Acórdão Nº 08004192320218200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 30-07-2021

Data de Julgamento30 Julho 2021
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08004192320218200000
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0800419-23.2021.8.20.0000
Polo ativo
JOSE DO CARMO COSTA FILHO e outros
Advogado(s): GIOVANNI ALESSANDRO BEGOSSI, BRUNO MACEDO DANTAS
Polo passivo
CHB - COMPANHIA HIPOTECARIA BRASILEIRA e outros
Advogado(s): JUBSON TELLES MEDEIROS DE LIMA, CAMILA OLIVEIRA TOSCANO DE ARAUJO

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSO CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA PROPOSTA COM O OBJETIVO DE REVER ÍNDICE DE CORREÇÃO APLICADO EM CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE APARTAMENTO RESIDENCIAL E DE VER DECLARADA A NULIDADE DE CESSÃO DE CRÉDITO PREVISTA NA AVENÇA. TUTELA INDEFERIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO, SUSCITADA EM CONTRARRAZÕES. ALEGADA AFRONTA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL. TESE INVEROSSÍMIL. INCONFORMISMO QUE ATACA OS FUNDAMENTOS UTILIZADOS NA DECISÃO COMBATIDA. REJEIÇÃO. MÉRITO. PLEITO DE ALTERAÇÃO DO PARÂMETRO ADOTADO A TÍTULO DE CORREÇÃO DAS PARCELAS AVENÇADAS, BEM ASSIM DE RECONHECIMENTO DA NULIDADE DA CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS QUE, AVALIADAS CRITERIOSAMENTE, DEMONSTRAM A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE ÍNDICE DIVERSO (IPCA) DO INICIALMENTE CONTRATADO (IGPM). POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO PREVISTA NA AVENÇA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO, TODAVIA, NA CESSÃO DE CRÉDITO, DEVIDAMENTE MENCIONADA NO PACTO E NOTICIADA AOS RECORRENTES. DECISÃO REFORMADA EM TERMOS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.


ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, sem manifestação ministerial, em rejeitar a preliminar de não conhecimento do recurso, por afronta ao princípio da dialeticidade, suscitada nas contrarrazões apresentadas pela CHB – Companhia Hipotecária Brasileira. No mérito, por maioria de votos, dar provimento parcial ao agravo de instrumento, restando prejudicado o agravo interno, nos termos do voto da Relatora, vencido o Des. Ibanez Monteiro que desproveu do recurso.

RELATÓRIO

José do Carmo Costa Filho e Kellen Micheline Alves Henrique Costa ajuizaram Ação Ordinária nº 0876993-56.2020.8.20.5001 contra a CHB – Companhia Hipotecária Brasileira e a Cyrela Brazil Realty S.A. Empreendimentos e Participações.

Na ocasião, pugnaram pela concessão da tutela provisória de urgência com o objetivo de suspender os efeitos da cessão de crédito da primeira ré para a segunda, além da aplicação imediata de correção monetária das parcelas contratadas pelo IPCA, em substituição ao índice definido na avença (IGPM).

Subsidiariamente, pediram a consignação em juízo da parcela mensal do contrato.

Distribuído o feito, a MM. Juíza da 8ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN indeferiu a pretensão inicial e, inconformados, os autores protocolaram o presente agravo de instrumento, com base nos seguintes argumentos (Id 8467785, págs. 01/24):

a) no contrato de compra e venda de imóvel que firmaram com a CHB em 16/02/2017, obrigaram-se a pagar à vendedora a quantia financiada de R$ 1.203.480,00 (um milhão, duzentos e três mil, quatrocentos e oitenta reais) em 120 (cento e vinte) parcelas mensais de R$ 17.266,44 (dezessete mil, duzentos e sessenta e seis reais e quarenta e quatro centavos), corrigidas monetariamente pelo IGPM;

b) o índice ajustado acumula elevação de 2,37% (dois vírgula trinta e sete por centos percentuais) somente em 2021, e de 25,46% (vinte e cinco vírgula quarenta e seis por cento) nos últimos 12 (doze) meses, fato relacionado diretamente com a pandemia do COVID-19, e a alta observada por caso fortuito, diante do elevado valor contratado e da quantidade de prestações assumidas, somados aos juros pactuados, criou uma distorção no ajuste a ponto de ser impossível quitá-lo e ferindo seu equilíbrio econômico-financeiro;

c) a cessão de crédito entre as demandadas foi informada aos compradores em janeiro/18 e apesar de lhes ter sido noticiado que ela não traria ônus aos compradores, estão impedidos de tentar a portabilidade do financiamento imobiliário para buscar melhores condições, eis que a Cyrela não é instituição financeira, daí pugnarem por sua anulação;

d) presente o fumus boni iuris diante do caso fortuito que alterou o equilíbrio das cláusulas entabuladas em razão do elevado índice de correção aplicado na relação jurídica firmada entre os litigantes, bem assim diante da abusividade na cessão sub judice, que lhes impede de proceder com a portabilidade, viola o direito à informação por alteração substancial da simulação, além de ferir a ampla concorrência;

e) igualmente demonstrado o periculum in mora, eis que mantida a decisão de origem, os recorrentes não poderão realizar a permuta do financiamento para outra instituição e ficarão reféns de uma distorção contratual que poderá, até o julgamento de mérito, afetá-los financeiramente.

Pugnaram, então, pelo deferimento da tutela de urgência, determinando-se, de modo provisório e até o julgamento final da demanda principal: (i) a aplicação imediata da correção monetária pelo IPCA (ao invés do IGP-M), com consequente adequação do quantum debeatur no bojo do “contrato de compra e venda de imóvel, financiamento com pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia e emissão de cédula de crédito imobiliário” n° PF-0234, firmado com a agravada CHB; e (ii) a suspensão dos efeitos da cessão de crédito da agravada CHB à agravada Cyrela.

Subsidiariamente, pediram que lhes seja permitido garantir em juízo a parcela mensal do contrato até o julgamento do feito em análise exauriente.

O preparo foi recolhido, conforme documento de Id´s 8467789 a 8467790.

Em decisão de Id 8485600 (págs. 01/05), indeferi a antecipação dos efeitos da tutela recursal e, descontentes, os agravantes interpuseram agravo interno objetivando a reconsideração do decisum (Id 8615056, págs. 01/26), o qual foi contra-arrazoado apenas pela CHB – Companhia Hipotecária Brasileira (Id 9751937, págs. 01/17).

A mesma empresa também ofereceu contrarrazões ao agravo de instrumento alegando, preliminarmente, afronta ao princípio da dialeticidade recursal e, no mérito, sustentou (Id 8859027, págs. 01/16):

(i) inexiste ilegalidade, seja em relação à utilização do índice de correção monetária IGP-M, eis que pactuado pelas partes litigantes (Item 6º quadro resumo e cláusula 3.9 e seguintes do contrato), bem assim quanto à realização da cessão de crédito, também prevista na avença;

(ii) a alta do IGPM nos últimos meses, dentre outros fatores, pela pandemia do Covid-19, não é motivo de alteração contratual por desequilíbrio econômico, visto que o contrato ainda não percorreu sequer 20% o prazo previsto no contrato (120 meses)”;

(iii) substituir o índice cada vez que tenha alternância na alta do IGP-M ou IPCA em função de determinado evento, pode trazer a esdrúxula situação de intermináveis ações judiciais dos Autores em face das demandadas;

(iv) em relação à nulidade da cessão de crédito, a alegação dos Agravantes além de fundada em hipóteses sem fundo técnico, é lastreada em documentação desatualizada, isso porque a resolução nº3.401, de 6 de setembro de 2006do BACEN utilizada pelos Recorrentes para justificar sua impossibilidade de portabilidade sequer se encontra mais vigente nos termos apresentados, visto que a Resolução nº 4.292de 20 de dezembro de 2013 realizou substancial modificação em seu estrutura, melhorando, ampliando e acrescentado novas providências.

Enfim, a Cyrela Brazil Realty S.A. Empreendimentos e Participações foi intimada para apresentar contrarrazões ao agravo de instrumento, mas permaneceu inerte (certidão de Id 10067511).

Notificados para falar sobre a preliminar suscitada pela CHB – Companhia Hipotecária Brasileira (Id s 8859027, págs.01/16 e 9751937, págs. 01/17), os agravantes responderam em petição de Id 10215295 (págs. 01/02).

A Dra. Maria de Lourdes Medeiros de Azevêdo, 15ª Procuradora de Justiça, declinou da intervenção ministerial (Id 10082801).

É o relatório.

VOTO

- PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO, SUSCITADA PELA CHB – COMPANHIA HIPOTECÁRIA BRASILEIRA.

Ao apresentar contrarrazões ao recurso, a CHB – Companhia Hipotecária Brasileira disse que o inconformismo não ultrapassa o juízo de admissibilidade por afrontar ao princípio da dialeticidade recursal.

Sem razão, todavia, eis que ao interpor o agravo, os recorrentes transcreveram trechos da decisão combatida e pugnaram, expressamente, pela aplicação imediata do índice de correção monetária IPCA no lugar do IGP-M, bem assim pela suspensão dos efeitos da cessão de crédito da ré/agravada CHB à ré/agravada Cyrela, ambos os pleitos avaliados, mas negados pelo juízo de origem.

Além disso, destacaram que o fato de estar sendo cobrado índice (IGPM) previsto no contrato, fundamento utilizado no juízo de origem para negar o pedido de tutela, não impede sua alteração, haja vista que “a alta superveniente do IGP-M configura caso fortuito que não só foge completamente da simulação que integra o contrato, prejudicando o direito à informação do consumidor, mas que, principalmente, feriu de morte o equilíbrio econômico-financeiro do contrato” (Id 8467785 – pág. 05 do arrazoado, precisamente).

A meu sentir, portanto, as razões recursais trazem argumentos capazes de refutar aqueles utilizados na deliberação agravada para o indeferimento do pedido de tutela e, portanto, não há razão negar seguimento ao inconformismo.

Assim, rejeito a preliminar em questão.

Preenchidos, pois, os requisitos de admissibilidade, passo ao exame da questão de fundo.

MÉRITO

José do Carmo Costa Filho e Kellen Micheline Alves Henrique Costa insurgem-se contra decisão da Magistrada a quo que indeferiu a tutela de urgência por eles requerida com o objetivo de substituir o índice de correção (do IGPM para o IPCA) no contrato formalizado com os agravados, bem assim de ver reconhecida as nulidades da cessão de...

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