Acórdão Nº 08002578220208205102 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 2ª Turma Recursal Temporária, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08002578220208205102
Órgão2ª Turma Recursal Temporária
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0800257-82.2020.8.20.5102
Polo ativo
BANCO BRADESCO S/A
Advogado(s): LUIZ GUSTAVO FERNANDES DA COSTA, CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS
Polo passivo
GEOVANE DE SOUZA TOMAZ
Advogado(s): HALISON RODRIGUES DE BRITO registrado(a) civilmente como HALISON RODRIGUES DE BRITO, PAULO GUSTAVO FERNANDES MELO


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA – 2º GABINETE

RECURSO CÍVEL INOMINADO Nº 0800257-82.2020.8.20.5102

JUIZADO ESPECIAL CÍVEL E CRIMINAL DA COMARCA DE CEARÁ-MIRIM

RECORRENTE: BANCO BRADESCO S/A

ADVOGADO: LUIZ GUSTAVO FERNANDES DA COSTA E CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS

RECORRIDO: GEOVANE DE SOUZA TOMAZ

ADVOGADO: HALISON RODRIGUES DE BRITO

JUiz RELATOR: GUILHERME MELO CORTEZ

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSCRIÇÃO NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. DÉBITO INEXISTENTE. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS NA ESPÉCIE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes que integram a Turma Recursal Provisória dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos. Condenada a recorrente em custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Natal/RN, data da assinatura eletrônica.

GUILHERME MELO CORTEZ

Juiz Relator


RELATÓRIO

Trata-se de Recurso Inominado interposto por BANCO BRADESCO S/A contra sentença que julgou procedente o pedido inicial para “condenar o Requerido a desconstituir em definitivo o débito impugnado nestes autos, bem como, a proceder com a baixa definitiva da negativação em nome do Autor, referente ao contrato nº FI05535952451, no valor de R$ 110,00 (cento e dez reais), além de pagar ao Promovente, a título de danos morais, a importância de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), atualizada monetariamente, com incidência de juros de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação e correção monetária pelo IPCA-E, a contar da prolação desta sentença, pela exegese da Súmula 362 do STJ.

Consignou a magistrada em sentença que o banco réu não se desincumbiu do seu ônus probatório (art. 373, II, CPC), uma vez que não trouxe nenhuma demonstração de que o suposto empréstimo foi, de fato, realizado pela autora, o que poderia ter sido feito com a exibição das filmagens do caixa eletrônico do dia e do horário em que ocorreram as transações, bem como não fez prova do inadimplemento que teria dado causa a negativação. Sendo assim, à vista desse contexto fático-probatório, a parte ré não logrou êxito em comprovar que agiu no exercício regular do direito ao negativar o nome da parte autora. Portanto, não havendo prova da regularidade do débito levado a registro negativo, a declaração de inexistência da dívida é medida que se impõe.

Irresignada com a sentença, a ré BANCO BRADESCO S/A requer a reforma da r. decisão supra, sustentando que agiu no exercício regular do direito, posto alegar existência de contratação. Por fim, requereu a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos autorais ou para minorar o valor fixado a título de danos morais.

Não foram apresentadas contrarrazões.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, necessário o conhecimento do recurso inominado.

Compulsando os autos, verifico que as razões recursais não merecem acolhimento pela argumentação que se segue.

Afirma que a parte autora antes de ajuizar a presente demanda não tentou solucionar o litígio de forma extrajudicial, motivo este que ensejaria, em tese, a falta de interesse de agir pela parte autora. Todavia, tal preliminar não merece ser acolhida, visto que a ausência para a solução na via administrativa não obsta à apreciação jurisdicional, tendo em vista o princípio da universalidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF).

No caso vertente, a natureza jurídica do vínculo entre as partes configura uma clara relação de consumo, sendo indispensável uma análise do feito à luz da Lei 8.078/90.

Pois bem. Tratando o caso de relação de consumo, e, tendo em vista a hipossuficiência da consumidora à luz da teoria finalista mitigada, entendo que deve ser invertido o ônus da prova, modalidade de facilitação da defesa dos direitos do consumidor prevista no artigo 6º, inciso VIII, da Lei n. 8.078/90 (CDC), senão vejamos:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

(...)

