Acórdão Nº 08000233120198205104 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal Temporária, 13-09-2021

Data de Julgamento13 Setembro 2021
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08000233120198205104
Órgão1ª Turma Recursal Temporária
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0800023-31.2019.8.20.5104
Polo ativo
MARIA GIRLENE NORONHA DE LIMA e outros
Advogado(s): GILDEVAN MACEDO DA SILVA, ELIZA KAROLINE DE SOUZA ARAUJO
Polo passivo
TELTUR VIAGENS E TURISMO LTDA - ME e outros
Advogado(s): JOAO VICTOR PEREIRA DE MEDEIROS, MARLA MAYADEVA SILVA RAMOS SERRANO

Recurso cível nº 0800023-31.2019.8.20.5104

Origem: Juizado Especial da Comarca de João Câmara

Recorrente: MARIA GIRLENE NORONHA DE LIMA

Recorrente: CARLOS ALBERTO DE LIMA

Recorrido: TELTUR VIAGENS E TURISMO LTDA – ME

Recorrido: GOL LINHAS AEREAS INTELIGENTES S.A.

Juiz Relator: Valdir Flávio Lobo Maia

EMENTA: RECURSO INOMINADO CÍVEL. CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATRASO DE VOO. RECURSO DE AMBOS AUTORES PARA MAJORAR O DANO MORAL. PEDIDO DE MAJORAÇÃO REJEITADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Decidem os Juízes que integram a Primeira Turma Recursal Temporária dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos, de acordo com o voto do Relator. Com condenação em custas processuais e honorários advocatícios em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da causa, ficando suspensa a exigibilidade em razão do deferimento da Justiça Gratuita.

Natal/RN, 8 de setembro de 2021.

Valdir Flávio Lobo Maia

3º Juiz Relator

RELATÓRIO

Sentença que se adota:

SENTENÇA

Vistos etc.

Trata-se de pleito indenizatório ajuizado em face de TELTUR VIAGENS E TURISMO LTDA - ME e GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES S.A. (RÉU), no qual a parte autora alega, em apertada síntese, que contratou um pacote de viagem com a primeira demandada, o qual não foi gozado satisfatoriamente. Quanto ao segundo demandado, alega que não foram cumpridos os horários de voo conforme contratado. Pugna pela condenação de ambos a indenizá-lo pelos danos morais suportados.

Dispensado o relatório na forma do art. 38 da Lei nº 9.099/95.

Decido.

Trata o presente feito de matéria de fato e de direito, tendo as partes se manifestado pela dispensa de produção complementar de provas. Passo ao julgamento antecipado da lide, na forma do art. 355, I, do Código de Processo Civil.

A preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pelo réu TELTUR VIAGENS E TURISMO LTDA – ME confunde-se com o mérito da demanda; razão pela qual postergo sua análise.

O ponto controvertido do presente feito cinge-se à análise quanto à existência dano moral indenizável suportado pelo autor, em decorrência de falha na prestação de serviço perpetrada por ambos os requeridos.

Em linhas gerais, a responsabilidade civil é a obrigação de reparar o dano causado a outrem na esfera patrimonial ou extrapatrimonial. Para configurar-se, há necessidade de três pressupostos: conduta (comissiva ou omissiva); resultado danoso; e o nexo de causalidade entre fato e dano.

Ante a condição de prestadoras de serviços ostentada por ambas as rés, e considerando que o voo que trata os autos limitou-se ao território nacional – o que afasta a incidência da Convenção de Varsóvia e Montreal –, as relações jurídicas estabelecidas com os autores desta demanda têm inegável natureza consumerista, nos termos do art. 17 do CDC. Dessarte, a modalidade de responsabilidade imposta às rés é objetiva, decorrendo do simples fato de produzir, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços; e a modalidade reparatória é integral.

Quanto ao primeiro requisito da responsabilidade civil, ante a modalidade objetiva, a conduta apta a ensejar o dever de indenizar deve ser revestida de ilicitude, independente de perquirição de dolo ou culpa. Considerando o alegado na exordial, no caso em tela a conduta se confundiria com duas circunstâncias: 1) o cancelamento do voo inicialmente contratado; e 2) a não realização, às expensas da agência de turismo, do passeio ao DutyFree na Argentina.

Quanto à primeira conduta, observa-se que foi configurada a ilicitude; não pelo cancelamento do trecho – tal fato tratou-se de mera reorganização do serviço efetuada pela corré –, mas pela ausência de comunicação prévia à consumidora; o que viola a legislação consumerista, mormente o princípio da boa fé e o dever de informação.

Essa primeira conduta é imputável a ambos os corréus. Quanto à companhia aérea, não há nos autos efetiva comprovação que a empresa tenha diligenciado no sentido de informar a alteração do voo – seja aos autores ou ao corréu. A imagem anexada ao corpo da peça de defesa (ID 40431129, p. 77 dos autos eletrônicos) demonstra apenas que houve comunicação à empresa de turismo quanto à alteração dos trechos do dia 16.09.2018; enquanto a conduta ora discutida refere-se ao voo do dia 13.09.2018.

Ademais, ainda que assim não o fosse, a discussão sobre a existência de comunicação entre a companhia aérea e a empresa de turismo é irrelevante para o caso ora analisado. Isso porque, em relação ao consumidor, a responsabilidade imposta a ambas as requeridas é objetiva – prescinde de elemento subjetivo. O mero fato de a informação quanto ao cancelamento do voo não ter sido disponibilizada aos consumidores é bastante para atrair a responsabilidade de ambas; de modo que a eventual análise de culpa das prestadoras de serviço apenas importaria em caso de litigância entre as empresas, em ação regressiva.

Diante disso, constata-se que houve falha na prestação do serviço; e, caso constatado a existência de dano dele decorrente, serão os réus responsáveis por indenizar o consumidor.

Dano indenizável é entendido como o prejuízo suportado pelo indivíduo, podendo refletir em seu patrimônio material ou imaterial. No que tange à segunda modalidade, a violação recai no patrimônio ideal da pessoa – a exemplo da honra, dignidade e respeitabilidade etc. Por sua própria natureza, esta espécie de dano dispensa prova cabal de sua existência, ante a impossibilidade adentrar no âmago dos indivíduos para detectá-lo; devendo ser deduzido a partir das particularidades do caso em exame.

As circunstâncias apresentadas na peça inaugural são suficientes para denotar a efetiva existência do dano moral sofrido pelo autor. Há de considerar, no caso, a falta da devida informação ao autor acerca da situação; bem como a própria circunstância em que o evento ocorreu – numa viagem de férias; na qual, inclusive, seria comemorado o aniversário do litigante. A conduta toma contornos mais gravosos ao considerar o horário do voo cancelado – o qual ocorreria por volta das 02:30 da manhã; o que compeliu os autores a dirigirem-se ao aeroporto de madrugada, por um serviço que estava cancelado há dois meses. Tal conduta claramente viola princípios básicos estabelecidos pelo direito do consumidor – em especial o da boa-fé. Pode-se presumir, por essas circunstâncias que gerou transtornos que ultrapassaram o mero aborrecimento, de modo tal que é razoável deduzir a existência de abalo moral.

Em se tratando de dano moral, inexiste padrão para a fixação do quantum da indenização; sendo dever do julgador se ater aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, levando em consideração o bem jurídico lesado e a situação concreta posta em juízo. Pela natureza consumerista do dano, há que se considerar, ainda, o viés educativo do quantum indenizatório, para evitar a continuidade dos danos perpetrados.

Por entender que o quantum atende aos princípios mencionados, e considerando que ambos os litigantes diligenciaram a fim de amenizar o dano (conforme os prints de conversa por aplicativo de mensagens, e ante o fato de que os autores foram colocados no voo às 09:00 horas) – o que minora consideravelmente a extensão dano experimentado –, fixo o valor da indenização em R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos Reais) para cada autor, a ser suportado solidariamente pelas rés.

No que tange à segunda conduta, esta de responsabilidade exclusiva de TELTUR VIAGENS E TURISMO LTDA, observa-se que há nos autos declaração informando que o serviço foi prestado no dia 14.09.2018 (ID 41189906, p. 223). Tal documento não foi impugnado pela parte autora – a qual, ressalte-se, sequer se reporta a essa falha na prestação de serviço na réplica de ID 41596038.

Mesmo ante a aplicação da norma consumerista ao caso, a mera condição de consumidor não pode ser interpretada como permissivo à presunção absoluta de veracidade dos fatos por ele alegados. Cabe ao consumidor contraditar – de forma contundente e acompanhado de elementos probatórios – os documentos trazidos pelo prestador de serviços. Em suma, a palavra do consumidor tem prevalência sobre a palavra do fornecedor; porém não sobre documentos apresentados em Juízo.

Nesse cenário, e considerando que os autores reiteradamente requereram o julgamento antecipado da lide, deve-se reputar comprovado que o serviço, no que tange aos passeios contratados, foi prestado a contento; não havendo que se falar em responsabilidade indenizatória por esta conduta.

Diante do exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na petição inicial, para condenar ambos os réus, de forma solidária, ao pagamento de R$ 1.500,00 (hum mil e quinhentos Reais) a cada um dos autores, a título de reparação pelos danos morais suportados, que deverá ser acrescido de correção monetária com base no IGPM e juros de 1% (um por cento) ao mês, ambos a partir da publicação desta sentença, considerando este o momento em que a dívida tornou-se líquida.

Ficam as partes advertidas de que, em caso de inexistir cumprimento voluntário da obrigação, eventual execução seguirá o rito previsto no art. 52 da Lei n. 9.099/95, sendo dispensada nova citação, nos termos do inciso IV do art. 52 da mesma Lei.

Transitada em julgado a sentença e persistindo o descumprimento voluntário pela parte sucumbente, incidirá multa de 10% sobre o...

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