Acórdão Nº 08005433420198205122 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 05-07-2023

Data de Julgamento05 Julho 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08005433420198205122
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0800543-34.2019.8.20.5122
Polo ativo
IRISVANIA FERREIRA DA SILVA
Advogado(s): FRANCISCA EDNARIA FERREIRA DAS CHAGAS FERNANDES
Polo passivo
ANA PAULA WEY PEREZ - ME
Advogado(s): GUILHERME TILKIAN

RECURSO INOMINADO N° 0800543-34.2019.8.20.5122

ORIGEM: Juizado Especial Cível da Comarca de Martins

RECORRENTE: IRISVANIA FERREIRA DA SILVA

ADVOGADOS:FRANCISCA EDNARIA FERREIRA DAS CHAGAS FERNANDES

RECORRIDA: ANA PAULA WEY PEREZ - ME

ADVOGADO: GUILHERME TILKIAN

RELATORA: SABRINA SMITH CHAVES

EMENTA: RECURSO INOMINADO. Empréstimo. Fraude. Depósitos realizados pela autora para contas pertencentes a pessoas físicas alheias a suposta contratação. Sentença de improcedência. Culpa exclusiva do consumidor. NEGLIGÊNCIA DO CONSUMIDOR QUE AFASTA A RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR DO SERVIÇO. Sentença MANTIDA. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO

Decidem os Juízes que integram a Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso, mantendo a sentença atacada por seus próprios fundamentos. Condenação da parte recorrente ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face do deferimento do benefício da justiça gratuita

Natal, 20 de junho de 2023.

SABRINA SMITH CHAVES

JUÍZA RELATORA

RELATÓRIO



Sentença proferida pela Juiz(a) de Direito MONICA MARIA ANDRADE, que se adota:


SENTENÇA


Dispensado o relatório na forma do art. 38, Caput, da Lei 9.099/95.

Trata-se de AÇÃO ORDINÁRIA C/C DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO, proposta por IRISVANIA FERREIRA DA SILVA em face de WP CAPITAL ASSESSORIA FINANCEIRA LTDA, ambos já qualificados nos autos, aduzindo em síntese que fez um empréstimo junto a Requerida no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Informou que inicialmente foi exigido que tivesse um avalista e como a Requerente não dispunha de avalista, foi oferecida a opção de aderir a um contrato de seguro para poder finalizar o empréstimo, e que esse seguro era no valor de R$ 996,98 (novecentos e noventa e seis reais e noventa e oito centavos). A autora afirma que após depositar o valor desse seguro, foram feitas várias exigências de outros depósitos através de conversa via WhatsApp, tendo depositado o valor de R$ 6.173,67 (seis mil, cento e setenta e três reais e sessenta e sete centavos) e somente depois, percebeu que tratava-se de fraude.

Por fim, requereu a condenação da requerida referente à repetição do indébito em dobro, totalizando o valor de R$ 12.347,34 (doze mil, trezentos e quarenta e sete reais e trinta e quatro centavos), bem como a indenização no valor de R$ 8.000,00 (Oito mil reais) referente aos danos morais.

Junta procuração e documentos (Ids 48959409 a 48959416)

Citada, a requerida apresentou contestação, alegando, em síntese ausência de falha na prestação dos serviços já que não houve qualquer relação com a parte autora diante da atuação de terceiros, não tendo, portanto, participado do golpe. Informou que não realiza e nunca realizou empréstimos direito a consumidores e que em 15 de agosto de 2019, recebeu uma mensagem por meio do formulário de contato disponibilizado em seu site eletrônico onde um suposto cliente lhe questionou sobre a possibilidade de estar sendo vítima de uma fraude ao realizar um empréstimo com uma empresa que se apresentava como “WP Capital”, cujo contato era apenas por meio do aplicativo de mensagens WhatsApp.

Segundo a demandada, tomou conhecimento de que criminosos estavam utilizando seu nome e CNPJ para ofertar supostos empréstimos financeiros fraudulentos a pessoas negativadas, e, em razão disso, afirma que colocou um aviso em seu site eletrônico informando o ocorrido para que eventuais vítimas não mais caíssem em referido golpe, bem como realizou o Boletim de Ocorrência. Aduziu que as conversas de WhatsApp e comprovantes de depósito em contas bancárias não possuem qualquer vínculo com a empresa. Por fim, requereu a total improcedência da ação.

Eis o breve relato do essencial.

Fundamento e decido.

Pois bem.

