Acórdão Nº 08006293420218205122 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 22-09-2023

Data de Julgamento22 Setembro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08006293420218205122
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800629-34.2021.8.20.5122
Polo ativo
ANTONIA RAIMUNDA DE SOUSA
Advogado(s): FRANCISCA EDNARIA FERREIRA DAS CHAGAS FERNANDES
Polo passivo
BANCO BRADESCO S/A
Advogado(s): LARISSA SENTO SE ROSSI

APELAÇÃO CÍVEL Nº 0800629-34.2021.8.20.5122

APELANTE/APELADO: BANCO BRADESCO S/A

ADVOGADA: LARISSA SANTO-SÉ ROSSI

APELANTE/APELADA: ANTÔNIA RAIMUNDA DE SOUZA

ADVOGADA: FRANCISCA EDNÁRIA FERREIRA DAS CHAGAS FERNANDES

RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA DE LOURDES AZEVÊDO

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. ANÁLISE CONJUNTA. IDENTIDADE DA MATÉRIA. COBRANÇA DE TARIFA DE SERVIÇOS – CESTA B EXPRESSO 4, IOF E ENCARGO LIMITE DE CRÉDITO. CONTRATAÇÃO QUE NÃO RESTOU EFETIVAMENTE DEMONSTRADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE JUNTADA DO RESPECTIVO INSTRUMENTO CONTRATUAL. ABERTURA DE CONTA BANCÁRIA PARA RECEBIMENTO DE PENSÃO. AUSÊNCIA DE PROVA DA INFORMAÇÃO QUANTO À TARIFA BANCÁRIA REFERENTE À CONTA CORRENTE E POSSIBILIDADE DE ISENÇÃO DE TARIFAS. RESOLUÇÃO CMN Nº 3.402/2006. VEDAÇÃO DA COBRANÇA. IRREGULARIDADES CONFIGURADAS. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA, DA TRANSPARÊNCIA E DA INFORMAÇÃO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. VIABILIDADE. INCIDÊNCIA DO ARTIGO 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO A TÍTULO DE DANOS MORAIS. PRECEDENTES DESTA CORTE. APELO DE ANTÔNIA RAIMUNDA DE SOUZA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO E O DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CONHECIDO E IMPROVIDO.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, ausente o parecer Ministerial, em conhecer e dar provimento parcial ao apelo de Antônia Raimunda de Souza e conhecer e negar provimento ao do Banco Bradesco S/A, nos termos do voto da Relatora, que integra o Acórdão.

R E L A T Ó R I O

Apelações Cíveis interpostas pelo Banco Bradesco S/A e por Antônia Raimunda de Souza em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da Vara Única da Comarca de Martins, que nos autos da Ação Declaratória de Cobrança Indevida c/c Repetição do Indébito c/c Pedido de Tutela de Urgência c/c Danos Morais, julgou procedente em parte a pretensão autoral, declarando a inexistência da contratação da tarifa bancária – Cesta B. Expresso 04 e do Serviço de Anuidade de Cartão de Crédito, condenando ao pagamento em dobro dos descontos indevidos referentes as tarifas, anuidade cartão de crédito e Encargo Limite Crédito, com juros de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação e correção monetária pelo INPC a contar de cada desconto indevido; condenação no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a título de danos morais, com juros ao mês no percentual de 1% (um por cento) e atualização monetária pela Tabela JFRN, a contar da prolação da sentença (conforme entendimento do STJ – Resp 903258), deferindo a tutela de urgência para a imediata suspensão dos descontos objeto da lide, referentes às cobranças de tarifas e serviços; pagamento de custas e honorários sucumbenciais no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (art. 85, §2º CPC).

Em suas razões recursais (ID nº 19494105), a instituição bancária alegou a legalidade das cobranças, em conformidade com a Resolução do BACEN, bem como dos descontos comprovados através de extratos bancários, a anuência da autora/apelante quando da abertura da conta dos serviços ofertados, aduzindo que a única conta isenta de tarifação é a conta salário (que só possui a função débito), não sendo essa a espécie sob análise, ausência de falha na prestação do serviço ofertado, tendo agido no exercício regular do direito e, com isso, excluindo qualquer dever de indenizar, seja no âmbito material ou moral, regularidade das cobranças, pedindo a reforma da sentença; como pedido sucessivo pugna pela minoração do quantum fixado aos danos morais, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) diante da ocorrência do Princípio da Mitigação do próprio prejuízo, requerendo a compensação do serviço utilizado, afastando o percentual dos honorários advocatícios sucumbenciais, improcedência da ação e que todas as notificações sejam em nome da advogada que subscreve a peça recursal - Larissa sento Sé Rossi.

Contrarrazões ofertadas pela parte consumidora, também apelante (ID nº 19494112), arguindo a preliminar de não conhecimento do apelo visto não atendido ao disposto no art. 1.010, III do CPC, reprodução literal da contestação (Princípio da dialeticidade recursal), ausência de comprovação de uso para outros fins (comerciais), manutenção do decisum.

Em sede de apelação Antônia Raimunda de Souza (ID nº 19494113) pede a majoração dos danos morais e o aumento do percentual dos honorários sucumbenciais em 20% (vinte por cento).

Deixou a instituição financeira transcorrer in albis o prazo para contrarrazoar a instituição financeira.

Com vista dos autos, a Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção no feito, ao argumento de ausência de interesse público (ID nº 21007551).

É o relatório.

V O T O

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço das Apelações, as quais podem, diante da identidade da matéria, ser analisadas conjuntamente.

Cinge-se a análise recursal acerca da possibilidade da reforma da condenação do Banco Bradesco S/A a restituir a autora, também apelante, os valores descontados em sua conta bancária, a título da tarifa denominada “CESTA B. EXPRESS 4”, Encargos Limite Cartão de Crédito e IOF, bem como o pagamento em dobro dos descontos ditos indevidos (art. 42, parágrafo único do CDC), danos morais indenizáveis no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) e o pagamento das custas e honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) do valor da condenação, todos com as devidas atualizações – juros e correção monetária, como inclusive relatado.

Registre-se que, em sede de contrarrazões (ID nº 19494112), a autora recorrente alegou o Princípio da dialeticidade no recurso do Banco Bradesco, não sendo vislumbrado, porém, no caso sob análise, ficando claro a sua irresignação.

Essa é a lição contida na obra abaixo mencionada:

“A motivação fática e jurídica do apelo deve constar expressamente das razões do recurso que são apresentadas ao tribunal, sob pena de indeferimento liminar do seu processamento em Juízo a quo ou não-conhecimento da apelação pelo Juízo ad quem. Trata-se, portanto, de elemento formal indispensável à admissibilidade do recurso, que não pode ser substituído por simples remissões às razões constantes na petição inicial, contestação, ou outra peça processual. Sem saber exatamente porque o recorrente se inconforma com a sentença proferida, não é possível ao tribunal apreciar a correção ou justiça da decisão atacada, de sorte que o não-conhecimento nesses casos é de rigor (a motivação está para o recurso como a causa de pretendida para a inicial ou como fundamento está para a sentença)”. (Código de Processo Civil Interpretado e Anotado, Barueri, SP: Monde, 2007, p. 959).

Insta consignar, de imediato, que se aplicam ao caso os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor, inclusive quanto à responsabilidade objetiva, não sendo cabível averiguar a existência ou não de culpa por parte do fornecedor de serviços, de acordo com o que dispõe o artigo 14 do referido diploma.

Sendo assim, a instituição financeira responde pelos prejuízos gerados por seus atos, consubstanciados na teoria do risco do empreendimento, devendo sofrer as obrigações decorrentes da operação, independentemente de culpa. Além disso, é também cediço que essa espécie de relação processual impõe, como regra, a inversão do ônus probatório, nos termos do artigo 6º, inciso VIII, do CDC.

Compulsando o caderno processual, verifica-se que a recorrente alega ter aberto uma conta junto à instituição financeira em questão a fim de receber tão somente os valores de sua pensão, não tendo solicitado os serviços correspondentes à cobrança da tarifa “CESTA B. EXPRESS 4” e nem utilizado serviços que comportassem os descontos referentes aos Encargos de Limite de Crédito e IOF, sendo este último um tributo federal que incide sobre as operações financeiras.

Por sua vez, no decorrer da instrução processual, o Banco Bradesco S/A limitou-se a sustentar a regularidade da cobrança, de acordo com a Resolução do BACEN, que na abertura da conta Antônia Raimunda de Souza assinou contrato anuindo os demais serviços, não tendo, contudo, acostado cópia do contrato ou qualquer outro documento constando a anuência da autora em relação as taxas dos serviços cobrados. Ao revés, apesar de realizar descontos nos proventos da autora referente às tarifas acima nominadas, não logrando êxito sequer em especificar a quais serviços correspondem a cobrança desses encargos e se, de fato, teriam sido efetivamente disponibilizados e utilizados pela consumidora. Alegando também que a única conta isenta de tarifação é a conta salário, só tendo a função débito, não sendo a espécie sob análise.

Dessa forma, não cumpriu a instituição financeira o ônus que lhe cabia, nos termos do artigo 373, inciso II, do CPC.

Nesse diapasão, a ausência de demonstração clara a consumidora acerca dos valores que seriam descontados em sua conta corrente reforça a tese autoral de ofensa ao dever de informação e ao princípio da boa-fé contratual, restando configurada, por conseguinte, a falha na prestação de serviço ante a ausência de comprovação da devida contratação que pudesse ensejar a cobrança das taxas e tarifas ora discutidas.

Logo, a cobrança desarrazoada de serviços bancários e desconto automático na conta corrente ferem o princípio da boa-fé objetiva, além de consistir em vedação legal, pelo que não há que se falar que teria a instituição financeira agido em exercício...

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