Acórdão Nº 01264627920148200001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 29-04-2020

Data de Julgamento29 Abril 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo01264627920148200001
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0126462-79.2014.8.20.0001
Polo ativo
MARIA NUBIA DA CRUZ e outros
Advogado(s): MAGALY DANTAS DE MEDEIROS
Polo passivo
NUTRIVIDA LTDA
Advogado(s): ADILSON DE OLIVEIRA PEREIRA JUNIOR, CARLOS OCTACILIO BOCAYUVA CARVALHO

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SENTENÇA QUE CONFIRMOU A ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA PARA QUE FOSSE AUTORIZADO O TRATAMENTO DOMICILIAR NOS MOLDES PRESCRITOS PELO MÉDICOS QUE ASSISTIAM A PACIENTE. IRRESIGNAÇÃO DA EMPRESA PRESTADORA DOS SERVIÇOS DE HOME CARE IMPRESCINDIBILIDADE DO TRATAMENTO DEVIDAMENTE COMPROVADA POR MEIO DE LAUDO MÉDICO. DIREITO À SAÚDE E À VIDA QUE DEVEM PREVALECER. REVISÃO CONTRATUAL INCOMPATÍVEL COM O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ABUSIVIDADE RECONHECIDA. DANOS MORAIS. CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO APELO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, sem opinamento ministerial, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator que integra este acórdão.

acórdão.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta pela NUTRIVIDA LTDA em face da sentença proferida pelo Juízo da 15ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN (Id. 4549272), que, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer nº 0126462-79.2014.8.20.0001, interposta por Esmeralda Leonor Da Cruz, substituída processualmente por sua filha por Maria Núbia Da Cruz, julgou procedente a pretensão autoral.

Em suas razões, de Id.nº 4659032, a empresa Apelante alega que a redução dos serviços de home care foi em decorrência do quadro clínico da paciente permitir. Narra que o contrato permitia alteração no tempo de permanência da equipe do home care que assistia a Sra. Esmeralda Leonor da Cruz tanto para mais quanto para menos.

Sustenta que o acompanhamento domiciliar do paciente envolve serviços de enfermagem, fisioterapia, nutricionista e por esta razão e estes concluíram quanto as melhoras no quadro clínico da paciente.

Assevera que a NUTRIVIDA manteve um cuidador em tempo integral e na hipótese de alguma urgência a equipe técnica da empresa seria acionada para atendimento ambulatorial.

Por fim, pugna pela reforma integral do julgado.

A parte Apelada não apresentou contrarrazões, conforme certidão de Id. nº 4659032.]

O Ministério Público, por meio da 9ª Procuradoria de Justiça, declinou de sua atuação no feito, conforme manifestação de Id. nº 4910824.

Autos remetidos por prevenção, conforme Despacho do Desembargador Gilson Barbosa, de Id. 5220867.

É o que importa relatar.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cinge-se o mérito recursal em perquirir se a apelante é obrigada a manter os serviços, no padrão estabelecido pelos médicos que assistiam a genitora da Apelante, que necessitava do atendimento em home care.

É imperioso, de logo, frisar-se, que estamos diante de uma relação de consumo amparada na Lei nº 8.078/90, o Código de Defesa do Consumidor (CDC), onde o consumidor é considerado como " aquele que se encontra numa situação de usar ou consumir, estabelecendo-se, por isso, uma relação atual ou potencial, fática sem dúvida, porém, a que se deve dar valoração jurídica, a fim de protegê-lo, quer evitando, quer reparando os danos sofridos" (Waldírio Bulgarelli, Tutela do Consumidor na Jurisprudência e de lege ferenda, in Revista de Direito Mercantil, Nova Série, ano XVII, nº 49).

Os Tribunais pátrios têm decidido que as cláusulas contratuais insertas em com o objetivo de restringir procedimentos médicos, por serem abusivas, revestem-se de nulidade. Isto porque contrariam a boa-fé do consumidor, vedando-lhe a realização da expectativa legítima da prestação dos serviços almejados, em desobediência à prescrição médica, ameaçando, inclusive, o próprio objetivo do contrato, que consiste no fornecimento do serviço de saúde, o que implica em flagrante desequilíbrio contratual.

No caso dos autos, restou suficientemente comprovado, por meio do laudo médico que concluiu pela necessidade do home care(4659021), que atesta o estado avançado de sua doença, a necessidade da continuidade do seu tratamento deverá se dar em seu domicílio, nos moldes estabelecidos, não podendo, desta forma, sobrevir mudança desfavorável a paciente, cujo estado clínico se lhe fosse favorável não teria sobrevindo aos autos o seu óbito.

No caso presente, constata-se que o atendimento solicitado pela paciente apelada, que tinha 88 (oitenta e oito anos) de idade, era de extrema necessidade para a manutenção de sua vida, pois, de acordo com os relatos médicos acostados, esta necessita de assistência médica diária contínua, em razão de sua fragilizada condição de saúde decorrente da patologia DPOC estágio IV, sendo dependente de O2 domiciliar, com insuficiência cardíaca e demência decorrente de doença de Alzheimer.

Diante desse quadro clínico, as mudanças no oferecimento dos serviços de home care, nos moldes propostos pela Apelante, modificam o acompanhamento integral a paciente.

Com efeito, o bem jurídico que se pretende tutelar é da maior importância, concernente à própria vida do usuário, cuja proteção decorre de imperativo constitucional que resguarda, no art. 1º, III, a dignidade da pessoa humana, e deve sobrepor-se ao direito eminentemente pecuniário.

A tutela do direito buscado emerge, ainda, do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil, garantidores do princípio da boa-fé objetiva, que remete à imposição de deveres aos contratantes, especialmente o de resguardar os direitos das pessoas com quem se contrata.

Neste sentido a jurisprudência desta Corte Estadual:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PLANO DE SAÚDE. NECESSIDADE DE INTERNAÇÃO DOMICILIAR. SERVIÇO DE HOME CARE. REDUÇÃO PARCIAL DO SERVIÇO PELA PRESTADORA. REDUÇÃO DO ATENDIMENTO DE 24 HORAS PARA 12 HORAS. NECESSIDADE DO PERÍODO INTEGRAL. PACIENTE IDOSO COM SEQUELAS DE ACIDENTE VASCULAR ENCEFÁLICO. PREVALÊNCIA DO DIREITO À SAÚDE E À VIDA. REFORMA DA DECISÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO. (Agravo de Instrumento Com Suspensividade n° 2013.010652-2, Relator: Des. Cláudio Santos, 3ª Câmara Cível. Data de Julgamento: 27/03/2014)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. PLANO DE SAÚDE. ASSISTÊNCIA HOME CARE. DECISÃO QUE CONCEDEU A TUTELA ANTECIPADA, AUTORIZANDO O RESTABELECIMENTO DE TAL ASSISTÊNCIA EM FAVOR DA AGRAVADA. PARTE AGRAVANTE QUE NÃO APRESENTA NOVAS INFORMAÇÕES A JUSTIFICARA A REFORMA DE DECISÃO. PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES À CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA EM FAVOR DA RECORRIDA. PRECEDENTES DESTA EGRÉGIA CORTE DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Com Suspensividade n° 2012.010494-1, Relator: Des. Expedito Ferreira, 1ª Câmara Cível. Data de Julgamento: 04/07/2013)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA SUSCITADA PELA AGRAVANTE. REJEIÇÃO. PLANO DE SAÚDE. NECESSIDADE DE INTERNAÇÃO DOMICILIAR. SERVIÇO DE HOME CARE. CONCESSÃO PARCIAL DO SERVIÇO PELA PRESTADORA. REDUÇÃO DO ATENDIMENTO DE 24 HORAS PARA 12 HORAS. PREVALÊNCIA DO DIREITO À SAÚDE E À VIDA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. (Relator: Des. Cláudio Santos. Julgamento: 09/05/2013. Órgão Julgador: 3ª Câmara Cível. Classe: Agravo de Instrumento com Suspensividade nº 2013.001281-6)

Dessa forma, caracterizada a obrigação da Apelante em manter o atendimento em home care necessitado pela paciente, nos moldes prescritos pelos profissionais que a assistiam, resta configurado o dano moral.

Com efeito, em casos como o presente, a jurisprudência do STJ (REsp 657717/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, DJ 12/12/2005) considera que o dano moral é presumido (in re ipsa), uma vez que não há necessidade de comprovação do sofrimento ou do abalo psicológico numa situação desta natureza.

Desse modo, evidenciado o ato ilícito e o nexo de causalidade entre aquele e o dano, surge a responsabilidade civil para reparar os danos decorrentes do ilícito praticado, mormente porque em se tratando de relação de consumo, a responsabilidade do fornecedor do serviço é objetiva, nos termos do art.12 do CDC.

Cumpre-nos estabelecer o quantum indenizatório.

Nessa perspectiva, sopesando todos esses aspectos, bem como observados os parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, a condição sócio-econômica do autor da ação, da instituição recorrida, e atento aos parâmetros fixados pela jurisprudência em casos similares, entendo que o valor de 6.000,00 (seis mil reais), é capaz de servir de

Neste diapasão, válidas as transcrições:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. LUCROS CESSANTES. SÚMULA STJ/7. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. IMPROVIMENTO. 1.- A convicção a que chegou o Tribunal a quo quanto à inexistência dos lucros cessantes decorreu da análise do conjunto probatório. O acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte. Incide nesse ponto a Súmula STJ/7. 2.- Os juros moratórios, em sede de responsabilidade contratual, fluem a partir da citação. Precedentes. 3.- Agravo Regimental improvido (AgRg no REsp 1341138/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/05/2013, DJe 07/06/2013 – Destaque acrescido).

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE ATENDIMENTO. PROCEDIMENTO REALIZADO NA REDE NÃO CREDENCIADA. DEVER DE RESSARCIR O CONSUMIDOR. PREJUÍZO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. OBSERVÂNCIA...

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