Acórdão Nº 08005980420178205106 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Tribunal Pleno, 07-10-2020

Data de Julgamento07 Outubro 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08005980420178205106
ÓrgãoTribunal Pleno
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800598-04.2017.8.20.5106
Polo ativo
FAN SECURITIZADORA S/A
Advogado(s): DANIEL PINTO LIMA, ERNESTO ALMEIDA PINTO VIEIRA
Polo passivo
R TRAJANO GOMES DE LIMA - EPP
Advogado(s): JULYAN VIANA DE SOUSA

EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MONITÓRIA. EMBARGOS MONITÓRIOS. SENTENÇA DE ACOLHIMENTO DOS EMBARGOS E DE IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE CESSÃO DE CRÉDITO, DE PRESTAÇÃO DE AVAL E OUTRAS AVENÇAS. AQUISIÇÃO DE RECEBÍVEIS REALIZADA POR SECURITIZADORA. ATIVIDADE QUE NÃO SE CONFUNDE COM OPERAÇÃO DE FACTORING. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA ESTABELECENDO A RESPONSABILIDADE DA CEDENTE PELO INADIMPLEMENTO DOS CRÉDITOS VENDIDOS. EMBARGOS MONITÓRIOS REJEITADOS DADA A AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE FATOS IMPEDITIVOS, MODIFICATIVOS OU EXTINTIVOS DA SECURITIZADORA. AÇÃO MONITÓRIA QUE PREENCHE OS REQUISITOS DO ART. 700 DO CPC. CONSTITUIÇÃO DE PLENO DIREITO DO TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO. INTELIGÊNCIA, DO PARÁGRAFO 8º DO ART. 702, DO CPC. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Turma da 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e julgar provida a apelação cível, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pela FAN SECURITIZADORA S/A, em face de sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Cível da Comarca de Mossoró/RN (ID 5800276), que em autos da Ação Monitória, julgou desprovido o pleito exordial “por falta de prova de que tinha prévia ciência da insolvibilidade dos títulos cedidos, não pode ser responsabilizado pelo inadimplemento dos mesmos”.

No mesmo dispositivo, condenou a empresa autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

Nas razões recursais (ID 5800278), a apelante esclarece que ajuizou a presente ação em face dos demandados em razão de crédito não adimplido originado de cessão de crédito, objeto do CONTRATO DE CESSÃO DE CRÉDITO, DE PRESTAÇÃO DE AVAL E OUTRAS AVENÇAS N° 466.

Destaca que a relação entre a apelada e a empresa Iguana Factoring Fomento Mercantil é diferente da havida entre os litigantes, aduzindo restar cabalmente demonstrado pelos extratos e a planilha de débito contidos nos autos que os débitos foram constituídos pelo inadimplemento da apelada na constância do contrato firmado entre as partes.

Aponta erro no julgado ao considerar que o contrato havido nos autos é de fomento mercantil, aduzindo que o pacto existente é de securitização.

Aduz que em sua essência, a securitização funda-se nas regras de cessão de crédito estabelecidas nos artigos 286 a 298 do Código Civil.”

Discorre sobre a regularidade do contrato de securitização, “bem como a possibilidade de se exercer o direito de regresso, uma vez que os embargantes/demandados se obrigaram voluntariamente por força de disposição contratual a responder pelo adimplemento do mesmo".

Argumenta haver a responsabilização do apelado presente no art. 395, do Código Civil, uma vez que “como as mercadorias não foram efetivamente entregues aos sacados das duplicatas, há de se concluir que o crédito cedido não existia”.

Destaca que caberia aos demandados comprovar a entrega das mercadorias negociadas.

Defende a responsabilidade voluntária do apelado, sendo coobrigado pela inadimplência do devedor, tendo em vista que “é plenamente válida a cláusula que estipula o direito de regresso no contrato de securitização”.

Por fim, requer que seja conhecido e provido o recurso.

Contrarrazões do apelado no ID 5800283, nas quais alterca haver robusta documentação nos autos de que o contrato entabulado entre as partes foi de fomento mercantil (factoring).

Expõe que a apelante esconde que o contrato não é de factoring, pois a jurisprudência é pacifica “no sentido de que na operação de factoring, a inclusão de cláusula de regresso ou recompra em caso de eventual não pagamento do título desvirtua totalmente a natureza da operação, sendo consequentemente nula de pleno direito a dita cláusula. Logo, a ação monitória não pode prosperar, já que foi pautada na cláusula de regresso.”

Assevera que “é pertinente registrar que, além do que já foi apresentado que comprova que a verdadeira atividade da Recorrente era o fomento mercantil (factoring), tem-se que esta não prova a emissão de valores mobiliários aos títulos que foram cedidos, o que somente então caracterizaria a securitização.”

Acrescenta ter o apelante incorrido em inovação recursal no tocante a “tese de que não teria havido a entrega das mercadorias correspondentes a cada título juntado aos autos pela Recorrente”.

Ao final, requer o desprovimento do apelo.

Instado a se manifestar, o Ministério Público, através da 7ª Procuradoria de Justiça, declinou de sua intervenção no feito por ausência de interesse público (ID 5829492).

É o que importa relatar.

VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do apelo.

Cinge-se o mérito recursal à análise da possibilidade da pretensão creditícia suscitada por meio de ação monitória, pela qual a empresa autora pleiteia o pagamento do importe de R$ 966.315,73 (novecentos e sessenta e seis mil trezentos e quinze reais e setenta e três centavos), supostamente exigível em decorrência do CONTRATO DE CESSÃO DE CRÉDITO, DE PRESTAÇÃO DE AVAL E OUTRAS AVENÇAS N° 466.

Primeiramente, convém enfrentar o argumento soerguido pela apelada, nas suas contrarrazões, de que o recorrente teria incorrido em inovação recursal, eis que não conta na exordial a questão atinente a “tese de que não teria havido a entrega das mercadorias correspondentes a cada título juntado aos autos pela Recorrente”.

Contudo, entendo não ter o apelado incorrido em inovação recursal.

Isto, pois, como demais consabido, o ordenamento jurídico nacional proíbe a inovação no argumento fático em sede recursal, contudo, volvendo-se à situação dos autos, vislumbro ter o apelante expedido tal tese na impugnação aos embargos monitórios, isto é, antes da prolação da sentença, motivo pelo qual não há que se falar em inovação fática nesta instância recursal.

Volvendo-se ao mérito, conforme narrado, o juiz a quo considerou que o contrato consubstanciado consiste em operação de factoring, em razão da existência de outro contrato pactuado pelo demandado, no mesmo dia valores globais idênticos, com a empresa IGUANA FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA, pertencente ao mesmo grupo da apelante. Porquanto, o magistrado sentenciante decidiu por não ser possível a devolução dos riscos assumidos com a compra, ante a inexistência de provas de que o apelado tinha prévia ciência da insolvabilidade dos créditos.

Porém, compulsando os autos, entendo não ser esse o melhor entendimento a ser direcionado à hipótese dos autos, motivo pelo qual tenho por carecer de reforma a sentença, tendo em vista rejeitar os embargos monitórios.

É que, pela análise dos documentos colacionados aos autos, resta patente que a relação jurídica entabulada entre as partes se trata de contrato de securitização, de maneira que a cláusula que transfere a responsabilidade pela solvibilidade dos créditos se demonstra válida.

Com efeito, tem-se que a Securitização, advindo do termo em inglês “securities”, consiste em modalidade financeira na qual se agrupa vários tipos de ativos financeiros, que são convertidos em títulos padronizados negociáveis no mercado de capitais interno e externo.

A Associação Nacional de Securitizadoras de Ativos Empresariais e Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios - ANSAE FIDC -, define a securitização, a seguir in verbis:

“A palavra securitização provém do termo “securities”, que em inglês se refere a valores mobiliários e títulos de crédito. Dessa forma, securitizar tem o significado de converter determinados créditos (ativos recebíveis), em lastro para títulos ou valores mobiliários a serem emitidos posteriormente. A securitização serve, portanto, como suporte para a emissão de títulos ou valores mobiliários."

(http://www.ansae.com.br/index.php/ansae/securitizacao/)

Porquanto, tem-se que securitização consiste em prática financeira que promove o agrupamento de vários tipos de ativos tais como duplicatas, cheques, notas promissórias, convertendo-os em títulos padronizados negociáveis no mercado de capitais interno e externo.

Em outras palavras, pela securitização, uma determinada dívida, é transferida onerosamente, na forma de títulos lastreável e negociável, para outras instituições financeiras, como ocorrido na situação delineada nos autos.

Conforme visto, um dos aspectos discutidos nos presentes autos circunda em averiguar se o contrato objeto do litígio trata-se de instrumento de securitização ou de operação de fomento, havendo uma possível...

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