Acórdão Nº 08011463320208205103 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal, 22-03-2021

Data de Julgamento22 Março 2021
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08011463320208205103
Órgão1ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0801146-33.2020.8.20.5103
Polo ativo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e outros
Advogado(s):
Polo passivo
BRAZ LEONCIO DE CARVALHO NETO
Advogado(s): PAMELLA MAYARA DE ARAUJO



PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gabinete do Juiz Mádson Ottoni de Almeida Rodrigues


RECURSO CÍVEL VIRTUAL nº 0801146-33.2020.8.20.5103
PARTE RECORRENTE: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PROCURADOR(A):CARLOS JOSE FERNANDES REGO
PARTE RECORRIDA:BRAZ LEONCIO DE CARVALHO NETO
ADVOGADO(A):PAMELLA MAYARA DE ARAUJO
JUIZ RELATOR: MÁDSON OTTONI DE ALMEIDA RODRIGUES


EMENTA: RECURSO INOMINADO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. NÃO RECEBIMENTO DOS VALORES RELATIVOS AO 13º SALÁRIO DE 2018. SITUAÇÃO ECONÔMICA E FISCAL DO ESTADO NÃO ELIDE O DIREITO DO SERVIDOR PÚBLICO. CORREÇÃO MONETÁRIA COM BASE NO IPCA-E E JUROS DE MORA À TAXA BÁSICA DA CADERNETA DE POUPANÇA, AMBOS COMPUTADOS A PARTIR A DATA EM QUE A OBRIGAÇÃO DEVERIA TER SIDO SATISFEITA. INTELIGÊNCIA DO ART. 397 DO CÓDIGO CIVIL. PEDIDOS IMPLÍCITOS (§ 1º DO ART. 322 DO CPC). MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. CONHECIMENTO DE OFÍCIO PELO JUIZ. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Comprovado o não pagamento de verbas remuneratórias previstas em lei, cujo inadimplemento é incontroverso, é dever da administração pública cumprir a obrigação de efetuar os respectivos pagamentos, sob pena de enriquecimento ilícito, a despeito da grave crise econômica e fiscal enfrentada pelo Estado, a quem compete adotar as medidas necessárias para regularizar o atraso e normalizar a folha de pagamento de seus servidores.

A correção monetária e os juros de mora integram o chamado pedido implícito, configurando, portanto, matéria de ordem pública, que pode ser requerida a qualquer tempo e conhecida de ofício pelo juiz. Assim, a correção monetária, calculada com base no IPCA-E, e os juros de mora, correspondentes ao índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, consoante o art. 1º – f, acrescentado à Lei n.º 9.494/1997, incidirão desde a data em que a obrigação deveria ter sido satisfeita, com amparo no art. 397 do Código Civil.

Incidência de imposto de renda e contribuições previdenciárias, vez que se trata de verbas que já deveriam ter sido adimplidas no passado, de modo a se sujeitarem aos mesmos descontos cabíveis à época em que seriam devidas, consoante entendimento do STJ.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do recurso inominado acima identificado, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento, modificando, de ofício, o termo inicial dos juros de mora para a data em que a obrigação deveria ter sido satisfeita, assentando-se que os valores recebidos em Juízo estarão sujeitos à incidência de imposto de renda e contribuições previdenciárias, vigentes à época em
que os pagamentos deveriam ter ocorrido, nos termos do voto do relator.

A parte recorrente ficará isenta das custas do processo, mas pagará honorários advocatícios de sucumbência, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação atualizado, sopesados os critérios previstos no § 2º do art. 85 do CPC.

Natal/RN, data conforme o registro do sistema.


MÁDSON OTTONI DE ALMEIDA RODRIGUES

Juiz Relator


RELATÓRIO

Trata-se de Recurso Inominado interposto por ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em face de BRAZ LEONCIO DE CARVALHO NETO, ambas as partes qualificadas.

Segue sentença cujo relatório se adota, verbis (ID nº 7674875):

Trata-se de ação de cobrança proposta por a parte autora acima epigrafada em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE requerendo que este lhe pague, em sede de tutela antecipada, a gratificação natalina (13º salário) do ano de 2018.

O autor aduz, em síntese, que é servidor público estadual, onde atualmente exerce a função Polícia Militar. Que o Estado do Rio Grande do Norte, ora Requerido, não realizou o pagamento do décimo terceiro salário referente ao ano de 2018. O não pagamento supramencionado, afetou de forma brusca a vida financeira da parte Autora, haja vista, a mesma utilizar-se de empréstimos para conseguir pagar as contas mensais, e os juros altos cobrados terem desregulado o controle.

Intimado para esclarecer sobre as anotações de recebimento de proventos nos extratos bancários dos meses de dezembro de 2018 e janeiro de 2019, a parte informou que no primeiro caso o pagamento foi referente ao mês de novembro de 2018, que já vinha em atraso, enquanto que em janeiro recebeu adiantado dos vencimentos do referido mês, ficando o mês de dezembro sem recebimento.

Ato contínuo, a liminar restou indeferida nos autos.

Em sede de contestação o Estado do Rio Grande do Norte impugnou a impossibilidade de concessão liminar contra a Fazenda Pública. Defendeu, em síntese, o princípio da reserva do possível e a ausência de previsão orçamentária que autorize o Estado a efetuar o pagamento das verbas e limite prudencial de despesas com pessoal. Por fim requereu pela improcedência dos pedidos iniciais.

O Ministério Público declinou da intervenção no feito.

Após, vieram os autos conclusos para sentença.

É o que importa relatar. Decido.

Tratando-se de matéria unicamente de direito e desnecessária a produção de prova em audiência (ausência de pedido das partes), passamos ao julgamento antecipado da lide, na forma do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

O cerne da presente demanda repousa na pretensão da parte demandante de receber a gratificação natalina (13º salário) referente ao período trabalhado em 2018, não pago no prazo estipulado pela Constituição Federal e pela Lei Complementar Estadual de nº 463/2012.

Inicialmente, no tocante a preliminar arguida pelo demandado de impugnação concessão de justiça gratuita, temos que esta não merece acolhimento uma vez que o art. 54 da Lei 9.099/95 estabelece que o acesso aos juizados especiais independe do pagamento de custas em primeiro grau, não havendo que se falar em análise de hipossuficiência econômica neste momento, razão pela qual a preliminar não merece prosperar.

Ultrapassada a preliminar suscitada, passamos a análise do mérito.

Sobre a celeuma, temos que o 13º salário é verba garantida pela Constituição Federal, que preceitua:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…)

VIII - décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria; (...)

Art. 39 Omissis. (…)

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir. (Grifo nosso)

A Lei Complementar nº 463/2012, Regime Jurídico Único dos Servidores do Estado do Rio Grande do Norte, também dispõe sobre o assunto, senão vejamos:

Art. 3º. O décimo terceiro salário devido ao militar corresponde a um doze avos do subsídio a que fizer jus no mês de dezembro, por mês de exercício no respectivo ano. Parágrafo único. A fração igual ou superior a quinze dias é considerada como mês integral.

Art. 4º. O décimo terceiro salário é pago no mês de dezembro. Parágrafo único. A título de adiantamento, a metade do décimo terceiro salário poderá ser paga juntamente com o subsídio do mês de junho.

Com base nas disposições legais em epígrafe temos que o direito da parte autora encontra-se revestido de legalidade, de modo que a Administração Pública não tem a faculdade de escolher o momento de realizar tais pagamentos, na medida em que o comando legal não oferece tal discricionariedade.

Desta feita, existindo a prestação de serviços, o servidor faz jus ao percebimento do seu salário, que significa a contraprestação dada em virtude do labor despendido, bem como, direito as férias acrescida de 1/3 constitucional após um ano de trabalho ou proporcionalmente ao período trabalhado, caso seja exonerado antes de completar doze meses de serviço.

In casu, afere-se dos documentos acostados aos autos que a parte ré, de fato, encontra-se inadimplente com a parte autora ante o pagamento da gratificação natalina do período de 2018, sendo crível a condenação daquele para que proceda com tal pagamento, caso contrário, evidencia-se enriquecimento ilícito do demandado, conduta que não pode ser chancelada pelo Poder Judiciário.

Registre-se, por oportuno, que a crise financeira enfrentada pelo nosso Estado, amplamente noticiada pela mídia, não é desconhecida deste Juízo, mas não pode ser utilizada como fundamento para o descumprimento do preceito legal, até porque as normas acima descritas não estabelecem qualquer hipótese fática ou jurídica que autorize a sua inobservância.

Ademais, anote-se que o ente demandado não contesta efetivamente o débito, apenas afirma a impossibilidade de pagamento em razão do limite prudencial fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Incabível o argumento. Há de se esclarecer que o pagamento das parcelas pretéritas não ofende o fundamento constitucional da previsão orçamentária (art. 169 da CF), eis que tal regra é dirigida ao Administrador Público quando da elaboração das políticas orçamentárias e não proíbe o servidor, lesado em seus direitos, de pleitear judicialmente o pagamento da remuneração a que tem direito.

Isso porque a Lei de Responsabilidade Fiscal(LC n.º 101/2000), estabeleceu em seu art. 19, § 1º, inciso IV, que as despesas decorrentes de decisões judiciais não são computadas para verificação dos limites previstos no caput do art. 19 da referida Lei.

Art. 19 (…)

§1º. Na aplicação do atendimento dos limites definidos neste artigo, não serão computadas as despesas:

(…)

IV – decorrentes de decisão judicial (…).(Grifo acrescido)

A...

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