Gize-se que a relação jurídica existente entre as partes é de consumo eis que a parte autora se amolda ao modelo normativo descrito no art. 2º do CDC; a parte ré ao art. 3º, caput do mesmo diploma - e a proteção a referida classe de vulneráveis possui estatura de garantia fundamental (art. 5º, inc. XXXII da CRFB) e princípio fundante da ordem econômica (art. 170, inc. V da CRFB).

Ademais, as normas consumeristas são de ordem pública, interesse social e aplicação cogente (art. 1º do CDC). Outrossim, impende destacar que a Política Nacional de Relações de Consumo possui como princípio o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercador de consumo (art. 4º, inc. I do CDC) e “a coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo” (art. 4º, inc. VI do CDC).

Não bastasse isso, é direito básico do consumidor a “efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos” (art. 6º, inc. VI e art. 81, caput do CDC).

Conforme lição de Eros Roberto Grau, a defesa do consumidor contido no art. 170, V, da nossa Carta Magna, é um princípio constitucional impositivo que tem como função servir como instrumento para a realização do fim de assegurar a todos, existência digna e objetivo particular a ser alcançado. No último sentido, assume a feição de diretriz norma objetivo dotada de caráter constitucional conformador, justificando a reivindicação pela realização de políticas públicas.

No sistema jurídico brasileiro, o direito do consumidor tem hierarquia constitucional e se apresenta como um princípio-programa tendo por objetivo uma ampla política pública.

O presente caso, trata-se de ação indenizatória na qual alega a parte autora ter sido vítima de golpe perpetrado por estelionatários, em razão da falha na prestação dos serviços prestados pela ré, já que terceiros se passaram pela empresa requerida ofertando-lhe empréstimo pessoal.

Segundo a peça preambular, o autor, após contratar empréstimo pessoal por meio do aplicativo “WhatsApp”, recebeu contrato de empréstimo supostamente emitido pela demandada, e que, para receber o crédito contratado, efetuou depósitos em contas distintas no total de R$ 6.173,67 (seis mil, cento e setenta e três reais e sessenta e sete centavos).

Com efeito, a autora não se cercou dos cuidados necessários para averiguar a veracidade da contratação, a qual deveria causar estranheza e desconfiança em razão da forma de contratação, por via do aplicativo “WhatsApp”, e por meio da transferência de valores a terceiros, pessoas físicas, antes mesmo de receber o crédito.

Com efeito, não é usual que instituições financeiras formalizem contratos de empréstimos por aplicativos de mensagens, tampouco que solicitem o pagamento de encargos prévios à concessão do crédito, ou, ainda, solicitem o depósito de tais encargos a pessoas físicas diversas.

Assim, conquanto a responsabilidade das instituições financeiras seja objetiva pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, a teor da Súmula n°. 479 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, há o rompimento do nexo causal, um dos requisitos da responsabilidade civil, quando o consumidor não se cerca dos cuidados mínimos antes de realizar transferências bancárias com claras evidências de fraude, pois incide, nesse caso, a excludente prevista no artigo 14, § 3°, inciso II, do Código de defesa do Consumidor.

Diante das circunstâncias acima apontas, não há que se falar em falha na prestação de serviço, concorrendo a parte autora para a consumação da fraude ao não se cercar dos devidos cuidados antes de efetuar os pagamentos.


DISPOSITIVO

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora em face de WP CAPITAL ASSESSORIA FINANCEIRA LTDA.

Sem custas e sem honorários advocatícios sucumbenciais, em observância às determinações dos arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Após o trânsito em julgado, arquivem-se.


MARTINS /RN, data da assinatura no sistema.



MONICA MARIA ANDRADE

Juiz(a) de Direito

(documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)



Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente o pedido autoral de indenização por danos morais e materiais.

Em suas razões, a parte recorrente aduz que o recorrido reconhece a existência de fraude, emitindo avisos aos seus clientes e realização boletim de ocorrência. Requereu ao fim, que seja reformada a r. sentença, para julgar procedente o pleito de indenização por danos morais e danos materiais no importe de R$ 12.347,34.

A recorrida apresentou contrarrazões ao recurso, onde sustentou a manutenção da sentença, com o argumento de que a recorrente foi vítima do crime de estelionato que, contudo, não foi praticado pela recorrida, mas por criminosos que estão se passando por esta.

Decido.



VOTO



Defiro o pedido de concessão do benefício da justiça gratuita, com base nos artigos 98 e 99 do CPC.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto e passo a analisá-lo.

Desde já, adianto que a sentença recorrida não merece reforma.

Os elementos dos autos evidenciam que o infortúnio experimentado pela parte recorrente advém de fraude, perpetrada por terceiros, quando da contratação de empréstimo. É de se observar que as provas acostadas pela parte autora evidenciam...

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