Acórdão Nº 08011485220198205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Terceira Câmara Cível, 15-07-2021

Data de Julgamento15 Julho 2021
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08011485220198205001
ÓrgãoTerceira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801148-52.2019.8.20.5001
Polo ativo
JANICLEIDE DA SILVA
Advogado(s): JANE VANESSA SILVA DE OLIVEIRA
Polo passivo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE e outros
Advogado(s):


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Gab. Des. Vivaldo Pinheiro na 3ª Câmara Cível
Juíza Convocada Dra. Maria Neize de Andrade


APELAÇÃO CÍVEL Nº 0801148-52.2019.8.20.5001

APELANTES: JANICLEIDE DA SILVA E OUTROS

ADVOGADO: JANE VANESSA SILVA DE OLIVEIRA

APELADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

PROCURADORA: JULIANA DE MORAIS GUERRA

RELATORA: DRA. MARIA NEÍZE DE ANDRADE FERNANDES (JUÍZA CONVOCADA)

EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PENSÃO POR ATO ILÍCITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. PRELIMINAR DE NULIDADE SUSCITADA PELOS APELANTES DADA A AUSÊNCIA DE INTERVENÇÃO DO PARQUET NO PRIMEIRO GRAU. DEMANDA QUE ENVOLVE INTERESSE DE MENORES. HIPÓTESE ENQUADRADA NO ARTIGO 178, II, DO CPC. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO E CONDENAÇÃO PARA ARCAR COM OS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. PREJUÍZO EVIDENCIADO. NULIDADE QUE SE IMPÕE DE TODOS OS ATOS POSTERIORES AO MOMENTO EM QUE O MINISTÉRIO PÚBLICO DEVERIA TER SIDO INTIMADO PARA INTERVIR NO PROCESSO DE CONHECIMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 279, §§ 1º E 2º, DO CPC. RETORNO DOS AUTOS À INSTÂNCIA INFERIOR PARA O REGULAR PROCESSAMENTO E POSTERIOR JULGAMENTO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em turma, à unanimidade de votos, em dar provimento ao apelo interposto, nos termos do voto da Relatora, parte integrante deste.


RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta por JANICLEIDE DA SILVA E OUTROS em face da sentença acostada ao Id. 8179284, proferida pelo Juízo de Direito da 3ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN que julgou improcedente sua “AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PENSÃO POR ATO ILÍCITO” ajuizada em desfavor do ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, por entender que a parte autora não conseguiu comprovar o nexo de causalidade entre a morte do detento e a omissão estatal.

Em suas razões recursais (Id. 8179288), os apelantes, com fulcro no artigo 279 do Código de Processo Civil, suscitam, inicialmente, preliminar de nulidade processual por falta de intervenção do Ministério Público, tendo em vista que a demanda envolve interesse de menores de idade, filhos do detendo falecido.

Sustentam, ainda, que, ao contrário do que restou decidido na sentença apelada, há nos autos provas suficientes para a condenação do Estado, pois “o Sr. Juvenal morreu enquanto estava tutelado pelo Estado (Certidão de óbito em Anexo), por adquirir infecção bacteriana enquanto estava no Centro de Detenção Provisória de Macaíba (Relatórios médicos do Hospital Walfredo Gurgel)”, além disso, segundo o próprio relatório dos agentes penitenciários acostado aos autos, quando o apenado fora levado ao Hospital, já estava com um estado avançado de infecção, tendo dado entrada no hospital já com diagnóstico de septicemia e fazia dias que ele se queixava de fortes dores abdominais, porém, como a unidade prisional não contava com atendimento médico, nada foi feito de prevenção.

Ressalta que, no âmbito do processo n° 0101998.14.2017.8.20.0121, um pouco antes da morte do Sr. Juvenal, restaram comprovadas as péssimas condições do Centro de Detenção Provisória de Macaíba, “onde não havia assistência médica, odontológica, banho de sol e os presos não são separados quando portadores de doenças infectocontagiosas”, circunstâncias estas que levaram ao seu posterior fechamento.

Por fim, defende que a responsabilidade do Estado em indenizar os familiares do detento está alicerçada “em um princípio moral, cabendo ao Estado uma sanção pela violação do dever de garantir a integridade física e moral do preso, seu direito à vida – previsto na Constituição Federal e na Declaração Universal dos Direitos Humanos – bem como pela Convenção Americana de Direitos Humanos”.

Ao final, requer que seu apelo seja conhecido e provido, para que seja declarada nula não só a sentença apelada, mas também todos os demais atos processuais praticados desde que o Ministério Público deveria intervir obrigatoriamente no presente feito.

Subsidiariamente, pugna para que a sentença seja reformada, julgando procedentes todos os pedidos formulados na inicial, dada a comprovação da morte do preso enquanto estava tutelado pelo Estado apelado, da conduta omissiva deste e o nexo causal entre esta e o evento danoso em questão.

Conforme Certidão acostada ao Id. 8179291, decorreu o prazo processual sem que fossem apresentadas contrarrazões.

Instada a se pronunciar, a 11ª Procuradoria de Justiça opinou pelo acolhimento da preliminar suscitada (Id. 9114599), em razão de existir o interesse de menores na presente lide e o Parquet não ter sido intimado para atuar na Primeira Instância, além ter restado evidente o prejuízo causado aqueles, diante da improcedência da demanda.

É o que importa relatar.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço a Apelação Cível interposta.

No caso em apreço, o Juízo a quo julgou improcedente a demanda proposta pelos apelantes sob o argumento de que não restou comprovado o liame causal entre a morte do apenado, parente destes, e qualquer omissão ou ato ilícito estatal.

Ocorre que, de início, suscitam os apelantes nulidade processual, em decorrência da não intervenção ministerial no âmbito do primeiro grau, mesmo sendo o caso de sua obrigatória participação, tendo em vista a demanda envolver interesse de menores de idade, nos termos do disposto no artigo 178 do Código de Processo Civil, que assim prescreve:

“Art. 178. O Ministério Público será intimado para, no prazo de 30 (trinta) dias, intervir como fiscal da ordem jurídica nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal e nos processos que envolvam:

I - interesse público ou social;

II - interesse de incapaz;

III - litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana.”

Ao compulsar os autos, verifica-se que, de fato, consta entre os demandantes, ora apelantes, filhos menores do apenado falecido (Id. 8179267), enquadrando-se, pois, na hipótese descrita no inciso II do supratranscrito dispositivo legal.

Quando constatada essa situação, é preciso analisar se houve prejuízo para as partes incapazes, na forma como dispõe o artigo 279, § 2º, do Código de Processo Civil, in verbis:

“Art. 279. É nulo o processo quando o membro do Ministério Público não for intimado a acompanhar o feito em que deva intervir.

§ 1º Se o processo tiver tramitado sem conhecimento do membro do Ministério Público, o juiz invalidará os atos praticados a partir do momento em que ele deveria ter sido intimado.

§ 2º A nulidade só pode ser decretada após a intimação do Ministério Público, que se manifestará sobre a existência ou a inexistência de prejuízo.

Em comentário à supra transcrita norma NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY, assim lecionam:

“A falta de intervenção do MP nas causas de interesse público enseja a nulidade do processo, alcançando todos os atos praticados a partir de quando era devida a intervenção. A nulidade só é decretada após a oitiva do MP, opinando sobre a existência ou não de prejuízo”. (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, pg. 671).

No presente processo, de fato, observa-se que no âmbito do Primeiro Grau, em nenhum momento foi oportunizado ao Ministério Público dizer se tinha ou não interesse em intervir no feito. Em contrapartida, quando da manifestação do Parquet junto à esta Segunda Instância, a 11ª Procuradoria de Justiça se manifestou não só pela necessidade de intervenção ministerial, mas também pelo acolhimento da nulidade suscitada, senão vejamos pela seguinte Ementa que resumiu seu Parecer, in verbis:

“EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PENSÃO POR ATO ILÍCITO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ÓBITO DE CÔNJUGE E GENITOR DOS MENORES QUE ENCONTRAVA-SE SEGREGADO EM ESTABELECIMENTO PRISIONAL ESTADUAL. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO ESTATAL NO QUE CONCERNE AO DEVIDO ATENDIMENTO AO DE CUJUS. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE O PLEITO DOS AUTORES. IRRESIGNAÇÃO. DA PRELIMINAR DE NULIDADE DO JULGADO POR AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO E, CONSEQUENTEMENTE, INTERVENÇÃO DE MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DE 1º GRAU, SUSCITADA PELOS APELANTES. CABIMENTO. INTERESSE DE MENORES. SUCUMBÊNCIA NA ORIGEM A SER ARCADA PELOS MENORES. PREJUÍZO DEMONSTRADO. INTERVENÇÃO OBRIGATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE DE SUPRIMENTO PELO ÓRGÃO MINISTERIAL EM SEGUNDO GRAU. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NULIDADE DO DECISUM. MÉRITO. PREJUDICIALIDADE DE ANÁLISE, NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. PRECEDENTES DO STJ.

- Quando da atuação em processos judiciais que envolvam interesse de menor, é obrigatória a intervenção do órgão ministerial, que se dá na qualidade de fiscal da lei.

- A ausência de intervenção do Ministério Público em primeiro grau de jurisdição viola a exigência legal contida no art. 178, II do CPC, já que a demanda versa sobre pretensão indenizatória de interesse de menores, tendo sido julgados totalmente improcedentes os pedidos iniciais.

- Não há que se falar em julgamento da lide nessa instância recursal, uma vez que a causa não está madura, ausentes elementos que somente podem ser obtidos por instrução probatória, devendo os autos serem remetidos ao primeiro grau para regular processamento.

PARECER PELO ACOLHIMENTO DA PRELIMINARDE NULIDADE ARGUIDA E, NO MÉRITO, PELAPREJUDICIALIDADE DA ANÁLISE PROCESSUALANTE A NECESSIDADE DE INSTRUÇÃOPROBATÓRIA.” (Grifos acrescidos).

Sendo assim, diante do prejuízo apontado pelo Parquet e da impossibilidade de novo julgamento perante esta Corte, por...

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