Acórdão Nº 08010554120238205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 10-10-2023
Data de Julgamento | 10 Outubro 2023 |
Classe processual | RECURSO INOMINADO CÍVEL |
Número do processo | 08010554120238205004 |
Órgão | 3ª Turma Recursal |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL
Processo: | RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0801055-41.2023.8.20.5004 |
Polo ativo |
MARIA JOSINEIDE BARBOSA E LOPES |
Advogado(s): | MARIZE DUARTE TAVARES DE ARAUJO PAULA, MARCEL GOMES DE SOUSA, RAQUEL TAVARES PAULA |
Polo passivo |
CVC BRASIL OPERADORA E AGENCIA DE VIAGENS S.A. e outros |
Advogado(s): | CAMILA DE ALMEIDA BASTOS DE MORAES REGO, MARCIO RAFAEL GAZZINEO, WILSON SALES BELCHIOR |
RECURSO INOMINADO nº 0801055-41.2023.8.20.5004
ORIGEM: 3º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL
RECORRENTE: MARIA JOSINEIDE BARBOSA E LOPES
ADVOGADO: MARCEL GOMES DE SOUSA OAB/RN n.º 13.965
RECORRIDO: CVC BRASIL OPERADORA E AGENCIA DE VIAGENS S.A
ADVOGADO(A): CAMILA DE ALMEIDA BASTOS DE MORAES REGO - OAB PE33667-A
RELATOR: JUIZ CLEANTO ALVES PANTALEÃO FILHO
EMENTA: RECURSO INOMINADO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSUMIDOR. TEORIA DO DESVIO IMPRODUTIVO. PRESENÇA DE REQUISITOS. SENTENÇA REFORMADA PARA CONCEDER A REPARAÇÃO PELOS DANOS MORAIS. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
ACÓRDÃO
Decidem os Juízes que integram a Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, reformando a sentença para conceder a reparação pecuniária pelo dano moral, de acordo com o voto do Relator. Sem condenação em custas ante o provimento do recurso.
Natal/RN, 04.10.23.
Cleanto Alves Pantaleão Filho
Juiz Relator
RELATÓRIO
Sentença que se adota:
SENTENÇA
Vistos, etc.
Dispensado o relatório, na forma do art.38 da Lei nº 9.099/95.
A parte autora afirma, em síntese, que em 04/09/2021 adquiriu um pacote turístico perante a parte ré, com viagem a Portugal agendada para 01/06/2022, dividindo o pagamento de R$ 4.470,29 da seguinte forma:
(i) Parcelamento 1: R$ 1.401,29 divididos em 11 (onze) parcelas de R$ 127,39;
(ii) Parcelamento 2: R$ 3.069,00 divididos em 12 (doze) parcelas de R$ 255,75;
Ocorre que, por motivo de contenção de gastos, em 02/12/2021 solicitou o cancelamento total do pacote turístico contratado mediante contato telefônico com a agência demandada e, somente após 5 meses de espera, no mês de maio de 2022, foi informada de que o processo de reembolso já teria sido concluído. Ainda em maio de 2022 recebeu uma transferência via PIX no valor de R$ 367,62.
A CVC, por sua vez, aduz que procedeu com o reembolso no valor de R$ 4.887,08 da seguinte maneira: R$ 3.372,98 disponibilizados em créditos para compra de produtos e serviços da CVC BRASIL OPERADORA E AGENCIA DE VIAGENS S/A; R$ 367,62 disponibilizado por meio de transferência bancária, via pix; R$ 1.146,48 disponibilizados por meio de estorno no cartão de crédito VISA, feito na fatura do cartão de crédito com vencimento em 04/08/22.
É o que importa relatar. Fundamento e decido.
Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva arguida, visto que os débitos/estornos/créditos foram realizados pelo banco, seja na fatura do cartão de crédito por ele administrado, seja na própria conta bancária da autora, que também é responsabilidade da instituição financeira, o que a legitima a figurar no polo passivo da presente lide. Ademais, entendo que a preliminar está intrinsecamente ligada ao mérito da causa, motivo pelo qual remeto sua apreciação para momento oportuno.
No tocante à preliminar de carência da ação, verifica-se a falta do interesse processual quando não se puder vislumbrar utilidade do provimento jurisdicional pretendido pelo requerente. Não é o que ocorre, pois pela simples leitura da peça inicial constata-se que a autora tentou solucionar seus problemas extrajudicialmente sem obter o êxito necessário, buscando a prestação jurisdicional para ver resolvida a lide, de modo a existir, sim, interesse de agir da autora, razão pela qual rejeito a preliminar em comento.
Em razão da hipossuficiência da parte autora, deve ser aplicada a inversão do ônus probatório quando da análise das provas colacionadas aos autos, mas apenas no que couber, de acordo com o CDC.
Remeto a análise do pedido de justiça gratuita para o momento oportuno (fase recursal).
Indefiro o pedido de condenação em custas processuais e honorários advocatícios, por expressa vedação legal nesse sentido (arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95).
A autora fez juntada das faturas, especialmente aquelas com vencimento em ago/22 e set/22, onde não consta nenhum tipo de estorno, não tendo os réus se desincumbindo do seu ônus probatório, na forma do art. 373, II do CPC e art. 6º, VIII do CDC. Além disso, a CVC informa que realizou o reembolso em valor maior do que o pago pela própria autora, o que não faz sentido, motivo pelo qual entendo por acatar a versão apresentada pela autora de que não lhe foi devolvido qualquer valor, a não ser a transferência via PIX.
Não entendo pela repetição do indébito, visto que a contratação em sua origem foi devida, já que a autora pretendia inicialmente realizar a viagem, devendo ser analisado o pedido de restituição, mas de forma simples, por entender que o caso em apreço não se subsume ao disposto no parágrafo único do art.42 do CDC.
Estabelecida essa premissa, entendo que o reembolso é devido, visto que o serviço não foi prestado, sob pena de enriquecimento sem causa, o que é vedado no nosso ordenamento jurídico, contudo não no valor pretendido, devendo tal restituição acontecer de forma parcial e não integral.
Restou evidenciado nos autos que a autora solicitou o cancelamento das passagens, portanto, a multa por cancelamento é devida, consoante disposição do art.740, caput e §3° do Código Civil, devendo, por sua consequência, o réu restituir a quantia paga pelos bilhetes, debitada a multa compensatória de 5% e o valor transferido por meio do PIX, devendo, por sua consequência, ser restituído R$ 3.879,16, já debitado do valor pago pela passagem, a saber, R$ 4.470,29, a multa compensatória de 5% (R$223,51), presente no parágrafo do referido artigo bem como o valor recebido por PIX (R$ 367,62).
Devo esclarecer que não ficou comprovado o estorno no cartão de crédito da autora, e, portanto, eventual crédito/débito deverá ser resolvido entre as pessoas jurídicas demandadas em ação própria.
Também assevero que, em virtude de não ter sido evidenciado nos autos a responsabilidade da instituição financeira, entendo que a restituição deverá ser realizada apenas pela ré CVC.
No tocante ao pedido de indenização por danos morais, entendo não ter restado demonstrada a relação de causa e efeito dos sofrimentos que porventura tenha experimentado, não passando a situação do que a jurisprudência entende por meros aborrecimentos da vida em sociedade que não são passíveis de reparação, devendo ser aplicado o Enunciado 159 do CJF que dispõe: O dano moral, assim compreendido todo o dano extrapatrimonial, não se caracteriza quando há mero aborrecimento inerente a prejuízo material.
Pelo exposto, com base no art. 487, I do CPC, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos encartados na exordial, para condenar o réu CVC - BRASIL OPERADORA E AGENCIA DE VIAGENS S/A a pagar à autora MARIA JOSINEIDE BARBOSA E LOPES, a título de restituição simples, a quantia de R$ 3.879,16, acrescida de juros de 1% ao mês a partir da citação e correção monetária com base na tabela da Justiça Federal a contar de 02/12/2021.
Sem custas nem honorários, na forma dos arts. 54 e 55 da lei 9.099/95.
Publicação e registro automáticos. Intimem-se as partes.
NATAL /RN, 22 de maio de 2023.
GUSTAVO EUGENIO DE CARVALHO BEZERRA
Juiz(a) de Direito
(documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06)
Trata-se de recurso inominado interposto por Maria Josineide Barbosa e Lopes, onde argumenta ser devidos a reparação material e imaterial pela falha na prestação de serviço pela demanda. Sustenta que ficou durante 10 (dez) meses arcando com o custo de um contrato em sua totalidade mesmo já havendo solicitado a desistência, tendo feito diversos contatos, alegando ser aplicável ao caso a Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor. Solicita ao final a reparação pelos danos morais na quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), concessão da gratuidade judiciária e inversão do ônus da prova.
Apresentadas contrarrazões onde argumenta-se preliminarmente ser incabível a concessão da gratuidade judiciária em sede de recurso, ante a não comprovação da hipossuficiência, no mérito sustenta não ser cabível a reparação pelos danos morais por tratar-se de mero aborrecimento, não havendo os requisitos necessários para a caracterização da responsabilidade civil, bem como já haver efetuado o reembolso das despesas materiais, pugnando no final pelo indeferimento da gratuidade judiciária e que seja negado provimento ao recurso.
É o que basta relatar.
VOTO
Inicialmente, defiro o pedido de assistência judiciária gratuita, a vista da inexistência de elementos que impeçam a concessão da benesse.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Com relação ao mérito, a insurgência recursal merece guarida.
Considerando que a relação jurídica trazida à apreciação judicial configura nítida relação de consumo, sendo matéria de responsabilidade civil, há que coexistir todos os seus elementos para caracterização, a saber: conduta danosa, culpa e nexo causal.
A situação em deslinde ultrapassou o que se considera mero dissabor e aborrecimento da vida cotidiana, pois trata-se de falha na prestação de serviço a uma pessoa idosa, ficando comprovado o lapso temporal considerável na tentativa de solução da demanda, persistindo a cobrança por um serviço do qual havia solicitado cancelamento, conforme documentos de id nº 20302111 (prints de Whatsapp das tratativas), sendo várias as tentativas de resolução, que demandou tempo, que é um recurso escasso nos dias atuais e poderia ser utilizado pela...
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