Acórdão Nº 08002723120208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 29-01-2021

Data de Julgamento29 Janeiro 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08002723120208200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0800272-31.2020.8.20.0000
Polo ativo
SUL AMERICA COMPANHIA DE SEGURO SAUDE
Advogado(s): ANTONIO EDUARDO GONCALVES DE RUEDA
Polo passivo
MARIA CARDOZO DE FIGUEIREDO LOCATTO
Advogado(s): PAULO FLAMINIO MELO DE FIGUEIREDO LOCATTO, RAINA COSTA DE FIGUEIREDO

Agravo de Instrumento com Suspensividade nº: 0800272-31.2020.8.20.0000

Agravante: Sul América Companhia de Seguro Saúde.

Advogado: Antônio Eduardo Gonçalves de Rueda (OAB/PE 16983)

Agravada: Maria Cardozo de Figueiredo Locatto

Advogado: Paulo Flamínio Melo de Figueiredo Locatto (OAB/RN 9437)

Relatora: Desembargadora Judite Nunes

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DECISÃO QUE DEFERIU O PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA HÉRNIA DE DISCO. ROL DA ANS. PACIENTE QUE PLEITEIA O TRATAMENTO NOS MOLDES PRESCRITOS. EVIDENCIADA ABUSIVIDADE DA RECUSA. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À MEDIDA DE URGÊNCIA REQUERIDA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. MANUTENÇÃO DA DECISÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade de votos, em conhecer do agravo de instrumento, para, no mérito, julgá-lo desprovido, mantendo inalterada a decisão vergastada, nos termos do voto da relatora, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto pela Sul América Companhia de Seguro Saúde em face de decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Infância e Juventude da Comarca de Natal (em Plantão) que nos autos da Ação Ordinária de nº 0801024-45.2019.8.20.5300 deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, determinando à Sul América Companhia de Seguro Saúde, que viabilize, imediatamente, a internação hospitalar da parte autora e o tratamento cirúrgico da hérnia discal lombar + descompressão medular/cauda equina + tratamento cirúrgico do canal vertebral estreito indicado pelo médico. Intimem-se a SUL AMÉRICA COMPANHIA DE SEGURO SAÚDE, para cumprimento imediato desta decisão, sob pena de responsabilidade pela omissão, inclusive com multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pelo não cumprimento desta ordem, a ser revertida à requerente.”

A agravante sustenta, em resumo, que a cirurgia solicitada não se encontra na cobertura contratual e legal para liberação do tratamento.

Diz que no Rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde, acrescentando que a Lei nº 9656/1998, conhecida como “lei dos planos de saúde”, não consta as cirurgias de tratamento do canal vertebral estreito, tratamento de hérnia, descompressão medular e discografia intra-operatória, como é o caso dos autos.

Em seguida, alega que terá um prejuízo grave e de difícil reparação e até mesmo irreversível, uma vez que terá que custear internamento que não possui cobertura, sendo inquestionável a sua inviabilidade.

Requer, assim, a atribuição do efeito suspensivo e, no mérito, o provimento do agravo de instrumento.

O efeito suspensivo foi indeferido.

Agravo interno foi conhecido e desprovido.

A parte agravada não apresentou contrarrazões.

O Ministério Público, através da 8ª Procuradoria de Justiça, opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do agravo de instrumento.

Do exame do que consta dos autos, infere-se que a agravada se encontra internada no Hospital São Lucas e, conforme relatório médico (ID 5056885), com necessidade de procedimento cirúrgico de hérnia de disco na região lombar para descompressão medular de urgência, tendo sido negada a realização pelo plano de saúde recorrente, razão pela qual ajuizou a ação de origem.

Foi proferida decisão em plantão judicial deferindo o pleito de tutela antecipada, determinando que o plano de saúde demandado providenciasse o custeio do procedimento e o material que foram indicados por médico, insurgindo-se o plano de saúde ao fundamento de que o procedimento não consta no Rol da Agência Nacional de Saúde e nem no contrato celebrado entre as partes.

Com efeito, o fato de não constar na referida relação da ANS não significa que a sua prestação não possa ser exigida pelo segurado, uma vez que, tratando-se de rol exemplificativo, configura conduta abusiva do plano de saúde a negativa de cobertura de procedimento médico devidamente indicado por profissional habilitado, cuja doença correspondente esteja prevista no contrato de plano de saúde.

Outrossim, é pacífico o entendimento de que a alegada limitação do rol de tratamentos não pode ser utilizada como fundamento para se negar a realização de exame e tratamentos, eis que tal lista diz respeito apenas a uma parcela mínima de procedimentos que os planos de saúde devem cobrir.

Além disso, como é comum acontecer em contratos dessa natureza, a agravada, ao contratar a empresa de plano de saúde, revestindo-se de boa-fé, provavelmente acreditava que o tratamento solicitado estaria acobertado no instrumento contratual, uma vez que não há expressa exclusão de sua cobertura, não sendo razoável, portanto, sua negativa.

Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO MÉDICO. DOENÇA PREVISTA NO CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE. PROCEDIMENTO NÃO PREVISTO NO ROL DA ANS. ROL EXEMPLIFICATIVO. COBERTURA MÍNIMA. INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. SÚMULA N. 83 DO STJ. DANO MORAL. NÃO IMPUGNAÇÃO DE FUNDAMENTO SUFICIENTE POR SI SÓ PARA A MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. SÚMULA N. 283 DO STF. QUANTUM INDENIZATÓRIO. SÚMULA N. 182/STJ. 1. Não é cabível a negativa de tratamento indicado pelo profissional de saúde como necessário à saúde e à cura de doença efetivamente coberta pelo contrato de plano de saúde. 2. O fato de eventual tratamento médico não constar do rol de procedimentos da ANS não significa, per se, que a sua prestação não possa ser exigida pelo segurado, pois, tratando-se de rol exemplificativo, a negativa de cobertura do procedimento médico cuja doença é prevista no contrato firmado implicaria a adoção de interpretação menos favorável ao consumidor. 3. É inviável agravo regimental que deixa de impugnar fundamento da decisão recorrida por si só suficiente para mantê-la. Incidência da Súmula n. 283 do STF. 4. "É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada". (Súmula n. 182 do STJ). 5. Agravo regimental parcialmente conhecido e desprovido. (AgRg no AREsp 708.082/DF, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 26/02/2016).

Nesse mesmo sentido vem decidindo esta Egrégia Corte, a exemplo dos seguintes casos: Agravo de Instrumento n° 2017.002065-7, Relator: Desembargador Cornélio Alves (1ª Câmara Cível), julgado em 22/05/2017; Agravo de Instrumento n° 2016.010563-9, Relator: Desembargador João Rebouças (3ª Câmara Cível), julgado em 14/03/2017; e Agravo de Instrumento com Suspensividade n° 2016.014654-9, Relator: Des. Ibanez Monteiro (2ª Câmara Cível), julgado em 16/12/2016.

Ademais, consoante entendimento pacífico de nossos Tribunais, "somente ao médico que acompanha o caso é dado estabelecer qual o tratamento adequado para alcançar a cura ou amenizar os efeitos da enfermidade que acometeu o paciente; a seguradora não está habilitada, tampouco autorizada a limitar as alternativas possíveis para o restabelecimento da saúde do segurado, sob pena de colocar em risco a vida do consumidor" (Resp n. 1053810/SP, Terceira Turma, Rela. Mina. Nancy Andrighi, j. Em 17.12.2009). Em outras palavras, o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de tratamento indicado para a cura.

Em casos semelhantes, assim decidiu esta Corte de Justiça:

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. AUTORIZAÇÃO DA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA. NEGATIVA DE CUSTEIO DO DISPOSITIVO PROTÉTICO "VIKING". HÉRNIA DISCAL. ALEGAÇÃO DE NÃO CONFIABILIDADE NO MÉTODO DE TRATAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO AO TRATAMENTO INDICADO PELO MÉDICO DO PACIENTE. PRESCRIÇÃO MÉDICA. OBRIGATORIEDADE DE DISPONIBILIZAR TODOS OS MEIOS QUE IMPLIQUEM NO ÊXITO DO TRATAMENTO. DEVER DE CUSTEAR O PROCEDIMENTO E PRÓTESE. DANO MORAL CONFIGURADO. PRESENÇA DO LIAME DE CAUSALIDADE. DEVER DE INDENIZAR QUE SE IMPÕE. FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO EM OBERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES.

- O plano de saúde não pode estabelecer que tipo de tratamento deve ser adotado para a cura de respectiva doença. (TJRN – Apelação Cível nº2018.001365-5, Órgão Julgador: 3ª Câmara Cível, Relator: Juiz Eduardo Pinheiro (convocado), Julgamento: 12/02/2019).

EMENTA: CIVIL. PROCESSO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. PLANO DE SAÚDE. USUÁRIA PORTADORA DE CARDIOPATIA GRAVE, COM ESTENOSE VALVAR. RECUSA DA AGRAVANTE EM FORNECER O TRATAMENTO PRESCRITO PELO MÉDICO ASSISTENTE. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO SOLICITADO NO ROL DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE - ANS, BEM COMO INEXISTÊNCIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL QUE AMPARE O PEDIDO. ROL MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO. APLICAÇÃO DO CDC AOS CONTRATOS REALIZADOS JUNTO AS OPERADORAS DE PLANO DE SAÚDE. SÚMULA 469 DO STJ. INSTRUMENTO QUE DEVE SER INTERPRETADO DE FORMA FAVORÁVEL AO CONSUMIDOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 47 DO CDC. IMPOSSIBILIDADE DE CLÁUSULA QUE RESTRINJA A TENTATIVA DE RECUPERAÇÃO DO USUÁRIO. PROVA DA NECESSIDADE DO MÉTODO TERAPÊUTICO. RISCO DE DANO A SAÚDE DO PACIENTE. DIREITO À VIDA. PRECEDENTE DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJRN – Agravo de Instrumento nº 2017.012241-8, Órgão Julgador: 1ª Câmara Cível, Relator: Des. Cláudio Santos, Julgamento: 31/37/2018).

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