Acórdão Nº 08007610620238205160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 29-02-2024

Data de Julgamento29 Fevereiro 2024
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08007610620238205160
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800761-06.2023.8.20.5160
Polo ativo
JOAO BATISTA DA SILVA
Advogado(s): FRANCISCO CANINDE JACOME DA SILVA SEGUNDO
Polo passivo
BANCO BRADESCO S/A
Advogado(s): FELIPE D AGUIAR ROCHA FERREIRA

APELAÇÃO CÍVEL 0800761-06.2023.8.20.5160

APELANTE/APELADO: Banco Bradesco S/A

Advogados: Carlos Eduardo Cavalcante Ramos (OAB/RN 1216-A) e Felipe D`Aguiar Rocha Ferreira (OAB/BA 68.751)

APELANTE/APELADO: João Batista da Silva

Advogados: Francisco Canindé Jácome Segundo (OAB/RN 18.865)

RELATORA: Desembargadora Maria de Lourdes Azevêdo

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C DANOS MORAIS E MATERIAIS. PROCEDÊNCIA PARCIAL. APELAÇÃO CÍVEL PROPOSTA: I – PELO RÉU OBJETIVANDO O AFASTAMENTO DO DANO MORAL E, SUBSIDIARIAMENTE, A REDUÇÃO DO SEU VALOR; E II – PELO AUTOR BUSCANDO A MAJORAÇÃO DO REFERIDO QUANTUM. ILEGALIDADE DA COBRANÇA SOB A RUBRICA DE TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO, SEM PROVA DA CIÊNCIA/ANUÊNCIA DO CONSUMIDOR. DESCONTO, APESAR DE ÚNICO, CAUSADOR DE PREJUÍZO EXTRAPATRIMONIAL PELAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO (AUTOR IDOSO, APOSENTADO, HIPOSSUFICIENTE, NÃO ALFABETIZADO, QUE RESIDE NO INTERIOR DO ESTADO POTIGUAR – UPANEMAE SOFREU COBRANÇA DE R$ 500,00, VALOR PRÓXIMO DA METADE DE SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO). DANO MORAL MANTIDO. FIXAÇÃO NA SENTENÇA EM R$ 1.000,00, CUJO MONTANTE NÃO MERECE REDUÇÃO, COMO PLEITEIA O RÉU, MAS AUMENTO, MAS NÃO PARA O PARÂMETRO VINDICADO PELO DEMANDANTE (R$ 8.000,00), E SIM PARA R$ 2.000,00, EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE RECURSOS CONHECIDOS, SENDO DESPROVIDO O DO RÉU E PROVIDO EM PARTE O DO AUTOR.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos e sem parecer ministerial, em conhecer de ambos os recursos para desprover o do réu e prover em parte o do autor, nos termos do voto da relatora.

RELATÓRIO

João Batista da Silva ajuizou Ação Ordinária nº 0800761-06.2023.8.20.5160 contra o Banco Bradesco S/A.

Ao decidir a causa, o MM. Juiz da Vara Única da Comarca de Upanema/RN julgou-a parcialmente procedente, nos seguintes termos:

a) declarou a nulidade das cobranças relativas ao contrato de seguro intitulo “TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO”, devendo o réu fazer cessar os descontos vindouros na conta bancária do autor, no prazo de 10 (dez) dias, a contar da intimação da presente sentença, sob pena de incidência de multa por descumprimento de ordem judicial;

b) condenou o requerido a restituir em dobro o valor de R$ 500,00 (quinhentos reais) cobrado indevidamente sob a rubrica de Título de Capitalização, em julho/19, com correção monetária pelo INPC, a partir do efetivo prejuízo, além de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação válida;

c) obrigou-o a pagar R$ 1.000,00 (mil reais) a título de danos morais, corrigido monetariamente pelo INPC e com juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, ambos desde o arbitramento.

Ao final, impôs ao vencido, também, o dever de arcar com as custas processuais e honorários sucumbenciais, estes à razão de 10% (dez por cento) do valor da condenação (Id 22503010, págs. 01/08).

Inconformados, autor e réu interpuseram apelação cível.

O primeiro reiterou o pedido de justiça gratuita, pugnou pela majoração dos danos morais para R$ 8.000,00 (oito mil reais) sob a justificativa de que, “no caso dos autos, restou evidenciado o descaso da empresa recorrida e não solucionar o impasse, o que gerou a cobrança dos descontos indevidos em seu benefício previdenciário durante muitos meses”, além da demora injustificada para resolver o impasse e consequente perda de tempo útil do consumidor (Id 22503014, págs. 01/07).

Sem recolhimento de preparo por se tratar, o recorrente, de beneficiário da justiça gratuita.

A financeira, por sua vez, disse não haver prova do dano moral, devendo ser afastada sua condenação em indenização extrapatrimonial.

Subsidiariamente, pugnou pela redução do dano moral (Id 22503016, págs. 01/07).

O preparo foi recolhido (Id 22503017, págs. 01/02).

Intimados para apresentar contrarrazões, somente o autor manifestou-se nos autos pleiteando o desprovimento do recurso formulado pela parte adversa (Id 22503270).

Sem parecer ministerial.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço das apelações cíveis formulados tanto pelo autor, quanto pelo réu, deixando o registro, por oportuno, que fica mantido o benefício da justiça gratuita deferido ao consumidor pelo juízo de origem, eis que, uma vez concedida a gratuidade da justiça, tal benesse conserva-se em todas as instâncias e para todos os atos do processo, salvo se expressamente revogada[1].

A questão de mérito é de fácil resolução eis que João Batista da Silva propôs ação judicial após observar desconto no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais), realizado em 09.07.19 em sua conta corrente, referente a título de capitalização (Id 22502998), cujo produto alega não ter solicitado e autorizado.

O banco, por sua vez, ao contestar o feito, defendeu a regularidade na contratação, mas sem apresentar qualquer documento que comprovasse a ciência e consentimento do consumidor, idoso e analfabeto, com a cobrança realizada, logo, não há dúvida quanto à ilegalidade da contratação, conforme precedentes assim ementados:

EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E REPETIÇÃO DO INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS POR COBRANÇA INDEVIDA, COM TUTELA ANTECIPADA. COBRANÇA DE TARIFA REFERENTE A TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO. CONTRATAÇÃO QUE NÃO RESTOU EFETIVAMENTE DEMONSTRADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. AUSÊNCIA DE JUNTADA DO RESPECTIVO INSTRUMENTO CONTRATUAL. IRREGULARIDADE DA COBRANÇA CONFIGURADA. (...) APELO DA PARTE CONSUMIDORA CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE E CONHECIDO E DESPROVIDO O DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA.

(Apelação Cível 0801575-92.2023.8.20.5103, Relatora: Desª. Lourdes de Azevedo, 2ª Câmara Cível, julgado em 24/11/2023, publicado em 29/11/2023)

EMENTA: DIREITOS DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE COBRANÇA INDEVIDA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. PROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. APELAÇÕES. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO TRIENAL. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO ART. 27 DO CDC. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. NÃO OCORRÊNCIA. DESCONTO INDEVIDO EM CONTA CORRENTE. TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO. SERVIÇO NÃO CONTRATADO. OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. QUEBRA DA BOA-FÉ OBJETIVA. APLICABILIDADE DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO DO CDC. DESCONTO DE ÚNICO VALOR ANUAL (R$ 200,00). RENDA NÃO AFETADA. SUBSISTÊNCIA NÃO PREJUDICADA. ABALO EMOCIONAL NÃO CARACTERIZADO. DANO NÃO OCORRENTE. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. PREJUDICADO O APELO DA PARTE AUTORA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA CARACTERIZADA.

(Apelação Cível 0800946-81.2022.8.20.5159, Relator: Des. Ibanez Monteiro, 2ª Câmara Cível, julgado em 27/10/2023, publicado em 31/10/2023)

Resta analisar, todavia, se a conduta perpetrada pelo banco, qual seja, cobrança de valor referente a produto não contratado pelo correntista, é suficiente para reconhecer a ocorrência de dano moral ao autor e, em caso afirmativo, se o valor arbitrado na sentença (R$ 1.000,00) deve ser majorado, como pede o autor (para R$ 8.000,00), ou reduzido, conforme pleiteia o réu.

Pois bem. No caso concreto, João Batista da Silva afirmou na inicial que “ao verificar seus extratos bancários de sua aposentadoria, constatou que a parte Demandada lhe cobrou um desconto denominado de “TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO” (Id 22502994, pág. 02 precisamente).

Asseverou, também, que “o valor descontado representou um decréscimo em seu benefício previdenciário, que se trata de verba alimentar, e que se encontra com dívidas a pagar, trazendo uma sensação de apreensão e desamparo, em face do inevitável constrangimento do mesmo frente aos seus credores e da angústia de não poder pagar os respectivos compromissos” (Id 22502994, pág. 04).

Nas razões recursais, todavia, disse que a cobrança foi realizada “durante muitos meses” e que houve demora injustificada para resolver o impasse e consequente perda de tempo útil (Id 22503014, págs. 05/06).

Analisando-se o feito, observa-se que, consoante destacado pelo julgador de primeira instância, “conforme se extrai dos extratos bancários juntados à exordial (ID nº 101293566), restou comprovado 01 (UM) desconto no mês de Julho de 2019, no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais)”.

Ocorre que apesar de o consumidor ter sofrido um único abatimento em sua conta corrente, o que acarretaria, a princípio, mero aborrecimento, conforme recentes julgados da 2ª Câmara Cível, algumas particularidades devem ser consideradas no caso concreto:

a) o autor é idoso, hipossuficiente, não alfabetizado e reside no Sítio Carão, na cidade de Upanema, interior do Estado Potiguar, conforme instrumento procuratório;

b) a tarifa cobrada foi de R$ 500,00 (quinhentos reais), cuja importância aproxima-se da quantia que o promovente recebe mensalmente a título de benefício previdenciário, pouco superior a R$ 1.000,00 (mil reais).

Nesse cenário, conclui-se que a cobrança, nos moldes acima, seguramente gerou no animus do consumidor uma angústia, insatisfação e abalo psicológico e, consequentemente, dificuldade ao demandante para arcar com seus compromissos, como ele defende.

Logo, não restando caracterizado o mero aborrecimento, especialmente por se tratar de exigência de quantia expressiva que afetou significativamente a renda do suplicante, a condenação do Banco Bradesco S/A em danos morais, reconhecida na sentença, deve ser mantida.

Quanto ao valor definido pelo juízo de origem, qual seja, R$ 1.000,00 (mil reais), a financeira pede que ele seja reduzido, ao passo que o consumidor pretende ...

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