Acórdão Nº 08031118020198205103 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Segunda Câmara Cível, 01-10-2020

Data de Julgamento01 Outubro 2020
Número do processo08031118020198205103
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0803111-80.2019.8.20.5103
Polo ativo
FRANCISCO SALES DA SILVA
Advogado(s): GREGORY BATISTA FERREIRA DE MOURA
Polo passivo
MUNICIPIO DE CURRAIS NOVOS e outros
Advogado(s):

Apelação Cível nº 0803111-80.2019.8.20.5103

Origem: 2ª Vara da Comarca de Currais Novos

Apelante: Francisco Sales da Silva

Advogado: Gregory Batista Ferreira de Moura (OAB/RN 15.635)

Apelado: Município de Currais Novos

Advogado: Rafael de Moraes Souza (OAB/RN 15.410)

Relatora: Desembargadora Judite Nunes

EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE COBRANÇA DE ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. SERVIDOR PÚBLICO EFETIVO DO MUNICÍPIO DE CURRAIS NOVOS/RN. PRETENDIDA RETROAÇÃO DA VANTAGEM A PERÍODO EM QUE NÃO HAVIA LEGISLAÇÃO LOCAL REGULAMENTADORA. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO PELA SEÇÃO CÍVEL DESTE TRIBUNAL EM INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma e à unanimidade, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora, parte integrante deste.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de Apelação Cível interposta por Francisco Sales da Silva em face da sentença proferida pelo Juízo da Segunda Vara da Comarca de Currais Novos, que nos autos da Ação de Cobrança registrada sob o nº 0803111-80.2019.8.20.5103, ajuizada pelo ora apelante em desfavor do Município de Currais Novos, julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial e, por conseguinte, condenou o autor no pagamento de custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, ressalvada a justiça gratuita.

Em suas razões recursais (Id. 6734090), o apelante requer, preliminarmente, a concessão do benefício da gratuidade da justiça, alegando, em seguida, que o direito a receber o adicional de periculosidade é reconhecido pelo Regime Jurídico Único dos Servidores do Município de Currais Novos. Acrescenta que a Norma Regulamentadora nº 16, do Ministério do Trabalho e Emprego, define como atividade perigosa, dentre outras, a segurança patrimonial de bens públicos, atividade esta desempenhada por ele na função de vigilante.

Aduz exercer o serviço de vigilante, o qual reflete constante risco de vida, expondo-o a roubos e outras espécies de violência física, requerendo, ao final, o provimento do recurso com a reforma da sentença para se julgar procedente o pedido inicial.

A parte recorrida apresentou contrarrazões, pugnando pelo desprovimento do recurso (Id. 6734096).

A Procuradoria de Justiça declinou de intervir no feito (Id. 7071202).

É o relatório.

V O T O

Presentes seus requisitos de admissibilidade, conheço do apelo, valendo ressaltar que a justiça gratuita deferida em favor do apelante, desde a origem, estende-se naturalmente à instância recursal.

O apelante pretende obter o direito à percepção do adicional de periculosidade, posto integrante do quadro efetivo de servidores do Município de Currais Novos, na função de vigilante.

Nesse contexto, é entendimento firmado nesta Corte Estadual que a imposição do pagamento de adicional de periculosidade a servidor público, sem que antes haja a devida regulamentação em lei específica do ente público a que esteja vinculado, fere o princípio da legalidade.

Sobre o referido tema, a orientação jurisprudencial foi pacificada por meio do julgamento do Incidente de Assunção de Competência em Apelação Cível nº 2015.014008-7, nos termos da ementa que segue transcrita:

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO DO MUNICÍPIO DE AREZ. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. CARGO DE VIGILANTE. DIVERGÊNCIA DE INTERPRETAÇÃO DE REGRA JURÍDICA ENTRE A 2ª E A 3ª CÂMARAS CÍVEIS EVIDENCIADA. IMPOSSIBILIDADE DE IMPLANTAÇÃO. NÃO DEMONSTRAÇÃO DA NATUREZA PERIGOSA DAS ATIVIDADES EXERCIDAS. AUSÊNCIA DE NORMA LOCAL LEGAL REGULAMENTADORA. ARTS. 69 e 71 DA LEI Nº 003/1997. LEI DE EFICÁCIA LIMITADA. NORMA REGULAMENTADORA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO E DO EMPREGO QUE NÃO É LEI EM SENTIDO FORMAL. INAPLICABILIDADE. RESPEITO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. ILEGALIDADE DA IMPLANTAÇÃO DE ADICIONAL DE PERICULOSIDADE À CATEGORIA DE VIGILANTES DO MUNICÍPIO DE AREZ. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES.”

(Incidente de Assunção de Competência em Apelação Cível nº 2015.014008-7, Seção Cível, Rel. Des. João Rebouças, j. 27/11/2017 – grifo acrescido).

Registre-se que, apesar de o precedente vinculante citado envolver o Município de Arez, as razões de decidir que serviram de base à tese jurídica fixada pela Seção Cível deste Tribunal aplicam-se integralmente ao caso em análise, uma vez que as normas estatutárias editadas por ambos os entes públicos, relativamente ao adicional pleiteado, têm, na prática, idêntico teor.

Com efeito, no âmbito do Município de Currais Novos, a implantação do adicional de periculosidade aos vigilantes somente se fez possível com o advento da Lei Municipal nº 3.352/2017, que veio a regulamentar tal vantagem funcional.

Sabe-se que, originalmente, o adicional de periculosidade foi trazido pela Lei Complementar Municipal nº 07/2006 (Regime Jurídico Único dos Servidores Municipais), cujos artigos 73, 80 e 81 assim registram:

“Art. 73 Além do vencimento e das vantagens previstas nesta Lei, serão deferidos aos servidores, as seguintes retribuições, gratificações e adicionais:

[...]

IV- adicional pelo exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas;

Art. 80 Os servidores que trabalhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas, radioativas ou com risco de vida, fazem jus a um adicional sobre o vencimento do cargo efetivo:

[...]

II – de 30% (trinta por cento), no caso de periculosidade.

Art. 81 Na classificação das atividades penosas, insalubres ou perigosas são observadas, no que couber, as normas de segurança ou medicina do trabalho estabelecidas em legislação específica.” (grifo acrescido).

No entanto, a simples existência de previsão no RJU municipal acerca do pagamento de adicional de periculosidade não é circunstância que, por si só, autoriza a implantação da verba nos vencimentos do servidor, na medida em que a legislação a que se refere o estatuto funcional é aquela editada pelo Poder Público local, e não a estabelecida em leis ou regulamentos federais sobre relações trabalhistas.

Dito de outro modo, a interpretação que se confere ao artigo 81 da Lei Complementar nº 07/2006 é a de que legislação específica, a que incumbe estabelecer as normas de segurança e medicina do trabalho para efeito de classificação das atividades perigosas, é aquela a ser oportunamente editada pelo Município de Currais Novos – na espécie, a Lei Municipal nº 3.352/2017.

Por outro lado, no tocante à invocação, a título de legislação específica, da Consolidação das Leis do Trabalho e da Norma Regulamentadora nº 16, do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, assim ficou consignado no Incidente de Assunção de Competência nº 2015.014008-7:

“[...] ainda que a parte autora esteja supostamente desempenhando sua atividade em condições periculosas, a ausência de regulamentação da norma municipal impede o pagamento do adicional de periculosidade, face à obediência ao princípio da legalidade que, como dito acima, veda que o administrador se afaste dos mandamentos da lei, sob pena de responsabilização.

[...]

Assim, diante da ausência de previsão normativa específica sobre a vantagem pretendida pela parte autora, resta clarividente ser impossível a implantação do adicional de periculosidade, posto que não pode a Administração Pública cumprir ato distinto daquele que determina a lei, sob pena de configurar-se ofensa ao princípio da legalidade.

Destaque-se, por oportuno, que a Norma Regulamentadora nº 16, editada pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, não é lei em sentido formal, possuindo natureza jurídica de instrumento regulamentador, apenas em casos específicos e previstos, inclusive instituído através de Portaria pelo órgão, não sendo, à toda evidência, aplicável ao presente caso concreto.” (grifado).

Por fim, o citado Relator ainda consignou:

“Em decorrência, há de ser fixado o seguinte entendimento, a ser adotado pelas demais Câmaras deste Egrégio Tribunal de Justiça e também pelos Juízes, nos termos do art. 947, § 3º do CPC, a saber: Inexistindo legislação local regulamentadora das atividades perigosas, não há que se falar em direito à percepção do adicional de periculosidade em sede Municipal.”

E, repise-se, em se tratando de situação idêntica àquela decidida no referido Incidente, há de ser aplicada nestes autos a mesma tese jurídica, consoante dispõe o artigo 985, incisos I e II, do Código de Processo Civil/2015, in verbis:

“Art. 985. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada:

I - a todos os processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo Estado ou região;

II - aos casos futuros que versem idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de competência do tribunal, salvo revisão na forma do art. 986.”

Apenas como reforço argumentativo, cito precedente de minha relatoria em caso análogo, referente ao adicional de penosidade estabelecido no Estatuto dos Servidores Públicos Estaduais, e em que se adotou o mesmo posicionamento:

“EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO ORDINÁRIA. [...]. MÉRITO: SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PRETENDIDO PAGAMENTO DE VALORES...

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