Acórdão Nº 08006760320208205135 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 06-06-2023

Data de Julgamento06 Junho 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08006760320208205135
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800676-03.2020.8.20.5135
Polo ativo
MARIA DO CEU
Advogado(s): ANA GEORGIA NUNES DE MESQUITA
Polo passivo
BANCO BRADESCO S/A
Advogado(s): ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gab. Des. Vivaldo Pinheiro na Câmara Cível


APELAÇÃO CÍVEL Nº 0800676-03.2020.8.20.5135.

Origem: Vara Única de Almino Afonso/RN.

Apte/Apda: Maria do Céu

Advogado(a): Ana Geórgia Nunes de Mesquita. (OAB/RN 16.703).

Apte/Apdo: Banco Bradesco S/A.

Advogado(a) Antônio Morais Dourado Neto (OAB/PE 23.255) e outros.

Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. DUPLO APELO. DESCONTOS INDEVIDOS NO BENEFÍCIO DA PARTE DEMANDANTE. COBRANÇA DE TARIFA BANCÁRIA DENOMINADA “CESTA B. EXPRESSO 01”. ALEGATIVA DE CONTA CORRENTE DESTINADA AO RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. SEM PRÉVIA CONTRATAÇÃO E/OU AUTORIZAÇÃO. ILEGALIDADE RECONHECIDA, COM DETERMINAÇÃO DE RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES INDEVIDAMENTE DESCONTADOS. INCONFORMISMO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. PLEITOS DE RECONHECIMENTO DA LEGALIDADE DA COBRANÇA E DE INOCORRÊNCIA DO DANO MORAL. NÃO ACOLHIMENTO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PROVIDO. PARTE RÉ CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso da parte autora, e conhecer negar provimento ao apelo da parte ré, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

Tratam-se de Apelações Cíveis interpostas por Maria do Céu e Banco Bradesco S/A., em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única de Almino Afonso/RN que, nos autos da nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Danos Morais nº 0800676-03.2020.8.20.5135, julgou parcialmente procedente os pedidos autorais, nos seguintes termos:

“Ante o exposto, e considerando tudo o mais que dos autos consta, REJEITO AS PRELIMINARES ARGUIDAS e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, e assim o faço com resolução do mérito, a teor do art. 487, I, do CPC, para: i) Declarar a inexistência da relação jurídica que originou os descontos efetivados na conta bancária da parte autora (conta bancária nº 0680726-7/agência 5894), a título de tarifa bancária (Cesta B. Expresso1), bem como declarar a inexigibilidade dos descontos, com o cancelamento das respectivas cobranças, sem qualquer ônus para o consumidor/autor; ii) Condenar o BANCO BRADESCO S.A, parte requerida, à restituição em dobro dos valores descontados indevidamente da conta bancária da parte autora (conta bancária nº 0680726-7/agência 5894), referentes à tarifa bancária (Cesta B. Expresso1), acrescidos de correção monetária pelo INPC, contada a partir da cobrança indevida e dos juros legais de 1% ao mês, desde a citação cujo valor será aferido na fase de cumprimento de sentença. Em razão da sucumbência mínima, condeno a parte ré ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários contratuais advocatícios, estes fixados em R$ 700,00 (setecentos reais), por apreciação equitativa, especialmente considerando tratar-se de causa repetitiva e de baixa complexidade (art. 85, §§ 2° e 8°, CPC). (...)”

Em sede de apelo (Id. 17945617), a Autora defende, em síntese, a reforma da sentença para que haja a restituição em dobro das tarifas bancárias debitadas indevidamente na conta salário e a condenação do apelado ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)

Ao final, requer o conhecimento e provimento do apelo, para julgar procedentes os pedidos iniciais e a condenação em honorários advocatícios sucumbenciais em 20% (vinte por cento) da condenação.

Por sua vez, o banco réu recorre (Id. 17945871), aduz, em sede de preliminar que houve cerceamento de defesa, merecendo ser anulada a sentença, pois não observou a juntada com a apresentação do contrato válido nos autos “já em sede de contestação” (Id. 17945871 - Pág. 4).

No mérito, afirma, resumidamente que os descontos efetivados no benefício previdenciário da parte recorrida se referem a uma tarifa bancária por ela contratada; discorre sobre o exercício regular de um direito, sendo a cobrança devida, o que impossibilita a devolução dos valores ou o reconhecimento de ato ilícito.

Requer, ao final, o conhecimento e provimento do recurso, com acolhimento da preliminar suscitada e no mérito que a ação seja julgada totalmente improcedente.

Contrarrazões ofertadas pelas partes litigantes, junto aos Ids 17945878 e 17945880.

A 17ª Procuradoria de Justiça declinou de sua intervenção (Id. 18832325).

É o relatório.

VOTO

I - PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA

O segundo apelante Banco Brasdeco S.A., arguiu em sede de preliminar de cerceamento de defesa, alegando que a sentença deve ser anulada por não ter sido observada a juntada aos autos do contrato válido “já em sede de contestação” (Id. 17945871 - Pág. 4).

Da análise dos autos, de logo rejeito a preliminar, tendo em vista que no presente caso não houve a juntada do aludido contrato, nem em contestação e nem os autos, uma vez que sequer foi pactuado contrato com a autora a aquisição de pacote de tarifa “Cesta B. Expresso1”.

Portanto, rejeito essa preliminar e passo a apreciação do mérito.

II - MÉRITO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos apelos interpostos.

O apelo interposto pela autora pretende reformar a sentença proferida no que pertine à restituição em dobro das tarifas bancárias debitadas indevidamente na conta salário e a condenação do apelado ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Por outro lado, o recurso da parte ré busca a total improcedência da demanda.

Por economia processual, examino simultaneamente as insurgências recursais.

Ab initio, faz-se mister destacar que ao caso em tela aplicam-se os dispositivos emanados do Código de Defesa do Consumidor, haja vista que a relação jurídico-material estabelecida entre as partes litigantes é dotada de caráter de consumo.

Importa destacar que, hodiernamente, não têm sido suscitadas grandes dúvidas acerca da possibilidade de as regras consumeristas aos contratos de natureza bancária e financeira, notadamente considerando o disposto no art. 3º, § 2º, de tal base normativa, ao preceituar in verbis:

“Art. 3º. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

(...)

§ 2º. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.

Como cediço, via de regra, cabe a quem ingressa com uma demanda judicial detém o ônus de provar suas alegações. Todavia, tratando-se de relação de consumo, como no caso em tela, existe a possibilidade da inversão desse ônus em favor do consumidor, quando verossímil sua alegação ou em caso de hipossuficiência, conforme estabelece o art. 6º, VIII do CDC, ou seja, pode-se transferir para o fornecedor a obrigação de provar que não lesou o consumidor.

Estabelecidas tais premissas e analisando a hipótese cotejada, verifico que a parte autora, ora apelante, anexou extratos bancários que demonstram a existência dos descontos alusivos aos encargos questionados, com a cobrança de tarifa bancária denominada “Cesta B. Expresso 01 (Id. 17945585 - Pág. 1).

Doutra banda, observo que o banco Demandado, ao contestar os pedidos autorais, alegou que a cobrança da tarifa de cesta básica é devida, pois havia sido devidamente contratada a aquisição da tarifa questionada, juntando vários extratos da aludida conta corrente, conforme se vê dos Ids. 17945604 - Pág. 1 a 15; em que tenha havido a juntada do contrato.

Logo, premente reconhecer a ilegalidade da cobrança da tarifa bancária, pois a movimentação verificada nos extratos acostados dão conta de que realmente a conta era utilizada apenas para recebimento dos proventos oriundos da aposentadoria, embora esteja, tal conta, caracterizada como conta corrente.

Referente a matéria discutida nos autos, a Resolução do Banco Central do Brasil nº 3.402 veda a cobrança de qualquer tarifa bancária em contas destinadas, unicamente a receber salários, proventos, soldos, vencimentos, aposentadorias e similares, consoante dispositivos que transcrevo:

Art. 1ºA partir de 2 de abril de 2007, as instituições financeiras, na prestação de serviços de pagamento de salários, proventos, soldos, vencimentos, aposentadorias, pensões e similares, ficam obrigadas a proceder aos respectivos créditos em nome dos beneficiários mediante utilização de contas não movimentáveis por cheques destinadas ao registro e controle do fluxo de recursos, às quais não se aplicam as disposições da Resolução 2.025, de 24 de novembro de 1993, com as alterações introduzidas pelas Resoluções 2.747,de 28 de junho de 2000, e 2.953, de 25 de abril de 2002,nemda Resolução 3.211, de 30 de junho de 2004.

Parágrafo único. É vedada a abertura das contas de registro de que trata este artigo tendo como titulares pessoas jurídicas.

Art. 2º Na prestação de serviços nos termos do art. 1º:

I - é vedado à instituição financeira contratada cobrar dos beneficiários, a qualquer título, tarifas destinadas ao ressarcimento pela realização dos serviços, devendo ser observadas, além das condições previstas nesta resolução, a legislação específica referente a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT