Acórdão Nº 08015583920238200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 28-07-2023

Data de Julgamento28 Julho 2023
Classe processualAGRAVO DE INSTRUMENTO
Número do processo08015583920238200000
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0801558-39.2023.8.20.0000
Polo ativo
ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):
Polo passivo
MUNICIPIO DE NATAL
Advogado(s):

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DO MUNICÍPIO DE NATAL. ALEGADA OMISSÃO QUANTO À REGRA PREVISTA NO ART. 111 DO CTN, QUE APREGOA QUE O BENEFÍCIO FISCAL DEVE VIR PREVISTO NECESSARIAMENTE EM LEI, A QUAL SE CONFERE INTERPRETAÇÃO LITERAL. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE PRONUNCIAMENTO QUANTO A TESE DEFENSIVA CAPAZ DE INFIRMAR A CONCLUSÃO ADOTADA. COBRANÇA DE TAXA DE LIMPEZA PÚBLICA – TLP. TETO PREVISTO NO ART. 104, § 4°, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL DE NATAL, QUE NÃO SE APLICA AO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. REGRA PROTETIVA APLICÁVEL AOS CASOS DE CONTRIBUINTE SUJEITO À COBRANÇA DOS DOIS TRIBUTOS (IPTU E TLP). INTERPRETAÇÃO DIVERSA QUE SIGNIFICARIA ESTENDER A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA – QUE SOMENTE ABRANGE OS IMPOSTOS – À TAXA EM ANÁLISE. EMBARGOS ACOLHIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES. RECURSO DO ESTADO JULGADO PREJUDICADO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas, acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em turma, à unanimidade, conhecer e dar provimento aos Embargos de Declaração do Município de Natal e julgar prejudicados os Embargos de Declaração do Estado do Rio Grande do Norte, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Tratam-se de Embargos de Declaração opostos pelo Município de Natal e pelo Estado do Rio Grande do Norte contra acórdão proferido pela 1ª Câmara Cível do TJRN, cuja ementa transcreve-se a seguir:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE JULGADA IMPROCEDENTE NA ORIGEM. EXECUÇÃO FISCAL PROPOSTA PELO MUNICÍPIO DE NATAL EM DESFAVOR DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. ALEGADA NULIDADE DA CDA POR CONSTAR COMO RESPONSÁVFEL A SECRETARIA DO ESTADO. INOCORRÊNCIA. ERRO MERAMENTE MATERIAL. POSSIBILIDADE DE CORREÇÃO, SEM QUE IMPLIQUE OFENSA À SÚMULA 392, DO STJ. COBRANÇA DE TAXA DE LIMPEZA PÚBLICA – TLP. NORMA VIGENTE À ÉPOCA DO FATO GERADOR QUE EXPRESSAMENTE LIMITAVA O VALOR DA TLP AO VALOR DO IPTU. VINCULAÇÃO QUE, NO CASO DOS AUTOS, INEVITAVELMENTE “ZERA” O MONTANTE DO TRIBUTO. APLICAÇÃO DOS MESMOS FUNDAMENTOS UTILIZADOS PELA SEÇÃO CÍVEL DO TJRN NO JULGAMENTO DO IRDR N° 0807753-16.2018.8.20.0000. TETO PREVISTO NO ART. 104, § 4°, DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL DE NATAL QUE EVIDENCIA A ILEGITIMIDADE DA COBRANÇA. AGRAVO PROVIDO.

Alega o Município de Natal, em síntese, que a “decisão embargada foi omissa quanto à análise da norma complementar federal que apregoa que o benefício fiscal deve vir previsto necessariamente em lei, a qual se confere interpretação literal (art. 111, CTN)”.

O Estado, por sua vez, sustenta que o acórdão “quedou-se obscuro quanto a condenação do Município ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, uma vez que não apontou o exato parâmetro para a liquidação, o que pode acarretar uma indesejável discussão em sede de cumprimento de sentença”.

Apesar de intimados, as partes não contrarrazoaram os recursos.

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos aclaratórios.

Sobre o expediente em riste, o Código de Processo Civil dispõe:

Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:

I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;

II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;

III - corrigir erro material.

De acordo com o artigo suso mencionado, os embargos de declaração são cabíveis quando houver obscuridade, contradição, omissão ou erro material na decisão impugnada.

In casu, sustenta a parte embargante, em síntese, que “a decisão embargada foi omissa quanto à análise da norma complementar federal que apregoa que o benefício fiscal deve vir previsto necessariamente em lei, a qual se confere interpretação literal (art. 111, CTN)”.

Com razão.

O objeto central da questão reside em verificar a legitimidade da cobrança realizada pelo Município de Natal em face do Estado do Rio Grande do Norte, a título de Taxa de Limpeza Pública – TLP.

Após aprofundar o estudo sobre as questões que envolvem o caso dos autos, registro a mudança do entendimento que vinha adotando até o momento.

Isso porque, a norma prevista no art. 104, § 4°, do CTMN, que limita o valor da Taxa de Limpeza Pública – TLP ao valor cobrado a título de IPTU, deve ser aplicada com temperamentos, mormente quando se estiver diante de contribuinte imune ao referido imposto, sob pena de, na prática, se projetar a regra de imunidade à taxa, em inaceitável afronta ao que prescreve o art. 150, VI, “a”, da Constituição Federal, e ao já consolidado entendimento de que não se aplica às taxas o instituto da imunidade tributária, que se refere somente a impostos[1].

