Acórdão Nº 08007914320228205300 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 04-03-2024

Data de Julgamento04 Março 2024
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
Número do processo08007914320228205300
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0800791-43.2022.8.20.5300
Polo ativo
CHARLES MESSIAS BARBOSA
Advogado(s): LAERCIO COSTA DE SOUSA JUNIOR
Polo passivo
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):

Apelação Criminal nº 0800791-43.2022.8.20.5300

Apelante: Charles Messias Barbosa

Advogado: Dr. Laércio Costa de Sousa Júnior – OAB/RN nº 4535

Apelado: Ministério Público

Origem: 3ª Vara Criminal da Comarca de Natal

Relator: Juiz Convocado Ricardo Tinoco

APELAÇÃO CRIMINAL. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. ART. 14 DA LEI Nº 10.826/2003. CONDENAÇÃO. RECURSO DEFENSIVO. PRELIMINARES DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO SUSCITADAS PELA PROCURADORIA DE JUSTIÇA: I) VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE QUANTO AO PEDIDO DE REDIMENSIONAMENTO DA PENA. II) CONCESSÃO DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE POR AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. ACOLHIMENTO. APELANTE QUE DEIXOU DE FUNDAMENTAR O PLEITO DE REDUÇÃO DA PENA. INVIABILIDADE DA ANÁLISE. RECORRENTE EM LIBERDADE. AUSÊNCIA DE SUCUMBÊNCIA. MÉRITO. ABSOLVIÇÃO POR ATIPICIDADE DA CONDUTA. IMPOSSIBILIDADE. EXCLUDENTE DE ILICITUDE POR AUSÊNCIA DE INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. NÃO CABIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DELITO DE MERA CONDUTA E PERIGO ABSTRATO. PRECEDENTES. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, por unanimidade, em acolher as preliminares de não conhecimento parcial do apelo em relação ao pedido de redução da pena e do direito de recorrer em liberdade, suscitadas pela 5ª Procuradoria de Justiça. No mérito, em consonância com o parecer ministerial, negar provimento ao apelo, mantendo todos os termos da sentença recorrida, nos moldes do voto do Relator, que deste passa a fazer parte integrante.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Criminal interposta por Charles Messias Barbosa, ID. 22401464, p. 1-2, contra sentença proferida pelo Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Natal, ID. 22401461, p. 1-12, que o condenou pela prática do crime tipificado no art. 14 da Lei nº 10.826/2003, ao cumprimento de pena de 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa, estipulados à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente ao tempo do fato, ID. 9839283, p. 1-15.

O apelante, em razões recursais, ID. 22401474, p. 1-4, postula a absolvição do crime de porte de arma de fogo a si imputado, alegando que a arma era para defesa pessoal, eis ter sido vítima de assalto em seu estabelecimento comercial, defendendo a ausência de tipicidade por ofensividade ao princípio da intervenção mínima ou inexigibilidade de conduta diversa.

O Ministério Público, contra-arrazoando, ID. 22401476, p. 1-3, refuta os argumentos defensivos e pugna pelo conhecimento e desprovimento do apelo, a fim de manter na íntegra a sentença recorrida.

A 5ª Procuradoria de Justiça, no parecer ofertado, ID 22643187, p. 269-278, suscita preliminares de não conhecimento parcial do recurso: a) em relação ao pedido da “pena justa” por ofensa ao princípio da dialeticidade e b) quanto ao pleito de recorrer em liberdade por ausência de interesse recursal. Na parte conhecida, opina pelo desprovimento do recurso interposto.

É o relatório.

VOTO

PRELIMINARES DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO QUANTO AOS PEDIDOS DE REDUÇÃO DA PENA POR VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE E DE RECORRER EM LIBERDADE POR AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL ARGUIDA PELA 5ª PROCURADORIA DE JUSTIÇA.

Suscita a Procuradoria de Justiça as preliminares de não conhecimento parcial do recurso quanto ao pedido de redução da pena por ofensa ao princípio da dialeticidade e pela ausência de interesse no pleito de recorrer em liberdade.

Dos autos, verifica-se que o recorrente postulou, subsidiariamente, a redução da pena, de forma genérica, na parte final de suas razões, nos seguintes termos: “E caso, Vossa Excelência tenha opinião divergente, que seja aplicado a Pena Justa, analisando os esclarecimentos prestados pelo acusado” (sic).

Conforme exposto, o apelante não demonstrou sua irresignação de forma pontual e fundamentada acerca do decidido na sentença sobre a pena, de modo a viabilizar o exame do pedido invocado e os limites de sua apreciação.

Nesse sentido, configurada a ofensa ao princípio da dialeticidade em razão da ausência de argumentação relativa aos pontos suscetíveis de análise recursal.

A respeito,segue julgado desta Câmara Criminal:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI N. 11.343/2006). APELAÇÃO DEFENSIVA. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO QUANTO AO PEDIDO DE REDIMENSIONAMENTO DA PENA-BASE POR OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE SUSCITADA PELA PROCURADORIA DE JUSTIÇA. ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO ACERCA DO PEDIDO. (...) RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AP. CRIM, 0804818-42.2022.8.20.5600, Des. Gilson Barbosa (Juiz Convocado Ricardo Tinoco), Câm. Crim, em 08/01/2024, PUB. em 10/01/2024)

Ainda, em relação ao pleito de recorrer em liberdade, também não deve ser conhecido por ausência de interesse recursal, considerando que a sentença questionada já concedeu o direito, conforme print abaixo:

Desse modo, as preliminares devem ser acolhidas.

MÉRITO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade do pleito absolutório, deve ser conhecido o presente recurso de apelação.

Cinge-se a pretensão recursal à absolvição do delito por ausência de tipicidade, com base na ofensa ao princípio da intervenção mínima, ou pela excludente de culpabilidade de inexigibilidade de conduta diversa.

Razão não assiste ao recorrente.

Narra a peça acusatória, em síntese, que:

"No dia 25 de fevereiro de 2022, por volta das 21h30min, em via pública, na BR 101 Norte, KM 79, nesta Capital, o denunciado portava, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: 01 (uma) pistola, calibre .380, marca Taurus, carregada com 15 (quinze) cartuchos intactos, juntamente com mais 02 (dois) carregadores municiados com 15 (quinze) cartuchos cada um deles.

Policiais Militares encontravam-se de serviço quando abordaram o veículo Corsa/GM, placas JIF 2706. O denunciado conduzia o automóvel e estava acompanhado da esposa, e seus 02 (dois) filhos. Ao se consultar os dados do motorista, verificou-se que CHARLES possuía mandado de prisão expedido em aberto oriundo da 1ª Vara Criminal da Comarca de Parnamirim.

Em revista ao carro, os artefatos já descritos foram apreendidos, tendo o denunciado justificado que estava “jurado de morte”. Ante as evidências, ele recebeu voz de prisão e foi conduzido até a Delegacia de Polícia para lavratura do flagrante, onde admitiu a propriedade do material.

Pois bem.

O crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido encontra-se assim descrito na Lei nº 10.826/2003:

"Art. 14. Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: pena - reclusão, de dois a quatro anos, e multa. Parágrafo único. O crime previsto neste artigo é inafiançável, salvo quando a arma de fogo estiver registrada em nome do agente."

No contexto fático, a materialidade do crime de porte ilegal de arma de fogo ficou comprovada pelo APF (ID 22401371, p. 1-7), Auto de Exibição e Apreensão (ID. 22401371, p. 9), Boletim de Ocorrência (ID. 2401371, p. 1-2), laudo de eficiência (ID 22401440) e pelos depoimentos testemunhais.

No que pertine à autoria, além dos relatos testemunhais dos policiais que se mostraram presentes no momento da prisão do réu, há de ser destacado que, perante autoridade judicial, o apelante confirmou os fatos narrados na exordial. Veja-se:

Charles Messias Barbosa – Réu: “03:51 Eles encontraram a arma, que eu mesmo falei que tinha a arma dentro do carro, a arma estava dentro da bolsa da minha filha que eu coloquei antes de sair de casa (...)”

Luiz Ferreira de Lima Júnior – PRF: “01:28 - Fomos fazer uma analise dos pertences, das bagagens que tinham dentro do veículo e encontramos uma arma dentro da mochila infantil (...); 02:19 - O que motivou a busca minuciosa no veículo foi a consulta que a gente realizou e a verificação do mandado de prisão existente (...)”

Gustavo Henrique Câmara Santos – PRF: “01:23 - Nosso sistema informou quando pegamos o documento dele que ele tinha uma mandado de prisão em aberto, conversamos com ele, explicamos a situação, e aprofundando a fiscalização descobrimos a arma no veículo (...) 02:00 - Ele que apontou onde a arma estava, dentro da mochila de uma das crianças, tinha arma e algumas munições (...);

Infere-se, da apreciação do conjunto probatório, que os relatos uníssonos dos policiais evidenciaram que a arma de fogo foi localizada dentro do veículo do réu, sem que houvesse autorização para transportá-la, inclusive, registre-se, que, de acordo com agentes rodoviários federais, o próprio réu, informou que estava transportando a arma de fogo, apontando o local onde a mesma estava (dentro da mochila da filha), juntamente com algumas munições.

Ora, o modus operandi do delito está bem definido na forma como ocorreu a apreensão de 01 (uma) pistola, calibre .380, marca Taurus, carregada com 15 (quinze) cartuchos intactos, juntamente com mais 02 (dois) carregadores municiados com 15 (quinze) cartuchos cada um deles, conforme ID 22401371 p. 14.

Outrossim, sabe-se que para configuração dos crimes tipificados na Lei nº 10.826/2003, basta tão somente a prática de qualquer ação prevista nos núcleos dos artigos, pois é delito de perigo abstrato e de mera conduta, cuja tutela jurídica recai sobre a segurança pública e a paz social, e não sobre a...

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