Acórdão Nº 01010682620138200124 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 06-03-2020

Data de Julgamento06 Março 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01010682620138200124
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0101068-26.2013.8.20.0124
Polo ativo
SOCIAL - SOCIEDADE IMOBILIARIA E AGRICOLA LTDA
Advogado(s): CARLOS JOILSON VIEIRA
Polo passivo
MUNICIPIO DE PARNAMIRIM e outros
Advogado(s):

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA. I) PRELIMINAR CONTRARRECURSAL DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. MÁCULA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. REJEIÇÃO. II) MÉRITO. TAXA DE LICENÇA PARA EXECUÇÃO DE OBRAS E LOTEAMENTOS. MUNICÍPIO DE PARNAMIRIM/RN. VALOR EXORBITANTE. CARÁTER CONFISCATÓRIO. CONSTATAÇÃO. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, rejeitar a preliminar contrarecursal de não conhecimento do recurso. No mérito, por idêntica votação, conhecer e negar provimento à Apelação Cível, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste julgado.

RELATÓRIO

Cuida-se de Apelação Cível interposta pelo Município de Parnamirim/RN em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Parnamirim/RN que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídico-Tributária (processo nº 0101068-26.2013.8.20.0124), movida contra si por SOCIAL – Sociedade Imobiliária e Agrícola LTDA, foi exarada nos seguintes termos (Id 4694675):

Diante do exposto, com base no art. 487, I, do Código de Processo Civil, julgo procedente a pretensão autoral para declarar a nulidade do crédito tributário constituído através do DAM nº 2013930109, objeto do processo administrativo nº 2849/2012, tratado nos autos.

Condeno a parte ré a ressarcir as custas processuais pagas pela autora.

Condeno a parte ré ao pagamento de honorários advocatícios, estes fixados e, 10% (dez por cento) do valor do proveito econômico obtivo, no caso o importe de R$ 140.099,15 (cento e quarenta mil, noventa e nove reais e quinze centavos), considerando o valor do tributo cobrado à parte autora, tudo isso de conformidade com o artigo 85, §§2º, 3ª, do Código de Processo Civil vidente, levando em conta se tratar de causa sem maior complexidade, cujo trâmite se deu em comarca de fácil acesso e sem necessidade de prática de muitos atos processuais.

Irresignado, o ente federado persegue reforma do julgado.

Em suas razões (Id 4694676), afirma que: i) “sempre que um contribuinte apresentar um projeto de loteamento, desmembramento ou remembramento, deverá ser recolhida a referida taxa, em razão do dispêndio que causará à Administração Municipal em razão da análise desse projeto”; ii) “calcula-se o valor de taxa de licença para execução de loteamento, desmembramento ou remembramento, de acordo com a área do imóvel a ser fiscalizada, multiplicada pelo valor em UFIR’s”; e iii) “inexiste identidade entre a base de cálculo da referida taxa com a base de cálculo de qualquer imposto municipal, nem mesmo o IPTU como tenta induzir a parte autora”.

Neste sentido requer o conhecimento e provimento do recurso para declaração de total improcedência dos pedidos inaugurais.

Contrarrazões ao Id 4694677, nas quais a recorrida agita preliminar de não conhecimento do recurso por mácula ao princípio da dialeticidade. No mérito, defende o desprovimento deste.

Com vistas dos autos, o 17º Procurador de Justiça declinou de sua intervenção.

É o relatório.

VOTO

I – Preliminar contrarrecursal

A prefacial de não conhecimento do recurso por mácula ao principio da dialeticidade não é digna de acolhimento. Isto porque, embora tenha resgatados os argumentos já perfilados na contestação, o insurgente impugnou, ainda que com certo grau de generalidade, as razões de decidir da sentença vergastada.

Assim, rejeito a presente preliminar.

Preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, conheço do apelo.

II - Mérito

Cinge-se o mérito do recurso em perquirir o acerto da sentença quando declarou a nulidade do crédito tributário constituído através do DAM nº 2013930109, que tinha por objeto a cobrança de Taxa de Licença para execução de loteamento, desmembramento e remembramento, previsto no art. 187, inciso viii[1], do Código Tributário do Município de Parnamirim (Lei Municipal nº 951/1997).

Pois bem.

O artigo 77 do Código Tributário Nacional dispõe que:

Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

Ao seu turno, o art. 78 do mesmo diploma legislativo assevera que:

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.

