Acórdão Nº 01123926220118200001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 08-04-2020

Data de Julgamento08 Abril 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01123926220118200001
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0112392-62.2011.8.20.0001
Polo ativo
MARIA JOSE BATISTA e outros
Advogado(s): EDUARDO CHAN, EDILAINE CRISTINA DONADELLO DUARTE, ARICIA DE FREITAS CASTELLO BRANCO
Polo passivo
MUNICIPIO DE MACAU e outros
Advogado(s):

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ATENDIMENTO DEFICIENTE EM HOSPITAL. MORTE DO PACIENTE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO MÉDICO PLANTONISTA, SUSCITADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ACOLHIMENTO. OMISSÃO DO MUNICÍPIO E HOSPITAL CARACTERIZADA. PACIENTE QUE NÃO RECEBEU ATENDIMENTO ADEQUADO. EXPOSIÇÃO DA VÍTIMA A CONDIÇÃO DEGRADANTE E INDIGNA. DANOS MORAIS E MATERIAIS PATENTES. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE. DANO, CONDUTA OMISSIVA E NEXO CAUSAL EVIDENCIADOS. REPERCUSSÃO MORAL INEQUÍVOCA. FIXAÇÃO DO MONTANTE INDENIZATÓRIO EM VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL AO ABALO. CONHECIMENTO E PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO.

1. Corroborado pelo julgamento do Recurso Extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de Repercussão Geral, o qual fixou a tese que “A teor do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica privada prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima passiva o autor do ato” (RE 1.027.633, rel. Min. Marco Aurélio, j. 14.08.2019, DJE 06.12.2019, Tese 940), deve ser reconhecida a ilegitimidade passiva do médico plantonista.

2. Considera-se, pois, que a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, isto é, para sua caracterização é suficiente a demonstração de uma conduta, o dano suportado e o nexo causal entre conduta e dano.

3. Precedente do TJRN (Apelação Cível nº 2018.006358-8, Rel. Desembargador Cornélio Alves, 1ª Câmara Cível, j. 18/12/2018; Apelação Cível nº 2018.005610-5, Rel. Desembargador Ibanez Monteiro, 2ª Câmara Cível, j. 12/02/2019).

4. Apelação conhecida e parcialmente provida.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas.

ACORDAM os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, por unanimidade de votos, em consonância com o parecer de Dra. Maria de Lourdes Medeiros de Azevêdo, Décima Quinta Procuradora de Justiça, conhecer do recurso, para acolher a preliminar de ilegitimidade passiva do médico plantonista, suscitada pelo Ministério Público, e, no mérito, pela mesma votação, dar parcial provimento ao apelo, para condenar a parte apelada no pagamento mensal à parte apelante, a proporção de 2/3 (dois terços) do salário mínimo vigente, calculando-se até a data em que o de cujus completaria 65 (sessenta e cinco) anos de idade a título de danos materiais, e dano moral em patamar equivalente a R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO


1. Trata-se de apelação cível interposta por MARIA JOSÉ BATISTA e ROBERTO SILVINO BATISTA em face da sentença proferida pelo Juízo da 8ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN (Id 4943213), que, nos autos da Ação de Indenização por Responsabilidade Civil c/c Danos Morais (Proc. nº 0112392-62.2011.8.20.0001) ajuizada em desfavor do MUNICÍPIO DE MACAU e HOSPITAL E FUNDAÇÃO ANTÔNIO FERRAZ, julgou improcedente o pedido inicial, condenando os autores ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais), ficando suspensa a exigibilidade em razão do deferimento da gratuidade judiciária.


2. Em suas razões recursais (Id 4943214), os apelantes requereram o conhecimento e provimento do apelo para julgar totalmente procedente a pretensão inicial, tendo em vista a ocorrência de negligência por parte dos apelados, causando o óbito do genitor/filho dos apelantes, pois competia ao Município disponibilizar a estrutura suficiente, como hospital estruturado, bem como coordenar e supervisionar os serviços prestados pelos profissionais da área de saúde, encarregados pelos cuidados necessários em casos de urgência e emergência dos pacientes.


3. Pediram, ao final, a reforma da sentença, para os recorridos serem condenados ao pagamento a título de dano material, em caráter alimentar, em razão da morte da vítima, considerando a idade na data do evento, a expectativa de vida e seus vencimentos, no importe de 2/3 (dois terços) de seus rendimentos no valor de R$ 1.471,67 (um mil, quatrocentos e setenta e um reais e sessenta sete centavos), até a sobrevida estimada em 65 (sessenta e cinco) anos de idade, bem como o pagamento, por parte de cada apelado, de indenização por danos morais no valor de 500 (quinhentos) salários mínimos.