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

Por sua vez, o Código de Processo Civil, em seu artigo 373, estabeleceu que incumbe ao autor provar o fato constitutivo de seu direito, cabendo ao réu a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autoral. No entanto, faz-se mister ressalvar que tal disciplinamento só deve ser aplicável quando se estiver diante de uma relação jurídica em que ambas as partes estejam em condições de igualdade; caso contrário, atribui-se o ônus da prova aquele que melhor puder suportá-lo, atendendo justamente ao princípio da igualdade material (“teoria da distribuição dinâmica das provas”).

Ademais, em se tratando de fato negativo – ausência de relação jurídica/débito – prova impossível de ser produzida pela parte que a alega, torna-se diabólica, ou seja, não se pode imputar a obrigação de produzi-la ao autor, senão vejamos:

APELAÇÃO - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - INSCRIÇÃO INDEVIDA NOS CADASTROS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO - FALSÁRIOS - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - PROVA DIABÓLICA - DANOS MORAIS EXISTENTES. - Na inscrição indevida em cadastros de restrição ao crédito, o dano moral se configura in re ipsa, ou seja, prescinde de prova. - "Para efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil, as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno" (STJ, REsp 1197929, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 12/09/2011). - Prova diabólica é aquela que é impossível, senão muito difícil, de ser produzida. A jurisprudência usa a expressão prova malévola, outrossim, para designar prova de algo que não ocorreu, ou seja, a prova de fato negativo. - Recurso não provido. (TJ-MG - AC: 10439120096185001 MG, Relator: Veiga de Oliveira, Data de Julgamento: 27/08/2013, Câmaras Cíveis / 10ª CÂMARA CÍVEL).

Para contexto dos autos, é incontroversa a inscrição do nome da parte recorrida no ID 9628109.

Para contraditar as circunstâncias enunciadas acima, a instituição ré não fez constar dos autos qualquer prova idônea capaz de infirmar as alegações da postulante, como contrato, gravação, ou outro documento que ateste a legitimidade da cobrança.

Logo, cabia ao réu se desincumbir quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora, na esteira do inciso II, do art. 373, do CPC. Ausente, portanto, qualquer elemento de prova tendente a subsidiar a conduta da fornecedora, ou afastar a legitimidade das provas carreadas aos autos, tem-se por configurada a falha na prestação do serviço.

In casu, restou configurado o ato ilícito do demandado ao efetuar a cobrança indevida em face do demandante. Isto porque não comprovou o requerido a existência de qualquer liame obrigacional que justificasse a negativação questionada, limitando-se a argumentar o exercício regular da cobrança, sem, contudo, carrear aos autos elemento probatório que demonstrasse a existência de relação jurídica com o Autor, ao passo que a negativação se refere ao contrato nº FI05535952451, enquanto que o réu juntou o contrato nº 263663223, que não se coaduna com a anotação questionada, sendo correto, portanto, o pedido de declaração de inexistência do débito.

Nesse prisma, prevalece a hipótese da responsabilidade civil da empresa, porquanto, em se tratando de relação de consumo, a responsabilização da fornecedora independe da comprovação de culpa, sendo de rigor as disposições disciplinadas no art. 14 do CDC.

Acerca do dano moral na relação de consumo, sua justificação decorre do sofrimento, da dor, do constrangimento, da angústia experimentada pelo consumidor, por bens e serviços defeituosos ou inadequadamente fornecidos (CAHALY, Yussef Said, Dano Moral, 2ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998 p. 520).

Como é sabido, atribui-se um duplo caráter à compensação financeira por danos morais: (i) caráter punitivo, assumindo a natureza de pena privada, impondo ao ofensor uma sanção para não ficar impune o ato ilícito e para desestimulá-lo à prática de novas agressões; (ii) caráter compensatório, que visa atenuar as consequências advindas da ofensa, conferindo uma compensação ou satisfação ao lesado pela agressão sofrida: dor, vexame, humilhação, aflição, angústia e desequilíbrio ao bem estar do ofendido.

Como asseverou o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino do STJ, em voto proferido no REsp 1.152.541-RS, julgado em 13/09/2011, as principais circunstâncias a serem consideradas como elementos objetivos e subjetivos de concreção do valor do dano moral são as seguintes: a) a gravidade do fato em si e suas consequências para a vítima...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT