Acórdão Nº 08007662820238205160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 14-11-2023
Data de Julgamento | 14 Novembro 2023 |
Classe processual | RECURSO INOMINADO CÍVEL |
Número do processo | 08007662820238205160 |
Órgão | 3ª Turma Recursal |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL
Processo: | RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0800766-28.2023.8.20.5160 |
Polo ativo |
JYSRAEL WAGNER DA SILVA DANTAS |
Advogado(s): | JOSE INACIO DA COSTA SOBRINHO, ALUIZIO DELMIRO DA COSTA JUNIOR |
Polo passivo |
EMBRACON ADMINISTRADORA DE CONSORCIO LTDA |
Advogado(s): | RUI NOGUEIRA PAES CAMINHA BARBOSA |
RECURSO CÍVEL INOMINADO Nº 0800766-28.2023.8.20.5160
ORIGEM: JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE UPANEMA/RN
RECORRENTE(S): JYSRAEL WAGNER DA SILVA DANTAS
ADVOGADO: JOSE INACIO DA COSTA SOBRINHO - OAB RN13186-A E ALUIZIO DELMIRO DA COSTA JUNIOR - OAB RN14872-A
RECORRENTE(S): EMBRACON ADMINISTRADORA DE CONSORCIO LTDA
adVOGADO: RUI NOGUEIRA PAES CAMINHA BARBOSA - OAB SP274876-A
JUIZ RELATOR: CLEANTO ALVES PANTALEÃO FILHO
EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CONSÓRCIO. RETENÇÃO DE VALORES. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO. IRRESIGNAÇÃO DA PARTE AUTORA QUANTO A RESTITUIÇÃO DO FUNDO DE RESERVA E TAXA DE ADMINISTRAÇÃO PROPORCIONAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
Acórdão
DECIDEM os Juízes que integram a Terceira Turma Recursal Permanente dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos. Na oportunidade, condenada a recorrente em custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação – considerando o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço –, que ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade nos termos do §3º do art. 98 do CPC.
Natal/RN, 07 de novembro de 2023.
Cleanto Alves Pantaleão Filho
Juiz Relator
RELATÓRIO
SENTENÇA
I – Do Relatório.
Vistos etc.
JYSRAEL WAGNER DA SILVA, já qualificado nos autos, através de advogado, ingressou com AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO c/c DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS ABUSIVAS E RESSARCIMENTO DE CRÉDITO em desfavor da empresa EMBRACON ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA., também qualificada, alegando, em síntese, que:
a) em 03/10/2018 firmou com a parte demandada contrato de consórcio nº 3226695, para percepção de uma carta de crédito no montante de R$ 270.000,00, com valor de adesão na monta de R$ 2.700,00 (dois mil e setecentos reais), mais 70 parcelas de cerca de R$ 4.226,85 (quatro mil duzentos e vinte e seis reais e oitenta e cinco centavos), para compra de um imóvel;
b) em dezembro de 2019, resolveu rescindir o negócio, por não ter mais interesse no contrato celebrado, entrando em contato com a demandada que o autor receberia o valor de R$ 19.265,22;
c) mesmo tendo desembolsado a quantia de R$ 55.958,17 (cinquenta e cinco mil novecentos e cinquenta e oito reais e dezessete centavos), a parte ré devolveu somente cerca 30% do que foi investido no negócio;
d) inconformado com a situação e considerando a enorme discrepância entre a quantia investida e a quantia efetivamente devolvida, diligenciou junto à demandada para obter esclarecimentos, sendo informado que não receberia o valor integralmente em razão dos descontos relativos taxa de administração (20%), fundo de reserva (2%), cláusula penal (20%) e multa (10%);
e) a parte demandada incorreu em práticas abusivas consistentes na cobrança de multas indenizatórias em duplicidade;
f) falta amparo jurídico para a restituição dos valores pagos somente no encerramento do consórcio;
g) ao desistir do contrato, não causou qualquer prejuízo à demandada, uma vez que a substituição de consorciados se dá a todo o momento com a adesão de novos membros a grupos que inclusive estão em andamento, além de transferência de cotas a terceiros;
h) mesmo ocorrendo a desistência do contrato de consórcio, a cobrança da cláusula penal apenas é justificada na hipótese de comprovação do prejuízo causado pela saída do consorciado.
Ao final, pleiteou a condenação da parte demandada:
a) a declaração de nulidade das cláusulas penais por cancelamento do contrato e da cláusula que obriga aguardar o encerramento do grupo ou sorteio para receber de volta o valor pago, bem como as que cobra o valor integral da taxa de administração sobre cada parcela, devendo os valores pagos serem restituídos integral e imediatamente e,
b) a devolução de todas as parcelas pagas de forma imediata, devendo serem descontados eventual seguro (se contratado) e a taxa de administração proporcional ao tempo em que o consorciado participou do grupo de consórcio.
Acompanharam a exordial os documentos de ID n.º 101287776 e seguintes.
Audiência de conciliação infrutífera (ID nº 102224701).
Citada, a parte ré apresentou contestação na qual suscitou, em resumo:
a) consorciado deixa de pagar as mensalidades, causa prejuízos para o grupo, uma vez que o valor arrecadado para o fundo fica defasado atrasando os sorteios de contemplação;
b) o Autor deixou de cumprir suas obrigações contratuais, sendo que até o cancelamento houve o pagamento total de R$ 55.958,17, havendo devolução administrativa em 06/12/2019 do valor de R$ 20.765,70;
c) a taxa de administração foi fixada em 20%, não havendo o que se falar em abusividade ou ilegalidade;
d) houve correta aplicação de taxas e multas contratuais, além do fundo de reserva.
Concluiu pugnando pela total improcedência dos pedidos articulados na exordial.
Anexou os documentos de ID n.º 103369989 e seguintes.
A audiência de conciliação restou infrutífera conforme termo em ID n.º 87595976.
Réplica à contestação em ID n.º 103769910, ocasião em que parte autora informou a devolução administrativa da quantia de R$ 20.765,70 e pugnou pelo julgamento antecipado da lide.
As partes informaram em audiência o não ter interesse na produção de outras provas.
É o que importa relatar. Fundamenta-se e decide-se.
De início, impende anotar que a lide em apreço comporta julgamento antecipado, por força do disposto no art. 355, I, do CPC, uma vez que se trata de lide que versa sobre direito disponível e as partes requereram o julgamento antecipado.
II – Do mérito
II.1 - Da Relação de Consumo
É cediço que está caracterizada a relação de consumo quando, de um lado, tem-se o consumidor, que em consonância com o disposto no Código de Defesa do Consumidor, “é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”, e do outro - o fornecedor, conceituado como “toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional e estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.”
Do garimpo dos autos, e albergando-se nos conceitos mencionados, nota-se que a lide em tela tem como esteio uma relação de consumo, na qual figura como consumidor o autor e fornecedora a Embracon – Administradora de Consórcio Ltda.
Nessa esteira, segue-se com a força irresistível dos raciocínios lógicos para considerar plenamente aplicável o Código do Consumidor ao caso sub judice.
II.2 – Dos valores a serem restituídos ao consorciado excluído
III.2.1 – Da multa compensatória
O contrato de participação em grupo de consórcio celebrado entre as partes prevê que a desistência ou exclusão do consorciado caracteriza infração contratual, sujeitando a parte excluída ou desistente ao pagamento de multa compensatória na importância equivalente a 10% (dez por cento) do montante do crédito a ser restituído, em benefício do grupo de consórcio, e de percentual de até 20% (vinte por cento) em benefício da administradora do consórcio (ver ID n.º 103369989, Pág. 25).
Sobre o tema, os artigos 10, § 5º, Lei nº 11.795/2008 e 53, § 2º, do CDC preveem a possibilidade de estipulação de multa destinada ao ressarcimento dos prejuízos que a desistência ou exclusão do consorciado causar ao grupo, nos seguintes termos:
“Art. 10. O contrato de participação em grupo de consórcio, por adesão, é o instrumento plurilateral de natureza associativa cujo escopo é a constituição de fundo pecuniário para as finalidades previstas no art. 2o.
(…)
§ 5o É facultada a estipulação de multa pecuniária em virtude de descumprimento de obrigação contratual, que a parte que lhe der causa pagará à outra.”
"Art. 53. Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado.
(…) § 2º Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação ou a restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá descontada, além da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente ou inadimplente causar ao grupo."
Sendo assim, depreende-se que, à luz da legislação consumerista, a aplicação da penalidade sobre o consorciado desistente depende da prova de que sua saída do consórcio causou efetivo prejuízo à integral consecução dos objetivos do grupo, não se operando automaticamente pela estipulação contratual de perdas e danos pré-estabelecidas.
Nesse sentido, segue julgado do STJ:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CONSTITUTIVA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER. RESTITUIÇÃO DE PARCELAS PAGAS. CONSÓRCIO. CLÁUSULA PENAL. EFETIVO PREJUÍZO. DEMONSTRAÇÃO. AUSÊNCIA. REVISÃO. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. A cobrança da cláusula penal em contrato de consórcio está condicionada à demonstração, pela administradora, de que a saída do consorciado prejudicou o grupo....
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO