Acórdão Nº 08004069520178205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 04-02-2022

Data de Julgamento04 Fevereiro 2022
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08004069520178205001
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0800406-95.2017.8.20.5001
Polo ativo
FLAVIO GENTIL DE ARAUJO FILHO
Advogado(s):
Polo passivo
MUNICIPIO DE NATAL e outros
Advogado(s):

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

SEGUNDA TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

RECURSO CÍVEL INOMINADO VIRTUAL Nº 0800406-95.2017.8.20.5001

JUÍZO ORIGINÁRIO: 1º JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE NATAL

RECORRENTE: FLÁVIO GENTIL DE ARAÚJO FILHO

ADVOGADO: LUCAS BEZERRA VIEIRA (OAB/RN 14.465)

RECORRIDO: MUNICÍPIO DE NATAL

ADVOGADA: PROCURADORIA-GERAL DO MUNICÍPIO DE NATAL

RELATORa: Juíza VALÉRIA MARIA LACERDA ROCHA

EMENTA: RECURSO INOMINADO. JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. ITBI. IMPOSTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR DECLARAÇÃO. INCIDÊNCIA SOBRE A TRANSMISSÃO ONEROSA E INTER VIVOS DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA. BASE DE CÁLCULO QUE CORRESPONDE AO VALOR VENAL DO IMÓVEL, EQUIVALENTE AO PREÇO DA COMPRA E VENDA SEGUNDO AS CONDIÇÕES MERCADOLÓGICAS. POSSIBILIDADE DE O FISCO ARBITRAR A BASE DE CÁLCULO DO TRIBUTO, NÃO SE VINCULANDO AO VALOR VENAL DO IPTU OU AO DECLARADO PELO CONTRIBUINTE NO CONTRATO DE COMPRA E VENDA. NECESSIDADE, CONTUDO, DE DEMONSTRAÇÃO PELA FAZENDA MUNICIPAL, MEDIANTE PROCESSO REGULAR, DE OMISSÕES E MÁ-FÉ DO SUJEITO PASSIVO E DE QUE O PREÇO DE VENDA DO IMÓVEL É NOTADAMENTE INFERIOR AO DE MERCADO. AUSÊNCIA DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO FISCAL PARA ARBITRAMENTO DA BASE DE CÁLCULO DO ITBI, REALIZADO UNILATERALMENTE PELO MUNICÍPIO DE NATAL. VIOLAÇÃO AO ART. 148 DO CTN, AO DEVIDO PROCESSO LEGAL, AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. PREVALÊNCIA DO VALOR DA BASE DE CÁLCULO DECLARADO NO CONTRATO DE COMPRA E VENDA IMOBILIÁRIA E BASEADO EM ANÚNCIO DE VENDA DE IMÓVEL SEMELHANTE, ALIENADO PELA MESMA CONSTRUTORA E SITUADO NO MESMO EMPREENDIMENTO HABITACIONAL. RESTITUIÇÃO DO VALOR PAGO A MAIOR A TÍTULO DE ITBI E TAXAS CARTORÁRIAS QUE SE IMPÕE, NOS TERMOS DO ART. 165, I, DO CTN. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO

Decidem os Juízes que integram a Segunda Turma Recursal Temporária dos Juizados Especiais Cíveis, da Fazenda Pública e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, a conhecer e dar provimento ao recurso inominado interposto pela parte autora, para reformar a sentença e determinar a repetição do indébito tributário pago a maior pelo demandante a título de ITBI e taxas cartorárias, acrescido de correção monetária pelo IPCA-E desde o pagamento indevido e juros moratórios simples de 1% ao mês a partir do trânsito em julgado, nos termos do voto da relatora. Sem custas e sem honorários ante o provimento do recurso.

Natal/RN, 7 de dezembro de 2021.

Valéria Maria Lacerda Rocha

Juíza Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de recurso inominado interposto por FLÁVIO GENTIL DE ARAÚJO FILHO, no qual pugna pela reforma da sentença que julgou improcedente a pretensão autoral de repetição de indébito tributário de ITBI e taxas cartorárias pagos a maior em decorrência de arbitramento da base de cálculo do imposto sem observância de procedimento administrativo fiscal, contraditório e ampla defesa. A decisão hostilizada assim se pronunciou.

PROJETO DE SENTENÇA

FLAVIO GENTIL DE ARAÚJO FILHO ajuizou ação de restituição de indébito, neste Juizado Especial Fazendário, em face do MUNICÍPIO DO NATAL, insurgindo-se contra o valor do ITIV (Imposto de Transmissão de Bens Inter Vivos) cobrado pelo demandado e pugnando que o percentual a ser pago do tributo seja calculado tomando como base o valor constante em escritura de compra e venda. Alegou, em síntese, que adquiriu o apartamento 801, do empreendimento Class Alonso Bezerra, comercializado por ROSSI (Santa Enriqueta Empreendimento Imobiliários Ltda.), pelo preço de R$ 950.000,00 (novecentos e cinquenta mil reais). E que, quando foi realizar o pagamento do Imposto de Transmissão Inter Vivos - ITIV, foi surpreendido com o valor da avaliação em R$ 1.321.000,00 (um milhão, trezentos e vinte e um mil reais), uma diferença de R$ 371.000,00 (trezentos e setenta e um mil reais), entre o valor pago e valor arbitrado pelo município. Sustentou que com a alíquota de 3% do ITIV, sobre o valor do bem, deveria pagar R$ 28.500,00 (vinte e oito mil e quinhentos reais), entretanto, com a avaliação do ente demandado, viu-se devedor de R$ 39.630,00 (trinta e nove mil, seiscentos e trinta reais), resultando numa diferença de R$ 11.130,00 (onze mil, cento e trinta reais). Assim, requereu a restituição do valor pago a maior pelo tributo. Noticiou que pagou pelo registro do imóvel, taxas e emolumentos a importância de R$ 17.824,97 (dezessete mil, oitocentos e vinte e quatro reais e noventa e sete centavos), mas que se considerado o valor real do imóvel, teria uma despesa de R$ 15.333,90 (quinze mil, trezentos e trinta e três reais e noventa centavos). Destarte, o pagamento a título de indenização por danos materiais cartorários a importância de R$ 2.491,07 (dois mil, quatrocentos e noventa e um reais e sete centavos). Citado, o Município do Natal apresentou contestação pugnando pela improcedência dos pedidos autorais. A parte autora apresentou resposta à contestação reiterando o pedido de procedência da ação. É o relatório. Decido. Compulsando os presentes autos, observa-se que o bem em questão foi objeto de escritura pública por compra efetuada a Santa Enriqueta Empreendimento Imobiliários Ltda., comercializado por ROSSI, em 30/04/2016, no valor de R$ 950.000,00 (novecentos e cinquenta mil reais). Dispõe o art. 156 da Constituição Federal: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição; (...)”. Versa, portanto, o cerne da questão quanto à base de cálculo do imposto de transmissão “inter vivos” notadamente quanto ao valor venal do imóvel em questão, e a qual possui previsão no art. 38 do Código Tributário Nacional: "Art. 38. A base de cálculo do imposto é o valor venal dos bens ou direitos transmitidos". Nesse ponto importa saber o que se deve entender por valor venal. Segundo De Plácido e Silva, seria o valor da venda, isto é, o preço por que as coisas foram, são ou possam ser vendidas. O tributo é recolhido quando da realização do ato ou negócio jurídico, sendo que cabe à autoridade administrativa fornecer o valor de avaliação do bem, cujas alíquotas são estabelecidas por lei ordinária, a critério do ente municipal. Como bem disposto, o valor do tributo é pautado no valor venal do imóvel, mediante estimativa fiscal. No caso dos autos, o Município do Natal se insurge contrariamente ao pedido, dispondo não representar o valor apontado pelo autor o valor real do bem objeto da presente ação. No caso em tela, impõe-se a análise do pedido com supedâneo nos documentos colacionados aos autos. Registre-se que o ente fiscal detém competência exclusiva para realizar sua própria estimativa fiscal, a partir de critérios que garantam a isonomia de tratamento e de atribuição de valor, nos termos da Constituição Federal. A espécie tributária tem como fato gerador a transmissão, seja a que título for, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis, por natureza ou acessão física; a transmissão a qualquer título, de créditos reais sobre imóveis, exceto os de garantia; e ainda sobre a cessão de direitos pertinentes às ditas operações, encontrando previsão no inciso II do art. 156 da CF, conforme disposto anteriormente. No âmbito do Município do Natal o imposto de transmissão “inter vivos” restou disciplinado pela LC nº 3.882/89, concluindo-se dos documentos trazidos a colação a ocorrência do fato gerador a ensejar nestes termos a pertinência da cobrança do mencionado imposto. Quanto à base de cálculo a ser utilizada, impõe-se o disposto no art. 38 do CTN. A determinação do valor venal do imóvel, como base de cálculo do Imposto sobre transmissão de Bens Imóveis, é perspectiva apta a dimensionar a intensidade do comportamento inserto no núcleo jurídico tributário, na medida que corresponde ao valor que o imóvel alcançaria caso fosse posto à venda em condições usuais de mercado, competindo a fixação dos critérios para a determinação da base de cálculo em concreto à legislação ordinária de cada Município. É cediço na jurisprudência do STJ que a base de cálculo do Imposto sobre transmissão de Bens Imóveis é o valor real da venda do imóvel ou de mercado. No caso, entretanto, de imposto que venha incidir sobre a transmissão de ato oneroso, tem-se como ponto de partida para a determinação da base de cálculo, na hipótese mais geral, que é a compra e venda, o preço. A propósito, citam-se os seguintes julgados:

TRIBUTÁRIO. ITBI. BASE DE CÁLCULO. VALOR VENAL DO IMÓVEL. APURAÇÃO POR ARBITRAMENTO POSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte superior de justiça aponta no sentido de que o valor da base de cálculo do ITBI é o valor real da venda do imóvel ou de mercado, sendo que nos casos de divergência quanto ao valor declarado pelo contribuinte pode-se arbitrar o valor do imposto, por meio de procedimento administrativo fiscal, com posterior lançamento de ofício, desde que atendidos os termos do art. 148 do CTN. 2. A análise dos requisitos para o arbitramento do valor venal do imóvel encontra óbice na Súmula 7 desta Corte. 3. Ademais, a municipalidade levou em consideração a legislação local, que determina a incidência do ITBI tanto sobre as áreas de terras quanto as benfeitorias (áreas de florestas). Essa análise é vedada no âmbito desta Corte devido o obstáculo da Súmula 280/STF. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 263685 / RS; DJe...

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