Acórdão Nº 08026156520218205108 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 1ª Turma Recursal, 08-02-2024

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Classe processualRECURSO INOMINADO CÍVEL
Número do processo08026156520218205108
Órgão1ª Turma Recursal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
1ª TURMA RECURSAL

Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0802615-65.2021.8.20.5108
Polo ativo
MARIA VERA LUCIA MORAIS DE LIMA
Advogado(s): GERLIANN MARIA LISBOA DE AQUINO
Polo passivo
BANCO BGN S/A
Advogado(s): SUELLEN PONCELL DO NASCIMENTO DUARTE

PODER JUDICIÁRIO

ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS, CRIMINAIS E DA FAZENDA PÚBLICA

PRIMEIRA TURMA RECURSAL

RECURSO CÍVEL Nº 0802615-65.2021.8.20.5108

RECORRENTE: MARIA VERA LÚCIA MORAIS DE LIMA

ADVOGADA: GERLIANN MARIA LISBOA DE AQUINO

RECORRIDO: BANCO BGN S/A.

ADVOGADO: SUELLEN PONCELL DO NASCIMENTO DUARTE

RELATORA: JUÍZA SANDRA SIMÕES DE SOUZA DANTAS ELALI

EMENTA: CIVIL E CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NAS RELAÇÕES DE CONSUMO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS C/C DECLARATÓRIA NEGATIVA DE DÉBITO E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AUSÊNCIA DE CONTRATO. DESCONTOS INDEVIDOS. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO DO AUTOR. INTELIGÊNCIA DO ART. 373, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO CONTRATO. CONDENAÇÃO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM REPETIÇÃO DO INDÉBITO, NA FORMA SIMPLES. COMPENSAÇÃO DO VALOR CREDITADO EM FAVOR DA CORRENTISTA. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL. RECURSO INOMINADO. AUSÊNCIA DE PROVA DA EXISTÊNCIA DO CONTRATO QUESTIONADO. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE HIPÓTESE DE ENGANO JUSTIFICÁVEL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CONSUMIDOR QUE TEM DIREITO À REPETIÇÃO DO INDÉBITO, POR VALOR IGUAL AO DOBRO DO QUE PAGOU EM EXCESSO, ACRESCIDO DE CORREÇÃO MONETÁRIA E DE JUROS LEGAIS. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO QUE INDEPENDE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE COBROU VALOR INDEVIDO, REVELANDO-SE CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIA CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA (STJ. CORTE ESPECIAL. EAREsp. 76608/RS, RELATOR MINISTRO OG FERNANDES, JULGADO EM 21/10/2020) - TEMA 929 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM FIXADO OBSERVANDO-SE OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE E OS PARÂMETROS DA TURMA RECURSAL. CONFIRMAÇÃO DA COMPENSAÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do recurso acima identificado, ACORDAM os Juízes da Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento parcial, nos termos do voto da relatora, parte integrante deste acórdão. Sem condenação em custas e em honorários advocatícios em face do disposto art. 55, caput, da Lei nº 9.099/95.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso inominado interposto por MARIA VERA LÚCIA MORAIS DE LIMA contra a sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos contidos na inicial da ação que ajuizou em desfavor do BANCO BGN S/A, declarando a nulidade do contrato de empréstimo consignado nº 51-818945133/16, com a determinação da exclusão dos descontos mensais pelo banco e condenando a instituição financeira a restituir-lhe, na forma simples, todos os valores descontados indevidamente de sua conta, acrescidos de juros e de correção monetária, e a lhe pagar a importância de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de compensação por danos morais, com juros e correção monetária, deferindo o pedido contraposto de compensação formulado pelo ora recorrido.

Ao fundamentar a procedência parcial dos pedidos iniciais, o Juízo a quo registrou que “Em sua contestação o banco demandado apresenta alegações genéricas, no sentido da regularidade do pacto firmado entre as partes. Contudo, ignorando totalmente o ônus da prova, seja pela regra geral do art. 373, II do CPC, e, mais ainda pelas normas consumeristas, não procedeu a juntada do instrumento contratual, não apresentando assim qualquer fato impeditivo ou modificativo do direito autoral, o que por sua vez reforça a tese constante na inicial no sentido de que o requerente não realizou o negócio jurídico contestado”.

Acrescentou que “não me parece que o engano/equívoco da parte promovida ao efetuar os descontos seja injustificável ao ponto de autorizar a repetição em dobro do indébito, visto que atuou inicialmente amparado em contratação comum na praxe bancária”. Entendendo ser “Devida, pois, a mera restituição simples dos valores indevidamente descontados, de forma a evitar o enriquecimento sem causa”. E que “De igual modo, a fim de acompanhar o entendimento predominante em nossas turmas recursais, e, visando evitar o enriquecimento indevido do autor/consumidor, os valores disponibilizados devem ser devidamente compensados/abatidos do quantum a ser ressarcido ao consumidor”.

