Acórdão Nº 08002028220188200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 20-02-2020

Data de Julgamento20 Fevereiro 2020
Classe processualMANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
Número do processo08002028220188200000
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TRIBUNAL PLENO

Processo: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL - 0800202-82.2018.8.20.0000
Polo ativo
CORACI CARLOS FONSECA FERNANDES e outros
Advogado(s): ERNANDES DA SILVA BRAGA
Polo passivo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e outros
Advogado(s):

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. POLICIAIS MILITARES. PROCESSO SELETIVO. PREENCHIMENTO DE VAGAS PARA O QUADRO DE OFICIAIS DA ADMINISTRAÇÃO – QOA. LIMITE ETÁRIO. PREVISÃO NO EDITAL PARA IDADE MÁXIMA DE 44 ANOS AMPARADA NO INCISO III DO ART. 12 DA LEI Nº 5.142/82. EXIGÊNCIA EDITALÍCIA INAPLICÁVEL AO CASO CONCRETO POR CONTRARIAR OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 683 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DIREITO LÍQUIDO E CERTO EVIDENCIADO. JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE DE JUSTIÇA. CONHECIMENTO E CONCESSÃO DA SEGURANÇA.

ACÓRDÃO

Vistos etc.

Acordam os Desembargadores que integram o Tribunal Pleno desta Egrégia Corte de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer ministerial, em conhecer do mandamus e conceder a segurança, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Mandado de Segurança impetrado por Coraci Carlos Fonseca Fernandes e outros contra ato omissivo supostamente ilegal atribuído ao Comandante Geral da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, contando como ente público interessado o Estado do Rio Grande do Norte.

Alegaram os impetrantes que são policiais militares desde o ano de 1980, contando com cerca de 28 (vinte e oito) anos de contribuição e 25 (vinte e cinco) anos de serviço, conforme respectivos assentamentos funcionais.

Ato contínuo, aduziram que a Polícia Militar do RN divulgou processo seletivo visando o preenchimento de vagas do Quadro de Oficiais de Administração - QOA, por meio do Edital nº 001/2017.1, publicado no Boletim Geral nº 240, de 28 de dezembro de 2017.

Asseveraram que, dentre as exigências gerais para ingresso no Quadro de Oficiais da PMRN, faz-se necessário a configuração de determinados requisitos, dentre os quais “ter, no máximo, 44 (quarenta e quatro) anos de idade”.

Defenderam que preenchem parcialmente os pressupostos para inscrição, porquanto gozam de boa saúde física e mental, todavia encontra-se impedidos de prosseguir em virtude da condicionante prevista no item 2.1.4 do Edital, pois possuem 45 (quarenta e cinco) anos.

Afirmaram que, em que pese toda discricionariedade da administração pública, seus atos estão vinculados à sua legalidade, o que quer dizer que à administração cabe somente o que a lei autoriza. Neste sentido, destacaram que o predito limite etário não pode ser obstáculo à participação no certame, seja em razão da ausência de amparo legal ou da garantia constitucional de isonomia, inserta no artigo 7º, inciso XXX, da Constituição Federal.

Acentuaram que se o provimento jurisdicional não for concedido perderão uma significativa chance nas respectivas carreiras, na medida em que o último curso de Habilitação para Oficiais da PMRN foi realizado em 2006.

Informaram que o limite etário é inconstitucional e viola o princípio da razoabilidade e legalidade, citando, para tanto, a Súmula 683 do Supremo Tribunal Federal, bem como decisões anteriores desta Corte de Justiça concedendo o direito reclamado na exordial.

Sob o argumento de que é arbitrário e ilegal o ato contestado, requereram que fosse determinada, inclusive liminarmente, ao Comando Geral da PMRN, a realização de suas inscrições no Curso de Formação de Oficiais PMRN, bem como fossem mantidos e promovidos no caso de aprovação no referido certame, afastando-se as exigências ora questionadas.

O Juiz convocado em atuação, Dr. Ricardo Tinôco, indeferiu a petição inicial, com fulcro no art. 485 do CPC c/c art. 10 da Lei nº 12.016/2009, por entender inexistente a ilegalidade do expediente apontado e da inaplicabilidade do entendimento disciplinado na Súmula nº 683 do Supremo Tribunal Federal (ID 1264511).

Após interposição de agravo interno, este Relator, por meio da decisão de ID 4383391, em juízo de retratação e em atenção ao entendimento firmado por este órgão plenário, acolheu o pedido dos autores, a fim de permitir a continuidade do remédio constitucional ora analisado.

Notificada, a autoridade coatora prestou as devidas informações (ID nº 4548242).

O Estado do Rio Grande do Norte postulou por seu ingresso no feito e ratificou a manifestação da parte impetrada (ID 4575384).

A 10ª Procuradora de Justiça opinou pelo conhecimento e concessão da segurança (ID 5121146).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente writ.

Cinge-se a controvérsia processual em avaliar se há ofensa a direito líquido e certo de Policiais Militares que têm a inscrição indeferida para Processo Seletivo para o Curso de Habilitação de Oficiais – CHO/QOA, em razão de limitação etária (44 anos), conforme previsão do Edital nº 001/2017.1, publicado no Boletim Geral nº 240, consubstanciado na Lei nº 5.142/82.

De acordo com o art. 5º, inc. LXIX, da Constituição da República, o Mandado de Segurança pode ser preventivo ou repressivo e será cabível para a proteção de direito líquido e certo, não amparado por Habeas Corpus ou por Habeas Data, em sendo o responsável pelo abuso de poder ou ilegalidade autoridade pública, ou agente de pessoa jurídica, no exercício de atribuições do poder público. Do mesmo modo, é o disposto no art. 1º, da Lei 12.016/2009, que rege o instituto do Writ.

Pela leitura dos referidos artigos, infere-se que as condições necessárias e suficientes para a concessão de liminar no remédio constitucional em foco são: a) a existência de um direito líquido e certo, e b) ameaçado ou violado por um ato ilegal ou abusivo de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições públicas.

Pois bem. Conforme já relatado, trata-se de mandamus no qual os autores objetivam a concessão da segurança para que seja permitida a participação no Curso de Habilitação de Oficiais de Administração da PM/RN, afastando-se a exigência editalícia correspondente à limitação etária.

Acerca da carreira da Polícia Militar, a Constituição Federal, em seu art. 42, § 1°, vaticina que:

Art. 42. Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

§ 1º Aplicam-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, além do que vier a ser fixado em lei, as disposições do art. 14, § 8º; do art. 40, § 9º; e do art. 142, §§ 2º e 3º, cabendo a lei estadual específica dispor sobre as matérias do art. 142, § 3º, inciso X, sendo as patentes dos oficiais conferidas pelos respectivos governadores.

O art. 142, §§ 2º e 3º, inciso X, da Constituição Federal, por sua vez, estabelece:

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

(...)

§ 2º Não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares.

§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:

(...)

X - a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra. (grifos acrescidos).

Na seara estadual, a Lei nº 5.142/82, que dispôs sobre o Quadro de Oficiais de Administração (QOA) e de Oficiais Especialistas (QOE) da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, preconiza, em seu artigo 12, inciso III e IV, que o candidato dever ter, no máximo, 44 (quarenta e quatro) anos de idade para ingressar no Curso de Habilitação de Oficiais. A corroborar:

Art. 12 – O ingresso no Curso de Habilitação far-se-á mediante concurso de admissão, atendidos os seguintes requisitos:

I – possuir o Curso de Aperfeiçoamento de Sargento (CAS);

II – possuir escolaridade, no mínimo correspondente ao Curso de Segundo Grau Completo;

III – ter no máximo, quarenta e quatro (44) anos de idade;

IV – ter, no mínimo, 16 (dezesseis) anos de efetivo serviço como Praça, sendo 2 (dois) anos na graduação, quando se tratar de 1º Sargento PM.

Sobre o assunto em vergasta, é cediço que esta Corte tem entendido que a restrição impugnada se revela exacerbada, uma vez que o permissivo constitucional (no sentido da liberdade de regulamentação por parte do Estado) não tutela a criação de exigências desacompanhadas da respectiva e necessária justificativa, sob pena de tornar-se distante da razoabilidade que deve nortear os atos administrativos.

Com efeito, a razoabilidade é instrumento a ser adotado para interpretação das normas constitucionais e corolário do princípio do devido processo legal, prestando-se ao controle de legalidade/compatibilidade dos atos administrativos, inclusive pautados em lei, quando se revelarem desproporcionais.

Nessa intelecção é que o Supremo Tribunal Federal editou o enunciado sumular nº 683, dispondo que: "O limite de idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face do art. 7º, XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela natureza das atribuições do cargo a ser preenchido".

In casu, a restrição etária em 44 (quarenta e quatro) anos não se revela justificada em razão das atribuições do cargo, sobretudo quando os impetrantes almejam tão somente a ascensão na...

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