Acórdão Nº 01008631720168200148 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 13-11-2023

Data de Julgamento13 Novembro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01008631720168200148
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0100863-17.2016.8.20.0148
Polo ativo
MPRN - Promotoria Pendências
Advogado(s):
Polo passivo
ABELARDO RODRIGUES FILHO e outros
Advogado(s): CAIO VITOR RIBEIRO BARBOSA, MARILIA DE GOIS RAMOS

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIZAÇÃO POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. INOCORRÊNCIA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PATROCÍNIO À ATIVIDADE CULTURAL NO ÂMBITO MUNICIPAL. ATO ADMINISTRATIVO QUE COMPORTAVA A INCIDÊNCIA DE HIPÓTESE DE INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO (ARTIGO 25, INCISO III, DA LEI N.º 8.666/93). PRÉVIA AUTORIZAÇÃO LEGISLATIVA PARA A REALIZAÇÃO DA DESPESA PÚBLICA. OBSERVÂNCIA DA DOCUMENTAÇÃO E CERTIDÕES NECESSÁRIAS PARA A CONTRATAÇÃO DIRETA. INEXISTÊNCIA DE ARDIL. MERA IRREGULARIDADE QUE NÃO ENSEJA AUTOMATICAMENTE O RECONHECIMENTO DO ATO ÍMPROBO. HISTÓRICO DE ATIVIDADES E VALOR CULTURAL RECONHECIDOS PELO MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO:

Acórdão os Desembargadores que integram a 3.ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, em dissonância com o opinamento ministerial, em conhecer e negar provimento à Apelação Cível, nos termos do voto da Relatora, parte integrante deste.

RELATÓRIO:

Trata-se de apelação cível interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Pendências/RN, nos autos da ação civil pública de responsabilização por ato de improbidade administrativa registrada sob n.º 0100863-17.2016.8.20.0148, ajuizada contra ABELARDO RODRIGUES FILHO, IRENE RODRIGUES BARBOZA, FRANCISCA IRANI CUNHA DE SOUZA e MIRELLE DA SILVA OLEGÁRIO, ora Apelados.

A sentença recorrida possui o seguinte teor:

“(...).

3 – DISPOSITIVO

Ante o exposto, REJEITO a alegação de prescrição intercorrente suscitada pela defesa em sede de alegações finais e, no mérito, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão formulada na inicial.

Sem condenação das partes em custas e honorários advocatícios, com base no princípio da simetria, nos termos da pacífica jurisprudência do E. STJ (Precedentes: EDcl no REsp 1320701e AgInt no AREsp 996.192)

Sentença não sujeita ao reexame necessário, conforme alteração trazida pelo art. 17, § 19, IV, da Lei 8.429/92, com a redação dada pela Lei 14.230/2021.

Intimem-se.

Pendências/RN, data do sistema.

(...).”.

Nas suas razões recursais, o Apelante aduziu, em resumo, que:

a) a prova testemunhal não desconfigurou os atos de improbidade administrativa, uma vez que as testemunhas se pronunciaram quanto às irregularidades afirmando apenas que a quadrilha junina sempre era patrocinada pela Prefeitura;

b) houve uma inobservância quanto aos requisitos legais do procedimento licitatório escolhido e o quanto ao destinatário dos recursos públicos;

c) a justificativa de preço, assim como a razão da escolha, tratam-se de atos que deveriam ter sido formalizados pela Prefeitura de Alto do Rodrigues/RN, mediante ao ônus que à época que cabia aos apelados (gestor e secretárias)

d) pela ausência do cumprimento dos requisitos previstos no art. 26, § Único, incisos II e III da Lei n° 8.666/93, verifica-se incidência no art. 10, inciso III da Lei n° 8.924/92

e) a concordância de Abelardo Rodrigues Filho, Irene Rodrigues Barboza e Francisca Irani Cunha de Souza – conforme demonstrado no recorte factual –, em autorizar o procedimento diante de tal documentação reforça o dolo destes em frustrar o processo licitatório pela inobservância dos requisitos legais e de doar recursos públicos a pessoa física sem a observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis a espécie (art. 10, incisos III e VIII da Lei n° 8.924/93);

f) o prejuízo ao erário é presente na própria má aplicação dos recursos públicos, que somaram o montante de R$ 21.500,00;

Ao final, requereu o provimento do apelo, com a reforma da sentença nos termos da fundamentação recursal.

Os Apelados Abelardo Rodrigues Filho, Irene Rodrigues Barboza e Francisca Irani Cunha de Souza apresentaram contrarrazões (ID n.ºs 19123363 e 19123364) pugnando pelo desprovimento do recurso.

Instado a se pronunciar, o Ministério Público, através da 7ª Procuradoria de Justiça, opinou pelo conhecimento e provimento do apelo.

É o relatório.

VOTO:

Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Discute-se na apelação cível, em análise, acerca do acerto ou não da sentença de ID n.º 19123354, que julgou improcedentes os pedidos formulados na exordial da presente ação civil pública de responsabilização por ato de improbidade administrativa.

1. Contexto fático contido na inicial:

A peça inicial apresentada pelo Ministério Público narra que a Apelada Mirelle da Silva Olegário solicitou ao então prefeito, o Recorrido Abelardo Rodrigues Filho, a concessão de patrocínio à quadrilha junina “Explosão Potiguar” para que esta participasse de campeonato a nível estadual, sendo atendida através de processo de despesa autorizado pelo gestor municipal no valor de R$ 21.500,00 (vinte um mil e quinhentos reais).

O referido procedimento administrativo teria contado com a participação da requerida Irene Rodrigues Barboza, Secretária de Finanças à época, que emitiu parecer pela disponibilidade dos recursos em dotação orçamentária e firmou as notas de empenho, liquidação e pagamento da quantia, que ocorreu na mesma data.

Além disso, o referido ato administrativo também foi certificado pela então Secretária de Educação, Esporte e CulturaFrancisca Irani Cunha de Souza, que também assinou o recibo do pagamento e figura como Demandada, ora Apelada.

2. Análise perpetrada na sentença:

Ao proferir a sentença sob vergasta, o magistrado de primeiro grau expôs os seguintes fundamentos:

“(...).

Do mérito

Impende ressaltar que a Constituição Federal, no art. 37, § 4º, estabeleceu as sanções para os atos de improbidade administrativa, objetivando conferir proteção à moralidade e à probidade no trato com a coisa pública:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

§ 4º – Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Por sua vez, a Lei 8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa – LIA) tipifica as condutas que importam enriquecimento ilícito (art. 9º), que causam prejuízo ao erário (art. 10), e, ainda, que violem os princípios da Administração Pública (art. 11), bem como regulamenta o dispositivo constitucional acima retratado instituindo as sanções cabíveis de acordo com a conduta praticada.

Para tanto, revela-se indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, no caso das condutas descritas nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA.

Em relação ao dolo necessário para a configuração da conduta ímproba discutida, o elemento subjetivo consiste na vontade livre e consciente de realizar a conduta, ou seja, a consciência e deliberação de praticar o ato em contrariedade ao ordenamento.

No caso dos autos, a exordial aponta que houve a prática de ato de improbidade administrativa pelos requeridos, na medida em que concorreram na doação de recursos públicos dissimulado em patrocínio cultural, frustrando a licitude de procedimento licitatório e em inobservância às formalidades legais para tal despesa.

Nesse ínterim, alega a prática de ato de improbidade administrativa tipificado no art. 10 (prejuízo ao erário) e, subsidiariamente, no art. 11 (violação aos princípios) da LIA, consistente em:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie;

(…)

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva;

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

Antes de adentrar no exame das provas produzidas e dos fatos articulados na petição inicial, imperioso enfatizar os contornos em que se insere a questão jurídica tratada nos autos.

A exigência de procedimento licitatório encontra previsão na Constituição Federal, mais especificamente em seu artigo 37, XXI, o qual estabelece, inclusive, a ressalva de sua dispensa e inexigibilidade em casos específicos:

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o que somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

...

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