De fato, utilizando-me dos métodos de interpretação da hermenêutica jurídica clássica, especialmente o sistêmico e o teleológico, penso que o legislador municipal, ao editar a norma do art. 104, § 4°, do CTMN, o fez pensando nos casos de contribuinte sujeito à cobrança dos dois tributos (IPTU E TLP), tratando-se de regra protetiva que estabelece um teto do qual o valor da taxa não poderá ultrapassar, não havendo qualquer confusão entre os fatos geradores dos tributos ou mesmo vinculação entre o valor do IPTU e o valor da TLP.

Tanto é assim que a Regra Matriz de Incidência da TLP está prevista nos incisos I e II do art. 104 do CTMN, o que possibilita sua cobrança independentemente do valor que o contribuinte pague a título de IPTU, apesar deste servir de teto para os casos nos quais efetivamente incida. Confira-se:

Art. 104 - A Taxa de Coleta, Remoção, Transporte e Destinação do Lixo (Taxa de Lixo) é calculada em

moeda corrente de acordo com as seguintes fórmulas:

I - para os imóveis edificados: TLP = Ui x R$ 98,21 x Ac (onde: Ui = fator de utilização do imóvel

conforme especificado na Tabela IV em anexo, Ac = área construída);

II - para imóveis não edificados: TLP = At x 0,03 x R$ 98,21 (onde: AT = área do terreno).

Por assim ser, entendo que a melhor interpretação extrai da norma o sentindo de que o “teto” serve para os casos em que há valor de IPTU a ser calculado. O que não é o caso do Estado do Rio Grande do Norte, já que o mesmo é imune à cobrança do aludido imposto, por força do art. 150, VI, “a”, da Constituição Federal.

Assim, não seria razoável impedir a cobrança da taxa sob o argumento de que a imunidade do Estado “zera” o seu valor, pois essa interpretação, na prática, estenderia a imunidade tributária recíproca - que somente abrange os impostos - para alcançar a taxa em análise, afrontando, também, o art. 111 do CTN, conforme defende o embargante.

Além disso, a questão da constitucionalidade da Taxa de Limpeza Pública já é pacificamente definida tanto no âmbito desta Corte de Justiça, como por parte do STF, que assentaram entendimento quanto àquela instituída pelo Município de Natal, ante sua especificidade e divisibilidade conforme se denota dos arestos abaixo ementados:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MUNICÍPIO DE NATAL. TAXA DE LIMPEZA PÚBLICA.CONSTITUCIONALIDADE. 1. A Taxa de Limpeza Pública - TLP instituída pelo Município de Natal/RN é constitucional, vez que constitui contraprestação de atuação estatal específica e divisível. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF - RE n° 490441 AgR, Relator Ministro EROS GRAU, julgado em 10.06.2008).

“DIREITO TRIBUTÁRIO, CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. EXECUÇÃO FISCAL. IPTU E TLP. (...) TAXA DE LIMPEZA PÚBLICA. CONSTITUCIONALIDADE EVIDENCIADA. SERVIÇO PÚBLICO ESPECÍFICO E DIVISÍVEL. EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRECEDENTES DO STF E DESTA CORTE DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJRN - AC n° 2012.012149-7, Relator Desembargador EXPEDITO FERREIRA, julgado em 14.02.2013).

É, pois, legítima a cobrança da Taxa de Limpeza Pública, dado que instituída em face de uma atuação estatal específica e divisível, não havendo fundamento legal ou constitucional apto a dispensar o Estado do seu pagamento, já que o serviço é por ele utilizado ou posto a sua disposição.

Por fim, há de se registrar, também, que o caso dos autos de fato difere daquele decidido pela Seção Cível no IRDR n° 0807753-16.2018.8.20.0000.

Naquele caso, havia normas expressas vinculando a TLP e a COSIP ao IPTU, que tratava de imóveis encravados em áreas non edificandi, de conservação e preservação ambiental, definidas pelo plano diretor de natal, quando o poder executivo reduzisse a alíquota do IPTU a zero por cento.

Ou seja, a matéria tratada nos autos do referido IRDR diz respeito à isenção de IPTU de imóveis construídos em área non edificandi, não sendo esta a característica própria dos imóveis tratados nestes autos. Além disso, o caso transcrito diz respeito à redução de alíquota de imposto (ou isenção fiscal) e não de imunidade tributária, cujos conceitos efetivamente divergem entre si.

Forte nesses argumentos, evoluo no meu entendimento para, afastando o vício apontado, admitir a legitimidade da cobrança de TLP realizada pelo Município de Natal em face do Estado do Rio Grande do Norte.

Nesse cenário, passo a analisar o pedido subsidiário do agravo do Estado, que diz respeito à alegada ilegalidade dos juros de mora e correção monetária existentes na CDA superiores à taxa SELIC.

Sobre o tema, apesar da Corte Suprema no Recurso Extraordinário com Agravo - ARE 1.216.078, processado sob o rito da Repercussão Geral, ter fixado a tese de que: “Os estados-membros e o Distrito Federal podem legislar sobre índices de correção monetária e taxas de juros de mora incidentes sobre seus créditos fiscais,...

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