Acórdão Nº 08013653720158205001 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 05-03-2020

Data de Julgamento05 Março 2020
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08013653720158205001
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801365-37.2015.8.20.5001
Polo ativo
RANGEL DA SILVA LIMA
Advogado(s): SAMARA MARIA BRITO DE ARAUJO
Polo passivo
BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A.
Advogado(s): WILSON SALES BELCHIOR

EMENTA: DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. DECISÃO PROFERIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. CONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.107-36/2001 (RE 529.377; TEMA 33 DA REPERCUSSÃO GERAL). MUDANÇA DE POSICIONAMENTO DO PLENO DO TJRN A FIM DE SE ALINHAR AO ENTENDIMENTO DA CORTE SUPREMA. CONSONÂNCIA COM O STJ (RESP 973.827/RS). COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA NÃO COMPROVADA NOS AUTOS. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PREJUDICADA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. PROVEITO ECONÔMICO DEFINIDO. ART. 85, § 2º DO CPC. VALOR IRRISÓRIO. REMUNERAÇÃO DIGNA DO ADVOGADO. APLICAÇÃO DA REGRA DO §8º. APRECIAÇÃO EQUITATIVA. FIXAÇÃO EQUIVALENTE A UM SALÁRIO MÍNIMO. VALOR ADEQUADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade, em prover parcialmente o recurso, nos termos do voto do relator.

Apelação Cível interposta por RANGEL DA SILVA LIMA em face da sentença que julgou procedentes em parte os pedidos contidos à inicial para: condenar o demandado à devolução, de forma simples, dos valores cobrados ao demandante, referente apenas aos serviços cobrados a título de correspondente não bancário, no correspondente a R$ 138,46, a ser corrigido monetariamente, pelo INPC, e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, ambos a contar da citação; em razão da sucumbência recíproca, condenar cada uma das partes rés ao pagamento de 50% sobre as custas processuais e honorários sucumbenciais, estes fixados em 10% do proveito econômico obtido (art. 85, §§ 2º e 14º, CPC), ficando tal condenação suspensa em relação a parte autora que é beneficiário da justiça gratuita, nos moldes do artigo 98, § 3º do atual CPC.

Alegou que: não há previsão contratual da capitalização de juros e, ainda que houvesse tal cobrança, não é possível ante a inconstitucionalidade da Medida Provisória n° 2.170-36/2001 e o entendimento do Enunciado n° 121 da Súmula do STJ; deve ser afastada a incidência da cobrança de comissão de permanência; faz jus à repetição de indébito, na forma dobrada, dos valores cobrados indevidamente pelo recorrido. Requereu, ao final, o provimento do apelo para afastar o anatocismo e determinar a devolução em dobro dos valores pagos indevidamente e; majorar os ônus sucumbenciais em benefício da parte recorrente.

A parte apelada apresentou contrarrazões pugnando pelo desprovimento do recurso.

Esclareço que o Código de Defesa do Consumidor se aplica às relações de consumo envolvendo instituições financeiras, conforme entendimento consolidado pelos Tribunais Superiores: no Superior Tribunal de Justiça, por meio do Enunciado n° 297 de sua Súmula[1]; no Supremo Tribunal Federal, pelo julgamento da ADI n° 2591/DF[2] (“ADI dos Bancos”).

Sendo assim, há plena possibilidade de revisão judicial das cláusulas contratuais consideradas abusivas previstas em contratos bancários, incompatíveis com a boa-fé ou equidade, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou estabeleçam prestações desproporcionais (art. 6º, V e art. 51, IV do CDC[3]).

Em processos discutindo a matéria ora analisada, este relator vinha declarando a nulidade das cláusulas que previam a capitalização de juros, com fundamento na decisão proferida pelo Plenário deste Tribunal na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível n° 2008.004025-9/0002.00, que declarou a inconstitucionalidade formal do art. 5º da Medida Provisória n° 1.963/2000 (atual MP n° 2.107-36/2001), que admite a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano. Como o referido julgamento foi à unanimidade de votos, passou a vincular os demais órgãos do Tribunal por força do art. 243, caput, do Regimento Interno[4].

Em 04/02/2015, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, por maioria de votos, a constitucionalidade formal da Medida Provisória nº 2.170-36/2001, nos termos do acórdão adiante transcrito:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO.

1. A jurisprudência da Suprema Corte está consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência.

2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país.

3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados.

4. Recurso extraordinário provido.

(RE n° 592.377/RS. Tribunal Pleno. Relator: Min. Marco Aurélio. Relator p/ Acórdão: Min. Teori Zavascki. DJe de 20/03/2015).

Transcrevo, por oportuno, a proclamação do julgamento:

O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, rejeitou a preliminar de prejudicialidade apontada pelo Ministério Público. No mérito, o Tribunal, decidindo o tema 33 da repercussão geral, por maioria, deu provimento ao recurso, vencido o Ministro Marco Aurélio (Relator), que lhe negava provimento e declarava inconstitucional o art. 5º, cabeça, da Medida Provisória nº 2.170-36, de 23 de agosto de 2001. (...)

Na mesma direção, o Superior Tribunal de Justiça já havia pacificado seu posicionamento no julgamento do REsp nº 973.827/RS, o qual foi analisado sob a sistemática dos recursos repetitivos e fixou as seguintes teses para os efeitos do art. 543-C do CPC:

É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.

Como se trata de matéria constitucional, este Tribunal não estava vinculado aos efeitos do REsp nº 973.827-RS, mas, por outro lado, deve seguir o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, em respeito ao art. 243, II e § 1º, do RITJRN, senão veja-se:

Art. 243. A decisão declaratória ou denegatória da inconstitucionalidade, quando unânime, terá aplicação obrigatória para o futuro aos casos análogos, ressalvadas as seguintes hipóteses:

I - se houver alteração do texto constitucional em que se fundamentou a decisão;

II - se o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidir contrariamente sobre a mesma lei ou ato idêntico inquinado de inconstitucional, mesmo que não conste ainda de súmula;

III - se houver possibilidade de modificação do pronunciamento do Tribunal Pleno, pela mudança de sua composição ou apresentação de novos fundamentos jurídicos, a critério da Câmara julgadora.

§ 1º Ocorrendo a circunstância prevista no inciso II, aplica-se a jurisprudência do Excelso Pretório.

§ 2º Poderá a Câmara deixar de remeter os autos ao Tribunal Pleno, quando este, embora por maioria de votos, houver firmado jurisprudência uniforme sobre a mesma matéria constitucional. (grifos acrescidos)

Nesse cenário, o Plenário deste Tribunal de Justiça rediscutiu a matéria em Embargos Infringentes e alinhou-se à recente decisão da Corte Suprema, conforme se verifica nas decisões adiante transcritas:

EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. POSSIBILIDADE ANTE O DECIDIDO NO RECURSO ESPECIAL Nº 973.827 (ART. 543-C) E A CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 5º DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.170-36/2001 AFIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N.º 592.377 EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL (ART. 543-B DO CPC). NECESSIDADE DE ADOÇÃO DO ENTENDIMENTO DO STF POR ESTA CORTE. ART. 243, II, § 1º, DO RITJRN. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO.

- O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 973.827, com base no art. 543-C do CPC (sistemática de recurso repetitivo), decidiu ser permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.

- O Supremo Tribunal Federal por meio do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 592.377 em regime de repercussão geral (art. 543-B do CPC), considerou constitucional o art. 5º da MP 2.170-36/2001, inviabilizando a manutenção do entendimento desta Corte de Justiça exarado na Arguição de Inconstitucionalidade em Apelação Cível nº 2008.004025-9/0002.00, ante o disposto no art. 243, II, § 1º, do RITJRN.

(Embargos Infringentes n° 2014.026005-6. Relator: Des. Amílcar Maia. Julgamento: 25/02/2015).

EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. DECLARAÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001 PELO SUPREMO TRIBUNAL...

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