Acórdão Nº 08000144420228205143 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 2ª Turma Recursal, 04-07-2023

Data de Julgamento04 Julho 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08000144420228205143
Órgão2ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0800014-44.2022.8.20.5143
Polo ativo
MUNICIPIO DE MARCELINO VIEIRA
Advogado(s):
Polo passivo
LUIZA MARILLAC CHAVES DO NASCIMENTO
Advogado(s): LIECIO DE MORAIS NOGUEIRA

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

SEGUNDA TURMA RECURSAL

RECURSO INOMINADO 0800014-44.2022.8.20.5143

RECORRENTE: MUNICIPIO DE MARCELINO VIEIRA

RECORRIDO: LUIZA MARILLAC CHAVES DO NASCIMENTO

JUIZ RELATOR: REYNALDO ODILO MARTINS SOARES

DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL APOSENTADO. MUNICÍPIO DE MARCELINO VIEIRA/RN. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. LICENÇA-PRÊMIO. PREVISÃO LEGAL. DIREITO NÃO USUFRUÍDO ANTES DA INATIVIDADE. PEDIDO DE CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ENTENDIMENTO FIRMADO PELO STF NO JULGAMENTO DO ARE Nº 721001 (TEMA 635). REPERCUSSÃO GERAL. SÚMULA Nº 48 DO TJRN. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. IRRELEVÂNCIA. PRECEDENTE DO STJ. JUROS MORATÓRIOS, COM BASE NA REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA, DEVEM FLUIR DESDE O EFETIVO PREJUÍZO. INTELIGÊNCIA DO ART. 397 DO CÓDIGO CIVIL. A PARTIR DE 9/12/2021, EM FACE DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 113/2021, JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA COM ESTEIO NA TAXA SELIC. ADEQUAÇÃO DE OFÍCIO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1 – O Ente público possui o ônus de colacionar aos autos os documentos necessários ao esclarecimento da causa, nos termos do art. 9º da Lei 12.153/2009, bem como de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado, conforme dispõe o art. 373, II, § 1º, do CPC

2 – É cabível a conversão em pecúnia de licença-prêmio que não foi usufruída ou contada em dobro para fins de aposentadoria, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 721.001 (Tema 635), em sede de repercussão geral, e da Súmula nº 48 do TJRN.

3 – O Superior Tribunal de Justiça, seguindo o entendimento do STF, firmou precedente no sentido de que a conversão em pecúnia da licença-prêmio independe de requerimento administrativo, sob pena de configuração do enriquecimento ilícito da Administração (AgInt no REsp 1634468/RS, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 15/05/2018, DJe 18/05/2018).

4 – O termo inicial de incidência dos juros em caso de verba devida a servidor público, flui a partir do ato ilícito, em face da liquidez da obrigação. Inteligência do artigo 397 do Código Civil e Súmula nº 43 do STJ.

5 – Nas condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, os juros moratórios corresponderão ao índice oficial da caderneta de poupança e a correção monetária ao índice do IPCA-E, e, a partir de 09/12/2021, início da vigência da EC nº 113/2021, nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza, deve-se observar a incidência da SELIC, sem cumulação com qualquer outro índice.


ACÓRDÃO

DECIDEM os Juízes que integram a Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais de Natal e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso negar-lhe provimento, mantendo a sentença pelos seus próprios fundamentos, alterando-se, de ofício, apenas a data inicial da contagem de juros, e que a partir de 9/12/2021, seja aplicada a SELIC para atualização monetária e juros, nos termos do voto do relator.

Condenação em honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, ex vi art.55 da Lei nº 9.099/95.

Natal/RN, data do registro no sistema.

REYNALDO ODILO MARTINS SOARES

Juiz Relator

(documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso inominado interposto pela parte demandada, haja vista sentença que julgou procedente o pedido autoral de pagamento das licenças-prêmios não usufruídas em pecúnia.

Em suas razões recursais, a parte recorrente aduziu, em síntese, a nulidade da sentença por ter julgado antecipadamente o mérito sem apreciação de qualquer prova e, no mérito, que não é possível a conversão da licença-prêmio em prestação pecuniária, em decorrência da ausência de previsão legal. Pugna pelo provimento recursal.

Contrarrazões pelo não provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Evidencia-se o cabimento do recurso, ante à legitimação para recorrer, o interesse recursal, a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, bem como a tempestividade e a regularidade formal, devendo, por isso, ser recebido e conhecido.

Inicialmente, não assiste razão à parte recorrente quanto à alegação de nulidade da sentença, em razão do julgamento antecipado da lide. O Ente público possui o ônus de colacionar aos autos os documentos necessários ao esclarecimento da causa, nos termos do art. 9º da Lei 12.153/2009, bem como de provar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito invocado, conforme dispõe o art. 373, II, § 1º, do CPC.

Pois bem. O direito à licença-prêmio, como não possui o status de garantia constitucional, depende do atendimento, primeiro, do princípio da legalidade estrita, ou seja, necessita de previsão legal específica. E, no Município de Marcelino Vieira-RN, tal direito ressai dos art. 102 e 103 da Lei Municipal nº 036/96, considerando-se adquirido o direito à percepção da licença-prêmio após 05 (cinco) anos de exercício.

Havendo a previsão legal de licença-prêmio (ou licença especial por tempo de serviço), duas hipóteses podem ocorrer em relação aos períodos de licença-prêmio aperfeiçoados, mas não gozados:

Primeiro, enquanto o servidor estiver em atividade, a conversão em pecúnia somente é possível se houver expressa previsão legal neste sentido – no âmbito do município, não há, logo seria improcedente a pretensão enquanto o servidor permanecesse em atividade.

Segundo, se o servidor já estiver em inatividade e o tempo de licença-prêmio não gozada não foi computado (em acréscimo de tempo) para fins de concessão de sua aposentadoria, deverá ocorrer a indenização pela administração pública ao servidor, como forma de evitar o enriquecimento sem causa da Administração.

No que tange à conversão em pecúnia, o STJ já assinalou que o pagamento, em tais situações, independe de previsão legal:

“(...) 3. A conversão em pecúnia das licenças-prêmios não gozadas, em razão do interesse público, independe de previsão legal, uma vez que esse direito, como acima apresentado, está calcado na responsabilidade objetiva do Estado, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, e não no art. 159 do Código Civil, que prevê a responsabilidade subjetiva.(...)” RMS 19395 / MA; Ministra LAURITA VAZ; T5 -QUINTA TURMA; DJe 29/03/2010).

Ademais, o direito à conversão de licença-prêmio não gozada em pecúnia também foi reconhecido pelo STF no julgamento do ARE 721.001 (Tema nº 635), em sede de repercussão geral. Vejamos:

Recurso extraordinário com agravo. 2. Administrativo. Servidor Público. 3. Conversão de férias não gozadas – bem como outros direitos de natureza remuneratória – em indenização pecuniária, por aqueles que não mais podem delas usufruir. Possibilidade. Vedação do enriquecimento sem causa da Administração. 4. Repercussão Geral reconhecida para reafirmar a jurisprudência desta Corte.

(...) Assim, com o advento da inatividade, há que se assegurar a conversão em pecúnia de férias ou de quaisquer outros direitos de natureza remuneratória, entre eles a licença-prêmio não gozadas, em face da vedação ao enriquecimento sem causa. (...)

(ARE 721001 RG-RJ Relator (a): Min. Gilmar Mendes Julgamento: 28/02/2013 Órgão Julgador: Tribunal Pleno do STF) – grifos acrescidos.

Quanto à desnecessidade de requerimento administrativo prévio, firmou a jurisprudência do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. SERVIDOR PÚBLICO. CONVERSÃO EM PECÚNIA DA LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO QUE VEDA O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DA ADMINISTRAÇÃO. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 1.021, § 4º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DESCABIMENTO.

(Omissis)

II - O acórdão recorrido está em confronto com orientação desta Corte, segundo a qual é cabível a conversão em pecúnia da licença-prêmio não gozada e não contada em dobro para a aposentadoria, independentemente de requerimento administrativo, sob pena de configuração de enriquecimento ilícito da Administração Pública.

(Omissis)

(AgInt no REsp 1634468/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/05/2018, DJe 18/05/2018) – grifos acrescidos.

Considerando o entendimento dos Tribunais Superiores, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte editou a Súmula nº 48, sedimentando que “é devida ao servidor aposentado indenização por férias e licença-prêmio não usufruídas em atividade”.

Por fim, esta Turma Recursal, igualmente, palmilha por tal entendimento, sedimentando, ainda, a base de cálculo, verbis:

RECURSO INOMINADO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. CONVERSÃO EM PECÚNIA DE LICENÇA-PRÊMIO NÃO USUFRUÍDA. POSSIBILIDADE. COM O ADVENTO DA INATIVIDADE, DEVE SER ASSEGURADO AO SERVIDOR O DIREITO À CONVERSÃO DA LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA EM INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. ENTENDIMENTO DO STF EM SEDE DE REPERCUSSÃO GERAL. DESNECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA QUE SE BENEFICIOU DOS SERVIÇOS PRESTADOS PELO SERVIDOR DURANTE O PERÍODO EM QUE DEIXOU DE USUFRUIR DO BENEFÍCIO. DESNECESSIDADE DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. BASE DE CÁLCULO DA LICENÇA-PRÊMIO QUE CORRESPONDE À ÚLTIMA REMUNERAÇÃO PERCEBIDA PELO SERVIDOR QUANDO EM ATIVIDADE. ACRÉSCIMO DAS VANTAGENS DE...

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