Acórdão Nº 08006295720198205137 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 2ª Turma Recursal Temporária, 19-02-2021

Data de Julgamento19 Fevereiro 2021
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08006295720198205137
Órgão2ª Turma Recursal Temporária
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0800629-57.2019.8.20.5137
Polo ativo
CORINA AMELIA
Advogado(s): ADEILSON FERREIRA DE ANDRADE, MANOEL PAIXAO NETO
Polo passivo
BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA
Advogado(s): MARCOS DELLI RIBEIRO RODRIGUES

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

PRIMEIRA TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

RECURSO CÍVEL VIRTUAL Nº 0800629-57.2019.8.20.5137

RECORRENTE: CORINA AMÉLIA

ADVOGADO: ADEÍLSON FERREIRA DE ANDRADE

RECORRIDO: BANCO MERCANTIL DO BRASIL S/A

ADVOGADO: MARCOS DELLI RIBEIRO RODRIGUES

RELATOR: JUIZ ANDREO ALEKSANDRO NOBRE MARQUES

RELATOR PARA ACÓRDÃO: JOSÉ MARIA NASCIMENTO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER C/C DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO CARTÃO CONSIGNADO COM DESCONTOS NO CONTRACHEQUE. INTENÇÃO DE CONTRATAR MODALIDADE CONSIGNADO TRADICIONAL. CONSUMIDOR INDUZIDO A ERRO. DESCONTOS PARA PAGAMENTO DE VALOR MÍNIMO DE FATURA DE CARTÃO DE CRÉDITO. DESCUMPRIMENTO ARTS 4º, INCISO III; 6º, INCISO III, ART. 31, ART. 39 E ART. 52 DO CDC, ART. 422 DO CCB E ART. 21-A DA INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES Nº 28/08, COM AS ALTERAÇÕES DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 100 /PRES/INSS, DE 28/12/2018. ABALO FINANCEIRO E EMOCIONAL NARRADO. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ CONTRATUAL. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO E TRANSPARÊNCIA NA CONTRATAÇÃO. ONEROSIDADE EXCESSIVA. NULIDADE. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS, ABATIDA A QUANTIA RECEBIDA. RECONHECIMENTO DO DANO MORAL E CONSEQUENTE DEVER DE INDENIZAR. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

DECIDEM os Juízes que integram a Turma Recursal Provisória dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer e, por maioria de votos, pelo conhecimento e provimento do recurso, para acolher, em parte, na forma do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, os pedidos formulados na inicial e nas razões do recurso para declarar a nulidade da contratação de cartão de crédito com RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC); impor à parte recorrida a obrigação de cessar imediatamente o desconto de R$ 48,90 (quarenta e oito reais e noventa centavos) no benefício do(a) autor(a) referente a contratação do cartão acima mencionado, sob pena de multa correspondente a 04 vezes o valor descontado; restituir em dobro todos os valores indevidamente consignados(pagos), e os que ainda forem pagos no curso da ação, devendo ser acrescido de correção monetária e juros legais e deduzido o valor recebido pela recorrente, não podendo ser considerado amostra grátis; bem como pagar a título de compensação por Danos Morais o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) com juros e correção da data deste julgamento, deduzindo-se o valor do empréstimo, com o retorno ao status quo ante. Sem custas e honorários advocatícios. Vencido o Juiz Relator que conhecia e negava provimento ao recurso interposto, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos.

Natal/RN, 09 de fevereiro de 2021.

José Maria Nascimento

Juiz relator para acórdão

RELATÓRIO

Trata-se de demanda de anulação de negócio jurídico c/c ressarcimento por danos morais e materiais, sob a alegação de erro na modalidade de contratação.

A sentença julgou improcedentes os pedidos.

Irresignada, a autora CORINA AMELIA interpôs Recurso Inominado visando a parcial reforma da decisão de primeiro grau.


Em suas razões recursais, a recorrente aduziu, em resumo, que fora induzido a erro, acreditando estar celebrando um contrato de empréstimo consignado, o qual prevê juros reduzidos e número de parcelas predeterminadas, mas acabou contratando um empréstimo de cartão de crédito, com juros altos, cuja parcela mensal não amortiza o saldo devedor do empréstimo, eternizando as mensalidades enquanto não pagar de uma vez o valor integral. Que o recorrido não enviou faturas ao endereço do autor. Que o contrato é nulo e fere a obrigatoriedade de informação.


Finalizou requerendo o provimento do presente recurso para reformar a decisão guerreada, acolhendo os pleitos iniciais.


Contrarrazões pela manutenção da sentença.


É o breve relatório.

18 RI 0800629-57.2019.8.20.5137

CORINA AMELIA X BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA

VOTO DIVERGENTE

Chamo atenção, inicialmente, para o fato de que não foram juntadas faturas que registre alguma utilização de CARTÃO DE CRÉDITO, o que corrobora sua alegação de que não teve a intenção de contratar cartão nesta modalidade e sim um empréstimo consignado comum, bem menos oneroso do que a modalidade “empurrada” à demandante.

O contrato não obedeceu às formalidades legais, notadamente a norma administrativa do INSS, que tem aplicação obrigatória ao presente caso, visto que se trata de consignação junto àquele Instituto de Previdência, além de descumprimento de acordo formalizado em AÇÃO CIVÍL PÚBLICA.

À propósito, na pauta da Sessão da Turma Recursal Provisória desta semana (Plenário Virtual de 02 a 08.02.21), acompanhei o eminente Relator do Recurso 0800814-56.2019.8.20.5150, no seu entendimento sobre a declaração da nulidade do contrato, deste tipo, com a restituição ao status quo ante, acrescentando aos seus fundamentos que, naquele caso, como neste, o Contrato juntado também não obedeceu ao art. 21-A da INSTRUÇÃO NORMATIVA INSS/PRES Nº 28, DE 16 DE MAIO DE 2008, alterada pela Instrução Normativa nº 100 /PRES/INSS, de 28/12/2018), notadamente quanto à obrigação de, nos termos da decisão homologatória de acordo firmado na Ação Civil Pública nº 0106890-28.2015.4.01.3700, ser acompanhado de Termo de Consentimento Esclarecido – TCE, que constará de página única, reservada exclusivamente para tal documento, constituindo-se instrumento apartado de outros que formalizem a contratação do Cartão de Crédito Consignado, e não cumpre o previsto no inciso I, da referida norma, não contendo a expressão "TERMO DE CONSENTIMENTO ESCLARECIDO DO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO", inserida na parte superior do documento e com fonte em tamanho quatorze; além de outros requisitos nela previstos.

Acrescentei, ainda, que da JUSTIFICAÇÃO ao PROJETO DE LEI N.º 1.106, DE 2019 (do Sr. Deputado Baleia Rossi), em tramitação no Congresso Nacional, consta:

As regras e procedimentos aplicáveis aos empréstimos consignados de aposentados e pensionistas da Previdência Social estão previstas na Instrução Normativa INSS/PRES nº 28, de 16 de maio de 2008.A alteração mais recente da citada norma foi realizada pela Instrução Normativa INSS/PRES nº 100, de 28 de dezembro de 2018,com o principal objetivo de tornar mais rígido o controle sobre essa modalidade de crédito, para combater fraudes e assédio comercial indevido por parte de bancos e financeiras, em desfavor dos segurados da previdência.” (grifei)

Independente da questão acima, tenho considerado invalido os contratos celebrados com aposentados de baixa renda, declarados analfabetos ou com baixa instrução e que não tem experiência e conhecimento em contratos complexos como este. Além disso, é comum no momento da assinatura de um contrato de abertura de conta, por exemplo, ser solicitada a assinatura em dezenas de folhas, nas quais dificilmente os consumidores mais letrados leem tudo.

Entendo que quando se trata de aposentados do INSS, notadamente aqueles que residem na zona rural e/ou com baixa renda e baixa instrução, considerando a complexidade do contrato em questão e quando há o descumprimento do art.21-A da Instrução Normativa INSS/PRES acima mencionada, deve ser feita uma DISTINÇÃO na aplicação da Súmula 36 da TUJ-RN, que dispõe sobre a questão de uma forma genérica e que venho adotando em casos de servidores públicos que possuem um maior grau de instrução e mais experiência em contratos.

Para reforço desse entendimento, transcrevo os fundamentos do voto aprovado em junho do ano passado, há menos de um 1 ano, pela então 3ª Turma Recursal deste Estado, no Recurso 0800561-10.2019.8.20.5137, que retrata muito bem essa situação:

[…] O cartão de crédito consignado é um produto de crédito híbrido. Trata-se de modalidade de cartão de crédito cujo pagamento ocorre parte por meio de desconto em folha de pagamento e parte (saldo devedor remanescente) por meio de pagamento do boleto na data de vencimento da fatura.

Os principais contornos jurídicos do produto estão dispostos na citada Lei nº 10.820/2003, com as alterações promovidas pela Lei nº 13.172/2015, tais quais a fixação da margem exclusiva de 5% (cinco por cento) destinada para a amortização de despesas contraídas por meio do cartão de crédito ou para a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito, como assinalado acima.Esta margem tem sua disponibilização garantida mesmo a quem já comprometeu toda a margem para empréstimo consignado, correspondente a 30% da remuneração líquida.

Vislumbra-se, pois, que o público-alvo do cartão de crédito consignado cuida, indubitavelmente, de parcela de população à beira do superendividamento, sendo razoável presumir a preferência do consumidor minimamente esclarecido pelo empréstimo consignado em sua configuração tradicional. Conforme relatórios semanais do Banco Central do Brasil – BCB[1], as taxas de juros praticadas para mútuo consignado típico podem ser até quatro vezes menores que aquelas normalmente fixadas nos contratos de cartão de crédito consignado.

O cartão de crédito é, por conseguinte, produto que atende a uma necessidade específica de parcela importante da população, implementando melhoria financeira considerável àquele que realiza a reestruturação de dívidas – em linha com o artigo 4º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC). Segundo o Relatório de Economia Básica de 2018 do BCB[2], verifica-se que os tomadores de baixa renda – inferior a três...

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