Em suas razões recursais, MARIA VERA LÚCIA MORAIS DE LIMA requereu os benefícios da gratuidade da justiça e sustentou a necessidade de reforma parcial da sentença recorrida, afirmando que há de ser julgado improcedente o pedido contraposto deferido pelo Juízo a quo, por entender se tratar de prática abusiva e que se equipararia “à amostra grátis”.

Quanto à repetição do indébito, alegou que “resta demonstrada a má-fé da parte contrária em tentar imputar débito não solicitado pela parte Recorrente, realizando cobrança de dívida inexistente e, portanto, não sendo a hipótese de erro justificável”, razão pela caberia a repetição em dobro dos valores indevidamente descontados do seu benefício previdenciário, a teor do disposto no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.

Reiterou a ausência da contratação dos serviços, registrando que não foi juntado aos autos contrato que comprovasse a pactuação em apreço e que o valor da compensação por danos morais foi “completamente desproporcional e inadequado quando observada a lesão sofrida pela Recorrente, posto que há indícios suficientes de que a Sra. Maria Vera Lucía foi vítima de contratação completamente fraudulenta”, pleiteando a majoração do quantum indenizatório.

Requereu, afinal, a reforma da sentença para que seja julgado procedente o seu pedido de restituição em dobro, afastando-se a compensação e majorando-se os danos morais para R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Em suas contrarrazões, a instituição financeira recorrida requereu o desprovimento do recurso, com a confirmação da sentença por seus próprios fundamentos.

É o relatório.

VOTO


Inicialmente, há de se observar que o pedido de gratuidade da justiça já foi deferido pelo Juízo a quo, razão pela qual a recorrente deixou de efetuar o respectivo preparo, inexistindo elementos que determinem a revogação da concessão desse benefício à recorrente.

Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade do recurso, impõe-se que seja, assim, conhecido. Com efeito, evidencia-se o cabimento do recurso, a legitimação para recorrer, o interesse recursal, a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, bem como a tempestividade e a regularidade formal, tratando-se a recorrente de beneficiária da gratuidade da justiça.

Pelo exame dos autos verifica-se que da sentença recorrida consta o seguinte:

[…] Inicialmente, no tocante a preliminar de inépcia da inicial por Comprovante de residência desatualizado, entendo que não merece prosperar, tendo em vista que o código de processo civil não dispõe que o comprovante de residência tenha prazo de validade. Ademais, a parte a autora compareceu à audiência de conciliação.

Afasto a preliminar de incompetência do Juizado Especial, posto que, em que pese seja sabido que, a teor do art. 3º da Lei n.º 9.099/95, os juizados especiais cíveis detêm competência para processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, de modo que a realização de prova pericial acaba por afastar-se de sua alçada, no caso dos autos, contudo, o instrumento contratual sequer fora juntado.

No tocante a preliminar de falta de interesse de agir, percebo que a mesma não merece acolhimento, visto que não se impõe a parte autora a obrigatoriedade de tentar resolver extrajudicialmente a controvérsia, diante do direito de acesso à justiça e a garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional (art. 5º, inc. XXXV, da CF/88), mesmo porque a experiência demonstra o insucesso dessas tentativas.

Por fim, também não merece prosperar a preliminar de prescrição seja pela aplicação as relações contratuais da prescrição decenal, conforme entendimento sedimentado no Superior Tribunal de Justiça (REsp 1708326/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/08/2019, DJe 08/08/2019), seja pela inexistência de prescrição quando diante de negócio jurídico nulo, consoante será verificado a seguir.

Não havendo outras preliminares ou questões processuais para analisar, passo ao exame do mérito.

Destaque-se que se encontra consubstanciada a hipótese de julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355, I, do CPC, pois o deslinde da causa independe da produção de provas em audiência, havendo, ademais, possibilidade do julgamento do processo no estado em que se encontra, se mostrando desnecessária a realização de quaisquer outras diligências, a exemplo da realização de audiência de instrução e expedição de ofício às instituições financeiras, especialmente em razão de já ter este juízo entendimento firmado acerca da matéria, art. 370, parágrafo único, do CPC.

Aliás, segundo jurisprudência do STJ, ao juiz, como destinatário da prova, cabe indeferir as que entender impertinentes, sem que tal implique cerceamento de defesa/ação.

A situação narrada na inicial enseja a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, pois no negócio jurídico celebrado pelas partes a autora se encaixa no conceito de consumidor (art. 2º da Lei n.º 8.078/90) e o demandado no de fornecedor (art. 3º da Lei n.º 8.078/90...

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