Acórdão Nº 08015599820228205160 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 09-12-2023

Data de Julgamento09 Dezembro 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08015599820228205160
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801559-98.2022.8.20.5160
Polo ativo
ANTONIA LUCIA DA SILVA MELO FAUSTINO
Advogado(s): FRANCISCO CANINDE JACOME DA SILVA SEGUNDO
Polo passivo
BANCO BRADESCO S/A
Advogado(s): ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. CARTÃO DE CRÉDITO ENVIADO AO CONSUMIDOR SEM SOLICITAÇÃO. PRÁTICA COMERCIAL ABUSIVA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA Nº 532 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DANO MORAL ALEGADO. NÃO OCORRÊNCIA. MERO ABORRECIMENTO. SIMPLES ENVIO DO CARTÃO DE CRÉDITO PARA O ENDEREÇO DA PARTE AUTORA, SEM A PRÁTICA DE COBRANÇAS OU DE OUTRAS CONDUTAS QUE TENHAM COLOCADO O CONSUMIDOR EM SITUAÇÃO VEXATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE VIOLAÇÃO À HONRA DA PARTE AUTORA. SENTENÇA REFORMADA. APELO CONHECIDO E PROVIDO.

ACÓRDÃO


Acordam os Desembargadores que integram o Tribunal Pleno desta Egrégia Corte de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e julgar provido o recurso, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível nº 0801559-98.2022.8.20.5160 interposto pelo Banco Bradesco S.A. em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Upanema que, em sede de Ação de Indenização por Danos Morais ajuizada por Antonia Lucia da Silva Melo Faustino, julgou parcialmente procedente o pleito inicial, para condenar o Banco réu a pagar a parte autora, a título de indenização por danos morais, a quantia R$ 2.000,00 (dois mil reais), além de custas processuais e honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) sobre a condenação.

Em suas razões recursais, no ID 21953581, a parte apelante alega a ausência de requisitos autorizadores para a concessão do benefício da justiça gratuita.

Afirma ter agido no exercício regular do seu direito, não tendo praticado qualquer ato ilícito.

Defende não ter havido qualquer dano suportado pela parte apelada.

Entende ainda pela necessidade de fixação de quantum indenizatório em atenção aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Termina por pugnar pelo provimento do recurso.

Intimada, a parte apelada apresentou contrarrazões no ID 21953587, pleiteando o desprovimento do recurso.

Instada a se manifestar, o Ministério Público ofertou parecer no ID 22001727, assegurando inexistir interesse público a justificar sua intervenção no feito.

É o relatório.

VOTO

Restando preenchidos os requisitos de admissibilidade, voto pelo conhecimento do apelo.

Inicialmente, verifico que não merece prosperar o pleito de impugnação à justiça gratuita, formulada pela parte apelante, uma vez que a mesma foi concedida em primeira instância, restando preclusa a matéria, bem como não tendo a parte apelante apresentado nova documentação a justificar a revisão do tema.

Cinge-se o mérito do recurso em verificar o acerto da sentença que reconheceu o dano moral, bem como a razoabilidade desse valor.

Conforme comprovado nos autos, a parte demandada enviou cartão de crédito para a parte autora, não demonstrando que esta solicitou o mesmo, configurando-se a questão como prática abusiva, nos termos da Súmula n° 532 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

Constitui prática comercial abusiva o envio de cartão de crédito sem prévia e expressa solicitação do consumidor, configurando-se ato ilícito indenizável e sujeito à aplicação de multa administrativa.

Como bem destacado na sentença, “Em que pese a diligência deste Juízo ao ID n. 100294796 concedendo prazo para juntada de documentos comprobatórios a fim de comprovar a legalidade da contratação o demandado quedou-se inerte (ID n. 102523695), ou seja, não comprovou fato extintivo, modificativo e impeditivo do direito da autora, incorrendo assim no que fundamenta o art. 342 c/c art. 373, II, do CPC, com isso, o reconhecimento dos pleitos autorais é medida que se impõe”.

Assim, evidenciada a prática abusiva, inexistem motivos para a reforma da sentença quanto a este ponto.

Nada obstante o reconhecimento da prática abusiva, cumpre analisar a ocorrência de dano moral no caso concreto.

Para tanto, cumpre fixar que o caso vertente deve ser apreciado sob o manto da teoria da responsabilidade objetiva, aplicando-se os preceitos insculpidos pelo Código de Defesa do Consumidor, sobretudo o disposto em seu art. 14, caput, que prescreve:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Em extrato, pode-se afirmar que a teoria da responsabilidade objetiva está vinculada à ideia do risco, de modo que quem provoca uma lesão ao valor alheio é, ipso facto, responsável pelo ressarcimento decorrente.

Essa obrigação pela recomposição do prejuízo independerá da verificação – comprovação – de culpa na conduta do agente lesante. Tem-se, pois, como dispensada a demonstração da culpa, sendo suficiente a ocorrência do dano e sua associação à conduta que o causou (nexo de causalidade) para haver a responsabilidade.

Portanto, a responsabilidade objetiva se caracteriza por ser independente da presença de culpa no agir do que ocasionou a lesão, mas não prescinde da presença dos demais elementos da responsabilidade civil, tendo que haver nexo causal adequado entre a atividade do que causou o dano e a lesão provocada ao acervo jurídico do lesado.

Cumpre, pois, examinar a existência dos caracteres identificadores da responsabilidade civil na espécie, analisando se houve realmente o ato lesivo, identificando-se a parte responsável pelo ato, e, por fim, o nexo de causalidade entre a conduta e o possível dano experimentado.

A sentença reconheceu o dano moral, considerando que “restou evidenciado/provado indicativo mínimo de prejuízo, na medida em que não estamos diante de um mero encaminhamento do produto ou serviço, mas de uma situação em que a conduta da demandada ensejou transtorno no cotidiano da requerente, evidenciado o abuso de direito, tornando ilícito este ato, ensejando o ressarcimento a título de dano moral”.

Ocorre que, compulsando os autos, constata-se que a ocorrência de dano moral não restou demonstrada, não estando evidenciado o referido “transtorno no cotidiano da requerente”.

Conceituando o dano moral, leciona Yussef Said Cahali que pode ser considerado como “...a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do homem e que são a paz, a tranqüilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos'; classificando-se, desse modo, em dano que afeta a 'parte social do patrimônio moral' (honra, reputação, etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade, etc.); dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante, etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.)” (Dano Moral, pp. 20/21).

Na hipótese sob vergasta, afigura-se ausente a ocorrência do alegado dano moral, posto que...

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