART. 19-A DA LEI Nº 8.036/90. DIREITO RECONHECIDO EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL PELO STF (596478/RR). VERBAS DEVIDAS. PLEITO AJUIZADO DENTRO DO PRAZO DE DOIS ANOS PREVISTO NO ART. 7, INC. XXIX, DA CF. INAPLICABILIDADE DA PRESCRIÇÃO BIENAL NA HIPÓTESE. ALTERAÇÃO DA SENTENÇA PARA A NECESSÁRIA APLICAÇÃO DOS JUROS DE MORA E DA CORREÇÃO MONETÁRIA NOS TERMOS DAS PREMISSAS ASSENTADAS PELO STF NO JULGAMENTO DO RE Nº 870.947/SE (TEMA 810). MATÉRIAS DE ORDEM PÚBLICA QUE PODEM SER APRECIADAS EM QUALQUER FASE DO PROCESSO. ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES. CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA.” (TJRN, Apelação Cível nº 2018.000279-3, Relator: Desembargador Cornélio Alves, 1ª Câmara Cível, J. 13/12/2018).


"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL E REMESSA NECESSÁRIA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA CONVERTIDA EM AÇÃO ORDINÁRIA. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE SERRINHA/RN. VÍNCULO DECORRENTE DA CONTRATAÇÃO PARA DESEMPENHAR A FUNÇÃO DE SERVENTE DE PEDREIRO. SITUAÇÃO QUE NÃO SE ENQUADRA NA CONTRATAÇÃO EXCEPCIONAL PERMITIDA PELO ART. 37, II, DA CF. CONTRATO NULO. PRETENSÃO DE PERCEPÇÃO AO FGTS. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DO ART. 19-A DA LEI Nº 8.036/90. DIREITO RECONHECIDO EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL PELO STF (596478/RR). VERBA DEVIDA, SOB PENA DE LOCUPLETAMENTO ILÍCITO. ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES. OBSERVADA A PRESCRIÇÃO QUINQUENAL CONFORME ENTENDIMENTO PACIFICADO PELO STF. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL". (TJRN, Apelação Cível n° 2017.016643-4, Relator: Desembargador Claudio Santos, 1ª Câmara Cível, J. 10/12/2018). – Grifos acrescidos


"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE GOVERNADOR DIX-SEPT ROSADO. PRETENSÃO DE RECEBER FGTS. A CONTRATAÇÃO NULA NÃO SE SUBMETE AOS REGIMES CELETISTA NEM ESTATUTÁRIO. DEVIDA A RETRIBUIÇÃO FINANCEIRA E O PAGAMENTO DO FGTS PELO PERÍODO TRABALHADO. ARTIGO 19-A DA LEI N°...

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