Acórdão nº0141703-52.2018.8.17.2001 de Gabinete do Des. Fábio Eugênio Dantas de Oliveira Lima (1ª CC), 12-07-2023

Data de Julgamento12 Julho 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo0141703-52.2018.8.17.2001
AssuntoInclusão Indevida em Cadastro de Inadimplentes
Tipo de documentoAcórdão

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 1ª Câmara Cível - Recife - F:( ) Processo nº 0141703-52.2018.8.17.2001 REPRESENTANTE: BANCO BMG REPRESENTANTE: JOSECI ARAUJO FERNANDO INTEIRO TEOR
Relator: FABIO EUGENIO DANTAS DE OLIVEIRA LIMA Relatório: APELAÇÃO CÍVEL Nº 0141703-52.2018.8.17.2001
ÓRGÃO JULGADOR: 1ª Câmara Cível
RELATOR: Desembargador Fábio Eugênio Dantas de Oliveira Lima JUIZ PROLATOR: Cláudio Malta de Sá Barretto Sampaio – 1ª Vara Cível da Capital – Seção B
APELANTE: Banco BMG APELADO: Joseci Araújo Fernando RELATÓRIO Cuida-se, na origem, de ação ordinária ajuizada por JOSECI ARAÚJO FERNANDOem face de BANCO BMG, em que pretende, em primeiro plano, a intervenção judicial no contrato de empréstimo pessoal via cartão de crédito firmado entre as partespara declarar a nulidade do ajuste, sob o argumento de que avençou um mútuo em 2011, sendo certo que, embora venha sendo descontado em folha de pagamento desde então,permanece, até o momento do ajuizamento da ação, em dezembro de 2018, com o saldo devedor em aberto sem qualquer indicação sobre o termo final do contrato.


Pretende, ainda, indenizaçãopor dano moralepor dano material,este consistente na devolução do indébito.


Citado, o BANCO BMG apresentou contestação, alegando, em suma, que o contrato de “cartão de crédito consignado” fora firmado validamente.


Alega, em continuação, que o cartão de crédito foi desbloqueado e que, nos termos da avença, seria pago mediante desconto em folha de pagamento pelo valor correspondente ao mínimo da fatura e pelo pagamento, via boleto, do remanescente da fatura.


Sustenta, ainda, a inexistência de dano moral e de dano material.


A sentença julgou procedentes os pedidos para declarar a nulidade do contrato, condenado a ré a devolver, em dobro, os valores cobrados indevidamente, considerando a diferença de contratação entre as modalidades de empréstimo consignado e cartão de crédito consignado, bem como condenar a ré ao pagamento de indenização por dano moral no valor R$ 10.000,00 (dez mil reais).


Ademais, determinou a suspensão de imediata dos descontos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais).


Condenou, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.


Irresignado, BANCO BMGinterpôs apelação reiterando os argumentos aduzidos na contestação.


Ademais, requereu a redução da multa diária fixada na sentença e, subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório.


É o relatório.

Inclua-se em pauta para julgamento.


Recife, Fábio Eugênio Dantas de Oliveira Lima Desembargador Relator
Voto vencedor: APELAÇÃO CÍVEL Nº 0141703-52.2018.8.17.2001
ÓRGÃO JULGADOR: 1ª Câmara Cível
RELATOR: Desembargador Fábio Eugênio Dantas de Oliveira Lima JUIZ PROLATOR: Cláudio Malta de Sá Barretto Sampaio – 1ª Vara Cível da Capital – Seção B
APELANTE: Banco BMG APELADO: Joseci Araújo Fernando VOTO Sob o aspecto estritamente formal a relação de direito material firmada entre as partes consiste, em última análise, num contrato de empréstimo pessoal, obtido pela via da utilização de cartão de crédito, em que há a opção de saque, cujo pagamento dar-se-ia por desconto em folhado valor correspondente ao pagamento mínimo da fatura de cartão de crédito e pelo pagamento, via boleto, do remanescente da fatura.


À míngua de informações didáticas, tem-se que o consumidor estava seguro que contratara, em real verdade, um empréstimo pessoal e não uma modalidade peculiar e especial de cartão de crédito.


Não lhe foi dado saber, via contrato, que pagava mês a mês apenas parte da fatura de cartão de crédito e não a quitação de parcela de empréstimo.


Não lhe foi informado, com clareza e objetividade, que seguindo o curso ordinário dos termos da avença, vale dizer a amortização mínima correspondente ao valor descontado em folha, permaneceria indefinidamente em mora, o que o levaria a suportar os juros e encargos sobre o saldo devedor total desde o primeiro mês.


Ao reverso, o consumidor foi deliberadamente induzido a compreender que, ao efetuar as parcelas pela via do desconto em folha, não havia inadimplência e não haveria incidência de juros ou encargos.


A simples concepção e engenharia jurídica do contrato já encerra uma vantagem excessiva para a instituição financeira.


Com efeito, o BANCO BMG conta coma garantia do empréstimo consignado em folha de pagamento, o que lhe confere a segurança do recebimento da dívida, e, de outro lado, estipula, pela via indireta, os juros altíssimos dos cartões de crédito inadimplidos.


Registre-se que diante da sistemática contratual,o consumidor começa a relação em mora e subordinado aos juros do rotativo do cartão de crédito, porquanto o desconto em folha dar-se-ia, nos termos da avença, pelo valor do mínimo da fatura mensal do cartão.


Em outros termos, a instituição financeira tem o melhor de todos os mundos: a garantia do empréstimo consignado, juros do rotativo do cartão de crédito e a certeza de que o consumidor estará desde sempre em mora.


De outra banda, a amortização pelo mínimo da fatura levará a uma dívida de impossível quitação para o consumidor que recorre a esse tipo de empréstimo.


Resta configurado, assim, uma postura contratual perversa, iniqua, adedremente concebida para manter o consumidor indefinidamente em mora.


Há, por assim dizer, uma evidente vantagem manifestamente excessiva e uma iniquidade contratual, posturas contratuais expressamente vedadas pelo Código de Defesa do Consumidor (art 51, inciso VI, e art. 39, inciso V, CDC).


De ponderar, com elevado destaque, que oCódigo de Defesa do Consumidor erigiu a boa-fé a princípio de primeira grandeza na proteção contratual do fornecedor e do consumidor e, como corolário seu, o direito à informação clara e precisa sobre produtos e serviços (arts.
4º, III e 6º, III, da Lei 8.078/90). Cuida-se aqui da boa-fé objetiva, vale dizer, aquela segundo a qual consumidor e fornecedor devem procurar o equilíbrio contratual e pautar-se pelo respeito, pela lealdade e pela transparência recíprocos.

Daí porque o fornecedor, dominador das informações especializadas sobre o produto e o serviço, deve adotar medidas úteis e eficazes para não passar ao consumidor uma ideia aparente ou incompleta acerca do produto ou serviço que comercializa.


Importa realçar que direito à informação significa clareza e precisão quanto ao real e efetivo conteúdo do contrato.


Exige, por seu turno, cláusulas redigidas sem fórmulas e conceitos abstratos, de difícil entendimento para os leigos ou para quem não detém informações especializadas sobre os produtos e serviços.


Essa exigência, tem ainda maior razão de ser nos contratos de adesão, em relação aos quais dispõe o art. 54, § 3º, CDC: “os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor”.


Em sentido idêntico, o § 4º do mesmo dispositivo afirma que “as cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão”.


De novo, o consumidor não foi esclarecido, com objetividade e lealdade, de que deveria pagar, cumulativamente, um desconto em folha de pagamento referente ao pagamento mínimo e o seu restante via boleto.


Em conclusão,os termos da avença, por frontal violação ao princípio básico e fundamental da boa-fé objetiva (art.
e 51, IV, CDC), que orienta, limita e baliza as posturas e as práticas das partes desde a formação do contrato de consumo até a sua execução, além do que impõe aos fornecedores de produtos e serviços uma revisitação nas suas práticas comerciais, é de abusividade evidente.

Diria de uma abusividade evidente e qualificada, na medida em que deliberadamente pensada para levar a erro o consumidor, para obter umavantagem manifestamente excessiva, tudo isso originando uma iniquidade contratual em desfavor do consumidor.


Caracterizada a abusividade, tem-se como configurado o ato ilícito, devendo o BANCO BMG responder pelos danos daí advindos.


Neste diapasão, tem-se como configurado o dano moral na perspectiva de que os descontos em folha de pagamento são, como consequência da frontal violação ao princípio da boa-fé objetiva, indevidos e, portanto, abusivos.


Dano moral que decorre diretamente da ilicitude da postura contratual, o que prescinde da comprovação de ofensa efetiva aos chamados direito de personalidade.


Decorre, por assim dizer,do próprio fato, operando-se in re ipsa.


Certo o dever de indenizar, passo a analisar o valor arbitrado.


A indenização por dano moral, que deve ser fixada pelo prudente, racional e motivado arbitramento judicial, tem por finalidade, a um só tempo, compensar o ofendido e punir o ofensor, cuja sanção volta-se destacadamente à prevenção.


Neste contexto, tem-se que o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) fixado a título de dano moral atende a sua dupla função: ressarcitório e punitiva/preventiva.


Com efeito, a parte ré é empresa de grande porte econômico/financeiro.


Indenização modesta em termos pecuniários não estimulará o ofensor a revisitar conceitos e comportamentos com o objetivo de não mais praticar a conduta ilícita.


E mais: indenizações módicas permitem que o fornecedor lucre com a ofensa moral, preferindo arcar com indenizações, aqui e ali, ao invés de aparelhar-se adequadamente segundo as exigências do mercado consumidor.


O quantum deve ser arbitrado, por essa ótica, afim de evitar reparação meramente simbólica.


Por outro lado, a parte autora, ostenta condição econômica modesta, de modo que para a indenização cumprir seu papel ressarcitório de recompensar a autora deve ser fixada sem exageros ou excessos.


Por idênticas razões, tem-se que os descontos que excederam do razoável deve ser devolvido ao consumidor, conforme apuração em liquidação da sentença.


A devolução dar-se-á em dobro da quantia cobrada em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, nos termos do artigo 42 do Código de
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