Acórdão Nº 08003741420238209000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal, 07-12-2023

Data de Julgamento07 Dezembro 2023
Classe processualMANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
Número do processo08003741420238209000
Órgão1ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL

Processo: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL - 0800374-14.2023.8.20.9000
Polo ativo
CLAUDIA DE AZEVEDO MIRANDA MENDONCA
Advogado(s): CLAUDIA DE AZEVEDO MIRANDA MENDONCA
Polo passivo
JUIZ DE DIREITO DO 13 JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL
Advogado(s):

PODER JUDICIÁRIO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

1ª TURMA RECURSAL

MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL N.º 0800374-14.2023.8.20.9000

IMPETRANTE: CLÁUDIA DE AZEVEDO MIRANDA MENDONÇA (EM CAUSA PRÓPRIA)

IMPETRADO: JOSÉ MARIA NASCIMENTO (JUIZ DE DIREITO TITULAR DO 13º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL/RN)

RELATOR: JUIZ RICARDO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL IMPETRADO CONTRA DECISÃO QUE REDUZIU, DE OFÍCIO, O PERCENTUAL FIXADO A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS, POR ENTENDER O JUIZ DA ORIGEM ABUSIVA A CLÁUSULA “QUOTA LITIS” FIRMADA ENTRE AS PARTES. REDUÇÃO DE 50% (CINQUENTA POR CENTO) PARA 30% (TRINTA POR CENTO) DO VALOR DO PROVEITO OBTIDO COM O PROCESSO. CLÁUSULA QUE RESPEITA O LIMITE ESTABELECIDO NO ARTIGO 22, “CAPUT” E § 4º, DA LEI N.º 8.906/1964, E NO ARTIGO 38, “CAPUT”, DO CÓDIGO DE ÉTICA E DISCIPLINA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. A ADVOGADA IMPETRANTE NÃO RECEBERÁ PROVEITO ECONÔMICO SUPERIOR AO RECEBIDO PELO SEU CLIENTE. REVISÃO DE OFÍCIO QUE OFENDE O PRINCÍPIO DA AUTONOMIA DA VONTADE. CONCESSÃO DA SEGURANÇA NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

ACÓRDÃO

ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conceder a segurança postulada, nos termos do voto do Relator.

Sem condenação em custas processuais e em honorários advocatícios.

Participaram do julgamento, além do Relator, a juíza Sandra Simões de Souza Dantas Elali e o juiz Madson Ottoni de Almeida Rodrigues.

Natal/RN, data do sistema.

RICARDO PROCÓPIO BANDEIRA DE MELO

Juiz Relator

I – RELATÓRIO

1. Mandado de Segurança impetrado por CLÁUDIA DE AZEVEDO MIRANDA MENDONÇA contra decisão alegadamente ilegal proferida pelo Juiz de Direito Titular do 13º Juizado Especial Cível da Comarca de Natal/RN, que, no Processo n.º 0826237-68.2019.8.20.5004, indeferiu o pedido de liberação dos honorários advocatícios contratuais no percentual de 50% (cinquenta por cento), fixando-os em 30% (trinta por cento) do crédito a ser recebido pelo seu cliente.

2. A impetrante narrou que patrocinou ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos morais (Processo n.º 0826237-68.2019.8.20.5004), em favor de MATEUS HENRIQUE BARBOSA DE CARVALHO BORGES, seu cliente.

3. Disse que a sentença de parcial procedência da pretensão autoral transitou em julgado e, tendo em vista que o réu cumpriu a obrigação de pagar determinada, requereu a retenção de valores a título de honorários advocatícios contratuais. Acostou, para tanto, o instrumento particular firmado com o mandante, o qual previa o pagamento de honorários percentuais de 50% (cinquenta por cento) do proveito por ele obtido.

4. Narrou que a autoridade impetrada declarou, de ofício, a abusividade da cláusula e indeferiu parcialmente o pedido, autorizando a expedição de alvará no valor de 30% (trinta por cento) do crédito do exequente.

5. Alegou que a cláusula “quota litis” foi estipulada em decorrência da hipossuficiência financeira do assistido, que não pôde sequer arcar com as custas processuais, tendo o escritório suportado os ônus da demanda até o seu trânsito em julgado. Argumentou que o artigo 22, § 4º, da Lei n.º 8.906/1994 (Estatuto da OAB) condiciona o direito à percepção dos honorários convencionados apenas à juntada do contrato de honorários.

6. Afirmou que, entre o causídico e o seu cliente, incide o princípio da autonomia da vontade, não podendo o julgador, em juízo de discricionariedade, revisar o valor dos honorários contratuais fixados livremente entre as partes, competindo aos Conselhos Éticos e Disciplinares da OAB eventual apuração e punição de qualquer abuso por parte do profissional advogado.

7. Pediu, ao fim, a concessão de liminar para que a decisão atacada seja suspensa até o julgamento definitivo do presente “writ”, permitindo-se a expedição de alvarás judiciais relativos apenas aos valores incontroversos, quais sejam, 30% (trinta por cento) para a advogada e 50% (cinquenta por cento) para o seu cliente.

8. Liminar concedida em Decisão de Id. N.º 19427151.

9. A autoridade impetrada prestou as informações que entendeu necessárias (Id. N.º 19776416 – Págs. 12/14) e o Ministério Público, regularmente intimado, declinou da intervenção no presente feito (Id. N.º 20106874).

