Acórdão Nº 08021467420208205004 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 3ª Turma Recursal, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08021467420208205004
Órgão3ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
2ª TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0802146-74.2020.8.20.5004
Polo ativo
CARLOS HEBERT BARBOSA CAMPOS e outros
Advogado(s): GABRIEL DE ARAUJO FONSECA, GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO
Polo passivo
WEBJET PARTICIPACOES S.A. e outros
Advogado(s): GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO, GABRIEL DE ARAUJO FONSECA


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS

SEGUNDA TURMA RECURSAL TEMPORÁRIA

RECURSO CÍVEL INOMINADO VIRTUAL Nº 0802146-74.2020.8.20.5004

8º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DA COMARCA DE NATAL/RN

RECORRENTE: WEBJET LINHAS AEREAS S.A.

ADVOGADO: GUSTAVO ANTÔNIO FERES PAIXÃO

RECORRIDO: CARLOS HERBET BARBOSA CAMPOS

ADVOGADO: LUIZ FRANÇA BELARMINO

RECORRENTE: CARLOS HERBET BARBOSA CAMPOS

ADVOGADO: LUIZ FRANÇA BELARMINO

RECORRIDO: WEBJET LINHAS AEREAS S.A.

ADVOGADO: GUSTAVO ANTÔNIO FERES PAIXÃO

JUÍZA RELATORA: VALÉRIA Maria Lacerda Rocha

EMENTA: RECURSO INOMINADO. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. COMPANHIA AÉREA. CANCELAMENTO UNILATERAL DE VOO DE VOLTA EM FACE DE NO SHOW NO VOO DE ORIGEM. ABUSIVIDADE. VIOLAÇÃO A BOA-FÉ CONTRATUAL. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO DECORRENTE DE DANO EXTRAPATRIMONIAL. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIAL PROCEDENTE O PLEITO AUTORAL. RECURSO DA EMPRESA. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO E DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. NÃO ACOLHIMENTO. PRECEDENTE DO STJ E DO STF. APLICAÇÃO DO CDC. EMPRESA QUE RESPONDE PELA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INDENIZAÇÃO ARBITRADA EM R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS), EM RESPEITO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. RECUSO DA PARTE AUTORA PUGNANDO PELA MAJORAÇÃO DOS DANOS MORAIS. RECUSO NÃO CONHECIDO. DESERÇÃO. JUNTADA DO COMPROVANTE DE PAGAMENTO DE PREPARO APÓS O TRANSCURSO DAS QUARENTA E OITO HORAS (48H). CONTAGEM DO PRAZO MINUTO A MINUTO. ART. 132, § 4º DO CÓDIGO CIVIL. RECUSO NÃO CONHECIDO.

ACÓRDÃO

VISTOS, relatados e discutidos estes autos do Recurso Inominado acima identificado, decidem os Juízes que integram a Segunda Turma Recursal Temporária dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, voto por não conhecer do recurso interposto pela parte autora, em face da deserção por intempestividade do preparo. Condenação em custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados no importe de 10% sobre o valor da condenação (Enunciado 122 do Fonaje). Outrossim, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto pela empresa, mantendo-se a sentença por seus próprios fundamentos, com os acréscimos acima. Condenação em custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados no importe de 10% sobre o valor da condenação.

Natal/RN, 14 de junho de 2022.

VALÉRIA MARIA LACERDA ROCHA

Juíza Relatora

RELATÓRIO

SENTENÇA

Dispensado o relatório, nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/1995.

O caso vertente evidencia incontroversa relação de consumo entre as partes litigantes, devendo ser aplicado o Código de Defesa do Consumidor, o qual conceitua consumidor como sendo a pessoa física que adquire produto ou serviço como destinatário final, enquadrando-se como fornecedor aquele que insere o aludido produto ou serviço no mercado de consumo.

É fato incontroverso que a parte autora adquiriu junto à empresa demandada passagens aéreas de ida e volta (São/Florianópolis – Florianópolis/São Paulo).

Por fato atribuível à própria parte autora, não houve o embarque no voo de ida.

A controvérsia reside, então, na utilização da passagem de volta, haja vista que, segundo informa a parte autora, teve que arcar com os custos de aquisição de uma nova passagem (R$ 1.230,98), eis que o trecho de volta teria sido cancelado à sua revelia, razão pela qual pugna pela restituição desse valor, bem como indenização por danos morais (R$ 24.619,60).

Em sede de contestação, a empresa demandada sustenta, em resumo, que o procedimento de cancelamento é lícito, eis que há previsão contratual para tanto, de modo que o consumidor deveria ter procedido com prévio aviso de que utilizaria o trecho de volta e se trata de passagem adquirida com base tarifária promocional.

Contudo, é entendimento assente no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, ao qual me filio (a exemplo, REsp 1699780/SP, julgado em 11/09/2018, cujos trechos a seguir citados são extraídos do acórdão respectivo), que configura “conduta abusiva o cancelamento automático e unilateral, por parte da empresa aérea, do trecho de volta do passageiro que adquiriu as passagens do tipo ida e volta, em razão de não ter utilizado o trecho inicial”.

É que além de “obrigar o consumidor a adquirir nova passagem aérea para efetuar a viagem no mesmo trecho e hora marcados, a despeito de já ter efetuado o pagamento”, configurando a abusividade da cláusula contratual nesse sentido, ainda resta caracterizada a hipótese de venda casada, “pois condiciona o fornecimento do serviço de transporte aéreo do ‘trecho de volta’ à utilização do ‘trecho de ida’."

A jurisprudência das Turmas Recursais dos Juizados Especiais do Rio Grande do Norte caminha no mesmo sentido:

PASSAGEM AÉREA AQUISIÇÃO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. NÃO UTILIZAÇÃO DO VÔO DE IDA POR PARTE DO AUTOR. PRETENSÃO DE USUFRUIR DO VÔO DE VOLTA. NEGATIVA PELA EMPRESA AÉREA. NO-SHOW. IMPOSIÇÃO À AQUISIÇÃO DE NOVA PASSAGEM. CONDUTA ABUSIVA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL DETERMINANDO A RESTITUIÇÃO DO IMPORTE PAGO A MAIOR E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RECURSO INOMINADO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS DIVERSOS DO EXISTENTES. IRRESIGNAÇÃO CONHECIDA E NÃO PROVIDA. - A ausência de qualquer destaque para cláusula restritiva de direito do consumidor, no show, afronta o princípio da transparência (art. 4º, do CDC), dificulta a ampla informação sobre as restrições impostas e gera nulidade da cláusula que prevê o cancelamento antecipado de trecho ainda não utilizado (art. 51, inciso XI combinado com o art. 54, § 4º, do CDC). ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos do recurso cível virtual acima identificado, decidem os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso, para negar provimento, mantendo a Sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Condenação em custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação. Esta Súmula servirá de Acórdão, nos termos do art. 46, da Lei 9.099/95. Natal/RN, 20 de abril de 2017. FRANCISCO SERÁPHICO DA NÓBREGA COUTINHO Juiz Relator (0830717-16.2015.8.20.5106, Rel. Gab. do Juiz Francisco Seráphico da Nóbrega Coutinho, RECURSO INOMINADO, Primeira Turma Recursal, juntado em 24/04/2017).

- Do dano material

No caso dos autos, houve quebra da boa-fé contratual a partir do momento em que se deu o cancelamento unilateral do trecho de volta, apesar de a autora já ter previamente pago por tal serviço.

Entretanto, deve-se frisar o ponto de que a abusividade contratual consiste no fato de a empresa, unilateralmente, cancelar o trecho de volta, forçando o consumidor a ter de arcar com os custos de retorno ao local de origem.

A parte autora pretende ver-se ressarcida do valor de R$ 1.230,98 (comprovante de ID 53103338 – Pág. 1 – valor/ documento não impugnado especificamente pela parte demandada).

Como a demandada havia restituído o valor de R$ 61,05 (ID 55622967 – Pág. 5 – fato não impugnado pela parte autora), a empresa requerida deve arcar com a diferença do valor por ela pago para aquisição e realização do trecho de retorno, ou seja, R$ 1.169,93 (= R$ 1.230,98 – R$ 61,05).

- Do dano moral

No caso, como se argumentou, restou devidamente demonstrada a abusividade de cláusula a que restou sujeita a parte autora, além da incidência da hipótese de venda casada, forçando o consumidor à aquisição de nova passagem, sob pena de não ter como concluir a viagem.

É certo que tais fatos não podem ser considerados mero inadimplemento contratual, posto que ofensiva à própria dignidade do consumidor.

Registre-se que os julgados mencionados antes amparam tal conclusão, pelo dever da demandada de indenizar moralmente os consumidores, em situações como a dos autos.

Assim, demonstrada a reprovabilidade da conduta da parte ré, deve-se ponderar a extensão do dano e também as condições pessoais da vítima e as condições econômicas da parte contrária.

O quantum do dano moral não está previsto expressamente em lei, devendo ser observada a doutrina e a jurisprudência aplicáveis em cada caso, sob a ótica do artigo 944 do Código Civil, o qual estabelece que “a indenização mede-se pela extensão do dano”, não se olvidando que o dano moral possui caráter compensatório para a vítima.

Por estas razões e de acordo com as circunstâncias do caso em tela, razoável se afigura a fixação do valor do dano moral em R$ 3.000,00 (já que ausentes elementos específicos que demonstrem que o dano tenha sido de maior monta), valor que não é ínfimo e nem exagerado, motivo pelo qual reputo razoável.

- DISPOSITIVO

Ante o exposto, reconhecendo a abusividade da cláusula que autoriza o cancelamento unilateral do trecho de volta do voo contratado, JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pleitos autorais, nos termos do art. 487, I, do CPC, para CONDENAR a parte requerida:

A) a restituir à autora o valor de R$ 1.169,93, a ser acrescido de correção monetária pelo INPC, a contar da data do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ), devendo incidir juros de mora de 1% ao mês (artigos 398 e 406 do Código Civil/2002 c/c art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional), desde a citação (art. 405 do CC); e

B) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 em favor da parte autora, devendo incidir juros de mora de 1% ao mês (artigos 398 e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT