Acórdão Nº 08028217720218200000 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 20-04-2021

Data de Julgamento20 Abril 2021
Classe processualHABEAS CORPUS CRIMINAL
Número do processo08028217720218200000
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: HABEAS CORPUS CRIMINAL - 0802821-77.2021.8.20.0000
Polo ativo
HEDER AZEVEDO DA ROCHA
Advogado(s): PAULO ROBERTO DE SOUZA LEAO JUNIOR, PAULO ROBERTO DANTAS DE SOUZA LEAO
Polo passivo
2° JUIZADO DA VIOLENCIA DOMESTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
Advogado(s):

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

Gabinete do Desembargador Gilson Barbosa

Habeas Corpus n° 0802821-77.2021.8.20.0000

Impetrantes: Dr. Paulo Roberto Dantas de Souza Leão – OAB/RN 1.839

Dr. Paulo Roberto Dantas de Souza Leão Júnior – OAB/RN 8.968

Paciente: Heder de Azevedo Rocha

Aut. coatora: Juiz de Direito do 2º Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Natal/RN

Relator: Desembargador Gilson Barbosa

EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. AMEAÇA E VIAS DE FATO (ART. ART. 147, CAPUT DO CÓDIGO PENAL E ART. 21 DA LEI DE CONTRAVENÇÕES PENAIS C/C ART. 5º III E 7º, I (VIOLÊNCIA FÍSICA) E II (VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA) DA LEI Nº 11.340/2006). PRETENSO TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGADA FALTA DE JUSTA CAUSA E INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. NÃO OCORRÊNCIA. EXISTÊNCIA DE LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO PARA SUPEDANEAR A DENÚNCIA. REQUISITOS DO ART. 41, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ATENDIDOS. INEXISTÊNCIA DE QUALQUER CAUSA DE REJEIÇÃO DA DENÚNCIA PREVISTA NO ART. 395 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM CONHECIDA E DENEGADA. CONSONÂNCIA COM PARECER DA 15ª PROCURADORIA DE JUSTIÇA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância com parecer do 15ª Procuradoria de Justiça, conhecer e denegar a presente ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar impetrado pelos advogados acima identificados, em favor de Heder de Azevedo Rocha, sob a alegação de estar o paciente sofrendo constrangimento ilegal por parte do Juiz de Direito do 2º Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Natal/RN.

Em suas razões, alegaram, em síntese, ser devido o trancamento da ação penal nº 0114753-42.2017.8.20.0001, na qual o paciente foi denunciado pelo suposto cometimento do crime de ameaça contra sua ex-namorada Rayssa Pereira do Nascimento, tendo em vista inexistir justa causa para a persecução criminal.

Argumentaram ser a ação desprovida de qualquer esteio probante quanto à prática delitiva por parte do paciente.

Afirmaram também ser nulo o despacho que recebeu a denúncia por absoluta ausência de fundamentação.

Por fim, requereram a concessão liminar da ordem impetrada, para que fosse determinada a suspensão do curso da ação penal n° 0114753-42.2017.8.20.0001, considerando que há audiência designada para o próximo dia 07 de abril do corrente ano.

No mérito, pugnaram pelo trancamento da referida ação penal por absoluta falta de justa causa.

Alternativamente, pleitearam a anulação do processo, a partir do despacho que recebeu a denúncia, determinando ao juízo coator que, se for o caso, fundamente adequadamente o recebimento da denúncia para, só assim, proporcionar a boa fluência processual penal.

Acostaram aos autos os documentos de fls. 16-198 (ID 8884018-8884163).

Na certidão de fl. 201, expedida pela Secretaria Judiciária deste Tribunal, consta inexistir outros processos em nome do paciente, e vinculadas às ações penais nº 0100356-75.2017.8.20.0001 e 0114753-42.2017.8.20.0001.

Liminar indeferida, fls. 202-205 (ID 9018833).

A autoridade apontada como coatora prestou informações, fls. 216-217 (ID 9196755).

Instada a se pronunciar, fls. 315-320, a 15ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

É comezinho que a ação constitucional de habeas corpus pode ser veiculada para o trancamento da ação penal, ainda que ausente o encarceramento provisório, uma vez que a persecução criminal, por si, gera coação física à liberdade do indivíduo.

Porém, somente será cabível nos casos em que configurada de plano a ausência de justa causa para o seu prosseguimento, restando patente e induvidosa a improcedência da acusação, já que não é possível, nesta via de exceção, a dilação probatória.

Da mesma forma, será pertinente o trancamento da ação pela via estreita do writ quando o fato descrito na peça acusatória for atípico, ou inexistentes indícios suficientes de autoria e materialidade, assim como diante de denúncia que não preencha os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.

Compulsando os autos, entendo que não assiste razão aos impetrantes, pois não foi possível visualizar a ocorrência de quaisquer dessas hipóteses.

Analisando os documentos juntados aos autos, em especial a peça acusatória, fls. 152-155 (ID 8884125), observa-se que estão presentes os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, pois houve a exposição do fato criminoso e todas as suas circunstâncias, tendo o órgão acusador delimitado a conduta do réu de forma clara e apta a ensejar o regular processo e o exercício da ampla defesa.

Depreende-se dos autos que o paciente foi denunciado pela suposta prática do crime de ameaça, previsto no art. 147, caput do Código Penal e pela contravenção, prevista no art. 21 da Lei de Contravenções Penais c/c art. 5º III e 7º, I (violência física) e II (violência psicológica) da Lei nº 11.340/2006, uma vez que supostamente ameaçou e praticou vias de fato contra sua ex-namorada Rayssa Pereira do Nascimento.

Ressalte-se que não é cabível a valoração das provas quando do juízo de admissibilidade da denúncia realizado pela autoridade coatora, devendo essa limitar-se ao recebimento da peça de acusação, caso não vislumbrada hipótese de rejeição prevista no art. 395 do Código de Processo Penal, para que, após a instrução processual, possa se concluir pela responsabilidade penal ou não do paciente, como procedido pelo magistrado a quo. Se não, vejamos:

“A denúncia preenche os requisitos legais. Expõe o fato criminoso com todas as suas circunstâncias, qualifica o denunciado e classifica o crime, arrolando as testemunhas e requerendo provas, atendendo, então, ao disposto no artigo 41do Código de Processo Penal. Permite, assim, o exercício da ampla defesa, que é constitucionalmente assegurado e a justa causa (lastro probatório mínimo necessário para a propositura da ação) também está presente. Além disso, nenhuma das circunstâncias previstas no artigo 395, do mesmo Estatuto, pode ser vislumbrada no caso concreto. Portanto, recebo a denúncia”.(sic)

Igualmente, também não se observa a incidência de qualquer causa de rejeição da denúncia prevista no art. 395, do Código de Processo Penal, nem mesmo a falta de justa causa para o exercício da ação penal, essencialmente porque o fato descrito na peça acusatória configura, em tese, as infrações penais de ameaça e vias de fato, e a sua narrativa possibilita ao acusado o pleno exercício do direito de defesa, de forma que não se pode cogitar de sua inépcia, além de ter sido esta embasada em elementos informativos colhidos pela autoridade policial, dentre eles a declaração da vítima e o depoimento da testemunha Inácio José Oliveira Souza.

Dessa forma, presentes a materialidade e os indícios de autoria delitiva, no contexto da denúncia ofertada pelo Ministério Público, evidenciadas diante das provas coletadas, suficientes são para a propositura da ação penal, de modo que o recebimento da denúncia com esse fundamento não é manifestamente ilegal, razão pela qual não pode ser fulminada de plano pela via estreita do habeas corpus.

Assim, não visualizo a presença de nenhuma das situações alegadas pelos impetrantes.

Ademais, somente a análise profunda do conjunto probatório dos autos da ação penal poderia levar a se concluir pela existência ou não das alegações do paciente e tal análise não encontra possibilidade no rito do writ.

Nessa linha de entendimento são os julgados do Superior Tribunal de Justiça:

"PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL DA DECISÃO QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO. PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL. IMPOSSIBILIDADE.AUSÊNCIA DE PREVISÃO REGIMENTAL. TESE DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA COLEGIALIDADE E DA AMPLA DEFESA. ARTS. 34, XX, E 202 DO RISTJ. NÃO OCORRÊNCIA. INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO REGIMENTAL. SUPERAÇÃO DE EVENTUAIS VÍCIOS. TESES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA E DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPROCEDENTE.DENÚNCIA APTA. PROVA DE MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA DEMONSTRADOS. VEROSSIMILHANÇA E PROBABILIDADE DAS IMPUTAÇÕES. DESCRIÇÃO CONCRETA E PARTICULARIZADA DAS CONDUTAS. REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. INADMISSÍVEL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (...). V - O trancamento da ação penal constitui medida de exceção que se justifica apenas quando estiverem comprovadas, de plano e sem necessidade de exame aprofundado de fatos e provas, a inépcia da exordial acusatória, a atipicidade da conduta, a presença de excludente de ilicitude ou de culpabilidade ou causa de extinção de punibilidade ou, enfim, a ausência de indícios mínimos de autoria ou de prova de materialidade. VI - Justa causa para a ação penal condenatória é o suporte probatório mínimo ou o conjunto de elementos de fato e de direito (fumus comissi delicti) que evidenciam a probabilidade de confirmar-se a hipótese acusatória deduzida em juízo. Constitui, assim, uma plausibilidade do direito de punir, extraída dos elementos objetivos coligidos nos autos, os quais devem demonstrar satisfatoriamente a prova de materialidade e os indícios de que o denunciado foi o autor de conduta típica, ilícita (antijurídica) e culpável. VII- Para o recebimento da peça...

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