10. É o relatório.

II – VOTO

12. A impetrante tem razão.

13. Primeiro, é direito do advogado receber a contraprestação devida pelo seu trabalho. Para tanto, o artigo 22, “caput”, do Estatuto da OAB (Lei n.º 8.906/1994) prevê o direito aos honorários convencionados, aos de sucumbência e aos arbitrados judicialmente.

14. Tratando apenas dos honorários contratuais, o parágrafo quarto do artigo acima referido condiciona a expedição do mandado de levantamento apenas à juntada do contrato de prestação de serviços advocatícios firmado entre as partes, “in verbis”:

Art. 22. (…)

§ 4º Se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam pagos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou”.

15. Quando se trata, mais especificamente, de honorários contratuais previstos em cláusula “quota litis”, ou seja, que dependem da resolução favorável da causa, possui relevo a previsão do artigo 38, “caput”, do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil, que assim prevê:

Art. 38. Na hipótese da adoção de cláusula quota litis, os honorários devem ser necessariamente representados por pecúnia e, quando acrescidos dos honorários da sucumbência, não podem ser superiores às vantagens advindas a favor do constituinte ou cliente.

16. A partir desse parâmetro, pode-se considerar antiética e abusiva a inclusão, no contrato de honorários advocatícios, de cláusula “quota litis” que preveja que o percentual a título de honorários seja superior às vantagens auferidas pelo constituinte ou cliente, dando causa ao enriquecimento ilícito do causídico.

17. No caso, o Contrato de Prestação de Serviços Advocatícios firmado entre as partes (Id. N.º 98223970 do processo originário) estabelece, em sua Cláusula Terceira, o seguinte:

Em remuneração pelos serviços profissionais ora contratados serão devidos honorários advocatícios no importe 50% (cinquenta por cento) do valor do proveito que for obtido pelo contratante, quer em acordo extrajudicial, quer em sentença, ou em qualquer fase do processo mediante acordo, a serem pagos quando do efetivo recebimento por este último, conforme disciplina a modalidade COTA LITIS, conforme art. 22 e 50 da Lei 8.906/94.

18. A rigor, os honorários advocatícios contratados igualam-se à vantagem advinda em favor do constituinte ou cliente, não a ultrapassando, o que guarda conformidade com a previsão do art. 38, “caput”, do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil.

19. Sobre o tema, importa transcrever o seguinte precedente da 1ª Turma Recursal do RN:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. DECISÃO IMPETRADA QUE REDUZIU DE OFÍCIO O PERCENTUAL FIXADO A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS, POR ENTENDER ABUSIVA A CLÁUSULA DE ÊXITO AVENÇADA NO IMPORTE DE 50%. PACTO QUE NÃO AFRONTA O DISPOSTO NO ARTIGO 22 DA LEI Nº 8.906/1964, CUMULADO COM ARTIGO 38 DO CÓDIGO DE ÉTICA E DISCIPLINA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. PATRONO DA CAUSA QUE NÃO RECEBERÁ PROVEITO ECONÔMICO SUPERIOR AO RECEBIDO PELO CLIENTE. CONCESSÃO DA SEGURANÇA NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

A cláusula contratual que estabelece o pagamento de honorários quota litis, ou seja, cujo pagamento fica condicionado ao êxito da demanda, é válida, existindo somente a condicionante de que o valor recebido pelo causídico não ultrapasse a quantia auferida pelo constituinte, conforme previsto no art. 38 do Código de Ética e Disciplina da OAB.

Destarte, consoante a cópia do Contrato de Prestação de Serviços Advocatícios (ID 16581697 - Pág. 141), existe previsão da remuneração na modalidade cota litis fixada em 50% (cinquenta por cento) do valor do proveito que for obtido pelo contratante, quer em acordo extrajudicial, quer em sentença. Ou seja, os honorários advocatícios contratados igualam-se à vantagem advinda em favor do constituinte ou cliente, não a ultrapassando, o que guarda conformidade com a previsão do art. 38, caput, do Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil.

Conhecimento e concessão da segurança nos termos do voto do relator”.

(Mandado de Segurança Cível N.º 0800646-42.2022.8.20.9000, 1ª Turma Recursal do Rio Grande do Norte, Juiz Relator: Madson Ottoni de Almeida Rodrigues, Julgado em 19/12/2022, disponível em:

20. Destaco, ainda, que não houve condenação de nenhuma das partes ao pagamento de honorários sucumbenciais, pois o recurso inominado interposto pelo cliente da impetrante foi provido. Por essa razão, os honorários contratuais, de fato, se igualam à vantagem advinda em favor do constituinte.

21. O que houve, portanto, foi uma revisão de ofício do contrato de honorários advocatícios firmado entre o assistido e a sua advogada no processo de origem, ora impetrante. Contudo, essa revisão, a meu ver, ofende o princípio da autonomia da vontade, principalmente porque a cláusula revisada não ultrapassa o limite fixado pelo artigo 38, “caput”, do Código de Ética e Disciplinar da OAB.

22. Além disso, o artigo 22, § 4º, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, que estabelece regra para o levantamento do valor referente aos...

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