Acórdão Nº 08003674620198205125 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 13-08-2020

Data de Julgamento13 Agosto 2020
Tipo de documentoAcórdão
Número do processo08003674620198205125
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800367-46.2019.8.20.5125
Polo ativo
SABEMI SEGURADORA SA e outros
Advogado(s): JULIANO MARTINS MANSUR, WILSON SALES BELCHIOR
Polo passivo
PAULO CARDOSO JALES
Advogado(s): JORGE RICARD JALES GOMES, FELIX GOMES NETO, JANETE TEIXEIRA JALES, ANA ELIZA JALES GOMES

EMENTA: CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA de REPETIÇÃO do INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. CONTRATO DE SEGURO NÃO AUTORIZADO PELO CONSUMIDOR. COBRANÇA INDEVIDA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DOS DESCONTOS FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA. LESÃO CONFIGURADA. DESCONSTITUIÇÃO DA DÍVIDA. DANO MORAL IN RE IPSA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. INCIDÊNCIA DO VERBETE 479 DA SÚMULA DO STJ. DEVER DE INDENIZAR QUE SE CONFIRMA. INDENIZAÇÃO SUFICIENTE À REPARAÇÃO DO DANO. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE OBSERVADOS. SENTENÇA MANTIDA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO CÍVEL. PRECEDENTES DO STJ E DO TJRN.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Banco Bradesco S/A em face da sentença proferida pela Vara Única da Comarca de Patu nos autos da "Ação Declaratória de Repetição do Indébito C/C Indenização por Danos Morais e Pedido de Tutela Provisória de Urgência”, registrada sob o n.º 0800367-46.2019.8.20.5125, movida por Paulo Cardoso Jales, que julgou procedente o pedido contido na exordial, nos seguintes termos (ID 6742442):

"ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTES os pedidos contidos na petição inicial, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, para: a) confirmar a tutela de urgência concedida na decisão de Id. 42004277; b)declarar a inexistência da dívida discutida no presente processo; c) condenar a promovida SABEMI SEGURADORAS/Aao pagamento em dobro do valor efetivamente descontado nos proventos da autora, a título de danos materiais, com a incidência de correção monetária (pelo INPC), desde o evento danoso (data do respectivo desconto – Súmula 43 do STJ), e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês incidentes desde o evento danoso (desde o primeiro desconto indevido– Súmula 54 do STJ), a serem devidamente apurados em liquidação de sentença; d) condenar, solidariamente, os promovidos BANCO BRADESCO S/A e SABEMI SEGURADORAS/A ao pagamento da quantia de R$ 6.000,00 (seis mil reais) a título de danos morais, com a incidência de correção monetária (pelo INPC), desde a publicação da sentença (Súmula 362 do STJ), e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, incidentes desde o evento danoso (desde o primeiro desconto indevido– Súmula 54 do STJ). e) condenar os promovidosao pagamento das despesas processuais (art. 84 do CPC) e dos honorários advocatícios, estes que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (nos termos do parágrafo segundo do art. 85 do CPC). (...)” (Sentença proferida em 19 de março de 2020).

Em suas razões (ID 6742445), aduziu a instituição financeira Apelante, preliminarmente, sustenta que o banco funcionou apenas como um meio de pagamento do seguro questionado no autos, assim somente a Seguradora Sabemi deve ser responsabilizada por eventuais danos causados à parte autora, requerendo assim que seja reconhecida a ilegitimidade passiva da apelante; No mérito, em síntese, aduz que: a) não há o que se falar em responsabilização do Banco Bradesco S/A diante da sua ilegitimidade; b) no presente caso inexiste dever de indenizar por danos morais; c) ausência de nexo de causalidade entre o dano e o ato praticado pelo apelante; d) caso seja reconhecida a existência de danos morais, o quantum indenizatório não deve ser fixado em um valor exorbitante, sob pena de contribuir para o enriquecimento ilícito e sem causa, devendo observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Ao final, requereu o conhecimento e provimento do apelo para reformar a sentença e, por conseguinte, julgar improcedentes os pedidos contidos na exordial.

Contrarrazões apresentadas (ID 6742449), ocasião em que se insurge contra os argumentos recursais, pugnando pela manutenção do decisum de primeiro grau.

Ausentes as hipóteses do art. 178 do CPC a ensejar a intervenção do Ministério Público.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço da presente apelação.

O cerne da questão cinge-se acerca dos descontos referentes a um seguro e a ocorrência de dano moral advindo das reduções efetuadas pela instituição bancária apelante no benefício previdenciário da parte autora.

PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA

Constato que o apelante tem legitimidade para figurar no polo passivo da relação processual, pois, ainda que seja um cumpridor dos contratos de prestação de serviço, com a previsão de cobrança de débito automático, deve responder perante o seu cliente, no caso de realização de débitos indevidos, não havendo como afastar do polo passivo da demanda, de maneira que deve ser mantida a sua legitimidade, conforme consignado na sentença.


MÉRITO

Restaram incontroversos nos autos os descontos efetivados na conta-corrente do autor. Ademais, inexistem nos autos documentos que comprovem a expressa anuência dos descontos por meio de pagamentos mensais, nem mesmo a apólice do seguro foi juntada, motivo pelo qual reputam-se indevidos os descontos verificados, referentes a seguro que jamais contraiu. Isso porque é dever do fornecedor zelar pela segurança das contratações, devendo se certificar da veracidade das informações e documentos a ele apresentados, de modo a não prejudicar os consumidores, como ocorreu no caso analisado nestes autos.

Nesse sentido, não merece prosperar o inconformismo do recorrente uma vez que conforme fundamentos constantes da sentença recorrida há veracidade as alegações autorais são suficientes ao deferimento do pleito de inversão ônus da prova, bem assim há elementos probatórios hábeis a ensejar o acolhimento da pretensão autoral.

Vale ressaltar, ainda, que a responsabilidade da demandada é objetiva (art. 14, caput, do CDC), de modo que somente poderia ser afastada quando não ausentes o dano e o nexo causal. Todavia, no caso em epígrafe, o nexo de causalidade é evidente, visto que, em razão da conduta do demandado, a parte autora passou a ter descontos nos seus vencimentos em razão de seguros que nega ter contratado.

Por conseguinte, é de convir que não se pode exigir de quem aponta inexistência de relação jurídica comprovar negativamente esse fato, pois o ônus incumbe à parte que sustenta a existência da dívida decorrente da contratação, no caso a parte demandada que assim não procedeu.

Desse modo, a parte promovida não observou o estabelecido no 333, inciso II, do Código de Processo Civil, quanto à necessidade de demonstração de fato desconstitutivo do direito do autor, restando assim acolher a pretensão autoral.

Considerando a ilegitimidade dos descontos já destacada em linhas anteriores, registro a necessidade de manutenção da sentença quando reconheceu a obrigação do banco recorrente em promover a devolução em dobro sob os valores indevidamente descontados na conta-corrente do apelado, pois aplicável ao caso a regra estabelecida no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.

Esta Corte já se pronunciou em outras oportunidades, segundo o precedente que segue transcrito:

"CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIO DE COBRANÇA INDEVIDA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO AO QUAL FOI INSERIDO O VALOR DO SEGURO. INSURGÊNCIA. ALEGAÇÃO DE EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO. REJEIÇÃO. PRÁTICA VIOLADORA DOS PRINCÍPIOS DA INFORMAÇÃO E BOA FÉ PREVISTA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. VENDA CASADA CONFIGURA. PRETENSÃO DE REFORMA QUANTO A REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. COMPROVAÇÃO DO FATO LESIVO, DOS DANOS SOFRIDOS, DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE AMBOS E DA MÁ-FÉ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO DEVIDA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO."

(TJ-RN - AC: 20170074344 RN, Relator: Des. Dilermando Mota., Data de Julgamento: 28/02/2019, 1ª Câmara Cível) (Grifos acrescidos)

"EMENTA: CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. APELAÇÃO CÍVEL DA PARTE RÉ. CONCESSÃO DE FINANCIAMENTO PARA A DEMANDANTE. VENDA CASADA DE OUROCAP. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DA CONSUMIDORA ACERCA DA AQUISIÇÃO DE TÍTULO DE CAPTALIZAÇÃO. BOA-FÉ DA AUTORA VIOLADA. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA O MERO DISSABOR. DEVER DE INDENIZAR. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DA PARTE AUTORA. PEDIDO DE MAJORAÇÃO DO VALOR A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. PRECEDENTES. (TJRN, AC 2017.018848-5, 3ª Câmara Cível, Relator Des. JOÃO REBOUÇAS, DJe 19.04.2018). (Grifos acrescidos)

"EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. DESCONTO INDEVIDO EM CONTA BANCÁRIA EM VIRTUDE DE NEGÓCIO JURÍDICO EFETIVADO SEM SOLICITAÇÃO OU ANUÊNCIA DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE DO BANCO. INTELIGÊNCIA DO ART. 14 DO CDC. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM COMPENSATÓRIO FIXADO EM OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO." (TJRN, AC 2015.020935-0, 3ª Câmara Cível, Relator Des. AMÍLCAR MAIA, DJe 11.08.2016). (Grifos acrescidos)


Assim, a cobrança operou-se de forma ilegítima, uma vez que o autor/apelado foi cobrado pelo apelante por valores referentes a serviços pelos quais não tinha ciência.

Dessa forma, resta patente a conduta ilícita desenvolvida pelo apelante, sendo medida que se impõe o...

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