Acórdão Nº 08007795320228205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 11-10-2023

Data de Julgamento11 Outubro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08007795320228205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800779-53.2022.8.20.5001
Polo ativo
MUNICIPIO DE NATAL e outros
Advogado(s):
Polo passivo
AUTO ONIBUS SANTA MARIA TRANSPORTES E TURISMO LTDA
Advogado(s): AUGUSTO COSTA MARANHAO VALLE

Apelação Cível nº 0800779-53.2022.8.20.5001

Apelante: Município de Natal

Procuradora: Nair Gomes de Souza Pitombeira (OAB/RN 15.764-B)

Apelada: Auto Ônibus Santa Maria Transportes e Turismo Ltda.

Advogado: Augusto Costa Maranhão Valle (OAB/RN 5.418)

Relatora: Desembargadora Maria de Lourdes Azevêdo

EMENTA: CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. COBRANÇA DE ISS PELO MUNICÍPIO DE NATAL. CONTRATO DE LEASING. SUJEITO ATIVO DA RELAÇÃO JURÍDICA TRIBUTÁRIA. MUNICÍPIO SEDE ADMINISTRATIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, COM PODER DECISÓRIO SOBRE A CONCESSÃO DO FINANCIAMENTO. TEMA 355/STJ. AUSÊNCIA DE COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA DO MUNICÍPIO APELANTE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, deles sendo partes as inicialmente identificadas. Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em turma, à unanimidade de votos, conhecer negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto da relatora, que integra este acórdão.

R E L A T Ó R I O


Apelação Cível interposta pelo Município do Natal em face da sentença proferida pelo Juízo de Direito da 3ª Vara de Execução Fiscal e Tributária da Comarca de Natal que, nos autos dos Embargos à Execução opostos pela empresa Auto Ônibus Santa Maria Transportes e Turismo Ltda, julgou-os procedentes “para DECLARAR a nulidade do Auto de Infração nº 5000008116, objeto da CDA nº 1830787 e, por consequência, DECLARAR EXTINTA a execução fiscal de nº 0809923-95.2015.8.20.5001”. Houve, ainda, condenação do ente municipal ao reembolso das custas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios, fixados, “sucessivamente, em 10% (dez por cento) e 8% (oito por cento) sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 5º, do CPC)”.

Em suas razões (ID 19030547), o recorrente alega que “ficou apontado pela autuação que (i) as filiais possuem esse poder decisório, ao passo que (ii) o Recorrido não se desincumbiu do ônus de elidir a presunção relativa de veracidade da autuação, resumindo-se a tentar atribuir tal ônus para a Fazenda Pública, o que contraria disposição do CPC, muito embora tenha sido acatado pelo juízo de piso”.

Com relação à sua competência para a cobrança do ISS, invoca a aplicação do Tema 355/STJ ao caso, afirmando que “quando da lavratura da autuação restou especificado que as instituições financeiras detinham estrutura administrativa nesta capital”.

Pugna pela inversão do ônus da prova diante da presunção de veracidade dos atos administrativos, bem como da presunção de certeza e liquidez de que se revestem os débitos inscritos na dívida ativa (artigo 3º da Lei de Exeução Fiscal), cabendo ao contribuinte – responsável tributário na forma do artigo 64, inciso XV, do Código Tributário do Município de Natal – a obrigação de demonstrar que os prestadores de serviço com unidades econômicas sediadas em Natal/RN não possuem capacidade decisória para a prática dos seus atos.

Ao final, requer o provimento do apelo a fim de que seja reformada a sentença recorrida, julgando-se improcedente a pretensão contida nos embargos à execução.

A parte apelada apresentou contrarrazões (ID 19030549), oportunidade em que pugnou pelo desprovimento do recurso ou, sucessivamente, “caso se entenda pela competência do Município de Natal para exigir o ISSQN dos contratos de arrendamento mercantil objeto da atuação, pede a manutenção da sentença pela declaração de ilegitimidade passiva do substituto tributário, tendo em vista a recursa do contribuinte do ISSQN (instituição financeira) em permitir a retenção do imposto”.

Instada a se manifestar, a 13ª Procuradoria de Justiça não emitiu pronunciamento de mérito por entender prescindível sua atuação na espécie.

É o relatório.

V O T O


Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do apelo.

A questão trazida em sede recursal limita-se a verificar se o Município de Natal tem competência para exigir o ISS sobre operações que envolvem arrendamento mercantil por ser o local da celebração dos contratos de leasing, ou se a competência arrecadadora desse tributo seria do local onde ocorre a liberação/concessão do referido arrendamento.

Insta ressaltar, por oportuno, que a questão já foi bastante debatida, sendo certo que os argumentos amadureceram desde então, quer na seara jurisprudencial, quer na doutrinária.

Em se tratando de ISS, o "local da prestação do serviço" torna-se primordial para apuração de incidência do tributo no que se refere ao aspecto espacial e, visando elucidar tal aspecto, ressalta-se o que diz a respeito o tributarista Aires F. Barreto:

O local onde estabelecido o usuário do serviço também não tem nenhum relevo, para discernir o local da prestação, do mesmo modo que não se pode tomar, como critério de discernimento, o lugar onde são exercidas algumas atividades que podem ser úteis ou importantes para a prestação dos serviços, mas que, por si sós, não a consumam.

(...)

Para não incorrer em erro na definição do local em que é devido o ISS, é preciso, portanto, ter bem presente não apenas o local do estabelecimento (enquanto conjunto de meios necessários à realização dos serviços), mas a distinção entre atividade-meio e atividade-fim, pois só o perfazimento desta última é que constitui serviço tributável.

(In ISS na Constituição e na Lei. BARRETO, Aires F., 3ª Ed. - São Paulo: Dialética. 2009, p. 331/332).

Como dito anteriormente, a questão desafiou acirrados debates, pelo que o Supremo Tribunal Federal, em mais de uma ocasião, enfrentou a matéria sub judice e assim decidiu sob o regime da repercussão geral (Tema 355):

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. ARRENDAMENTO MERCANTIL. OPERAÇÃO DE LEASING FINANCEIRO. ARTIGO 156, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

O arrendamento mercantil compreende três modalidades, [i] o leasing operacional, [ii] o leasing financeiro e [iii] o chamado lease back. No primeiro caso há locação, nos outros dois, serviço. A lei complementar não define o que é serviço, apenas o declara, para os fins do inciso III do artigo 156 da Constituição. Não o inventa, simplesmente descobre o que é serviço para os efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição. No arrendamento mercantil (leasing financeiro), contrato autônomo que não é misto, o núcleo é o financiamento, não uma prestação de dar. E financiamento é serviço, sobre o qual o ISS pode incidir, resultando irrelevante a existência de uma compra nas hipóteses do leasing financeiro e do lease back. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (grifado).

(RE nº 592.905 - RG, rel Min. Eros Grau, DJe 5/3/2010).

Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça, sob a égide dos recursos repetitivos, também pacificou seu entendimento nos seguintes termos:

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. INCIDÊNCIA DE ISS SOBRE ARRENDAMENTO MERCANTIL FINANCEIRO. QUESTÃO PACIFICADA PELO STF POR OCASIÃO DO JULGAMENTO DO RE 592.905/SC, REL. MIN. EROS GRAU, DJE 05.03.2010. SUJEITO ATIVO DA RELAÇÃO TRIBUTÁRIA NA VIGÊNCIA DO DL 406/68: MUNICÍPIO DA SEDE DO ESTABELECIMENTO PRESTADOR. APÓS A LEI 116/03: LUGAR DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. LEASING. CONTRATO COMPLEXO. A CONCESSÃO DO FINANCIAMENTO É O NÚCLEO DO SERVIÇO NA OPERAÇÃO DE LEASING FINANCEIRO, À LUZ DO ENTENDIMENTO DO STF. O SERVIÇO OCORRE NO LOCAL ONDE SE TOMA A DECISÃO ACERCA DA APROVAÇÃO DO FINANCIAMENTO, ONDE SE CONCENTRA O PODER DECISÓRIO, ONDE SE SITUA A DIREÇÃO GERAL DA INSTITUIÇÃO. O FATO GERADOR NÃO SE CONFUNDE COM A VENDA DO BEM OBJETO DO LEASING FINANCEIRO, JÁ QUE O NÚCLEO DO SERVIÇO PRESTADO É O FINANCIAMENTO. IRRELEVANTE O LOCAL DA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO, DA ENTREGA DO BEM OU DE OUTRAS ATIVIDADES PREPARATÓRIAS E AUXILIARES À PERFECTIBILIZAÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA, A QUAL SÓ OCORRE EFETIVAMENTE COM A APROVAÇÃO DA PROPOSTA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. BASE DE CÁLCULO. PREJUDICADA A ANÁLISE DA ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 148 DO CTN E 9 DO DL 406/68. RECURSO ESPECIAL DE POTENZA LEASING S/A ARRENDAMENTO MERCANTIL PARCIALMENTE PROVIDO PARA JULGAR PROCEDENTES OS EMBARGOS À EXECUÇÃO E RECONHECER A ILEGITIMIDADE ATIVA DO MUNICÍPIO DE TUBARÃO/SC PARA EXIGIR O IMPOSTO. INVERSÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. ACÓRDÃO SUBMETIDO AO PROCEDIMENTO DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO 8/STJ.

1. O colendo STF já afirmou (RE 592905/SC) que ocorre o fato gerador da cobrança do ISS em contrato de arrendamento mercantil. O eminente Ministro EROS GRAU, relator daquele recurso, deixou claro que o fato gerador não se confunde com a venda do bem objeto do leasing financeiro, já que o núcleo do serviço prestado é o financiamento.

2. No contrato de arrendamento mercantil financeiro (Lei 6.099/74 e Resolução 2.309/96 do BACEN), uma empresa especialmente dedicada a essa atividade adquire um bem, segundo especificações do usuário/consumidor, que passa a ter a sua utilização imediata, com o pagamento de contraprestações previamente acertadas, e opção de, ao final, adquiri-lo por um valor residual também contratualmente estipulado. Essa modalidade de negócio dinamiza a fruição de bens e não implica imobilização contábil do capital por parte do arrendatário: os bens assim adquiridos entram na contabilidade como custo operacional (art. 11 e 13 da Lei 6.099/74). Trata-se de contrato complexo, de modo que o enfrentamento da matéria obriga a identificação do local onde se perfectibiliza o financiamento, núcleo da prestação dos serviços nas operações de leasing financeiro, à luz do entendimento que restou sedimentado no Supremo Tribunal Federal.

3. Omissis.

4. Omissis.

5. Omissis.

6. Omissis.

7. O contrato de leasing...

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