Acórdão Nº 08027354320208200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 12-05-2020

Data de Julgamento12 Maio 2020
Classe processualRECURSO EM SENTIDO ESTRITO
Número do processo08027354320208200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - 0802735-43.2020.8.20.0000
Polo ativo
COSME WENDELL RODRIGUES GOMES e outros
Advogado(s):
Polo passivo
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):

Recurso em Sentido Estrito 0802735-43.2020.8.20.0000

Origem: Juízo da 3ª Vara da Comarca de Macaíba

Recorrente: Cosme Wendel Rodrigues Gomes

Defensor Público: José Eduardo Brasil Louro da Silveira

Recorrente: Francigleydson Andrade dos Santos

Defensor Público: Rodolpho Penna Lima Rodrigues

Recorrente: Wagton Akin Fernandes

Defensora Pública: Paula de Vasconcelos de Melo Braz

Recorrido: Ministério Público

Relator: Desembargador Saraiva Sobrinho

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSOS EM SENTIDO ESTRITO. ANÁLISE CONJUNTA DADA A SIMILITUDE DAS MATÉRIAS. CRIME DE HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, §2º, I E IV DO CP). CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO A ENSEJAR A SUBMISSÃO DO CASO AO TRIBUNAL DO JÚRI POPULAR, SOB PENA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PRÓPRIA DO JUÍZO NATURAL. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONSISTENTES A AFASTAR AS QUALIFICADORAS. SENTENÇA DE PRONÚNCIA EM CONFORMIDADE COM O ART. 413 DO CPP. PRECEDENTES DO STJ. DECISUM MANTIDO. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO.

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores da Câmara Criminal deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos e em consonância com a 5ª Procuradoria de Justiça, conhecer e desprover os RESE’s, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

1. Recursos em Sentido Estrito interpostos por Cosme Wendel Rodrigues Gomes, Francigleydson Andrade dos Santos e Wagton Akin Fernandes, em face da decisão do Juiz da 3ª Vara da Comarca de Macaíba, o qual na AP 0100264-62.2016.8.20.0121, lhes pronunciou como incurso no art. 121, §2º, I e IV do CP (ID 5637458, págs. 24 e ss).

2. Como razões (IDs 5637460, págs. 02-11 e 12-18, e 5637461, págs. 14-25) sustentam resumidamente:

i) inexistirem indícios suficientes da autoria delitiva, porquanto a imputação se acha desconexa com os demais elementos de convicção, sendo os testemunhos insuficientes; e

ii) a necessidade de afastamento das qualificadoras do motivo torpe e impossibilidade de defesa da vítima.

3. Pugna pela despronúncia e, subsidiariamente, a desclassificação para homicídio simples.

4. Contrarrazões junto ao ID 5637461 e 462.

5. Parecer ministerial pelo desprovimento (ID 5810870).

6. É o relatório.

VOTO

7. Conheço da Insurgência.

8. No mais, sem razão o Recorrente.

9. Com efeito, cediço não reclamar a sentença de pronúncia, em absoluto, uma certeza jurídica, conformando-se simplesmente com a coexistência da materialidade e de indícios da autoria, dicção do art. 413, do CPP[1].

10. Sobre a temática, Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal comentado, 12ª ed, 2013) leciona:

"(...) O mínimo que se espera, para haver pronúncia, é a prova certa de que o fato aconteceu, devendo o magistrado indicar a fonte de seu convencimento nos elementos colhidos na instrução e presentes nos autos. (...). O aforismo in dubio pro societate que – malgrado as críticas procedentes à sua consistência lógica, tem sido reputada adequada a exprimir a inexigibilidade de certeza de autoria do crime, para fundar a pronúncia -, jamais vigorou no tocante à existência do próprio crime, em relação a qual se reclama esteja o juiz convencido. O convencimento do juiz, exigido na lei, não é obviamente a convicção íntima do jurado, que os princípios repeliram, mas convencimento fundado na prova: donde, a exigência – que aí cobre tanto a da existência do crime, quanto da ocorrência de indícios de autoria, de que o juiz decline, na decisão os motivos do seu convencimento. A sentença de pronúncia é baseada apenas na materialidade do fato e na existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, atento ao dispositivo no art. 413 do Código de Processo Penal (...)". grifei

11. Na seara jurisprudencial, destaca-se julgado do STJ:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DESCLASSIFICAÇÃO. CULPA CONSCIENTE OU DOLO EVENTUAL. PRESENÇA DE ELEMENTOS AUTORIZADORES DA PRONÚNCIA. SÚMULA 83/STJ. REVISÃO INVIÁVEL. REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. A pronúncia não exige a existência de prova cabal da autoria do delito, sendo suficiente, nessa fase processual, a mera existência de indícios da autoria, devendo estar comprovada, apenas, a materialidade do crime, uma vez que vigora o princípio do in dubio pro societate.

(...)

(Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 1.013.330/TO. Rel. Min. JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 25/09/2018, DJe 03/10/2018)

grifei

12. No concernente ao caso em liça, tenho por presente a materialidade e indícios suficientes de autoria da conduta (ponto i).

13. Quanto ao primeiro, exsurge Laudo de exame pericial em local de morte violenta (ID 5637460) e demais documentado acostados ao inquérito policial.

14. Já o segundo se acha robustecido pela confissão de um dos copronunciados (em sede policial), depoimento testemunhal em juízo e, ainda, interceptação telefônica, sinalizando, portanto, a participação de todos os acusados, como bem destacado pela 2ª PJ :

“[...] No presente caso, o depoimento da testemunha Bruna Duarte Bazan e o interrogatório do recorrente Francigleydson são elementos idôneos para evidenciar os indícios de autoria, viabilizando o juízo de probabilidade da acusação. [...]

E mais, em trechos da Interceptação telefônica da operação “Yosef” é possível confirmar a participação dos três recorrentes (ID num 5637465 – págs. 5-9).

Ora, diante da prova oral colhida e da dinâmica fática, restaram comprovados os indícios suficientes de autoria que apontam a participação dos três recorrentes. Diante do conjunto fático-probatório, há indícios de que o acusado Francigleydson foi o elo entre o mandante Cosme, conhecido por “Cego” e o executor Wagton, conhecido por “Juquinha. Por outro lado, a versão dos réus Cosme e Wagton não se sustenta e é incapaz de ensejar uma certeza ou uma forte probabilidade de não cometimento do crime por parte dos acusados. [...]”.

15. Neste compasso, resta aparentemente caracterizado o animus necandi, em uma análise primária, repise-se, própria dessa fase processual de sumário da culpa (judicium accusationis).

16. Por derradeiro, quanto ao pleito subsidiário de afastamento das qualificadoras dos incisos I e IV do § 2°, do art. 121, do CP (ponto ii), entendo não merecer prosperar, igualmente, a reinvindicação.

17. É, decerto, arraigada no âmbito da jurisprudência do Tribunal da Cidadania, a impossibilidade de exclusão de circunstâncias qualificadoras da sentença de pronúncia, salvo na hipótese de serem manifestamente improcedentes ou sem nenhum amparo nos autos:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DAS SÚMULAS N.7/STJ E 279/STF. MOTIVO TORPE. PRONÚNCIA. DECOTE DA QUALIFICADORA. MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA. NÃO CONFIGURADA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

(...)

2. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, somente devem ser excluídas da sentença de pronúncia as circunstâncias qualificadoras manifestamente improcedentes ou sem nenhum amparo nos elementos dos autos, sob pena de usurpação da competência constitucional do tribunal do júri. Precedentes.

(...)

(Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 1.319.673/MS. Rel. Min. ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 13/12/2018, DJe 01/02/2019)

18. Assim, em análise superficial inerente ao juízo de delibação próprio do momento processual, entendo desmerecer amparo a irresignação quanto à qualificadora atinente ao motivo torpe (vingança):

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA NÃO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE. NÃO CABIMENTO. VINGANÇA. QUALIFICADORA DO MOTIVO TORPE. PRECEDENTES. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 1. A decisão deve ser mantida por seus próprios fundamentos por estar em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior. 2. Na pronúncia, que não encerra juízo de procedência acerca da pretensão punitiva, somente se admite a exclusão de qualificadoras quando manifestamente improcedentes ou descabidas, sob pena de afrontar a soberania do Júri, o que não se verifica no caso concreto, mormente quando relatado na própria denúncia que o crime foi cometido por vingança, sendo considerada qualificadora do motivo torpe pela jurisprudência firme desta Corte. 3. Agravo regimental improvido” (AgRg no HC 523.029/PE, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 03/12/2019).

19. De outra banda, no correspondente à qualificadora por recurso o qual impossibilitou a defesa da vítima, vislumbro, em um exame apertado, ponderado o enquadramento, porquanto a vítima foi atingida com 07 (sete) disparos de arma de fogo na região da cabeça.

20. Ante o exposto, em consonância com a 2ª Procuradoria de Justiça, desprovejo o Recurso.

Natal, de de 2020.

Desembargador SARAIVA SOBRINHO

Relator



[1] Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

Natal/RN, 12 de Maio de 2020.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT