Acórdão Nº 08015469820168205002 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 30-01-2020

Data de Julgamento30 Janeiro 2020
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08015469820168205002
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0801546-98.2016.8.20.5002
Polo ativo
ITAU FINANCEIRA
Advogado(s): WILSON SALES BELCHIOR
Polo passivo
VERA LUCIA MARQUES DE FREITAS OLIVEIRA
Advogado(s): CAMILA ARRUDA DE PAULA

TARIFAS BANCÁRIAS. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. MATÉRIA APRECIADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NA SISTEMÁTICA DE RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. SÚMULA 566. TARIFA DE CADASTRO. VALIDADE. INOCORRÊNCIA DE VANTAGEM EXCESSIVA. TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. LAUDO INEXISTENTE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. CONTRATAÇÃO DE SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE OPÇÃO DE ESCOLHA PELO CONSUMIDOR, SOB PENA DE CONFIGURAÇÃO DA VENDA CASADA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. RECURSO DA PARTE DEMANDADA. RESTITUIÇÃO SIMPLES. IRRESIGNAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.


PRELIMINAR. PRESCRIÇÃO. REJEIÇÃO PELOS MESMOS FUNDAMENTOS EXPOSTOS NA SENTENÇA.



ACÓRDÃO


Vistos e relatados estes autos do recurso cível virtual acima identificado, decidem os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer e dar provimento parcial ao recurso de BANCO ITAUCARD S.A., nos termos do voto do Relator.

Sem condenação da parte recorrente em custas processuais e honorários advocatícios, em face do resultado do julgamento.

Participaram do julgamento os Juízes Valdir Flávio Lobo Maia e Ana Carolina Maranhão Melo.


Natal/RN, 29 de janeiro de 2020.



RELATÓRIO


Trata-se de Recurso Inominado interposto por BANCO ITAUCARD S.A. em face de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos para ”condenar a demandada a restituir à parte autora a quantia de R$ 2.135,86 (já calculada em dobro), a ser acrescida de correção monetária pelo INPC, a contar da data do efetivo prejuízo (Súmula 43 STJ), devendo incidir juros de mora de 1% ao mês (artigos 398 e 406 do Código Civil/2002 c/c art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional), desde a citação (art. 405 do CC)”.

Em suas razões, a instituição financeira alega que as cláusulas impugnadas pela autora não são abusivas, tendo sido estabelecidas por livre vontade das partes. Requer a improcedência total dos pedidos formulados e, subsidiariamente, o afastamento da condenação a devolução em dobro dos valores indevidamente cobrados.


Contrarrazões oferecidas.


É o relatório.

VOTO


Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.


A irresignação merece prosperar em parte.


De início, não há que se falar em aplicação do prazo trienal (art. 206, § 3º, inciso IV, do Código Civil), mas sim do decenal (art. 205, do Código Civil).


A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça pacificou o tema e estabeleceu que a repetição de indébito por cobrança indevida de valores decorrente de relação contratual se sujeita ao prazo de dez anos, não se aplicando o lapso de três anos, tendo em vista que a pretensão de enriquecimento sem causa (ação in rem verso) possui como requisitos: enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos; ausência de causa jurídica; inexistência de ação específica.”(In. Embargos de Divergência em REsp nº 1.523.744 – RS, Rel. Min. OG FERNANDES, j. 20/02/2019, DJe 13/03/2019)


Segundo a Corte Especial, a discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil/2002, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica.


Por isso, considerando que, no caso ora sob análise, não houve decurso de mais dez anos entre a celebração do contrato e a propositura da ação, inocorreu a prescrição da pretensão autoral.


Passa-se a apreciação do mérito.


O Juízo sentenciante considerou abusivas as seguintes cobranças:tarifa de avaliação de bens e seguro de proteção financeira, determinando a repetição do indébito dos valores em dobro. Considerou válida a tarifa de cadastro.


A irresignação merece prosperar apenas quanto a foma da repetição de indébito estabelecida na sentença, qual seja a restituição em dobro dos valores referentes a tarifa de avaliação de bens e ao seguro de proteção financeira.


Com efeito, o Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 42, parágrafo único dispõe que:

consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”.


Ocorre que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que no caso de cobrança indevida, o engano é justificável se não decorrer de dolo ou culpa (negligência, imprudência ou imperícia) do fornecedor do serviço. Sendo certo que, a mera ocorrência de cobrança indevida não dá ensejo à devolução em dobro do valor pago” (In. AgRg no AREsp 327606/RJ, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Primeira Turma, j. 28/03/2017, DJe 05/04/2017).


Assim, para que seja determinada a repetição do indébito em dobro não basta a cobrança indevida, mas, também, a configuração de má-fé (dolo) ou culpa do fornecedor do serviço, de modo a afastar a ressalva legal “engano justificável”.


No caso vertente, trata-se de engano justificável, tendo em vista que a legalidade da cobrança das tarifas e despesas analisadas não eram pacíficas no entendimento dos Tribunais, sobretudo considerando que foi necessária a afetação e análise do tema em âmbito de Recursos Especiais Repetitivos para que fosse analisada a abusividade ou não das cláusulas, de modo que se o próprio Poder Judiciário à época da celebração do contrato não possuía entendimento consolidado acerca da questão jurídica, não é possível observar dolo ou culpa na conduta da instituição financeira.


Por isso, a devolução dos valores deve ser feita na forma simples.


Ante o exposto, voto por conhecer e dar provimento parcial ao recurso de BANCO ITAUCARD S.A. apenas para condenar a parte demandada a pagar a autora, a título de repetição do indébito na forma simples, a quantia de R$ 1.067,93 (hum mil sessenta e sete reais e noventa e três centavos), acrescida de correção monetária pelo INPC desde a data do pagamento indevido e juros de mora a partir da citação válida, mantendo a sentença recorrida nos demais termos.


Natal/RN, 29 de janeiro de 2020.



Submeto, nos termos do art. 40, da Lei nº 9.099/95, o presente projeto de acórdão para fins de homologação por parte do Juiz de Direito.


Daniel Henrique de Sá

Juiz Leigo


HOMOLOGAÇÃO


Com fundamento no art. 40, da Lei nº 9.099/95, bem como por nada ter a acrescentar ao entendimento acima exposto. HOMOLOGO na íntegra o projeto de acórdão para que produza seus jurídicos e legais efeitos



FRANCISCO SERÁPHICO DA NÓBREGA COUTINHO

Juiz Relator

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Natal/RN, 29 de January de 2020.

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