4. Intimado para apresentar as contrarrazões, a parte apelada quedou-se inerte, transcorrendo o prazo in albis, conforme certidão de Id 4943216.


5. Com vista dos autos, Dra. Maria de Lourdes Medeiros de Azevêdo, Décima Quinta Procuradora de Justiça, opinou pelo conhecimento do recurso, suscitando a preliminar de ilegitimidade passiva do Dr. William da Fonseca Palhares, médico plantonista, e provimento parcial do apelo (Id 5044180).


6. É o relatório.

VOTO

7. Conheço do apelo.


PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO MÉDICO PLANTONISTA, SUSCITADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO


8. Em seu parecer, Dra. Maria de Lourdes Medeiros de Azevêdo, Décima Quinta Procuradora de Justiça, opinou e suscitou a preliminar de ilegitimidade passiva do Dr. William da Fonseca Palhares, médico responsável do Hospital, pois a responsabilidade objetiva se dirige a pessoa jurídica de direito público ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público.


9. De acordo com o art. 37, § 6º, da Constituição Federal, as pessoas jurídicas de direito público, bem como aquelas de direito privado que se apresentem como prestadoras de serviços públicos, respondem pelos danos causados por seus agentes, senão veja-se:



“Art. 37 – (omissis)

[...]

§ 6º – As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo e culpa.”



10. Da mesma forma, o art. 43 do Código Civil disciplina que:



“Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo."


11. Assim sendo, corroborado pelo julgamento do Recurso Extraordinário pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de Repercussão Geral, o qual fixou a tese que A teor do disposto no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica privada prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima passiva o autor do ato” (RE 1.027.633, rel. Min. Marco Aurélio, j. 14.08.2019, DJE 06.12.2019, Tese 940), deve ser reconhecida a ilegitimidade passiva do médico plantonista, Dr. Willian da Fonseca Palhares, razão pela qual acolha a presente preliminar.


MÉRITO


12. Buscam os apelantes a condenação dos apelados em decorrência da morte de seu genitor/filho em face da ocorrência de falha no atendimento médico-hospitalar por parte do Hospital e Fundação Antônio Ferraz do Município de Macau/RN, em face da seguinte narrativa (Id 4943213 – Pág. 1):


“Mencionam que o senhor Autelino Batista fora encaminhado ao Hospital Antônio Ferraz, por volta das 05:00 horas da manhã, do dia 16 de fevereiro de 2010, onde foi diagnosticada uma suspeita de ACIDENTE VASCULAR CELULAR HEMORRÁGICO. No entanto, a despeito do seu grave quadro, o médico responsável pelo diagnóstico, Senhor Willian da Fonseca Palhares, resolveu transporta-lo para esta capital, num carro particular, FIAT UNO e sem o auxílio de qualquer outro profissional ao invés de numa ambulância, mesmo havendo várias unidades disponíveis na cidade. Esta desídia do profissional teria colaborado para a morte do paciente, fato este que ocorreu na cidade de Jandaíra/Rn, distante uns 40 km de Macau.” (sic)


13. No caso dos autos, o médico responsável pelo Pronto Atendimento do Hospital do Município de Macau, após os primeiros socorros ao paciente resolveu encaminhá-lo ao Hospital Clóvis Sarinho em Natal, tendo sido feita a transferência em carro comum e inadequado, pois não podia ser liberada nenhuma ambulância devido a festa de carnaval na cidade, foi quando a vítima desfaleceu no caminho e veio à óbito.


14. Decerto que a responsabilidade da Administração Pública está disciplinada no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, cuja redação é a seguinte:


"As pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”


15. Sobre o tema, este é o entendimento do mestre HELY LOPES MEIRELES, conforme excerto extraído de sua consagrada obra Direito Administrativo Brasileiro, 36ª edição, editora Malheiros, 2010, p. 686 e 691:


"O exame desse dispositivo revela que o constituinte estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos administrativos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão.

[...]

Para obter a indenização, basta que o lesado acione a Fazenda Pública e demonstre o nexo causal entre o fato lesivo (omissivo ou comissivo) e o dano, bem como seu montante. Comprovados esses dois elementos, surge naturalmente a obrigação de indenizar. Para eximir-se dessa obrigação incumbirá à Fazenda...

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