No que se refere às limitações ao poder de tributar, Constituição Federal assinala:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)

IV - utilizar tributo com efeito de confisco;

Em comentários a norma supra, o Supremo Tribunal Federal salienta:

(...) a norma inscrita no art. 150, IV, da Constituição encerra uma cláusula aberta, veiculadora de conceito jurídico indeterminado, reclamando, em consequência, que os Tribunais, na ausência de "uma diretriz objetiva e genérica, aplicável a todas as circunstâncias" (DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio. Direito constitucional tributário e due process of law. 2. ed. Forense, 1986. p. 196, item 62) – e tendo em consideração as limitações que derivam do princípio da proporcionalidade –, procedam à avaliação dos excessos eventualmente praticados pelo Estado. (...) não há uma definição constitucional de confisco em matéria tributária. Trata-se, na realidade, de um conceito aberto, a ser utilizado pelo juiz, com apoio em seu prudente critério, quando chamado a resolver os conflitos entre o poder público e os contribuintes. (ARE 712.285 AgR, voto do Rel. Min. Celso de Mello, j. 23-4-2013, 2ª T, DJE de 28-6-2013)

Por sua vez, extrai-se da doutrina[2] que "A base de cálculo de uma taxa deve, tecnicamente, guardar relação com o custo da atividade estatal que constituiu o seu fato gerador". E, ainda, que:

A base de cálculo da taxa deve, simplesmente, traduzir um critério de proporção: os elementos integrantes da base de cálculo devem levar à presunção de que a sua variação para mais ou para menos afeta no mesmo sentido a intensidade, a extensão ou o volume exigidos da atividade estatal que configura o fato gerador da taxa.[3]

A análise minuciosa da demanda revela que restou evidenciado o caráter confiscatório da cobrança, uma vez que o custo da atividade estatal não guarda proporcionalidade em relação ao valor que este deve exigir do contribuinte.

No caso dos autos, a Administração Municipal exigiu a quantia de R$ 140.099,15 (cento e quarenta mil, noventa e nove reais e quinze centavos) para expedição da certidão de licença de execução de desemperramento requerida pela parte autora, a partir da apreciação dos planos e projetos de loteamento, nos termos do art. 251[4], do Código Tributário Municipal.

Noutros termos, calcula-se o valor da referida taxa de acordo com a área do imóvel a ser fiscalizada (in casu, 609069,28 m2), multiplicada pelo valor em UFIR’s (Unidade Fiscal de Referência) equivalente a R$ 0,23 (vinte e três centavos).

Ao analisar a controvérsia, assim valorou o magistrado sentenciante:

No caso dos autos, de acordo com as peças do processo administrativo nº 2849/2012 (fls. 64/82), por meio do qual se desenvolveu a cobrança do tributo objeto desta ação, o Município de Parnamirim cobrou o montante de R$ 140.099,15 (cento e quarenta mil, noventa e nove reais e quinze centavos), conforme DAM 2013930109 presente às fls. 66, isso pelo serviço de licença para execução de loteamento, desmembramento e remembramento de imóvel pertencente ao autor, o que, à luz dos argumentos acima apresentados se revela desproporcional, posto não representar o custo do serviço prestado ao contribuinte, razão pela qual deve ser declarada a nulidade dessa exação.

Portanto, embora não se exija exata correspondência entre o valor da taxa e o serviço estatal prestado (caráter não contraprestacional), o que ressalta a vertente da extrafiscalidade do tributo, há de se buscar razoabilidade no poder de tributar, circunstância não observada no caso dos autos.

Isto porque, consoante comprovado pela apelada, o exercício do mesmo poder de polícia (Licença para execução de loteamento) por outros entes municipais desta Região, com base em imóvel de idêntica dimensão, perfecbilizaria importe muito aquém do exigido pela fazenda recorrente.

Nesta linha de argumentação, o recorrido acosta simulação de prestação desse mesmo serviço estatal pelo Município de Recife/PE, no qual seria cobrado valor inferior a R$ 2.000,00 (dois mil reais) (Id 4694677, pág. 6), circunstância sequer impugnada pelo insurgente.

Em resumo, o montante impugnado é desarrazoado, eis que não encontra fundamento na própria atividade estatal que o origina. Não é outro o entendimento do Pretório Excelso:

O Supremo Tribunal Federal já se manifestou, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, pela necessidade de equivalência razoável entre o valor da taxa e o custo do serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais da não-confiscatoriedade (CF, art. 150, IV) e da...

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