Acórdão Nº 08032482120228205600 de TJRN. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, Câmara Criminal, 05-06-2023

Data de Julgamento05 Junho 2023
Classe processualAPELAÇÃO CRIMINAL
Número do processo08032482120228205600
ÓrgãoCâmara Criminal
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
CÂMARA CRIMINAL

Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0803248-21.2022.8.20.5600
Polo ativo
GABRIEL EPAMINONDAS GOUVEIA
Advogado(s): LEONARDO NASCIMENTO MIRANDA
Polo passivo
MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
Advogado(s):

Apelação Criminal n.º 0803248-21.2022.8.20.5600

Origem: Juízo de Direito da 5ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN

Apelante: Gabriel Epaminondas Gouveia

Advogado: Leonardo Nascimento Miranda (OAB/RN 13.305)

Apelado: Ministério Público

Relator: Desembargador Glauber Rêgo.

EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIMES USO DE DOCUMENTO FALSO. RESISTÊNCIA E DESOBEDIÊNCIA. DIREÇÃO SEM A DEVIDA HABILITAÇÃO. PLEITO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO ENTRE OS DELITOS TIPIFICADOS NOS ARTS. 297 E 304 DO CP. INVIABILIDADE. DOCUMENTO FALSO QUE NÃO TEM SUA POTENCIALIDADE LESIVA EXAURIDA NA EXECUÇÃO DO CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO DO CRIME DE RESISTÊNCIA. ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. EMPREGO DE VIOLÊNCIA PARA SE OPOR A ATO LEGAL DE SERVIDOR PÚBLICO. DEPOIMENTO POLICIAIS. VALIDADE PROBATÓRIA. PEDIDO DE APLICAÇÃO DA CONSUNÇÃO ENTRE OS DELITOS DE DESOBEDIÊNCIA E RESISTÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. ACERVO PROBATÓRIO DEMONSTRATIVO DE QUE OS CRIMES FORAM COMETIDOS DE FORMA AUTÔNOMA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

ACÓRDÃO


Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer da 1.ª Procuradoria de Justiça, em conhecer e negar provimento ao apelo, restando inalterada a sentença em vergasta, tudo nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.

RELATÓRIO


Trata-se de Recurso de Apelação Criminal interposto por Gabriel Epaminondas Gouveia, em face da sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 5ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN, que o condenou à pena final de 03 (três) anos de reclusão, 02 (dois) anos de detenção, a serem cumpridos inicialmente em regime fechado, além de 40 (quarenta) dias-multa, pela prática dos ilícitos de uso de documento falso (art. 304 c/c art. 297, do Código Penal), de desobediência (art. 330, do Código Penal), de resistência (art. 329, do Código Penal) e de dirigir sem a habilitação (art. 309, da Lei nº 9.503/97), todos em concurso material (art. 69, do Código Penal).

Em seu recurso (ID 18499781), o apelante postulou, em síntese: a) pela incidência da consunção entre os arts. 297 (falsificação de documento público) e 304 (uso de documento falso), ambos do Código Penal; b) pela absolvição do crime de resistência; e c) subsidiariamente, pela incidência da consunção entre os arts. 329 (resistência) e 330 (desobediência), ambos do Código Penal.

Nas contrarrazões (ID 18751214), o Ministério Público de primeiro grau postulou o desprovimento do recurso.

Com vistas aos autos, a 1.ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e desprovimento do recurso interposto. (ID 19124631).

É o relatório.

Ao Eminente Revisor.

VOTO

Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do presente recurso.

Inicialmente, pretende a defesa a aplicação do princípio da consunção entre os delitos tipificados nos arts. 297 e 304 do Código Penal. Sem razão. Explico.

A defesa técnica do recorrente narra que “Em análise, constata-se que o réu segundo a acusação fez uso da carteira de identidade falsificada, por ocasião da lavratura do auto de prisão em flagrante, a fim de ludibriar à autoridade policial, visto que estava foragido do regime semiaberto, como confessado pelo réu em juízo. Verifica-se que o réu foi preso em flagrante, tendo apresentado documento de identidade falso ao policial responsável pela sua apreensão, com vistas a ocultar a sua condição de foragido, não havendo se falar em prática dos crimes de falsificação de documento público e de uso de documento falso, devendo apenas ser mantida a persecução penal no que se refere ao crime do art. 297 do CP.”.

Diante deste pleito, é necessário analisar se o crime de uso de documento falso esgotou sua potencialidade lesiva na consecução do delito de falsificação de documento público ou se subsiste sua lesividade mesmo após o exaurimento daquele, para que se conclua pela incidência ou não do princípio da consunção ao caso em tela.

O Tribunal da Cidadania, em processo semelhante ao caso em tela, ao transcrever trecho utilizado em decisão anterior, explica perfeitamente que:O princípio da consunção, cuja função é solucionar aparente conflito entre normas penais, incide quando uma conduta típica configura "crime - meio" em relação a um "crime-fim", desde que esgotada no crime-fim a potencialidade lesiva do crime instrumental. É dizer, para que se configure a consunção, o crime-meio não pode configurar conduta autônoma que ofenda a outro bem juridicamente relevante. Com efeito, a carteira de identidade RG falsificada (fl. 21) não possui potencialidade lesiva restrita à execução do crime de tentativa de estelionato praticado. É certo que em face de sua ampla utilização, o documento poderia se prestar a inúmeras outras fraudes. (...)" (AgRg no AREsp 1742507/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 06/10/2020, DJe 13/10/2020 – destaques acrescidos).

In casu, não teve o documento falso (RG nº 003.384.773-ITEP/RN em nome de “Alisson Lima de Souza”) sua potencialidade lesiva restrita à execução do crime de falsificação de documento público e exaurida na consumação deste, uma vez que veio a ser utilizado outras vezes pelo apelante, a exemplo do seu atendimento no hospital Clóvis Sarinho e na sua condução para identificação na delegacia de polícia, não havendo que se falar em aplicação do princípio da consunção.

Adoto, nesse sentido, trecho das contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público de 1º grau, tendo o órgão destacado que:

“De acordo com a interpretação da doutrina, o art. 304, do Código Penal, é um exemplo de TIPO REMETIDO, isto é, tipo penal que, para ser inteiramente compreendido, faz remissão a outro(s) tipo(s) penal(is), mas não se trata de uma norma penal em branco, pois o dispositivo não depende de integração com outra figura normativa para ser aplicado. Por escolha do Legislador, há tão somente, no preceito primário, menção ao uso de quaisquer papéis falsificados ou alterados na forma dos arts. 297 a 302 do Código Penal, e, no preceito secundário, remissão às penas cominadas à própria falsificação. Dessa forma, não há que se falar em consunção entre os crimes previstos no art. 304, do Código Penal, e o art. 297, do Código Penal, porque não há nenhuma relação de DEPENDÊNCIA FÁTICA entre eles, mas sim, uma espécie de complementação a fim de que a pena relativa ao crime do art. 304, do Código Penal, seja baseada no mesmo quantum definido para as penas definidas para o art. 297, do Código Penal, por se tratar também de proteção a fé pública de documento do tipo público.(ID. 18751214).

Insubsistente, pois, o pleito defensivo supra.

Superado este ponto, pugna a defesa pela absolvição da imputação do crime do art. 329 do Código Penal.

Narra a denúncia de ID 16900518 que:

“(...) “no dia 09(nove) de agosto de 2022, às 13h40min, em via pública na av. Adolfo Gordo, bairro Cidade da Esperança, Natal- RN, o Sr. GABRIEL EPAMINONDAS GOUVEIA foi flagrado, por Policiais Militares que patrulhavam esse local, conduzindo, transportando e mantendo sob sua guarda a motocicleta YAMAHA/LANDER TXZ 250, cor preta e placa PFF-6181 que sabia ser de origem ilícita e, ao ser abordado e sabendo que contra si existia o mandado de prisão de fl. 14, apresentou para os PM’s o RG nº 003.384.773-ITEP/RN (FALSO) de fl. 13 em nome de “ALISSON LIMA DE SOUZA”, mas com sua fotografia, quando, então e diante da constatação de que contra esse igualmente havia o mandado de prisão de fl. 29, conseguiu se evadir à ação policial, foi perseguido, desobedeceu às seguidas ordens de parada e, após se deslocar por cerca de 1km, caiu e foi abordado, instante em que se insurgiu contra os militares, chegando a derrubar o PM CÂMARA, e causou danos à motocicleta HONDA/XRE 300, cor cinza e placa RGM-1G77 (ROCAM), seguindo-se com a constatação de que o denunciado também não possuía Carteira Nacional de Habilitação (CNH), consoante o BO nº 00123415/2022-DP de fls....

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