Acórdão Nº 01044235820158200129 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 28-03-2023

Data de Julgamento28 Março 2023
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
Número do processo01044235820158200129
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0104423-58.2015.8.20.0129
Polo ativo
BRUNO DA SILVA OLIVEIRA
Advogado(s): WALTER FRANCISCO SAMPAIO FILHO, MARIA TEREZA MORO SAMPAIO, WALTER FRANCISCO SAMPAIO NETO
Polo passivo
MPRN - 03ª Promotoria Parnamirim e outros
Advogado(s):

Apelação Criminal n° 0104423-58.2015.8.20.0129.

Origem: Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Parnamirim/RN.

Apelante: Bruno da Silva Oliveira.

Advogados: Maria Tereza Moro Sampaio (OAB/SP 328.249), Walter Francisco Sampaio Neto (OAB/SP 376.312) e Walter Francisco Sampaio Filho (OAB/SP 298.838).

Apelado: Ministério Público.

Relator: Desembargador Glauber Rêgo.

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. CONDENAÇÃO PELOS DELITOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 33 E 35 DA LEI Nº 11.343/2006 E ARTIGOS 12 E 16 DA LEI Nº 10.826/2003. PRELIMINAR DE NULIDADE DAS PROVAS, SUSCITADA PELA DEFESA. TRANSFERÊNCIA PARA O MÉRITO. MÉRITO. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS, POR VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. NÃO ACOLHIMENTO. EXISTÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES. CONTEXTO FÁTICO ANTERIOR À ENTRADA NO DOMICÍLIO À AUTORIZAR AS BUSCAS. CRIME DE NATUREZA PERMANENTE. DESNECESSIDADE DE MANDADO JUDICIAL. PLEITO ABSOLUTÓRIO QUANTO AO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO ANTE A ALEGADA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. POSSIBILIDADE. ANIMUS ASSOCIATIVO NÃO DEMONSTRADO. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer da 3.ª Procuradoria de Justiça, em conhecer e prover em parte o apelo interposto apenas para absolvê-lo do crime previsto no art. 35, da Lei n. 11.343/2006, fixando sua pena em 10 anos e 06 meses de reclusão e 02 anos de detenção, além de 585 dias-multa, mantendo inalterada, em suas demais disposições, a sentença vergastada, tudo nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por Bruno da Silva Oliveira, já qualificado nos autos da ação penal, em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Parnamirim/RN (ID 17755151), que o condenou a uma pena definitiva de 13 (treze) anos e 10 (dez) meses de reclusão, além de 2 (dois) anos de detenção e o pagamento de 1295 (mil duzentos e noventa e cinco) dias-multa, pela prática dos crimes descritos nos artigos 33 e 35 da Lei nº 11.343/2006 e artigos 12 e 16 da Lei nº 10.826/2003.

O apelante, em suas razões (ID 17755170), suscitou preliminar de nulidade ante a invasão ao domicílio e realização de busca e apreensão sem decisão judicial ou consentimento expresso dos moradores. No mérito, ante a alegada insuficiência de provas, requereu a sua absolvição do delito de associação para o tráfico de drogas.

Em sede de contrarrazões (ID 17755174), após rebater os fundamentos dos recursos, o Ministério Público de primeiro grau pugnou pelo desprovimento do apelo.

Por intermédio do parecer de ID 18116204, a 3.ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento parcial do apelo, apenas para que seja o recorrente absolvido do crime de associação para o tráfico de drogas.

É o relatório.

Ao Eminente Desembargador Revisor.

VOTO

PRELIMINAR DE NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS POR VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO, SUSCITADA PELA DEFESA.

A preliminar arguida pela ré pertence ao mérito recursal. Entendo que somente elementos atinentes aos pressupostos recursais objetivos (tempestividade, custas, etc.) e subjetivos (legitimidade, competência, etc.) se classificam como preliminares dos recursos em geral, não sendo o caso da questão arguida pelo recorrente, que deve ser apreciada em momento oportuno, razão pela qual transfiro-a para o mérito.

MÉRITO

Verifico preenchidos os requisitos de admissibilidade, portanto, conheço do presente recurso.

Inicialmente objetiva o recorrente a nulidade das provas obtidas sustentando que houve quebra da inviolabilidade domiciliar em razão da entrada na residência sem autorização dos moradores e sem o respectivo mandado judicial de busca e apreensão.

Inexiste respaldo na tese defensiva.

A inviolabilidade domiciliar constitui um dos mais caros e relevantes direitos fundamentais estampados na Constituição Federal de 1988, garantindo ao proprietário ou ocupante de um aposento habitado a garantia da incolumidade de sua residência contra as forças do Estado ou de outros particulares, dependendo, para o ingresso, de sua autorização ou em situações excepcionais elencadas pelo próprio texto constitucional, senão vejamos:

Art. 5 (...) XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.

Consoante aponta o próprio texto constitucional, por meio de uma limitação expressa ao direito fundamental que ora se discute, permite-se que as forças policiais repressivas do Poder Público adentrem no domicílio de quem esteja praticando em flagrante delito alguma infração penal, tendo em vista que a inviolabilidade domiciliar não pode servir de escudo à prática delituosa.

Nesse diapasão, considerando que a flagrância delitiva é hipótese que mitiga o direito fundamental em comento, resta saber se na hipótese vertente houve flagrante delito que tivesse autorizado a entrada forçada dos policiais civis na residência do acusado sem que houvesse autorização ou exibição de mandado judicial.

No caso dos autos, verifico que a quebra da inviolabilidade domiciliar ocorreu com a devida regularidade e dentro da hipótese excepcional autorizada pela norma constitucional, uma vez que o delito tipificado no art. 33, da Lei de Drogas possui natureza permanente, de tal forma que nos crimes dessa classificação o flagrante existe enquanto durar a permanência delitiva, porquanto a consumação se protrai durante no tempo.

Por outro lado, a fim de evitar arbitrariedades do Poder Público nesses casos de flagrante em crimes permanentes, a jurisprudência dos Tribunais Superiores sedimentaram o entendimento que a entrada forçada apenas é permitida se houver fundadas razões que legitimem o ingresso no domicílio do suspeito, senão vejamos:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. INEXISTÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. DECISÃO MANTIDA. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INVASÃO À DOMICÍLIO. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. INDÍCIOS PRÉVIOS DA SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. MANIPULAÇÃO DO APARELHO CELULAR DA AGRAVANTE SEM AUTORIZAÇÃO. NATUREZA DA SUBSTÂNCIA APREENDIDA.TEMAS NÃO DEBATIDOS NO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. No que se refere à ilicitude das provas obtidas em razão de violação do domicílio, é cediço que "o ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio" (AgRg no HC 678.069/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe 20/9/2021).

No caso em apreço, extrai-se dos autos justa causa para ingresso dos policiais no domicílio da agravante, tendo em vista que, em patrulhamento de rotina, os policiais militares avistaram a agravante e seu companheiro em uma lanchonete, que, ao perceberem a presença da viatura, se dirigiram a um veículo e ficaram dando voltas até parar novamente no mesmo local, e quando iam saindo novamente, os policiais os abordaram e, durante vistoria no veículo, encontraram duas porções de maconha e correspondências abertas com o endereço da acusada. Na busca domiciliar foram apreendidos 4kg de cocaína, além da quantia de R$ 97.100,00 (noventa e sete mil e cem reais) e caderno com anotações típicas da contabilidade da traficância, confirmando-se a possível ocorrência dos delitos de tráfico e associação para o tráfico. Nesse contexto, a partir da leitura dos autos, verifica-se que foi constatada a existência de indícios prévios da prática da traficância, o que autoriza a atuação policial, não havendo falar em nulidade das provas produzidas por ausência de mandado judicial. Ademais, foi destacado pela Corte estadual que "o acusado [corréu] afirmou, em seu interrogatório na fase policial, que franqueou a entrada dos policiais militares no quarto onde reside" (fl. 319). Desse modo, é inadmissível rever a conclusão das instâncias ordinárias na via estreita do habeas corpus, ante a necessária incursão probatória.

2. As matérias referentes à suposta manipulação, sem autorização judicial, do aparelho celular da agravante pelos policiais, bem como o fato da substância apreendida de cor branca não ser cocaína, não foram apreciadas pelo TJ/SP, no julgamento do habeas corpus originário, o que obsta a análise direta por este Tribunal Superior de Justiça, uma vez vedada a supressão de instância.

3. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no HC n. 701.156/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 17/10/2022, DJe de 19/10/2022.) Destaques acrescidos.

PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. LICITUDE DA PROVA. ALEGADA VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INOCORRÊNCIA. FUNDADAS RAZÕES. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O ART. 28 DA LEI N. 11.343/2006. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE FATOS. AUSÊNCIA DE MANIFESTA ILEGALIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. Na esteira do decidido em repercussão geral pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE n. 603.616, para a adoção da medida de busca e apreensão domiciliar sem mandado judicial, faz-se necessária a caracterização de justa causa,...

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