Acórdão Nº 08011670320218205126 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 18-07-2023

Data de Julgamento18 Julho 2023
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08011670320218205126
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
3ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0801167-03.2021.8.20.5126
Polo ativo
ILDEMAR BRANDAO DE AZEVEDO JUNIOR
Advogado(s): THIAGO AUGUSTO FONSECA GOMES
Polo passivo
Banco do Brasil S/A
Advogado(s): WILSON SALES BELCHIOR registrado(a) civilmente como WILSON SALES BELCHIOR

RECURSO INOMINADO CÍVEL Nº.: 0801167-03.2021.8.20.5126

ORIGEM: JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE SANTA CRUZ

RECORRENTE: BANCO DO BRASIL S/A

ADVOGADO: WILSON SALES BELCHIOR

RECORRIDO: ILDEMAR BRANDAO DE AZEVEDO JUNIOR

ADVOGADO: THIAGO AUGUSTO FONSECA GOMES

JUIZ RELATOR: CLEANTO ALVES PANTALEÃO FILHO

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO BANCÁRIO. BLOQUEIO DE CARTÃO DE CRÉDITO. LIMITE NEGATIVO. SALDO NEGATIVO. TRANSAÇÕES NEGADAS. CONJUNTO PROBATÓRIO. AUSÊNCIA DE FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO E EXTINTIVO DO DIREITO DO AUTOR (ART. 373, II, DO CPC). ALEGAÇÃO DE NECESSIDADE DE ATUALIZAÇÃO CADASTRAL. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ATO ILÍCITO CONFIGURADO. DANO MORAL CABÍVEL. RESTABELECIMENTO DO LIMITE DO CARTÃO DE CRÉDITO. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTE O PLEITO AUTORAL. RECURSO DA PARTE RÉ. MANUTENÇÃO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

ACÓRDÃO

Decidem os Juízes que integram a Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, conhecer do recurso e, por unanimidade, negar-lhe provimento, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos, com os acréscimos contidos no voto do Relator. Com condenação da parte recorrente vencida em custas processuais e em honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, ante o não provimento recursal.

Natal/RN, 04 de julho de 2023.

CLEANTO ALVES PANTALEÃO FILHO

Juiz Relator

RELATÓRIO

SENTENÇA:


ILDEMAR BRANDÃO DE AZEVEDO JUNIOR, devidamente qualificado, através de advogado legalmente habilitado, propôs Ação de Obrigação de Fazer cumulada com Indenização por Danos Morais em desfavor do BANCO DO BRASIL S.A., igualmente qualificado.

Alegou a parte autora, em síntese, que:

i) é empresário no ramo de hotelaria na cidade de Santa Cruz/RN;

ii) possuía um cartão de crédito sem limite de crédito perante o réu;

iii) viajou para a capital do Estado com o fim de realizar uma feira, mas, ao tentar realizá-la, foi surpreendido com a informação de que o seu cartão não tinha limite;

iv) ficou incrédulo já que seu cartão não tinha limite e, por isso, solicitou que a atendente do supermercado realizasse novas tentativas, entretanto, todas foram sem sucesso;

v) quando olhou o aplicativo do Banco réu em seu celular verificou que constava um limite negativo de R$ 51.780,00, sem que ele jamais tivesse utilizado tal montante;

vi) diante dessas circunstâncias, tentou realizar apenas a feira da sua residência, em valor menor, transação que também não foi autorizada;

vii) ficou muito constrangido, pois o supermercado estava cheio de pessoas;

viii) retornou para Santa Cruz sem resolver nada e, para completar, nem o valor da gasolina conseguiu pagar em seu cartão;

ix) em contato com o Banco réu foi informado que havia ocorrido um erro, mas que seu limite seria restituído;

x) no entanto, isso não ocorreu porque o Banco apenas reduziu o valor do saldo negativo para R$ 39.280,00;

xi) mesmo tendo se dirigido por diversas vezes à agência do Banco réu o seu limite não foi restabelecido, encontrando-se, atualmente, em R$ 4.418,00 negativo;

xii) tais fatos geraram danos de ordem moral para si.

Requereu, por isso, que a parte ré fosse condenada à obrigação de restabelecer o limite do seu cartão de crédito, bem como de pagar o valor de R$ 15.000,00 pelos danos morais sofridos.

Devidamente citada, a parte ré apresentou contestação, suscitando, preliminarmente, a falta de interesse de agir; impugnou, ainda, a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária e, no mérito, alegou, em resumo e genericamente, que, de fato, o cartão de crédito do autor teria sido bloqueado, em razão da necessidade de atualização cadastral.

Alegou, ainda, a inexistência de danos morais indenizáveis in casu.

Requereu, portanto, a extinção do processo sem resolução do mérito, ou a improcedência in totum dos pleitos autorais.

Réplica apresentada no ID 70834134.

É o que importa relatar, decido.

Anoto, de início, que, por não haver necessidade de produção de outras provas, impõe-se o julgamento antecipado do pedido, a teor do art. 355, I, do Código de Processo Civil.

Em exame da matéria processual prévia, observo que a preliminar de carência da ação em decorrência da falta de interesse de agir por não haver pretensão resistida, não merece acolhimento, tendo em vista o princípio da inafastabilidade da jurisdição, em face do qual o direito de ação prescinde de qualquer requerimento ou reclamação prévia no âmbito administrativo.

De fato, tal prática se mostra como uma relevante alternativa para a redução das demandas judiciais, no entanto inexiste regra que condicione a propositura da ação judicial a tal procedimento.

Ademais, o que se vê ao longo da contestação é justamente a existência de uma pretensão resistida.

Com relação à impugnação ao pedido de gratuidade judiciária, observe-se que sequer foi analisado por este Juízo o pleito da parte autora, ante a falta de interesse de agir, pois o acesso aos Juizados Especiais Cíveis, no primeiro grau de jurisdição, independe do pagamento de quaisquer custas ou despesas, conforme dicção do art. 54 da Lei n. 9.099/95.

Tal impugnação apenas terá cabimento, se for o caso, no âmbito do segundo grau de jurisdição, na hipótese de interposição de recurso.

Destarte, não há se falar em impugnação ao pedido de Justiça Gratuita no presente feito.

Passando ao mérito, reputo configurada entre as partes do processo uma relação consumerista, por amoldar-se a autora na definição contida no art. 2º do CDC e a ré, no art. 3º do mesmo diploma legal, de modo que o dever de indenizar os possíveis danos causados à parte autora se encontra regulado no art. 14 deste Código, o qual disciplina a responsabilidade do fornecedor pelo fato do serviço em face do consumidor.

Pois bem, apreciando o contexto fático-probatório da presente demanda, verifico que assiste razão ao autor.

Primeiramente, restando incontroversa a relação jurídica travada entre as partes, o Banco réu confessou em sua contestação que, de fato, o cartão de crédito do autor foi bloqueado, em razão da necessidade de atualização cadastral.

Nada obstante, não logrou êxito em demonstrar que, atendendo ao seu dever previsto no art. 6º, III, do CDC, informou previamente, de forma clara e adequada, ao autor acerca do bloqueio mencionado e que, por conseguinte, esse ficaria impossibilitado de o utilizar até a realização da alegada atualização.

Na verdade, o que se infere das conversas acostadas pelo autor no ID 69124962 e seguintes e pelo réu no ID 70042106 é que o aquele realmente não foi previamente cientificado do bloqueio do seu cartão, o que fez com que fosse surpreendido com a não autorização da realização de compras no comércio, quando, até então, acreditava que seu cartão de crédito era, até mesmo, "sem limites", por ser na modalidade “Black”.

Com efeito, além de a parte ré não ter impugnado especificamente os fatos narrados na exordial, ônus que lhe incumbia, nos termos do art. 341 do CPC, o próprio relatório de transações não aprovadas trazido pelo Banco réu no ID 70042105, dá conta que, de fato, o autor teve diversas compras negadas, em razão de insuficiência de limite.

Inclusive, a compra do posto de combustível relatada na exordial foi uma delas (vide pág. 06 do ID mencionado).

Desta feita, resta inequívoco que, de fato, a parte ré falhou na prestação do seu serviço, na medida que realizou o bloqueio do cartão de crédito do autor, sem cientificá-lo previamente, de modo que esse, lesado pela falha na prestação de serviço da parte ré, tendo optado pela continuidade contratual, faz jus a regularização do seu cartão de crédito com o respectivo restabelecimento do limite ofertado na atualidade.

Nesse ponto em específico, faz-se importante mencionar para fins da fixação dos limites objetivos desta sentença, que, embora o autor tenha alegado que seu cartão não teria limite estipulado de crédito, tal fato não restou demonstrado nos autos.

Na verdade, inexiste documento nos autos através do qual se possa aferir com precisão o real limite de compras que vinha sendo ofertado ao autor.

O contrato acostado pela parte ré no ID 70042109, por exemplo, assinado em 2017, faz alusão à existência de dois cartões de crédito, um denominado de "OUROCARD VISA INTL" e outro de "OUROCARD PLATINUM VISA" e indica como limite único o valor de R$ 12.000,00.

Já na tela do sistema informatizado da ré na pág. 10 do ID 70042114 o limite máximo para compras parceladas é no valor de R$ 19.255,00, porém o cartão em questão é intitulado de "OUROCARD MASTERCARD BLACK PRIV", isto é, claramente diverso dos cartões contratados originalmente, a denotar que houve uma alteração contratual na modalidade do cartão ofertado ao autor.

Por sua vez, a fatura apresentada pelo autor no ID 69124943 foi cobrada na monta de R$ 23.652,47, com vencimento em 05 de junho, além de constar que o autor já teria utilizado um limite total de R$ 37.013,00.

Diante dessas circunstâncias, consigne-se que o restabelecimento do limite em questão deverá ficar adstrito ao que estava sendo ofertado pelo Banco réu ao autor antes dos fatos narrados na exordial, sem olvidar, ainda, da liberdade concedida às instituições financeiras de, periodicamente, realizarem análise de crédito para fins de continuidade contratual ou não.

No que diz respeito ao pedido de danos morais, para a verificação da responsabilidade civil, faz-se necessária a avaliação de determinados requisitos, quais sejam,...

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