Acórdão Nº 08001938720238205160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 24-11-2023
Data de Julgamento | 24 Novembro 2023 |
Classe processual | APELAÇÃO CÍVEL |
Número do processo | 08001938720238205160 |
Órgão | Segunda Câmara Cível |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL
Processo: | APELAÇÃO CÍVEL - 0800193-87.2023.8.20.5160 |
Polo ativo |
LUIZ PEDRO DA SILVA NETO |
Advogado(s): | FRANCISCO CANINDE JACOME DA SILVA SEGUNDO |
Polo passivo |
BANCO BRADESCO S/A |
Advogado(s): | ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0800193-87.2023.8.20.5160
APELANTE: BANCO BRADESCO S/A
ADVOGADO: ANTÔNIO DE MORAES DOURADO NETO
APELADO: LUIZ PEDRO DA SILVA NETO
ADVOGADO: FRANCISCO CANINDÉ JÁCOME DA SILVA SEGUNDO
RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA DE LOURDES AZEVÊDO
EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – CARTÃO DE CRÉDITO NÃO SOLICITADO. PRÁTICA COMERCIAL ABUSIVA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO BANCÁRIO. OBRIGAÇÃO COMPENSATÓRIA RECONHECIDA. DANO MORAL IN RE IPSA. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA, DA TRANSPARÊNCIA E DA INFORMAÇÃO. ART. 39, III, DO CDC. SÚMULA 532 DO STJ. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora, que integra o Acórdão.
RELATÓRIO
Apelação Cível interposta pelo Banco Bradesco S/A em face da sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Upanema, nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais – Cartão de Crédito não solicitado ajuizada por Luiz Pedro da Silva Neto, que julgou procedente em parte a pretensão autoral indeferindo o pedido de realização de audiência, rejeitando as preliminares de falta de interesse de agir e conexão, condenando a instituição financeira ao pagamento de danos morais no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês, ambos a incidirem a partir da sentença (Súmula 362 do STJ e RESP nº 903.258/RS – STJ) e pagamento de custas e honorários sucumbenciais no percentual de 10% sobre o valor da condenação.
O apelante alegou que o cartão enviado à residência do recorrido é de natureza mútua – Cartão de crédito e débito -, ausência de cobrança referente ao cartão, estando ele inativo; ausência de danos morais (caracterização de mero aborrecimento), ausência de prejuízo e de danos sofridos, pedindo também que, em caso de condenação à contagem dos juros referente aos danos morais não sejam aplicados o art. 398 do CC e a Súmula nº 54 do STJ, ausência de requisitos para aplicação do art. 42 do CDC e, como pedidos sucessivos, a redução do valor dos danos morais, devendo a atualização ocorrer desde à época do depósito e que os juros sejam contados à partir do trânsito em julgado da ação ou pelo menos desde a data do julgamento do recurso. Pede também que todas as publicações sejam em nome do causídico – Antônio de Moraes Dourado Neto.
Contrarrazões foram ofertadas (ID nº 21276723), pugnando pelo desprovimento da apelação, condenando o apelante no pagamento de custas e honorários advocatícios.
É o relatório.
VOTO
Preenchidos os requisitos de admissibilidade conheço do recurso.
Cinge-se a análise recursal acerca da possibilidade de mudança do decisum que julgou procedente em parte os pedidos da exordial, conforme acima exposto.
Insta consignar, de imediato, a aplicabilidade à espécie dos dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor, visto a caracterização de relação de consumo de acordo com a Súmula nº 297 do STJ e não havendo dúvida sobre o tipo de relação entre as partes, verifica-se que o Banco é o fornecedor de produto e serviço e a parte consumidora é a destinatária final.
Por conseguinte, mostra-se clara a obrigação da instituição financeira em indenizar o apelado em decorrência de sua atitude de envio de cartão de crédito não solicitado, quando ausente o pedido. O envio de cartão de crédito à residência do consumidor sem anterior pedido expresso, mesmo que bloqueado, configura prática abusiva, nos termos do art. 39, III, do CDC, in verbis:
“Art. 39. É vedado ao fornecedor de produto ou serviço, dentre outras práticas abusivas:
III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço.”
Nesse sentido, vem decidindo o STJ, ao entender que “tutelam-se os interesses dos consumidores em fase pré-contratual, evitando a ocorrência de abuso de direito na atuação dos fornecedores na relação consumerista com esse tipo de prática comercial, absolutamente contrária à boa-fé objetiva. (REsp 1261513/SP, Rel. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, julgado em 27.08.2013)”.
Vindo, a posteriori a matéria ser sumulada:
“Constitui prática convencional abusiva o envio de cartão de crédito sem prévia e expressa solicitação do consumidor, configurando-se ato ilícito indenizável e sujeito à aplicação de multa administrativa (Súmula 532 STJ).”
Em nenhuma hipótese deverá ser presumido o pedido, tendo que ser expresso, repita-se.
O STJ reconhece a possibilidade de ocorrência do dano moral à simples remessa do cartão ao consumidor, independente de eventuais consequências ou cobranças.
Nesse sentido jurisprudência do STJ abaixo transcrita, com grifos acrescidos e adaptações devidas:
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO (ART. 544 DO CPC) - AÇÃO INDENIZATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL - INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. 1. O envio de cartão de crédito sem solicitação prévia configura prática comercial abusiva, dando ensejo à responsabilização civil por dano moral. Precedentes. 2. A ausência de inscrição do nome do consumidor em cadastro de inadimplentes não afasta a responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços, porque o dano, nessa hipótese, é presumido. 3. Restabelecido o quantum indenizatório fixado na sentença, por mostrar-se adequado e conforme os parâmetros estabelecidos pelo STJ para casos semelhantes. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 22/04/2014, T4 - QUARTA TURMA).
In casu, o recorrido alega ter recebido o cartão de crédito de nº 6505.2718.1990.0105, com validade até o ano de 2026, em sua residência sem a sua solicitação e anuência, não havendo por parte do recorrente qualquer apresentação de documento comprobatório que comprove a legalidade do envio. Portanto, conclui-se que não cumpriu a instituição bancária o ônus que lhe cabia (art. 373, inciso II, do CPC) diante da ausência de pedido/contrato nos autos, repita-se, fazendo emergir clara a falta de informação ao consumidor e a falha na prestação de serviço, restando maculado o princípio mais nobre do contrato, que é a boa-fé objetiva.
Desse modo, o banco é responsável em razão do risco da operação que pratica, da qual obtém lucro significativo e, portanto, se não desenvolveu mecanismo protetivos dos termos da negociação que celebra, deve arcar com o ônus decorrente da sua omissão, vez que não cumpriu o ônus de provar o que alegou, observando-se que somente a instituição financeira poderia demonstrar fato extintivo do direito do recorrido.
A teor de jurisprudência pacificada, impõe-se o reconhecimento da obrigação compensatória. Conforme julgados abaixo transcritos, com grifos acrescidos:
EMENTA DANO MORAL. ENVIO DE CARTÃO DE CRÉDITO NÃO SOLICITADO À RESIDÊNCIA DO CONSUMIDOR. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO BANCÁRIO. OBRIGAÇÃO COMPENSATÓRIA RECONHECIDA. 1. O envio de cartão de crédito à residência do consumidor, sem prévia e expressa solicitação, ainda que bloqueado, configura prática abusiva (art. 39, III, do Código de Defesa ao Consumidor e Súmula 532 do STJ). 2. Para o reconhecimento da obrigação compensatória, basta a simples remessa do cartão, independentemente de eventuais consequências decorrentes, como a inscrição em cadastros de restrição ao crédito ou a cobrança de tarifas de manutenção. 3. Hipótese em que houve o envio de cartão de crédito cuja bandeira é diversa daquela expressamente autorizada na relação contratual firmada entre as partes, a evidenciar falha na prestação do serviço e a necessidade de reconhecimento da obrigação compensatória. 4. Na linha da atual jurisprudência deste Colegiado para as condenações envolvendo danos desta natureza, e levando-se em conta, ainda, a função punitivo-pedagógica da condenação e critérios de razoabilidade, mostra-se adequado o arbitramento de R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), valor equivalente a 5 salários mínimos na data de prolação deste acórdão. 5. Recurso da parte autora provido. (TRF-4 - RECURSO CÍVEL: 50008933920204047118 RS 5000893-39.2020.4.04.7118, Relator: GIOVANI BIGOLIN, Data de Julgamento: 31/05/2021, QUINTA TURMA RECURSAL DO RS).
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL -"AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO"- CONTRATAÇÃO IRREGULAR - DESCONTOS INDEVIDOS EM FOLHA DE PAGAMENTO - DANOS MORAIS CONFIGURADOS - ENVIO DE CARTÃO DE CRÉDITO NÃO SOLICITADO - DANO MORAIL IN RE IPSA - SÚMULA 532 DO STJ - QUANTUM INDENIZATÓRIO - RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS INDEVIDAMENTE DESCONTADAS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA. Declarada a irregularidade da contratação, faz jus o consumidor à restituição das respectivas parcelas, comprovadamente descontadas de sua folha de pagamento. Constitui prática abusiva o envio de cartão de crédito ao consumidor, sem o seu requerimento prévio, consoante enunciado da Súmula 532 do STJ, ensejando a reparação. Ao arbitrar o quantum devido a título de danos morais, deve o Julgador se atentar para o caráter dúplice da indenização (punitivo e compensatório), bem como às circunstâncias do caso concreto, sem perder de vista os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da vedação ao enriquecimento sem causa. Sendo de pouca expressividade o conteúdo econômico da condenação, os honorários advocatícios de sucumbência podem ser fixados em percentual sobre o valor da causa, nos termos do § 2º, do art. 85 do CPC. (TJMG - ...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO