Acórdão Nº 08024642220198205124 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Primeira Câmara Cível, 10-04-2023

Data de Julgamento10 Abril 2023
Classe processualAPELAÇÃO CÍVEL
Número do processo08024642220198205124
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0802464-22.2019.8.20.5124
Polo ativo
DCASA URBANISMO E PARTICIPACOES LTDA e outros
Advogado(s): AUGUSTO FELIPE ARAUJO PINHO, GIRLEIDE DANTAS DE ARAUJO PAULINO
Polo passivo
WILSON JOSE FERREIRA e outros
Advogado(s): IURI DOS SANTOS LIMA E SOUSA

EMENTA: CIVIL, CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. ALEGAÇÃO DE FORÇA MAIOR. INOCORRÊNCIA. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. VERIFICAÇÃO. ATUAÇÃO ORDINÁRIA DE ÓRGÃOS FISCALIZADORES E LICENCIADORES. RISCO DA ATIVIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE. CULPA EXCLUSIVA DO VENDEDOR. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES INVESTIDOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 543/STJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.


ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento à Apelação Cível, nos termos do voto do Relator, parte integrante do julgado.

RELATÓRIO

Apelação Cível interposta pela DCASA Urbanismo e Participações LTDA em face de sentença da 2ª Vara Cível da Comarca de Parnamirim/RN que, nos autos da Ação Ordinária nº 0802464-22.2019.8.20.5124, contra si movida por Wilson José Ferreira, foi exarada nos seguintes termos (Id 18195604):

Isto posto, julgo PROCEDENTE a pretensão autoral para:

a) decretar a rescisão do contrato particular de promessa de compra e venda realizado entre WILSON JOSÉ FERREIRA, BIANCA FONTES DORE FERREIRA e DCASA URBANISMO E PARTICIPAÇÕES LTDA, referente ao lote 02, quadra F do empreendimento “Residencial Monte Carlo”;

b) determinar que as demandadas restituam à promovente, de forma simples, a quantia integralmente paga por ocasião do contrato objeto dos autos, devendo incidir juros de 1% ao mês pelo INSS, a partir da citação, e correção monetária desde o respectivo pagamento;

c) determinar, ainda, o pagamento de R$ 10.821,18 (dez mil, oitocentos e vinte e um reais e dezoito centavos), referente à repetição das arras, a título de indenização, na forma do art. 418 do Código Civil, devendo incidir juros de 1% (um por cento) ao mês e correção monetária a partir da sentença.

Condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.

Publique-se e registre-se. Intimem-se.

Irresignada, a insurgente persegue reforma do édito judicial a quo.

Em suas razões (Id 18195608), defende que: i) “o atraso na conclusão das obras do Residencial Monte Carlo não se deu por desídia ou responsabilidade exclusiva da parte ré, mas decorreu de fatos alheios à sua vontade, supervenientes e de difícil previsão”; ii) “a apelante foi notificada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte acerca do lançamento de poeira no condomínio vizinho, o que ensejou, para evitar o embargo da obra, a adoção de medidas mitigadoras, devidamente informadas à promotoria responsável, entre elas a adoção de uso de carros-pipa para realizar a umidificação de todo a área em que fosse haver movimentação de terra, apta a gerar a aspersão de particular sólidas no ar”; iii) “houve por parte da SEMUR questionamento sobre a parte do empreendimento que é contígua à área de proteção ambiental da margem do Rio Taborda, o que representaria suposto descumprimento ao item 1 das condicionantes da Licença de Instalação [o Empreendedor fica ciente de que não poderá haver infiltração direta no solo na faixa de 150 metros da margem do Rio Taborda]. Entendia aquele distinto órgão que a apelante eventualmente não estaria respeitando os limites geográficos da licença, o que poderia ensejar embargo em parte da obra, sua demolição”; iii) “Na mesma ocasião, questionou-se, sem razão acerca do descumprimento dos termos da licença de instalação, o que ensejaria a modificação quanto ao projeto de esgotamento sanitário, aprovado para tratamento por meio de Estação de Tratamento de Esgotos compacta, para 130 lotes do empreendimento, e 290 lotes com tratamento individual, dentro dos próprios lotes”; iv) “Não se trata, portanto, de meras questiúnculas burocráticas, de fácil previsão, capazes de serem absorvidas pelo poder de antecipação do empreendedor, mas de sérios problemas que impactaram o cronograma de entrega do Condomínio Monte Carlos, o que veio a ocorrer em agosto de 2019”; e v) “o valor tido como arras no caso ora versado significa mera parcela do preço, eis que o bem fora adquirido de forma parcelada. Não serviu, assim, a referida primeira parcela como uma confirmação de que os apelados queriam adquirir o imóvel objeto do negócio, eis que quando do seu pagamento o contrato já estava celebrado”.

Cita julgados que avalia subsidiar a sua argumentação, pugnando pelo conhecimento e provimento do recurso para “a) reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos autorais formulados, para a devolução de 75% (setenta e cinco por cento) do valor adimplido pelos compradores; b) caso esta egrégia Câmara Cível entenda ser o atraso atribuível à apelante, o que se admite apenas por argumentar, que lhe seja dado provimento para afastar a devolução das arras”.

Contrarrazões ao Id 18195614, pugnando pela manutenção incólume do decisum.

Com vista dos autos, o Ministério Público declinou de sua intervenção (Id 18418941).

É o relatório.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço da Apelação Cível.

Cinge-se o mérito recursal em aferir o acerto da decisão de primeiro grau que, considerando como configurado o inadimplemento das obrigações assumidas pela apelante frente aos apelados, declarou rescindido o contrato e a condenou a integral restituição dos valores adimplidos, além da repetição das arras.

Adiante-se, antes de mais nada, que o presente caso trata de relação consumerista, pois os apelantes e a apelada enquadram-se no conceito de fornecedor e consumidor previstos, respectivamente, nos art. 3º[1] e 2º[2], do CDC.

In casu, os recorridos firmaram com a apelante contrato de compra e venda tendo como objeto o lote 02, quadra F, do Condomínio Residencial Monte Carlo, localizado em Parnamirim/RN, com 385,37 metros quadrados, pelo valor de R$ 180.353,16 (cento e oitenta mil, trezentos e cinquenta e três reais e dezesseis centavos).

É incontroverso que o prazo de entrega da obra era o dia 30.06.2018, mas só foi realizado aos 29.08.2019, após o aforamento da presente demanda, ocorrido aos 08.03.2019.

Nesse cenário, incide a primeira parte do entendimento consolidado na Súmula 543[3], do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor.

No mesmo pórtico:

APELAÇÕES CÍVEIS. RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE IMPORTÂNCIAS PAGAS. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CULPA EXCLUSIVA DO VENDEDOR. APLICAÇÃO DA SÚMULA 543 DO STJ. I - Pela dicção do enunciado 543 do STJ, a rescisão do contrato por culpa exclusiva da vendedora impõe a restituição integral das parcelas pagas pela promitente compradora; II - A comissão de corretagem, a luz do que se contém no art. 725 do CC, é devida quando concretizado ou aperfeiçoado o negócio imobiliário, com a efetiva venda do imóvel. Se posteriormente à venda houver a rescisão do contrato, ainda assim o corretor é merecedor de sua comissão, ainda mais quando efetivamente pactuado, como sói ocorrer no caso em tela; III - Atento a que a valoração dos honorários está sujeito a critérios delineados na lei, e a considerar que para o cômputo da condenação há de ser entendido o conteúdo econômico da causa, ou seja, o valor principal com incidência de correção monetária e juros, o arbitramento no percentual máximo legalmente previsto no caso concreto não se mostra exorbitante. Mantido, portanto; IV - Sentença que não se ressente de mácula e fica, por isso mesmo, confirmada.APELAÇÕES CÍVEIS CONHECIDAS E DESPROVIDAS. (TJ-GO – Apelação Cível (CPC): 03244864020138090051, Relator: LEOBINO VALENTE CHAVES, Data de Julgamento: 20/11/2018, 3ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 20/11/2018). (Destaques acrescidos).

Ademais, não prospera a alegação de ocorrência de força maior em virtude “questionamentos” do Ministério Público e do órgão licenciador municipal sobre a execução e viabilidade da obra. Ora, tais fatores são considerados intrínsecos ao risco da atividade (fortuito interno), não afastando o condão de afastar a obrigação de cumprir o prazo avençado.

É esse o entendimento reiterado desta Corte de Justiça:

DIREITO CIVIL, DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS AUTORAIS. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA CARACTERIZADO. INADIMPLÊNCIA CONTRATUAL COMPROVADA NOS AUTOS. RISCO DO EMPREENDIMENTO. FATORES NÃO CARACTERIZADORES DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR. DANOS MORAIS OCORRENTES. VALOR A SER ARBITRADO DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REFORMA DA SENTENÇA NESSE PONTO. ENTENDIMENTO FIRMADO NESTA CORTE DE QUE O ATRASO NA ENTREGA DE IMÓVEL GERA DIREITO À REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS RELATIVOS AOS ALUGUÉIS QUE DEIXARAM DE SER AUFERIDOS. DANO PRESUMIDO. APLICAÇÃO DE MULTA POR INADIMPLEMENTO. CUMULATIVIDADE ENTRE MULTA PENAL E INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. NÃO APLICABILIDADE. JULGAMENTO RECENTE DE RECURSO REPETITIVO PELO STJ. TEMA 970. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELA EMPRESA DEMANDADA. APELAÇÃO CÍVEL DA PARTE AUTORA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDA.” (AC 2016.11242-1, Rel.ª Des.ª Judite Nunes, 2ª Câmara Cível, j. 12/11/2019 –...

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